Naruto não me pertence. Mas como tenho vida fora daqui do FF, logo também terei personagens e séries que serão meus por completo. Afinal, estes sairiam da minha cabeça... Porém, é claro que é ótimo planejar fanfics UA com a obra do Kishimoto-senpai. É muito divertido. E um bom treino para a escrita.

A história a seguir foi baseada no conto "A Bela Adormecida". E só mais uma coisa: Hiei-and-Shino, algumas coisas no desenrolar desta fanfic foram inspiradas no seu excelente NejiHina "You're waiting of a train". Como eu já havia lhe falado antes, considere isso como uma homenagem. E você merece!

Agradeço também à Po-chan.s. Ela foi a pessoinha que teve a paciência de betar esta fanfic. Valeu, Pô!

Enfim, vam'bora!


- ONCE UPON A DREAM


- I -

Os sinos bateram... Não eram as igrejas, mas nada melhor do que aqueles sinos enormes e barrocos para indicar o fim de mais uma manhã. O som deles era cheio, forte, pungente. Uma badalada bastava... Dois minutos depois, os primeiros alunos a saírem de ambos os colégios ganharam a rua.

Claro que os diretores de ambas as instituições não viam com bons olhos o fato de que o colégio masculino e o colégio feminino eram vizinhos de frente, mas já não podiam fazer nada quanto a isso – o processo de mudança é muito trabalhoso e burocrático, fora que aquela era uma localização privilegiada na cidade. Os alunos faziam pouco caso de toda essa preocupação com eles. Afinal, agora os muros ficaram para trás. Na rua as regras são outras. E, lá, eles poderiam finalmente encontrar suas queridas namoradas de boina, casaco verde-escuro e saia pregueada azul – que ia até o meio das canelas.

E elas, seus amados cavalheiros de calças vermelho-escuro e casaco xadrez cinza.

"Ainda bem que comigo ninguém precisa se preocupar...", pensou enquanto momentaneamente olhava para cima. O céu estava descaradamente limpo. Assim não tem graça...

Hi Hi Hi Hi!

- Ei, tá rindo de quê, Chouji? – Shikamaru perguntou, olhando de soslaio para o amigo.

- Olha! – E olhou. Kiba havia acabado de levar uma bofetada de uma moreninha - A bochecha dele decerto vai arder por um mês inteiro. Pode apostar.

Enquanto isso, Naruto ria enquanto ajudava uma menina de cabelos preto-azulados e faces coradas a subir na bicicleta. Neji caminhava de mãos dadas com uma morena que segurava a boina na outra mão – tinha muito orgulho de seus dois coques. E Sasuke estava esperando alguém, encostado em um hidrante. Shikamaru bufou.

- Sabe... – Chouji, ninguém o ensinou a não falar de boca cheia? – acho que no fundo você tem é inveja deles.

- Eu sabia que o sal disso está te fazendo mal... Só acho que eles gostam de fazer todo mundo achar que a vida amorosa deles é um mar de rosas. – de novo, olhou para o céu como se alguma nuvem tivesse aparecido. Nada ainda – E as mulheres são bem problemáticas...

- Você nunca conviveu com uma para poder ter certeza disso. E a sua mãe não conta.

Por que Chouji adora subestimar a inteligência dele?

- E daí? É só olhar para elas lá embaixo... – Falando nisso, o que ainda estavam fazendo perto da entrada? Os dois amigos começaram a descer a escada que os levaria até a calçada. Junto à multidão.

- Me desculpe. É que para mim não é assim tão simples... – Chouji virou o pacote para baixo. Vazio. Despachou-o em uma lixeira próxima. O fato de ser gordo e de andar com o casaco totalmente desabotoado o deixava com uma aparência ainda mais desleixada do que a de Shikamaru. Este gostava de usar o casaco com as mangas amarradas à cintura. Quem mandou aquilo ser de tecido quente se os ar-condicionados da escola são fracos?

Percebeu os sapatos de alguém fazendo um barulho forte. Shikamaru olhou na direção das passadas – parecia que alguém ia a toda velocidade passar por cima dele. Acontece que Sasuke não precisaria esperar mais. A pequena moça de cabelo médio loiro-queimado e olhar doce havia acabado de chegar e deu um sorriso cansado, mas extremamente feliz, para ele.

Agora, sabe se lá por qual razão, o Nara reparou em um detalhe mais adiante. Enquanto o Sr. e a Sra. Uchiha se encaravam amorosamente, um rabo de cavalo mais loiro ainda havia acabado de ganhar a calçada no outro lado. Parecia estar acompanhado de uma amiga. Sumiram tão rápido quanto apareceram.

Não que tivessem evaporado de fato. É que Shikamaru não deu mais atenção àquilo. O tal cabelo não o impressionara nem um pouco. Só mais uma garota problemática como tantas outras.

- Vamos até aquela lanchonete nova hoje? – Chouji usou o seu melhor olhar estilo "Gato de Botas". Como se isso fosse necessário.

