Eu andava pelo corredor do colégio olhando para meus próprios pés, como sempre. As pessoas passavam por mim sem nem sequer notar a garota ruiva caminhar solitária. Estavam sempre rodeados por amigos, conversando, rindo, ou até mesmo estudando. Para eles, uma garota quieta no corredor não significava nada. Absolutamente nada.
Não que eu me importasse, de qualquer maneira. Eu tinha amigos também. Bem, pelo menos uma, mas era maravilhosa. Quer dizer, era isso que contava, certo? O que adiantava, afinal, ter vários "amigos" que virariam as costas para você assim que cometesse algum erro? Ou "amigos" que falam mal dos próprios amigos para você e, consequentemente, falam mal de você para os outros amigos?
Era por isso que eu era extremamente grata por ter Emmy ao meu lado. A garota, um pouco quieta com os desconhecidos, era uma amiga verdadeiramente incrível. Guardava segredos como se fossem dela mesma, sempre falava as coisas certas, não gostava de se meter em brigas e, principalmente, era a pessoa mais justa que eu conheci.
Emmeline tinha um dom incrível de conseguir se colocar no lugar de qualquer pessoa, independente de quem fosse. Podia ser silenciosa quando queria, mas também sabia se expressar bem em público e conseguia sempre – ou quase – convencer qualquer um sobre qualquer coisa. Não era à toa que queria ser juíza quando terminasse a escola.
Ouvi uma risada alta e levantei os olhos. Jennifer Vicentin. Nunca gostei da garota – por mais que Emmy me dissesse que não existiam motivos para a minha implicância –, algo nela me irritava. Talvez fosse o cabelo loiro comprido, cheio de mechas, que parecia gritar "Sou artificial!", as risadas escandalosas que ela provavelmente ensaiava na frente do espelho, a mania de olhar todos de cima como fosse superior, ou o modo que choramingava sempre que não conseguia o que queria.
Ela cochichou algo para as amigas, Marlene e Susan, e riu de novo. Não consegui evitar revirar os olhos. Esse era o problema de estudar em um colégio interno, você tinha que suportar diariamente os outros estudantes idiotas.
- ...e então, ele disse que não podia deixar os amigos na mão por causa das minhas besteiras. Dá pra acreditar? – eu ouvi ela dizer às amigas, enquanto passavam por mim.
Abri meu armário e, por pura curiosidade, continuei prestando atenção no grupo de garotas.
Ouvi uma risada amarga de Jennifer enquanto pegava um dos meus livros. Eu sabia que a conversa era sobre James Potter, seu namorado, por quem metade das garotas do colégio eram apaixonadas. Todos consideravam Jennifer e James como o Casal Perfeito, ele sendo do time de futebol, e ela líder de torcida. Típico.
- Bom, ele não perde por esperar – disse, naquele tom superior. Eu arqueei a sobrancelha. – Até parece que eu vou deixar James ficar me trocando por aqueles amiguinhos imbecis dele.
Tive que controlar um risinho. James podia ser tudo, mas devia ser um bom amigo. Quer dizer, ele anda com os mesmos três amigos desde que eu o conheço, acho que isso quer dizer alguma coisa.
- Hum, Jen – disse Marlene, em tom baixo. – Não acho que você consiga, sei lá, afastar aqueles três. Eles são amigos há anos!
Talvez uma das três tenha um cérebro, afinal, pensei comigo mesma.
- Esse é o ponto – sussurrou Jennifer. Talvez tivesse notado agora que estava em um corredor onde não parava de passar alunos. – Quando as pessoas convivem por muito tempo, elas confiam mais.
- Sim, e o que isso tem a ver? – perguntou Susan, debilmente. Essa aí com certeza tinha uma ervilha no lugar do cérebro.
- É simples – respondeu Jennifer, e eu apostava que estava com aquela cara de superioridade de sempre -, eu só tenho que fazer com que eles quebrem a confiança de James. Então, ele vai voltar a ser só meu, como sempre foi.
Marlene bufou baixo e Susan fez aquele "Ahhhhh" como sempre faz quando entende alguma coisa.
Fechei o armário, me controlando para não bufar igual Marlene e saí dali antes que ouvisse mais besteiras. Bom, pelo menos agora eu tinha algum motivo para não gostar de Jennifer. Quer dizer, que vaca. Tentar separar os amigos do namorado só porque é possessiva? Chega a ser ridículo.
