Disclaimer: Pushing Daisies pertence aos céus.


Peppers

Olive Snook mastigava pimentas vermelhas enquanto observava, à distância, é claro, seu Fazedor de Tortas trocando sorrisos e temperos com a intrusa. Sua língua tornara-se estranhamente sensível, e a garganta parecia gritar sozinha pela sua atenção, tentando alertá-la de que atingira seu limite, porém sua atenção estava entregue à cena agoniante que permanecia imutável, embora constante, desenrolando-se diante de suas pupilas contraídas por conta do ardor a lhe subir pelo rosto. Uma parte de si queria esfregar aquelas pimentas nos olhos de Chuck, só para que ela não fosse capaz de piscar para o Fazedor de Tortas daquela forma, tão... íntima. Ainda não vira os dois se tocando, o que devia servir de consolo - mas só contribuía para o aumento daquele tornado que transformava seus pensamentos em pó de arroz e neblinava sua razão.

Com a intrusa Miss Simpatia, Olive descobrira que o real prazer do Fazedor de Tortas residia nos sorrisos embasbacados e frágeis olhares trocados durante o horário comercial. Cada novo momento do casal de intocáveis capturado por ela cavava um buraco profundo em seu estômago, fazendo-a rodopiar como água num ralo de pia, porém ela escorria para dentro de si mesma, sentindo-se pequena - bem menor -, chegando a um infinito abismo abrindo-se lotado de rostos, todos pertencendo a Chuck, com aqueles lábios sempre separados exibindo dentes perfeitos que, assim como os seus, nunca tinham se chocado acidentalmente contra os do Fazedor de Tortas num momento ardente de um beijo teatral e apaixonado.

Enquanto o efeito da pimenta e do estômago embrulhado se desfazia, Olive Snook anotava o pedido de algum cliente aleatório, ignorando as regras da casa sobre o bom tratamento. Havia um bom tempo que o bom tratamento do Fazedor de Tortas se limitava à intrusa Chuck e aquelas maçãs do rosto dela, constantemente coradas como se esfregasse morangos nelas todos os dias antes de sair de casa. Queria ser capaz de odiá-la, mas só sentia inveja. Não de seu rosto ou dos vestidos adoráveis. Era inveja do que ela causava no seu Fazedor de Tortas, de como o rosto dele se contraía em risos e outras expressões que Olive nunca vira antes e, para sua infelicidade eterna, o deixavam ainda mais bonito, tal como era bonito o céu outonal depois de um sereno repentino a lotar as folhas semi adormecidas de um orvalho frio e acalentado por um daqueles arco-íris movidos por um sol preguiçoso e inofensivo.

Apesar dos infinitos e inumeráveis motivos para lamentar sua má sorte, Olive Snook transformava tudo em música, geralmente dentro de si mesma, para depois cantarolar solitária pelo Pie Hole, ou na companhia de Digby, tão silencioso e atento às palavras que ela só conseguia expor por completo quando largava a voz em um complexo fá sol la si que somente seu coração tinha disposição suficiente para bombear sangue o bastante para manter os pulmões a pleno fôlego movimentando seu diafragma. O Fazedor de Tortas se transformava em sua canção particular, tão distante de suas mãos, tão impossível aos seus lábios, porém sempre ali, ao alcance de seus olhos, na companhia de Chuck Sorridente.

Olive Snook fazia da melodia de sua voz o único consolo - mesclada aos abraços peludos de Digby, que devia sentir falta do abraço do Fazedor de Tortas tanto quanto ela.

Lamentavelmente, naquele dia lotado de música, ficou sem voz.

Escreveu em seu bloco de notas um lembrete para nunca mais mastigar pimentas.


N/A: Aleatoriedade do dia, só porque sentir saudades não faz mal a ninguém, quando é uma saudadezinha assim.