- Tem drive-thru?

- Sim.

- Ótimo. Detesto ter que ficar lá dentro esperando você terminar de comer.

- Ué, mas você não fica dormindo nessas horas?

Shikamaru sorriu de canto. Era tão bom mostrar que não era uma pessoa tão previsível assim...

ooo

Atenção! Você está sonhando agora.

Ela é apenas um rabo-de-cavalo loiro com a roupa do colégio. Está caminhando sozinha por aquele caminho precariamente calçado. Ela mora longe. No lado esquerdo há um cerca pintada de creme. O que é creme? É aquela cor que quer ser amarelo, mas que só consegue ficar perto do marrom e, de vergonha, tenta se esconder no branco. É lógico.

(A amiga dela está indo mais à frente. Você sabe. Ou está em cima de alguma árvore. Mas de alguma estranha forma ela está ali...)

A garota começa a apertar o passo. Está incomodada com algo. Você não pode ver, mas sente que a testa e as mãos dela estão suando. O apoio da pasta deve estar bem molhado a essa altura. Ela aumenta a velocidade, está quase correndo. Enfim, aparece uma enorme sombra atrás dela.

Agora ela está correndo de fato. Já o Bicho-Algo-Indefinido não precisa disso, suas passadas são longas e largas. Por mais que o nome dele ainda sugira que ele é nada mais do que uma sombra, isso não é verdade. Ele é real e está atrás dela. E vai fazer algo muito ruim com ela. A sorte da garota é que ela corre muito, muito mesmo. E não grita nada. Vez ou outra, ela vira rápido o rosto para trás, mas você não consegue ver sua fisionomia. É tudo questão de segundos. A face dela é só um borrão nessas horas. Ela é apenas um rabo-de-cavalo loiro...

(Você quer ajudá-la. Mas não pode. Aquela realidade não lhe pertence e seu direito sobre ela é tão nulo que você sequer sente alguma coisa. Que ajudá-la, mas não há medo ou compaixão, por mais que você queira. Você apenas assiste a tudo.)

E ela corre tão rápido, e rápido, e rápido... que ela de repente abre e sacode os braços. E sai voando. O Bicho-Algo-Indefinido ficou lá embaixo com a maior cara de tacho. Ele não voa, oras! Perdeu!

(Enfim, você sente algo. Vontade de fazer troça* do monstro até cansar...)

Então, lá do céu, a moça olha para a criatura e mostra o dedo médio para ele. Você sabia que ela era problemática, não está vendo?

Ela está tão longe que não consegue ver o rosto dela.

ooo

- Mais uma vez você se salvou. Parabéns.

Duas folhas grampeadas sobre a mesa. Shikamaru não sentiu vontade de pegá-las, apesar do enorme "10" marcado com caneta vermelha bem no meio do papel da frente. Aliás, não sentia nada em relação a isso. Outro aluno provavelmente teria um treco com uma notícia dessas.

- Mas vamos combinar uma coisa. –Asuma mudou um pouco a postura na cadeira. – Eu sei que você faz de propósito, mas nunca é bom para aluno nenhum tirar boas notas apenas quando quer.

- Bom, mas o importante é que eu vou conseguir passar. Não é verdade isso?

- O importante é que você se esforce, Nara-san. És um aluno brilhante. Saiba que é um desperdício não usar esse potencial durante boa parte do ano. – Empurrou um pouco a prova para a frente. – Pode ir e chame o Uzumaki Naruto para mim, está bem?

Shikamaru assentiu. Pegou a folha e já ia saindo...

- Só mais uma coisa. Vou pegar no seu pé no semestre que vem. Quero no mínimo 8,5 na minha matéria nos meses de agosto e setembro, está bom assim para você?

- Hm. – Concordou. Não podia fazer nada mesmo. Saco!

Havia espaço de sobra na pasta no Nara. Foi fácil meter as folhas alí. Levantou-se e ergueu-a. Era chato sentir seu peso. Porém, ainda bem que não precisaria mais voltar àquele colégio pelo menos até daqui a um mês.

Hoje o céu estava melhor. Dava para ver pela janela o quanto as nuvens estavam harmoniosamente espalhadas e fofas...

Um pássaro cruzou o panorama ao longe. Por um minuto, Shikamaru achou que ele tinha cabelos loiros... Como?

- Ah, você está aí! – Chouji falou alto, com o eterno pacote de batatinhas em uma das mãos – O que foi que ele disse?

- O mesmo de sempre. Demorei tanto assim?

- Ei, deixa eu ver, 'ttebayo! – Não foi o gorducho quem respondeu.

Engraçado isso. Naruto via suas provas como se pudesse sugar as respostas e colocá-las na do própria avaliação. Como se isso fosse possível mudar alguma resposta a essa altura do campeonato... Pelo menos, ainda bem que o rapazinho estava ali, pouparia o Nara da problemática missão de colocar o colégio inteiro de cabeça para baixo. Foi o que acontecera no mês passado.

