Até a Última Lua
Por Elora
Se é destino, quem sabe?
Mas o certo é que seria assim
Você preencheu a parte
Que nem sabia faltar em mim
Sem você não há luz, não há nada
Só um imenso vazio sem fim
Que me faz perceber que a vida
Só é vida se estou junto a ti
No lugar onde nascem as estrelas
Estava escrito que serias meu
Só agora que tu me completas,
Eu sei quem sou, sou teu.
Capítulo 1
Era uma vez um cavaleiro, mas não um cavaleiro qualquer. Sir Sirius Howard Black pertencia a mais nobre e elevada das milícias: a Ordem da Fênix, uma organização que vinha através dos séculos, desde sua criação, lutando para livrar o mundo de suas mais odiosas pragas: espantando espíritos agourentos, enfrentando bruxos das trevas, exterminando lobisomens sanguinários, livrando pobres aldeias do flagelo dos vampiros, enfim, combatendo o mal, em suas piores formas.
Ser cavaleiro era tudo que Sirius sempre quis: uma vida errante de aventuras, enfrentando o perigo a cada nascer do sol, sem saber se veria um outro amanhecer ou se aquele seria o seu último dia na face da terra, sem contar que o título: Cavaleiro da Ordem da Fênix também era uma beleza para impressionar as damas menos impressionáveis e dobrar a donzela mais relutante. Não que ele realmente precisasse disso, Sir Black era um jovem muito formoso, seus cabelos negros e sedosos caíam-lhe brilhantes sobre os ombros fortes, seu rosto era de uma beleza delicada e máscula ao mesmo tempo: o nariz fino e longuilíneo, lábios carnudos e corados, cujo sorriso de dentes perfeitos, derreteria o coração mais gelado, olhos cinzentos e penetrantes que, quando em batalha, se acendiam de um furor tal que demônio algum jamais fitaria sem vacilar. Montado em seu corcel negro com sua armadura reluzente, uma espada imponente, a capa púrpura dardejando ao vento, Sir Black arrancaria suspiros de uma freira lésbica moribunda e caquética.
Como todo cavaleiro que se preze, Sir Black também tinha um fiel escudeiro, bom, não tão fiel quanto se poderia esperar. Digamos que servir um cavaleiro da Ordem da Fênix não era lá uma das profissões mais requisitadas ou duradouras, por isso, devido à constante demanda, criou-se um decreto permitindo aos condenados por crimes menos graves, alistar-se como pena alternativa. Assim, Peter Pettigrew deixou para trás uma vida de trapaças e ladroagem para servir ao lado da lei. Ao contrário de seu senhor, era baixo e desengonçado e o que esse tinha em altura, Peter tinha em circunferência. Nas batalhas era um completo inútil, mas ao menos sabia cozinhar, seria bom que, para variar, não acabasse com as provisões como vivia repreendendo-lhe seu mestre, até que era uma companhia aprazível pelas paragens solitárias e distantes em que viajavam, além disso, seu comportamento, débil e bajulador, era perfeito para a convivência com Sir Black, cujo espírito inflamado jamais admitia ser contrariado, e a quem um elogio, ou melhor, "uma exaltação mais que justa à suas habilidades incontestáveis", nunca seria demais.
Na noite em que começa esta história, senhor e criado, após mais uma empreitada bem sucedida nas terras do norte, viajavam com destino a Londres. Tinham cavalgado o dia inteiro, por isso estavam ávidos por uma farta refeição e uns bons canecos de vinho quando pararam às portas do Dragão Escarlate, uma estalagem cujo nome pomposo só servia para evidenciar ainda mais a espelunca que era.
A hospedaria estava lotada de gente encardida e mal encarada, o salão era pequeno, enfumaçado e mal iluminado, algum bêbado fizera a gentileza de vomitar na escada que levava aos quartos e, a um canto, os restos de uma mesa espatifada denunciavam uma briga recente. Assim que entraram, Peter se encolheu um pouco atrás de Sirius, que se dirigiu diretamente para o balcão, devolvendo cada olhar atravessado que recebeu pelo trajeto.
