Eu não podia continuar mais assim. Não podia fingir ser uma coisa que eu não sou. Não podia continuar com essa vida degenerada e sem sentido, sabendo que não estava no meu lugar, mesmo nunca tendo estado em outro.

Eu simplesmente não podia.

Então, naquela noite de sexta-feira, enquanto a minha mãe estava num bar, com os amigos, eu fugi.

Fui para onde o vento me levasse, e minha alma se enchesse de vida, para onde eu sentisse que meu futuro estivesse cheio de êxito, de pura esperança, de alegria.

Passei três dias caminhando, procurando algo que nem sequer sabia o que era.

E então, eu achei. Ou pelo menos uma parte dela. Quero dizer, dele. Sim, um homem, funcionário de uma estação de metrô em Miami.

Ele era um simples funcionário, mas algo nele irradiava poder. Fui até ele, como um imã me puxando.

Quando percebeu que eu me aproximava, sorriu e disse:

-Thalia - seu sorriso era luminoso, mas algo em seus olhos azuis e brilhantes como o céu mostravam preocupação. - Estive esperando você , filha.

-Pai- Falei, sem mesmo notar que ele sabia meu nome mesmo eu nem tendo dito, ou que ele havia me chamado de filha, e eu a ele de pai, ou talvez até eu notasse, mas era como se não fosse eu quem dominasse o meu corpo, como se algum tipo de força me influenciasse a dizê-lo.

Então, ele simplesmente me explicou. Me explicou tudo, o que eu era, o que ele próprio era, os perigos que eu corria, tudo.

E finalizou dizendo:

-Você nunca estará sozinha, Thalia. Eu sempre estarei ao seu lado,

E com isso, um metrô passou e ele desapareceu.

Original.

Então, comecei a procurar pela segunda coisa, que também não sabia que era, mas sabia que a acharia, algum dia.

E Não demorou muito.

Dobrei uma avenida e dei de cara com um garoto - devia ter entre 11 e 14 anos, era loiro, tinha olhos azuis, como os meus e os de meu pai, e era muito bonito - lutando com algum tipo de monstro, do qual eu nunca tinha cruzado.

Gritei e empurrei-o para o lado na hora exata em que as garras do monstro o atingiriam.

Nós dois caímos no chão e rolamos.

Então ele olhou para mim surpreso, e disse:

-Você vê…

Não deu tempo para dizer outra coisa além disso, pois o monstro já nos atacou e rolamos cada um para cada lado.

Ele jogou para mim um pedaço de metal afiado, parecido com bronze, para usar na luta contra o monstro.

Juntos, lutamos e derrotamos o monstro.

Ele olhou para mim e disse:

-Eu sou Luke.

E então eu soube que tinha achado a segunda coisa.

E que a minha aventura, logo começaria de verdade.

******

-Eu nunca tinha notado, mas os seus olhos são de um azul com um pouco de verde, misturado com azul bem claro, meio cinzento. - disse eu - São lindos.

Luke sorriu aquele seu sorriso radiante.

Estávamos sentados ao redor de uma fogueira, dentro de uma pequena caverna, de noite, enquanto a chuva caía lá fora.

-Os seus também, Thalia.

Luke estava afiando sua… bem, espada, que na verdade era só um pedaço de metal parecido com bronze, do qual ele me dissera serem o único tipo eficaz na luta contra monstros.

- Bem…- disse eu - Para onde vamos agora?

Ele afrouxou um pouco o sorriso.

- Boa pergunta.- disse ele- Estive pensando, Thalia, todo esse negócio de meio-sangues… Há de existir algum lugar para nós, não é? Quer dizer, nós ficamos o tempo todo rondando pelo mundo, sendo atacados por monstros, sempre tentando achar algum lugar em que sejamos acolhidos, amados, respeitados… Você acha que esse lugar existe, Thalia? Ou vamos ficar a vida inteira esperando encontrar algo que nunca encontraremos?

Fêz-se um silêncio. Pensei e respondi:

-Sabe, Luke, devemos sempre ter esperança de encontrar… Quer dizer, o meu pai disse eu eu o ém disse que eu encontraria amigos na mesma situação que eu que iriam ajudar. Disse-me que bastava eu ter fé e eu iria encontar…

-Pelo menos se eu soubesse quem o meu pai é…

-Hum… Que tal Apolo?

Ele juntou as sobrancelhas.

-Por que Apolo?