Naruto deprimiu tão logo ouviu a frase "O professor quer entregar sua nota".

- Não liga não! – Chouji falou – É que vão dar uma festa na casa dos Hyuuga hoje.

- Ah... E ele vai ficar sem ver a namorada?

- VOCÊS DOIS CALEM A BOCA! EU JÁ TÔ SOFRENDO O SUFICIENTE, 'TTEBAYO!

O loiro deu uma fungadinha enquanto os outros dois tentavam ter certeza de que não levariam outro susto desses de novo.

Todo mundo já sabia dessa festa. Evento típico de coluna social. Aquele lugarzinho dos jornais onde família da Hinata sempre foi figurinha fácil. Naruto iria mesmo se não lhe tivessem dado o convite. Pularia o muro, com certeza. Sasuke também iria aparecer por lá. Nem Chouji e nem Shikamaru iriam. Ninguém entregou os convites a eles.

Mas também não faziam questão disso. Era engraçado como todos estudavam em um mesmo lugar, pagavam a mesma mensalidade e tinham situações financeiras semelhantes – se bem que o caso do Sasuke e do Neji são praticamente anormalidades – mas ainda assim... A verdade é que tanto Chouji quanto Shikamaru (e o Naruto também, antes de ele conseguir o feito do ano: Tornar-se amigo do Sasuke) nunca fizeram parte, de fato, da turma unida que era o 2º ano B. Ou quase, o gorducho era bom em lembrar as colegas da existência dos dois. Mas só de vez em quando.

Eram amigos desde tempos dos quais não se lembravam mais. Apesar de que...

- Ei, Chouji?

- Sim?

- Acho que eu podia passar na sua casa em qualquer dia desses – de novo a rua cheia de alunos. De novo a escada da entrada (ou da saída). Rotinas – Você já foi tantas vezes lá em casa, mas eu nunca fui na sua... O que acha?

Nenhuma resposta ainda. Mas Shikamaru não estava ansioso por isso. Bom, ficara ansioso mas... Estava esticando o pescoço em direção à rua. Não conseguia ver...

- Procurando alguma garota? – Chouji estava com um sorrisão na cara. – Eu sabia!

-... – Tudo o que conseguira foi virar-se para o amigo, com o rosto quente. Por ora – Não tem nada a ver com garotas, cara. Pode parar.

Ele não parou de imediato. Riu um pouco como quem diz "Eu sabia!". Apesar disso, Shikamaru podia jurar que viu um traço de preocupação no rosto do outro. Os dois seguiram em frente, sem pressa de se livrar da confusão do fim das aulas.

O Nara passou o resto do dia de mau humor. Sabia que algo sério estava acontecendo consigo mesmo, e isso o chateava bastante. Maldita hora em que começou a ter aqueles sonhos...

ooo

Atenção! Você está sonhando agora.

Olhe como ela entra. Ela está fantástica! Suas jóias são discretas, mas o vestido e a própria beleza da garota compensam isso. Com louvor. Ora, você sabe que ela é belíssima. Tão bela quanto problemática... Seu olhar a acompanha por trás, como se você fosse seu pajem. Ela fica levemente incomodada de vez em quando, fica querendo olhar para trás. Porém, nunca olha.

(Parece que é por sua causa. Será? Mas não há ninguém atrás dela.)

O salão também é muito bonito. Não pertence aos donos da festa, você sabe. É um buffet. Há enfeites coloridos por todos os lados. Há muitas pessoas elegantes e crianças correndo. Parece que elas, muito discretamente, estão abrindo caminho para a garota. Num dado momento, uma senhora tão gentil quanto afoita (?) se acerca de Yamanaka Ino.

(Você não faz a mínima ideia de como soube qual era o nome dela, mas isso não importa. Você vai esquecê-lo assim que acordar.)

- Menina, você me lembra uma boneca que eu tinha quando eu era pequena – a senhora falou. Ela tinha cabelos bem pretos, amarrados em um enorme coque atrás da cabeça. Uma coisa bem de senhora mesmo... – Espero que você seja amiga da minha filha quando ela tiver a sua idade!

- Ah!... Você conseguiu engravidar? – Sim, é a voz da garota!

A outra mulher fez sim com a cabeça enquanto passava a mão na barriga – que já estava enorme, alias! A música ambiente era uma de desenho animado. Algo parecido com Foi você o sonho bonito que eu sonhei... Foi você, eu lembro tão bem de você na linda visão... Você sente que isso está soando meio irônico, mas logo deixa isso de lado.

(E continua: Que me fez sentir que o meu amor nasceu então...)

Ela continua seguindo adiante. Passam nuvens e mais nuvens de enfeites, pessoas e tecidos. Ela se aproxima de algo que você entende ser um berço. E ela se debruça, começa a falar umas coisas muito fofas, chama Haruno Sakura para chegar perto e ver também... E a música começa a falhar.

