FIC REVISADA ;)


É uma ideia louca da minha cabeça, de fazer um romance entre dois Comensais, dois vilões, e mantê-los assim sem redenção. Espero que gostem!

OS PERSONAGENS E O UNIVERSO DE HARRY POTTER NÃO PERTENCEM A MIM.

Os personagens originais e o enredo desta história, sim. Porém, não obtenho nenhum lucro disso... mas espero obter reviews porque as amo de paixão.

Boa leitura!


O dito e o escrito não provam quem sou,

Traga a plena prova e todo o resto em meu rosto,

Com meus lábios calados confundo o maior dos céticos.

–Walt Whitman

.

1973

Ele acordava todos os dias faltando cinco minutos para se apresentar ao Ministério: era tempo suficiente para se enfiar dentro da capa, jogar uma água no rosto, amarrar os cabelos e aparatar. Seus colegas estavam tão acostumados em vê-lo desleixado, com olheiras fundas e cheirando à nicotina, que aquele já era tido como o estado natural de Augustus Rookwood - surpreendente seria o dia em que ele chegasse apresentável ao trabalho.

Passava pelos corredores e elevadores com dificuldade perante os cumprimentos e os olhares tortos de tantas pessoas diferentes: do mais baixo ao mais alto escalão, ele possuía amizades e inimizades de todos os níveis. Adentrava o Departamento de Mistérios com reclamações dos mais velhos por causa do atraso, sempre. Assumia sua mesa na Sala dos Pensamentos, retomando as anotações, fitando com cansaço aqueles cérebros antipáticos que era pago para estudar. Tinha que fazer muito esforço para não usá-los de travesseiro ao longo do dia, especialmente no começo da tarde quando o sono batia com tudo.

Ao final do expediente, muitos o procuravam para saber onde seria a jogatina. Era de noite que ele ganhava a atenção de tantos senhores, aproveitando-se dos vícios que acometia a tantos de forma indistinta. Se Augustus não entendesse tanto sobre a natureza dos pensamentos humanos, não trabalharia onde trabalhava - conseguia decifrar qualquer comportamento ou sinal de uma pessoa e igualmente enganá-la e confundi-la, especialmente perante as cartas. Era fácil como roubar doce de uma criança. Para completar, era de um humor tão magnético que atraía pessoas à sua volta, sendo sempre fácil ter adversários incautos à mesa.

Augustus, o boêmio, sempre terminava suas noites tarde demais, com os bolsos cheios de dinheiro (que seria rapidamente desperdiçado) e alguma prostituta no braço.

Somente aos finais de semana, os abençoados dias sem cérebros para atormentá-lo, ele se dava ao luxo de tomar um banho verdadeiro, demorado, e se olhar no espelho propriamente antes de se vestir. A imagem refletida era de um homem de quase trinta anos, com cabelos castanhos molhados que cresciam desordenadamente sem corte. Sua constituição era longilínea, de pele pálida, completamente marcada por cicatrizes - varíola de dragão - e com poucos pelos sobre o peito. Porém, a aparência frágil e deformada não mais o incomodava, já havia se acostumado. Olhou para os próprios olhos castanhos, pequenos e fundos, maliciosos colocados naquela moldura imperfeita que era seu rosto sulcado, anguloso e com cicatrizes mais fundas que no resto do corpo. Fechou os olhos e abriu um sorriso com os dentes amarelados, ao lembrar-se que há mais de dez anos possuía uma aparência muito mais agradável, e ele era até capaz de gostar dela.

Abriu os olhos novamente e começou a se enxugar com a toalha. Deteve-se um pouco ao passar pela Marca Negra no braço esquerdo. Há muito tempo ela não doía, há muito tempo sua presença não era requisitada perante Lord Voldemort, e ele imaginou se aquele sábado seria diferente. Não conseguira obter muitas coisas dos bêbados e viciados em apostas do Ministério ultimamente, ademais, as ações dos Comensais da Morte estavam ainda pouco convincentes perante os olhos do senhor Ministro. Tudo o que sabia é que ele estava tentando fazer com que todos ignorassem a possível iminência de guerra e seus funcionários, como ovelhinhas, forçosamente fingiam que nada estava acontecendo.