Me permiti bufar depois que dobrei o corredor, o que fez com que algumas pessoas me encarassem confusas. Ótimo, pensei, agora elas notaram que Lily Evans existe por um segundo. E, provavelmente, vão esquecer no próximo.
Bufei mais uma vez ao passar por James Potter. Tinha certeza que agora mesmo ele estaria indo até Jennifer, implorar por perdão e eles voltariam a ser o casal feliz de sempre. E então, ele iria ter uma grande briga com os melhores amigos, causada pela própria namorada, e nunca iria descobrir. Imbecil.
- Algum problema, Evans?
Levantei a cabeça completamente surpresa. Primeiro, Potter estava falando comigo. Segundo, ele sabia meu nome! Como diabos Potter sabia meu nome? Quer dizer, ele mal sabia o nome dos professores.
Arqueei as sobrancelhas, confusa.
- Hum, não? – respondi hesitante. Soou mais como uma pergunta, mas ignorei.
Potter deu de ombros.
- Ótimo – disse.
E então, ele continuou andando, como se nunca tivesse parado para falar com a garota invisível.
Por um momento eu apenas fiquei ali, encarando o fundo do corredor com uma careta de confusão. Voltei a olhar para trás, onde James andava normalmente, com uma mão no bolso e outra bagunçando o cabelo – um gesto tão seu.
Apenas balancei a cabeça e continuei andando, tentando pensar em todas as vezes que eu havia falado com James. Hum, no primeiro dia de aula ele derramou suco em mim. Mas, pensando bem, nem posso dizer que foi um diálogo, já que quando ele virou para pedir desculpas ou fazer sei lá o que, Jennifer o puxou pelo braço para o outro lado. E teve o dia em que Black me fez tropeçar por gosto e ele o obrigou a pedir desculpas. Bem, aquilo tinha sido legal da sua parte, mas ele também não chegou a dirigir a palavra a mim. E eu também não me lembro de ter realmente me apresentado a ele.
Cheguei à conclusão que Potter era o tipo de pessoa que presta atenção na chamada.
Entrei a biblioteca e encontrei Emmy me esperando na mesa de sempre. A nossa mesa. Era em um canto mais escondido da biblioteca, não muito longe das estantes que continham os livros mais interessantes e ao mesmo tempo longe o suficiente de Madame Pince não ouvisse nossas conversas.
- Hey Lils – disse ela, assim que sentei.
- Hey – respondi. – Estudando o quê?
- Química – ela suspirou. – Por que tem que ser tão difícil?
Ela fez biquinho e eu ri.
- Não é tão horrível assim, Emmy. E eu sei que você está fazendo isso para eu te emprestar meus resumos, certo? – ela riu.
- É, certo. Eu admito – ela prendeu a franja atrás da orelha e se aproximou, como se fosse contar um segredo. – Mas eu também sei que você vai querer o meu de geografia – sussurrou ela.
Eu ri e revirei os olhos.
- Okay, temos um trato, então – disse, por fim e estendi o braço, numa pose formal.
Ela se fingiu séria, e apertou minha mão, mas foi a primeira a cair na gargalhada.
- Emmy? – chamei sua atenção.
- Sim? – ela respondeu, sem tirar os olhos do seu livro.
- Eu encontrei – falei. - Um motivo, quero dizer. Para não ir com a cara da Vicentin.
- Ah, é? – ela falou, ainda com os olhos no livro, desinteressada. Ela levantou as sobrancelhas para algo que leu, e anotou em seu caderno.
Odiava quando ela fazia isso. Ela simplesmente ignorava tudo o que eu falava quando estava estudando. Era irritante.
Peguei o livro de suas mãos e o fechei. Ela me olhou irritada.
- O que deu em você? – perguntou de cara amarrada.
- Você sabe que eu odeio quando faz isso – reclamei. - Parece que eu estou falando com as paredes.
Ela revirou os olhos.
- E você parece a minha mãe falando.
Eu sorri.
- Devia prestar mais atenção no que sua mãe fala – ela bufou e eu ri. – Enfim, como eu estava dizendo...
- Você descobriu um motivo para não gostar da Jennifer – ela completou. – Viu? Eu estava prestando atenção.
- Claro que estava – respondi com ironia. – Agora, você não vai perguntar qual motivo?
- Eu tenho alguma opção? – eu fiz que não e ela suspirou, mas deixou escapar um pequeno sorriso. – Qual?
- Ela é uma vaca – eu sorri, triunfante.
Emmy arqueou uma sobrancelha.
- Okay... Ela é uma vaca, certo. Agora, pode me explicar porque você acha isso?