A música cospe pedaços de frases e palavras. As luzes piscam e as crianças se escondem. E então o Bicho-Algo-Indefinido surge na festa. Cospe. Cospe. Cospe.

(Você tem que proteger a garota!)

O Bicho se torna mais Indefinido ainda. A única coisa certa é o sorriso macabro dele. E a garota é louca! Ela chega perto dele gritando um monte de coisas, intimando aquela coisa a ir embora. Mas ele não vai. Ele está se definindo. Ele segura o fuso de uma roca. Ele começa a cuspir palavras também.

- Pôr. Sol. Desesseis. – Ele vai no ritmo do vai-e-volta da música. – Aniversário. Dedo. Fuso. Roca. Morrerá!

E desaparece, deixando apenas o sorriso suspenso no ar. A garota joga algum objeto nele e ele se quebra em um monte de delicados cacos. Delicados e tenebrosos. Tudo volta ao normal como se nada tivesse acontecido. Só a moça não está normal. Está ajoelhada no chão, e outra garota surge-lhe por trás, abraçando-a. Por um minuto, você tem a impressão de que ela tem asas nas costas.

(Aquela deve ser Haruno Sakura. Faz sentido, você não sabe como. Ela lembra muito o seu amigo Chouji...)

- Calma, deixa ele ir! – a outra fala – Você não pode esmorecer. Quando ele voltar, você tem que estar pronta. E vai estar, não vai?

Uma lágrima pingando no chão.

- Sim. – A garota de rabo-de-cavalo cerrou o punho. Mas o pensamento dela grita: Estou com medo.

ooo

A primeira coisa em que Shikamaru pensou foi que setembro estava próximo.

ooo

- Pode começar a falar. Eu tenho todo o tempo do mundo.

- Não sou obrigado a dizer nada. Por que eu te deveria satisfações sobre a minha vida pessoal?

- Por que você ainda me deve os cinco ienes daquele lanchinho da cantina. E se a sua memória não estiver lá essas coisas, saiba que isso já faz quase cinco meses! – Droga! Shikamaru não poderia ter pensado em algo melhor do que ir à pet shop dos Inuzuka em plenas férias. Como adorava ser interrogado daquela forma... – Então, é melhor você me dizer logo quem é a garota que roubou seu coração ou já terei a minha fofoca para a volta ao trampo!

- Eu sabia que você tinha cara de fofoqueiro. Que problemático! – sobre o balcão, uma sacola com uma coleira dentro. "Shikamaru-san, poderia me fazer um favorzinho? É que, desde ontem, a minha perna está com não sei o quê e eu mal posso sair de casa..." Vizinhos! – Não tenho garota nenhuma.

- Sei. Então você olha para as meninas do outro colégio apenas para testar os índices de refração da sua retina. Conta outra!

- Você fica estranho falando de Física...

- Não mude de assunto!... Epa!

Shikamaru suspirou aliviado ao ver Kiba olhar para outra direção... Mas, sinceramente, há como um rapaz daqueles conquistar uma garota daquele jeito? Ele incorpora tão bem o Lobo Mau que não há Chapeuzinho que hesite em pedir socorro ao caçador. Kiba nem está ligando para o fato de que o cãozinho de um cliente está rosnando para aquela ruiva. E que ela o chutou em seguida...

Ele está pensando só nas curvas da garota! Só. Cérebro vazio.

- Olá! Acho que é a primeira vez que uma perfeição da natureza dessas aparece por aqui... – Kiba falou tão logo a moça se aproximou. – E, então, o que deseja, meu anjo?

- Que você seja mais profissional ao invés de ficar cantando a clientela – essa doeu! – Onde estão os bichos?

- Ei, bichos não. São cachorros – doeu tanto que Kiba até acordou. Parece. A ruiva quase soltou um "E daí? Qual é a diferença?", mas se conteve. O Inuzuka prosseguiu – É alí nos fundos, eu posso te mostrar o caminho.

- Não precisa. Ainda. Primeiro vou dar uma olhada na loja.

Logo depois, outro cliente chamou Kiba, que precisou sair do balcão. Shikamaru acabou a sós com aquela estranha de voz seca e olhos cheios de delineador preto. Um tipo bem diferente daquela loira de seus sonhos, embora ainda mais problemático. Ele resolveu aproveitar a hora para se mandar dalí. Kiba não hesitaria em prosseguir com aquele interrogatório despropositado. E o Nara não gostava de ninguém.

Pelo menos, não de uma mocinha de rabo-de-cavalo que talvez nem existisse.

- Ei! Você é Nara Shikamaru? – ele se virou, a ruiva olhando para ele.

"Como ela sabe o meu nome?"

- Sou – respondeu.

- Ah, prazer... – O tom de voz dela mudou tão completamente que Shikamaru até se assustou. A moça se aproximou, um tanto simpática – Minha mãe vivia falando de você. Ela queria que eu tivesse a sua inteligência, pff... Sou Mizuno Tayuya.

- Sua mãe... – ainda estava tentando organizar as informações – Espera um minuto aí! De onde vocês me conhecem?

