Às Avessas

Capítulo 1

Eu estava com uma sensação estranha. Não parecia que eu tinha acabado de acordar; era quase como se eu nunca tivesse dormido. Ou melhor, como se eu nunca tivesse existido. Se eu lembrasse do dia em que eu nasci, ou melhor, do dia em que eu comecei a ter consciência dentro da barriga da minha mãe, provavelmente essa seria a sensação exata.

Abri os meus olhos e tudo parecia extremamente diferente. As coisas estavam mais nítidas, mas claras do que sempre estiveram. Eu pude ouvir, por exemplo, que havia uma abelha em uma árvore próxima à janela do meu quarto. Eu podia ouvir as asas dela batendo. Eu nunca ouvi uma abelha que estivesse tão longe, porque isso é fisicamente impossível. Ok, ou eu provavelmente estou em um sonho muito maluco, ou eu pirei de vez. É Bella, deve ser a segunda opção.

Foi então que meus ouvidos "recentemente super desenvolvidos" captaram um som que lembrava uma respiração. Sim, era uma respiração. Lenta e profunda, provavelmente de alguma pessoa adormecida. Mas... de quem? Do Charlie, será? Não, ele não estava em casa. Não, é claro que não. Mas estava muito perto, perto demais...

Foi então que me dei ao trabalho de olhar para o chão, ao lado da minha cama. O que eu vi fez minha boca abrir-se de choque. Eu quase gritei, mas minha voz havia sumido. Ok, eu estava louca. Só podia ser.

Era o Edward. Bem, pelo menos parecia o Edward. Só que... haviam mudanças claras em sua aparência. Sua pele não era mais tão branca, era levemente corada. As olheiras não eram mais tão profundas, mas claras de um jeito natural. Eu podia, por mais estranho que isso fosse, ver as gotas de suor em sua testa. Suor. Mas o que era mais estranho de tudo isso não era sua pele, nem a transpiração. O mais estranho de tudo era ver ele... dormindo.

Sim, ele estava dormindo. E minha boca, que ainda estava aberta, transformou-se em um sorriso. Eu não fazia idéia do que estava acontecendo, mas eu não podia deixar de admirar o meu Edward dormindo como uma criança. Mesmo que tudo fosse completamente louco, eu não podia deixar de ficar maravilhada com aquilo: Edward dormindo no chão do meu quarto.

Me abaixei no chão para acordá-lo, mas então algo muito estranho aconteceu comigo. Eu me toquei que podia ouvir o coração do Edward, porque agora ele tinha um. Mas aquilo me deu uma sensação de... desejo. Uma sede que eu nunca havia sentido antes. Eu queria provar aquele sangue que corava o rosto do meu Edward, eu queria muito. Era como uma droga, me viciava. Me enlouquecia...

Não sei muito bem como eu consegui me afastar, mas em um segundo eu estava colada à parede do meu quarto. Acho que minha consciência gritou para que eu saísse de perto dele antes que eu pudesse machucá-lo. Foi então que eu me toquei de uma coisa que eu ainda não havia me tocado. Edward era humano e eu era...

Olhei para as minhas mãos e percebi que estavam mais brancas do que de costume. Coloquei a mão no próprio peito, tentando sentir os batimentos do meu coração, mas é claro que não pude sentir nada. Corri para a minha escrivaninha e peguei um espelho que havia ali em cima. Eu estava mais bonita do que eu era realmente e meus olhos eram... âmbar. Iguais aos do Edward. Desta vez, minha voz tinha voltado e eu gritei alto.

Edward acordou assustado e olhou para os lados, meio confuso. Eu estava com medo de mim mesma agora que eu pude ouvir seu coração acelerado. Eu tinha medo de machucá-lo agora que eu era uma vampira e ele que era humano. Oh, isso era tão confuso...

— Bella, por que você gritou e...?

Ele parou no meio da frase, pensativo. Ficou me observando por um longo tempo até que o desespero estampou-se em seu rosto.

— Eu... eu te... eu te mordi! — exclamou ele. — Eu te transformei, eu não queria, eu não podia e...

Ele levantara e parecia transtornado. Eu tentei falar, mas ele não parecia escutar nada do que eu dizia. Eu tive que gritar para que ele me ouvisse.

— Edward, presta atenção! — Ele se calou. — Você não me mordeu. Olhe... olhe para você! Você é humano!

Por um momento, Edward fez uma careta como se estivesse duvidando da minha sanidade. Ok, até eu estava duvidando dela. Mas depois, ele parou para se analisar. Edward passou a mão por sua pele, por seu rosto. Eu quase sorri ao reparar pela primeira vez que seus olhos eram de um verde vivo, absolutamente lindos.

— Viu? — falei. — Eu não sei o que está acontecendo, mas... De algum jeito, eu me transformei em vampira e você... voltou a ser humano. Nós, bem, trocamos.

Edward parecia confuso.

— Mas... como?

— Eu não sei — confessei, dando de ombros.

Fiquei levemente assustada quando o vi se aproximando de mim. Aquilo não era um bom sinal. Eu não sabia se podia constrolar meus instintos vampirescos ainda.

— Não! — exclamei. — Fique longe de mim!

Eu tinha estendido a mão, fazendo um gesto urgente. Pude ver a tristeza no rosto de Edward quando eu disse isso.

— Eu entendo que esteja... com medo.

Vi ele se afastar e sentar na minha cama, arrasado. Por um momento, eu não falei nada, meio confusa. Até eu entender o que ele estava pensando.

— Edward, não é nada disso! — expliquei, com urgência. — Não estou te culpando pelo que aconteceu, eu só... não sei se consigo me controlar. Seu sangue é... bem cheiroso.

Ele ficou perdido entre o sorriso e a confusão.

— Pelo menos agora você entende pelo que eu passava — Ele decidiu ficar com o sorriso. — Sabe o que eu queria dizer quando não queria que você... bem, passasse dos limites.

Eu não pude deixar de rir junto com ele. Nós mantínhamos uma boa distância um do outro, mas mesmo assim eu podia ouvir seu coração. Eu não consegui entender como o Edward suportava aquilo. Aquela sede que eu sentia pelo sangue dele era quase maníaca. Eu achava que quando chegasse perto demais, não conseguiria controlar meus próprios atos. E as conseqüência disso poderia ser desastrosas.

— A explicação mais sensata para tudo era que eu realmente te mordi, mas isso não faz sentido também. — Edward ainda pensava. — Primeiro porque seus olhos estão âmbar, e se você fosse uma recém-nascida seus olhos seriam vermelhos... Segundo porque a transfomação duraria mais e eu lembraria disso, porque eu estaria vendo. Terceiro porque eu virei humano...

— Quarto, porque isso, quinto porque aquilo... — brinquei, revirando os olhos. — Vai achar um monte de coisas para enumerar.

Edward ficou calado por um momento, olhando para o chão. Eu não fazia idéia do que se passava na cabeça dele. Acho que ele estava bem assustado com tudo o que acontecera, e para falar a verdade, eu também estava. Eu sempre quis que ele me trasformasse, mas isso era diferente. Primeiro porque era muito louco. Segundo pelo fato de eu ser o leão, e ele o cordeiro dessa vez. Afinal, eu queria que nós dois fossemos os leões; eu não queria cordeiros na história.

— Bella — ele me chamou. — Nós temos que consertar isso.

— E como?

— Não sei. — Eu vi a determinação em seus olhos. — Mas nós temos que dar um jeito. E depressa.