"Um quarto, uma garrafa do seu melhor vinho e ceia para dois", disse jogando uma moeda sobre o balcão. Peter deixou escapar um guincho lamurioso, Sirius suspirou vencido.
"Para três!" emendou erguendo os olhos para o teto encardido. Depois recomendando ao estalajadeiro que fossem servidos no quarto, retiraram-se para o mesmo.
Mal os recém-chegados desapareceram no andar superior, a porta do Dragão Escarlate abriu-se novamente para deixar entrar um insólito e interessante espetáculo. O silêncio imediatamente tomou conta do salão, seria possível ouvir até o zumbido da mosquinha que dava voltas na careca fedorenta do velho estalajadeiro. Acabara de chegar um homem enorme, o maior que já se vira por aquelas bandas, mal-encarado, todo vestido de preto, com uma capa enorme que facilmente abrigaria três homens, possuía também uma barba negra que lha chegava ao meio da barriga protuberante. Vinha trazendo atrás si, como se fosse um cãozinho, um garoto de mãos firmemente atadas e com uma corda em volta do pescoço, por onde era arrastado. Parecia muito jovem, pálido e magricela; usava uma camisa que um dia fora branca; as calças, em farrapos, deixavam ver os joelhos ossudos a cada passo que dava. O homem, ignorando os olhares curiosos, sentou-se numa mesa próxima ao balcão pedindo comida e cerveja.
Com a mesma facilidade com que o grandalhão esvaziava garrafas, o burburinho voltou ao salão. Embora a curiosidade reinasse, ninguém ousou se aproximar do gigante para fazer perguntas, mas nem por isso deixava-se de especular discretamente: Quem seria aquele homem? Quem seria o garoto? Que crime teria cometido para merecer tal tratamento?
O garoto mantinha-se o tempo todo de pé ao lado de seu carcereiro, os olhos, escondidos pela farta franja castanha, insistiam em encarar o chão, de onde só se despregaram uma única vez: quando o estalajadeiro depositou um prato de cozido à frente do barbudo, que devorou tudo num instante, sem se dignar a oferecer ao prisioneiro, uma mísera migalha que fosse.
Muitas cervejas depois, os dois despertavam a atenção tanto quanto a velha cabeça de urso carcomida sobre a lareira. Mas foi só o barbudo desabar de cara contra a mesa para os ânimos se agitarem novamente. Logo um bando, repentinamente audaz, cercou o garoto e começou a enchê-lo de perguntas do tipo: De onde vem? Pra onde vai? Está a passeio? Ladrão, assassino ou escravo sexual? Mas o garoto continuava mudo, e não tirava os olhos dos próprios pés. Por fim a turba se afastou, cuspindo palavrões e maldições, indignadíssimos com aquele garoto arrogante e que não lhes contava nada do que queriam saber sobre a vida dele!
A madrugada já ia alta, e depois da decepção, o lugar se esvaziou rapidamente, os que não estavam em condições de se retirarem pelas próprias pernas foram, involuntariamente, dormir sob as estrelas, mas não a "montanha roncante" debruçada sobre a mesa, nesta ninguém ousou tocar. Mas o que fazer com o prisioneiro? era a preocupação do estalajadeiro. Não sabiam nada a respeito dele, se era perigoso. E se fosse um ladrão? Não podia deixá-lo ali no meio de seu estabelecimento! Mas também, nem se quisesse, poderia acordar o homem para acudi-lo, e ele certamente não queria! Então resolveu, juntamente com seu ajudante, transportar o jovem para o estábulo, onde, muito bem amarrado, os riscos de fuga seriam mínimos. Mesmo assim, ao voltar, trancou bem as portas e janelas e, massageando os ossos moídos, foi para seu quarto, louco para tirar uma merecida soneca após um dia de árduo trabalho.