- Ué, ninguém te falou nada?

- Nada o quê?

- Saco! Eu sabia que os Nara eram esquecidos, mas não a esse ponto! Ninguém te falou de mim, Tayuya, sua querida priminha?

"Prima?"

Nesse momento, Kiba acabava de voltar. Viu Shikamaru olhando confuso para Tayuya, e ela com um sorriso bonito... Deu uma risadinha ao terminar de juntar as peças. Da forma que mais achara apropriada, claro.

"Ah, não..."

- ... Hum, senhorita, ainda quer ver os cachorros? – Kiba indicava o caminho com um dos braços enquanto falava muito gentilmente.O sorriso sacana estava de novo na boca do sujeito, e por outros motivos, droga!

- Claro – já ela continuou sem fazer a mínima questão de ser legal com ele. No entanto, parou no meio do caminho – Shikamaru, quero passar na sua casa em qualquer dia desses. O endereço, por favor?

- Ei, vá com calma. A gente ainda nem se conhece direito.

-Tudo bem – ela olhou de relance para Kiba, como se estivesse adivinhando os pensamentos dele. Isso não é bom! – Eu vou... – olhou para o Nara de forma muito, digamos, safada – Vou esperar por uma resposta sua. Até mais!

Enfim, a prima que ele acabava de conhecer cruzou a loja inteira e cruzou uma porta de metal pintado de branco. Mas Kiba ainda não tinha ido. Nem iria tão cedo...

- É ela, não é?

- Ela é só minha prima. Vá logo atendê-la e me deixe em paz.

- Ah, está pegando a priminha gostosa, não é? Volto logo! – e se foi também.

Agora sim, Shikamaru pôde fugir. A sacola fazendo barulho ao ser puxada de repente.

"Estou gostando de uma loira, seu problemático..."

ooo

Atenção! Você está sonhando agora.

(Você sabe que a sua responsabilidade aumentou. Você sabe. Precisa protegê-la. Protegê-la. Gê-la. Gelo. O Bicho-Nada-Indefinido é gelado. Ele está só se divertindo.

Você precisa protegê-la agora!)

ooo

Chouji estava com sono leve naquela noite. Pôs a culpa na chuva lá de fora. E depois no futon novo. Já estava quase parando de pensar nessas coisas e indo ao que realmente interessa quando ouviu algo parecido com um rosnado. Só que muito mais... sentido.

Sobressaltou-se quando viu o amigo encolhido e agarrado aos lençóis com se sua vida dependesse disso. E suando frio.

- Ei! Ei, Shikamaru, acorda! Acorda!

Estava difícil, o "rosnado" continuava. Tentou sacudí-lo mais fortemente. Nada ainda.

– Ei, acorda! Isso é só um so...!

PAF!

Havia conseguido! Havia conseguido acertar... Shikamaru só conseguiu pensar nisso até o momento em que pôs a mão no rosto e constatou, com 100% de certeza, que estava acordado agora. Aqueles sonhos estão ficando cada vez piores...

- Ei, você tá legal? – Chouji perguntou, a mão na bochecha esquerda.

- Acho que sim... O que você está fazendo deitado no chão?

- Você me bateu, cara! E não foi fraco não... Estou até surpreso.

Foi quando Shikamaru reparou: Tirou a mão da cara e percebeu que ela estava vermelha de impacto. Murmurou um "Me desculpe" e voltou a se deitar, olhando para o teto. Até que era bem confortável a casa do Chouji. O gorducho, no entanto, permaneceu sentado na beira do próprio futon, interrogativo. A luz vinda de fora incidia sobre ele de um jeito estranho.

- Foi a garota loira de novo? – Perguntou.

- Foi.

Era estranho ver aquela luz sombria pousando nas lâmpadas apagadas.

- Acho que estou precisando de terapia – Shikamaru começou a falar – Veja só: Quase toda noite eu sonho com uma garota loira que acho que tem olhos azuis. E quase toda vez ela está sendo ameaçada por alguma coisa. E toda vez depois que acordo continuo achando que ela está em algum lugar precisando de mim, correndo risco de vida talvez, e que eu deveria pegar um carro e correr para onde ela está. Isso sem contar que a menina fica na minha cabeça o dia todo. O que você acha?

- ...

- Não vai dizer nada?

- Você só está apaixonado – Chouji deu um sorriso compreensivo – Dá para ver pelo jeito como seus olhos brilham... quando você fala nela.

- Tsc... Apaixonado e um pouco paranoico também? – encarou o outro – Se é pra estar apaixonado, eu bem que poderia ter uns sonhos melhores com ela – Chouji riu – Ei, isso não tem graça.

- É que o jeito como você falou foi engraçado – Chouji se deitava enquanto falava – Faça o seguinte: Quando as aulas voltarem, vamos nós dois prestar muita atenção às meninas do outro colégio. Uma hora, a sua loirinha vai acabar aparecendo.