Porque Apolo é o deus grego mais bonito, e ele é o deus do sol, e por isso, ele teria filhos que dão calor só de se olhar como você.

-Hum… Sei lá. Eu apenas chutei - disse eu, levemente corada.

- Bem… Nesse caso… Que tal Hera?

-Luke, ela é a deusa do casamento. Não sairia por aí traindo o marido.

-Ah.. Certo, certo.. Que tal Ares?

- Acho que não. Sei lá, nunca fui com a cara dele. Ele é o deus da Guerra, agressivo, raivoso, nada parecido com você.

-Bem… Que tal o Seu Juca?

-Luke. Isso não é um deus grego.

-Eu sei, eu sei, só estava brincando.

- O.K… Então Afrodite, o que você me diz?

Ele fez uma careta.

-Nossa! Um cara filho de Afrodite deve ser um daqueles Mauricinhos da escola, que usam o cabelo para o lado e passam perfume cada vez que vão para a escola! É assim que você me vê, Thalia?

Comecei a gargalhar.

Ele me acompanhou.

- Ai, ai… -disse ainda sorrindo- E o que você acha de Hermes?

Mas então, no instante que ele disse Hermes, eu vi uma bola com o símbolo de Hermes - um caduceu- flutuando acima da cabeça dele.

-Ah!- gritei- Luke! Descobrimos, você é filho de Hermes!

Ele olhou para cima, se levantou e começou a rir.

-Woe… Essa eu nunca tinha imaginado! Bem, pelo menos agora sabemos… Mas… Thalia? O que eu faço com essa bola em cima da minha cabeça?- E começou a agitar as mãos sobre a cabeça.

Comecei a rir novamente.

A bola foi desaparecendo até que não havia mais nada.

Luke se sentou de novo e eu disse:

- Bem, agora que descobrimos as suas descendências gregas, o que nós vamos com…

Ele me interrompeu com um "Sh!''.

- O que houve? - perguntei.

- Está ouvindo isso?

Ficamos em silêncio e eu comecei a ouvir uma coisa fininha, um chorinho de criança não muito longe daqui.

-Eu vou ver o que é.-disse Luke e começou a se levantar.

-Eu vou junto- disse e me levantei o mais depressa possível.

Andamos juntos e vimos uma menininha loira, de baixo de dois pneus, obviamente, tentando se proteger da chuva.

Luke tentou tocar nela, e ela gritou e se se escondeu mais.

-"Sh… Está tudo bem. Nós só queremos te ajudar. - disse ele numa voz calorosa que me fez esquecer um pouco o meu nome.

Ela olhou para cima e perguntou:

-Que… Quem são vocês dois?

-Eu sou Luke, e esta é Thalia. Você não pode ficar aí na chuva, vai pegar um resfriado. Onde estão os seus pais?

Ela baixou a cabeça.

-Eles… Não estão mais comigo.

Luke e eu nos entreolhamos.

-Você pode ficar com a gente por enquanto.- eu disse- Vamos, tem uma caverna quentinha aqui perto.

Ela fungou e se levantou.

-Tudo bem.

Luke e eu pegamos ela pela mão, e fomos andando até a caverna.

A pequenininha estava tremendo.

Peguei o meu casaco junto a fogueira e o enrolei nela.

Ela parou de tremer.

Sentamos ao redor da fogueira e ficamos em silêncio, até que Luke disse:

-Então… Qual é o seu nome?

-Annabeth -disse ela, dessa vez sem gaguejar- Annabeth Chase.

-E por que você estava sozinha no meio daqueles pneus? Você… Não tem pais? - perguntou Luke.

-Tenho… Mas… Eu fugi. Eu não era querida. Meu pai não se importava comigo e minha madrasta me tratava como… se eu fosse um fantasma, ou algum tipo de animalzinho felpudo que não entende as coisas e que deixava toda a família em perigo.

Luke e eu nos entreolhamos outra vez.

- Em pergigo? - perguntou Luke.

-Vocês não iam acreditar em mim se eu dissesse.

-Ah, pode apostar que íamos.- disse eu.

Ela ficou um pouco em silêncio e disse:

-Monstros. Eles me atacam. Mas ninguém mais vê eles. Na primeira vez que aconteceu, eu pensei que era algum bichinho de pelúcia um pouquinho grande demais, pra gente poder abraçar e sentar em cima, mas…

-Luke- disse eu - Você já sabe o que isso significa não é?

-Sim- disse Luke- eu sei.

E então eu soube que a minha aventura iria enfim, começar.