- Bem, eu estava no meu armário e ouvi uma conversa – comecei.
- Ouvindo conversas alheias, dona Lily? – ela riu. – Tsc, tsc, que feio.
Eu revirei os olhos.
- Vai me deixar contar ou não?
Ela fez sinal para que eu continuasse.
Então eu contei. Tudo, sobre a briga, o plano e o fato de Marlene talvez não fosse tão ignorante como eu pensava. Só não falei sobre ter encontrado Potter logo em seguida, e que ele sabia o meu nome. E que falou comigo. Mas isso não importava, de qualquer maneira.
Quando terminei, ela estava pensativa.
- Isso é...
- Um bom motivo? – perguntei.
- Bem, é. Mas não só isso – disse, fazendo uma careta. – Eu acho que você devia contar a ele.
- Contar para quem? – perguntei, confusa.
Ela riu.
- Contar para o James, idiota – falou, revirando os olhos.
Mordi o lábio.
- Você acha? – disse, com um pouco de hesitação.
Realmente, tudo o que eu menos queria é ter de contar para ele. Tudo bem, era realmente injusto o que ela pretendia fazer, mas por que justo eu? E ele nem iria me ouvir, eu tinha certeza.
- Veja, Lily, o cara namora a garota por quase um ano e ainda não sabe quem realmente é ela – disse. Eu desviei os olhos. - E se sabe, não deve imaginar que ela queira afastar seus amigos. Posso não saber muito sobre James, mas da para ver que os amigos são importantes para ele. Muito importantes.
- É, certo – eu disse, balançando a cabeça, mas ainda sem encará-la. – Mas porque não podemos simplesmente deixar isso como está? Não é como se ela fosse realmente conseguir. Quer dizer, Black, Lupin e Potter são amigos praticamente desde que nasceram.
- Mas e se ela conseguir? – eu abri a boca para responder, mas ela me cortou. – Você não se sentiria culpada? Considerando o fato de que você sabia e não falou nada? Você não acha isso tão cruel quanto o que Jennifer está fazendo?
Okay, agora eu estava me sentindo culpada.
Com um suspiro, peguei um elástico e amarrei os meus cabelos ruivos em um rabo-de-cavalo mal feito.
- Você está certa – eu admiti, emburrada. – Mas porque tem que ser eu?
Ela revirou os olhos e eu fiz a minha melhor cara de cachorrinho abandonado.
- Você bem que podia fazer isso por mim, não é? – dei um sorriso doce.
- Na verdade, Lils, eu até iria – ela fez uma pausa, e eu sabia que era agora que ela ia dar uma daquelas desculpas que não tinha como contrariar. – Mas se eu dissesse que uma amiga me falou que ouviu a namorada dele dizendo tudo aquilo, ia parecer fofoca, não ia?
Eu ri.
- Fácil – disse, ainda sorrindo. – É só dizer que você mesma ouviu.
Ela balançou a cabeça.
- Então eu estaria mentindo – disse, desaprovadora. - O que seria tão ruim quanto.
- Ah, Emmy, não faz mal uma mentirinha pequena dessas – eu disse, com um sorriso inocente colado no rosto e fazendo um gesto de descaso com a mão.
- Nope – negou ela, sorrindo. - Eu não vou mentir. De jeito nenhum. Você ouviu, é o seu dever ir lá e avisá-lo.
- Que saco – resmunguei. – Eu não devia é ter te contado, isso sim.
Ela gargalhou.
- Quem mandou arrancar o meu livro de mim? – provocou.
E eu, como a pessoa madura que sou, mostrei a língua a ela.
Certo. Eu tinha que falar para o Potter que a namorada dele era uma vadia. Fácil. Quer dizer, eu podia simplesmente chegar e dizer "Hey Potter, sabe a sua namorada? Bom, ela é uma imbecil e quer afastar você dos seus amigos", porque não?
É, eu podia fazer isso. Soa meio insensível, mas isso não importa. O que importa é que eu vou ter feito o meu dever, caso ele não queira acreditar, problema é dele também. E eu não vou me sentir culpada depois, definitivamente não.
Droga.
Já era tarde e eu estava sentada ao lado de Emmeline no refeitório, observando Potter conversar com os amigos. Dava mesmo para ver que eles eram muito ligados, e eu me sentiria mal caso Jennifer conseguisse o que queria.
Emmeline me acotovelou.
- Ai! – reclamei, fazendo cara feia para ela, que só revirou os olhos.