- Eu nem faço tanta questão que ela apareça... Até que amar desse jeito parece ser bem menos problemático do que ter uma namorada de carne e osso. Só quero é me livrar dos sonhos.

- Meu palpite é que isso você vai ser um namorado bem atencioso para ela. Tanto medo de que ela se machuque, hein...

- E não quero mais dar motivos para aquele bando de problemáticos ficarem falando coisas pelas minhas costas. É um saco...

- Ah, mas pelo menos é bem melhor do que eles acharem que eu e você temos um caso. Acredite. Era essa a teoria da conspiração que andava rolando antes de aparecer a sua garota dos sonhos.

- Pff... Vai dormir, tá? – se virou no futon, ficando de costas para Chouji – Eu vou atrás da problemática, satisfeito?

Apenas ouviu o amigo concordar com um monossílabo. Ele devia estar bem feliz (Não viu Chouji fechar um dos punhos, tenso). Parece que não havia outra coisa a ser feita. Encontrar a menina chamada Ino (Era mesmo Ino?), ficar perto dela e protegê-la. Era o que ele deveria fazer. Definitivamente, algo muito complicado. Ela jamais o aceitaria. Dava para ver que ela decerto preferia caras como Neji ou Sasuke. Caras estilo galã de seriado americano, algo assim. Shikamaru estava muito longe disso.

Fora que ela também não era bem o que ele queria para si. Ela conseguiria ficar com caras perfeitos porque ela era perfeita o suficiente para eles. Combinação exata. Mesmo se fosse real, ela não era a garota comum que ele tanto acha melhor para si. Mesmo que nunca tenha ousado chegar perto de uma – Garotas comuns existem aos montes pelo mundo.

- Shikamaru... – Chouji ainda não estava dormindo? – ... como é que você não tem preguiça de falar "problemático"? É que essa é uma palavra meio comprida, não?

ooo

- Minha mãe vai me matar se eu chegar tarde no almoço.

- Já eu acho que ela vai ficar feliz se souber que você dedicou um pouco mais de seu tempo aos estudos – mas será que Asuma ao menos considerou a hipótese de que a D. Yoshino podia não acreditar nessa história? –Abra a página no assunto da última aula.

O homem estava decidido. Não iria deixar Shikamaru em paz enquanto não aparecessem quatro azulzinhas no boletim. O Nara sentiu muita raiva de si mesmo naquela hora. Nunca devia ter desejado que as férias passassem rápido. Tudo por causa da desconhecida dos sonhos. Tudo. Há pior coisa do que acordar de um pesadelo e, instantaneamente, entrar em outro?

Se bem que os sonhos haviam melhorado um pouco. Ontem a sua garota de rabo-de-cavalo estava passeando com o cachorro (que ele estranhou não ser um poodle) em um lugar cheio de frutas que falavam do quanto o futuro seria bonito. Coisa mais maluca e otimista...

- Pss! – Alguém na porta. E pelo jeito do barulho, a coisa não era com o professor.

Dava para ver o sorrisão do Naruto e a carinha tímida da moça de cabelos preto-azulados pela abertura. Esse garoto é louco, se algum bedel pega aquela menina lá dentro... Entre os dois, uma plaquinha feita com folha de caderno. "Munakata Jin & Oka Hiromi**. Se ferrou!", estava escrito.

Os dois se mandaram. Shikamaru não entendeu a piada, mas que havia uma piada alí... disso tinha certeza! Já que não podia esganar o Uzumaki e nem aquele professor desgraçado, apenas se recostou na cadeira e se limitou a pensar no quanto que sua vida era infeliz...

Mais tarde...

- Parabéns! – Shino deu-lhe uns tapinhas no ombro – Não gostei muito dela, mas cada um tem seus gostos.

Shikamaru se virou sem entender nada. E nem dava mais tempo de perguntar.

- Será que ele viu a sua moça loira? – Chouji perguntou.

- Quer parar de chamá-la de "minha moça loira"? Vamos lá pra fora.

Chouji deu uma risada que quase o faz se engasgar com as batatinhas. Ver Shikamaru apressar o passo daquele jeito era coisa rara. Lá fora, havia um razoável grupo de garotos cercando alguém que usava uma boina preta. Bem, algumas moças do outro colégio usam boinas pretas, Chouji nem ligou. Porém, sentiu perder o chão quando viu a pessoa. Aquilo era péssimo.

Shikamaru não teve uma reação tão exagerada quando a do amigo. Mas também não gostou muito de encontrar Mizuno Tayuya no final das escadas.

- Olá, priminho! – Ela também voltava de algum colégio. Saia pregueada preta, longa, camisa cinza e casaco também preto. Um leve suor em seu rosto denunciava que ela andara um pouco até chegar alí.

- Ah, então sua namorada também é sua prima? – Alguém perguntou, malicioso – Não sabia que você era tão...

- Ela não é minha namorada – e voltando-se para Tayuya. – Não ligue para eles, tá?

