Capítulo I – Lar;

Leo Valdez e Nico di Angelo eram companheiros de apartamento há, pelo menos, uns dois anos. Conheciam bem as manias um do outro, pareciam saber sempre o que se passava na cabeça do outro – e isso pode se considerar um milagre, já que a cabeça do Valdez é turbinada a cem por hora – e já conseguiam até mesmo concluir a frase um do outro. Era inegável que, os dois eram próximos, melhores amigos se lhes perguntassem.

O companheirismo entre os dois não fora algo fácil de surgir, se voltassem no tempo, no primeiro mês de convivência entre eles, não encontrariam essa amizade sólida, na verdade era mais fácil ser recebido pelo silêncio amargo de Nico e o peso cansado dos olhos de Leo e cada um em seu canto, com pelo menos uns dez metros de distância entre os dois. Cada um tinha sua própria história e cada um tinha o direito de não compartilhar isso com o outro, isso os dois sabiam e por esse motivo àquela convivência era, no mínimo, tolerável.

Leo era obsecado por seu trabalho como mecânico e designer de carros em sua própria oficina – um lugarzinho nos subúrbios de Nova Iorque bem distante do prédio de apartamentos dos dois e que tinha o nome mais estranho para a concepção dos amigos íntimos de Valdez, Bunker 9 –, o latino, certas vezes, não tinha tempo nem mesmo para comer ou dormir, somente para abastecer a jarra de café preto e atender o empregador trazendo suas tortilhas de carne de um restaurante mexicano que ficava do outro lado da rua. De primeira vista ele parecia um "homem das senhoras", sempre se apaixonando rapidamente por aquelas mulheres que nunca dariam sequer um segundo olhar para o jovem homem com uma aparência, curiosamente, élfica. Suas mãos, assim como sua mente, eram irrequietas sempre buscando ter algo nelas para mexer, sua personalidade exterior sempre alegre, festiva e cheia de sorrisos de rasgar o rosto.

E Leo Valdez era o total contrário de Nico, o que era um dos outros milhares de motivos – se não o primeiro da lista – para que nenhum dos dois fosse um com a cara do outro de primeira.

Já Nico era alguém bem simplista, de ações e falas pragmáticas, com ele conversas tornavam-se monólogos por conta da falta de participação do mesmo em uma. A postura aristocrática não deixava dúvidas que ele vinha de uma família influente e podre de rica, mas o que, mesmo não querendo, cativava a qualquer um que o conhecesse – e o Valdez é um dos primeiros dessa lista – era o forte sotaque italiano misturado com as palavras cultas demais para o século XXI e o modo como Nico praticamente falava com as mãos; era adorável quando Di Angelo se encontrava animado o bastante para fazer suas mãos moverem-se a duzentos por hora enquanto falava. Claro que as partes adoráveis do outro se encerravam aí, já que o Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC) do outro acabava se tornando um empecilho para ele se socializar ou se tornar sociável o bastante para as pessoas ao redor, claro que o transtorno era controlado a base de remédios e uma terapia em grupo que Nico tinha que participar duas vezes na semana – as segundas e as quintas, sempre no mesmo horário –, mas isso não impedia aos outros de se sentirem incomodados com a presença do menino de estilo punk.

Leo achava que a hipocrisia humana tinha chegado ao seu auge, mas aí conheceu Nico e seu lugar na escala social.

Mas o que mais intrigava alguns dos moradores do prédio no qual os dois homens peculiares moravam era o motivo do porque, de um dia para o outro depois de tantos resmungos altos e descontentes vindo do apartamento de número 309, os dois inquilinos passaram a se dar bem. Claro que o motivo para isso não é algo digno de virar uma novela mexicana ou um livro de comédia romântica que encanta cada vez mais as adolescentes dos dias atuais, na verdade o motivo fora até bem simples, se não cômico. Tudo por conta de um vizinho incrivelmente irritante que nunca soube não se meter onde não é chamado. Will Solace, ou também conhecido como o vizinho barulhento, super protetor e intrometido do apartamento 311.

Will havia se mudado há pouco e por quase sempre colocar música para tocar no volume máximo, o jovem loiro acabou ganhando dois inimigos com mentes estupendamente maléficas. Claro que tudo logo fora resolvido e o jovem estudante de medicina acabou ganhando uma restrição do sindico sobre o barulho no apartamento e também por ter inundado o apartamento e o corredor de sabão – claro que a última parte fora um truque dos companheiros do 309, e por consequência Will passou a mandar suas roupas para a lavanderia, com medo de sua máquina de lavar ficar louca novamente.

Um vínculo de companheirismo fora formado a partir daquele acontecimento e ele começou a se aprofundar cada vez mais ao verem que de um modo peculiar suas diferenças se encaixavam perfeitamente e a única semelhança entre os dois estava sendo destruída, a solidão não assolava tanto o coração de Leo e Nico, de alguma forma estranha eles se sentiam completos.

Depois daquilo o cantinho pequeno que era o apartamento pareceu ficar mais próximo de ser um lugar para chamar de lar.