- Acho que você deveria ir lá agora – sussurrou. – Enquanto a Vicentin ainda não está aqui. Você sabe o quanto ela é ciumenta.
- Agora? – fiz mais uma careta. – Por que agora?
- Você não quer que Jennifer faça um escândalo porque você está falando com o namorado dela, quer? – perguntou, risonha.
- Mas eu estou comendo agora! Eu não vou perder a minha janta por causa dele – sussurrei de volta, e indiquei com a cabeça onde James estava.
- Bom, é melhor do que perder a cabeça por causa da namorada dele – revirei os olhos. Ela me olhou acusadora. – E eu sei que você já terminou de comer faz um bom tempo.
Eu suspirei.
- Certo – disse -, estou indo.
Mas eu não me movi. Pelo menos, não sozinha. Emmeline praticamente me jogou para fora de onde eu estava sentada e me empurrou em direção a Potter.
Respirei fundo. Eu podia fazer isso, é claro. Não sei por que as pessoas se sentem mal em terminar o namoro das outras. É tão fácil.
Parei atrás de Potter e contive a vontade de correr dali. Tinha que fazer isso, de qualquer maneira. Seria injusto não fazer. Seria algo tão ruim quanto o que Jennifer queria fazer, foi o que disse Emmeline.
- Potter? – chamei, hesitante.
Lupin, Black e, finalmente, Potter viraram-se para me encarar. Droga, isso era pressão demais para uma só pessoa.
- Sim? – perguntou ele, com uma sobrancelha arqueada.
Eu estava começando a me sentir ridícula.
- Er... – olhei para Emmy em busca de apoio, mas, ao invés disso, ela estava com os olhos arregalados apontando para a porta do refeitório. Jennifer. – Oh, merda - deixei escapar baixinho. - Quer saber? – falei, me voltando para Potter. – Esqueça. Não era nada.
Jennifer já estava quase chegando à mesa e eu sabia que logo ia encontrar Potter. Dei a volta para sair dali enquanto podia.
- Hey, Evans.
Droga. Garoto idiota, por que não me deixa ir?
- Sim? – perguntei, espiando Jennifer se aproximar pelo canto do olho.
- Você poderia me emprestar sua redação de história? – perguntou ele, com um sorriso cara de pau.
Cara de pau. Era a única palavra que eu conseguia pensar. Era por isso, afinal, que ele sabia meu nome. Era por isso que ele havia falado comigo. Era porque ele achava que a idiota da garota ruiva que tirava notas boas era trouxa também. Mas acontece que não era. Garoto estúpido. Eu estava fervendo de raiva.
Apertei meus olhos, com ódio. Black riu, Lupin revirou os olhos e sorriu como se pedisse desculpa pela idiotice dos amigos. Eu coloquei um sorriso falso no rosto e me abaixei até meu rosto estar da altura do de James sentado.
- Não.
E eu não tirei o falso sorriso doce do rosto nem quando sai de lá e fui até Emmeline.
N/A: Antes de qualquer coisa, eu queria pedir desculpa a todas as pessoas maravilhosas que acompanham as minhas outras fanfics (There's no place like home ou Chased) por não ter postado durante todo esse tempo e ainda começar a postar outra fic. Eu sou uma vaca, eu sei. É só que a minha criatividade é limitada e eu tenho essa mania de começar a escrever várias coisas ao mesmo tempo e acabar perdendo interesse nas coisas antigas. Não se preocupem, eu não vou excluir nenhuma das outras histórias e estou tentando ter alguma ideia pra continuar TNPLH (Chased é mais complicado, até porque é a primeira fanfic que eu já escrevi em toda a minha vida, então eu leio uma frase daquilo e quero me matar de vergonha).
Sobre essa fic: eu tenho ela escrita (não completa, infelizmente) há muito tempo, só não postava porque eu pensava que, como mal conseguia manter atualizadas as outras histórias, como eu ia conseguir manter essa? Resolvi postar agora porque eu acho que voltar a conversar com vocês por meio das reviews, ser cobrada e tudo o mais, pode me incentivar a escrever. E daí eu posso continuar as outras fanfics (além desta) e parar de me sentir mal sobre isso. Eu já tenho bastante coisa escrita, então eu vou poder postar consideravelmente rápido, pelo menos por um tempo.
E é isso, acho. Deixem comentários me falando o que vocês acharam - mesmo se vocês acharam uma grande merda -, dando ideias ou falando qualquer coisa que vocês queiram.
Beijos
Ps: ninguém revisou o capítulo pra mim, então desculpem qualquer erro.