- Não se preocupe, seus colegas são muito cavalheiros – havia uma ponta de sarcasmo na frase dela. Mas, ao mesmo tempo, ela estava sinceramente feliz – Devem ter aprendido com o melhor... – Apontou com a cabeça para o colégio feminino.

- Viu? Não precisa ficar com ciúmes!

Eles não iriam parar. Aquele colégio estava ficando insuportável... Shikamaru se acercou da ruiva e resolveu se afastar com ela, por mais que isso gerasse mais comentários. Só queria ter sua paz de volta. Depois veria o que fazer com Tayuya.

Súbito, lembrou-se de Chouji.

- Ei! Você não vem? – Ainda nos degraus, o amigo estava pálido feito papel. Mas nem deu para notar isso direito. O dia estava ficando quente ou era o burburinho...

- Não, pode ir na frente. Preciso revolver umas coisas aqui ainda – a voz dele tremia – Pode ir. Pode ir.

Chouji viu o suficiente para perceber que Shikamaru estava se afastando com Tayuya e depois voltou ao colégio numa desesperada correria. Queria que os colegas não o interrogassem, queria achar uma solução. Teve que admitir para si mesmo que, por mais doloroso que isso fosse, não estava preparado para aquilo. E se viu sem saber o que fazer. Assaltou-o um grande medo de falhar.

Sentou-se no chão frio da entrada, desalentado. A cabeça mergulhada entre os braços e os ombros. O pacote de batatinhas pendendo na mão. E... o que estava fazendo alí parado feito um imbecil?

- Ei, por que é que você está sozinho aí, 'ttebayo? – A voz apareceu quando ele ia se levantar dalí.

- Ah, Naruto! – súbito, o rosto de Chouji se iluminou – Sabe, eu estava querendo mesmo falar com você.

- E eu também! – sentou-se ao lado – Acabaram de me dizer que o seu amigo arranjou uma baita namorada. É verdade?

Chouji não respondeu de imediato.

- Sim, é verdade. Só que... – se aproximou do outro – Você precisa me ajudar a juntar os dois. A menina estuda bem alí ao lado e é loira e usa um rabo-de-cavalo no cabelo. Só que ela não sabe que o meu amigo existe!

- Hum... Espera! Eu conheço uma menina assim! – Naruto falou. – Pode contar comigo!

- Puxa, você não sabe o quanto que eu te agradeço por isso! Vai lá e diga a ela que Nara Shikamaru quer marcar um encontro para amanhã, na hora da saída. Um encontro normal, só para conversar mesmo...

- Eu já disse, pode confiar, 'ttebayo! Essa loira vai ser a namorada do seu amigo até o final do ano. É palavra de honra! Até amanhã.

Finalmente, Chouji pôde sorrir de novo. Devia ter falado com Naruto antes...

ooo

Atenção! Você está sonhando agora.

O quintal da casa dela é muito bonito. A grama é muito bem aparada e há uma bela piscina perto de onde as garotas estão. Ela esta com as amigas dela já desde ontem, deve ser um grupo inseparável. São todas lindas, mas você vê apenas a loira. Ela está deitada, a mão apoiando a cabeça e o cotovelo no chão. O vestido dela é enorme. A saia do vestido é enorme, mais exatamente. Só que dá para ver a silhueta do tronco dela.

(Yamanaka Ino é magra, até um pouco mais do que deveria, mas o conjunto é harmonioso. As curvas não são voluptuosas, são delicadas. Ela não tem nada muito exagerado. Você sorri. Uniformes de colégio são um desperdício mesmo.)

Ela então se levanta. Haruno Sakura chegou. As duas se abraçam rodando e as outras meninas se aproximam. Parece que você conhece duas delas, a menina dos coques e a de cabelo preto-azulado.

(Hyuuga Hinata e Mitsashi Tenten. Guarde esses nomes.)

- Muito bem! – Ino começa a falar, tentando pegar um pouco mais de coragem – Eu sei que o aniversário é meu, mas quem vai ganhar presentes são vocês! – todas vibraram, surpresas – Sakura, manda ver aí!

E a tal garota chamada faz aparecer um caixinha com um pinguim bailarino nas mãos da namorada do Sasuke. A Hinata ganha um pequeno armário do qual sai coisas imagináveis e inimagináveis das gavetas e a Tenten ganha uma tartaruga de pelúcia que tem a cara do Neji e que canta "É o Amor". A primeira garota que você não conhece ganha um estojinho com mãos de sete dedos que colhem rosas. E a segunda garota que você também não conhece ganha um gato que tem uma abertura na barriga cheia de trufas de babalu. E há uma terceira garota? A loirinha realmente tem muitas amigas.

E Sakura não para. Você está espantado. Ela não para de soltar presentes. É muita lembrança para pouca garota. E a cada engenhoca que aparece você tem mais e mais certeza disso. É cor, é balão, é algodão, é carrão, é muito ão e muito inho. É o muito, muito que ela tira sabe se lá de onde. Muito, muito do muito de montão.