Ele se lembrou de uma conversa que tivera com Croaker, que trabalhava na Câmara da Morte, em que ele comentara perante a carta número treze do tarô que a palavra "Morte" era tão temida que muitos evitavam, e ainda evitam, pronunciá-la com medo de atraí-la. Por isso a palavra não estava escrita no baralho, e a morte era representada apenas pelo ceifador sinistro. Era o mesmo medo que fazia as pessoas não falarem a palavra "Guerra", com medo de atraí-la. Aquilo o fazia rir alto, sozinho, no quarto bagunçado onde a luz do sol não entrava por causa das pesadas cortinas.

Conhecia a morte muito bem, e quando o ceifador sinistro batera em sua porta, ele o teria convidado para um drink e uma partidinha amigável se essa entidade realmente existisse. O tal ceifador devia saber o quanto a família dele necessitava de uma limpeza, e durante um surto de varíola de dragão levou a todos, menos a ele. O único que permaneceu fiel à tradição, fiel aos princípios e ideais que deveriam reger o mundo. O único que se importou com a honra do próprio nome que fora jogado na lama pela nojenta simpatia por trouxas que seu pai teve e o levou a perder tudo, inclusive dinheiro e posição. E, sem nada, quando a doença os atingiu, eles não puderam fazer muito e acabaram perecendo com facilidade perante os olhos maravilhados de Augustus, que presenciava a justiça que a morte promovia.

Ele esperava o mesmo da guerra.

O estômago roncou, ele estava ainda em jejum. Pegou sua capa e desaparatou em Hogsmeade a fim de almoçar. Tudo bem que o Três Vassouras não servia necessariamente um almoço muito saudável, mas alimentar-se bem não era exatamente uma preocupação. Pegou a mesa mais afastada, acendeu seu cigarro e pediu um whisky de fogo enquanto pensava no que comer. Se tomasse mais umas doses, acabaria ficando só no whisky mesmo.

Ich will nicht hier essen, Sigurd! Lass mich!* - Uma loira elevara a voz, emburrada, para o seu acompanhante igualmente loiro em uma mesa próxima.

"Turistas...", Rookwood pensou, tendo a paz perturbada pelo grito. A posição da alemã era de extrema antipatia com o local pelo visto, e mesmo sem ter entendido uma palavra do que ela dissera, Augustus imaginava que ela estava se recusando a comer ali por nojo ou algo assim, pois ela cruzara os braços e as pernas e fechara a cara perante o cardápio que o acompanhante aparentemente solícito mostrara a ela. Era o tipo de mulher que ele adoraria levar ao local mais imundo que conhecesse e fazer o sexo mais sujo possível, só para que aprendesse a parar de ser fresca. Quando Augustus deu por si, os olhos dela estavam cravados nos seus com uma expressão nada amigável. Ele então percebeu que estava observando-a de uma maneira não muito discreta e voltou a atenção ao próprio copo.

Entre uma dose de whisky e outra ele conseguiu comer alguma coisa. Entre um cigarro e outro, ele não pôde evitar perceber que a alemã não comera nem bebera nada, apenas fumava em sua piteira com uma frequência maior do que ele mesmo conseguiria, enquanto o acompanhante dela agia com muito mais simpatia, bebendo e conversando com seu sotaque forte com o garçom.

Quando se deu por satisfeito, tanto da fome quanto da análise antropológica, Augustus retornou ao lar escuro e desorganizado. Permitiu-se cair num sono profundo durante a tarde e fora acordado de maneira abrupta ao cair da noite, quando a marca negra ardeu em seu braço.


*"Eu não quero comer aqui, Sigurd! Deixe-me!"

Obs: Os primeiros capítulos são curtos, depois eles se alongam pra cerca de 2.000 ou 3.000 palavras.