(O quintal está cheio! Vai cair em cima de você!)

É muito, muito e muito rápido e muito animadamente. Elas nunca viram tanto presente. Parece que até o Everest foi parar lá. E apareceu uma "câmera" e Ino olhou para a "câmera" e...

- KYAAA! O que você está fazendo aqui?...

(Está piscando REC no canto inferior direito.)

- Como foi que você entrou aqui? – Ela está injuriada. Uma mecha de cabelo quase lhe tapando um daqueles olhos azuis. Um cachorrinho latindo atrás dela. Mas que cachorro? -Por que é que você não me deixa em paz?

- Ino, pega leve, ele só...

- Você não está entendendo, Hinata. Esse cara aí é quem atrai aquela coisa!

(Você finalmente viu o rosto dela. É do jeito como você imaginou que fosse.)

- Dê o fora daqui antes que eu chame a polícia! Não quero te ver nunca mais, está ouvindo?

(Como se faz para parar de gravar?)

- Suma da minha frente já!

ooo

A mocinha tímida se virou e seguiu adiante, até o pátio, enquanto Naruto corria na direção oposta. Jurou a si mesma que daria um jeito. Que daria um jeito de o namorado para com essa mania de invadir o colégio feminino. O que seria dos dois se ele fosse pego? Temia mais a reação do pai do que a da instituição...

Enquanto isso, Naruto já estava pulando os degraus para chegar logo ao segundo andar. A biblioteca era o lugar favorito das colegas de Hinata. E, decerto, também o dela. Conhecia as rotinas da namorada e do colégio feminino o suficiente para saber que naquela hora, em que nenhuma alma vagava por aqueles corredores, elas estariam alí.

Abriu a porta devagarinho como quem se aproxima de uma bomba. E vê uma garota lá dentro. Ela está meio escondida entre dois armários, cuidando de alguma coisa. Naruto se aproxima, talvez seja a garota... E, quando está a quase dois metros dela, ele olha com mais atenção e percebe que ela está passando uma escova nas suas...

"Asas?..."

-... – Olhos verdes. Definitivamente não é a Ino.

-...

KYAAAAAAAAA!

Foi assim que Uzumaki Naruto conheceu Haruno Sakura. Olho no olho e grito no grito. E passadas pesadas chegando...

- Mas o que é que está acontecendo aqui? – Droga! Alguma professora! Naruto nem parou para pensar que a voz da criatura nem parecia com a de uma mulher feita. Mas não ficou menos assustado quando olhou para a porta e viu a pessoa quem procurava.

Cabelos loiros presos em um rabo-de-cavalo, não foi isso que o Chouji disse? Apesar da situação, o pensamento de que Shikamaru teve muita sorte veio como um tiro na cabeça do rapazinho. A moça ficou rígida no lugar. Estátua de cera.

- S-Sakura – Difícil dizer quem era o mais branco dos três alí dentro. – Não me diga que...

A garota das asas engasgou um sim. Já o Naruto...

- TEM UMA ARANHA ATRÁS DELAAAAA! – Ótimo. De onde foi que ele tirou essa frase?

Mais gritos.

ooo

Nunca a caneta de Shikamaru trabalhou tanto, mesmo que fosse só para sujar o papel. A enorme mancha preta de rabiscos que lembrava um pouco o Bicho-Algo-Indefinido. Graças a Kami-sama, ele nunca mais apareceu, mas sentia-o oculto em algum lugar. E não só nos sonhos.

Viu pela janela algumas meninas entrarem com um bolo no colégio da frente. Por um minuto, pensou que poderia ser o dela. A loira problemática fazia aniversário um dia antes do dele, e também iria completar 16 anos. E as datas já estavam próximas. Tão arranjado isso, não? Tudo coisa da cabeça dele.

- Escuta, eu fiquei sabendo que aquele seu professor chato faltou hoje – Chouji já estava terminando o terceiro sanduíche – Vamos poder sem problemas vigiar a entrada aí do vizinho. Quem sabe hoje a gente a encontra, né?

- Tsc... Se quiser, vá você. Eu não tô mais afim – um último risco no borrão – Se ela não apareceu até agora, não é agora que vai.

- Hum... Acho que vou comprar mais uma cota de persistência pra você. Era tão legal...

Shikamaru bufou.

- Vou estar naquele lugar – se levantou, sem nenhum pudor em deixar o amigo lanchando sozinho.

Pensou em se dirigir à sala dos professores e pedir para Kakashi substituir o Asuma na aula-extra do dia. Ele não negaria um pedido desses. Ultimamente, até que andava gostando daquele reforço compulsório porque ele lhe proporcionava pensar um pouco em coisas mais concretas. Estava com dificuldade em fazer isso nos últimos tempos.

Não era a toa que os adultos se preocupavam tanto com os namoricos do pessoal...

Há muito já havia repensado aquilo de que uma paixão platônica era menos problemática. Não era verdade, principalmente quando as expiadas no portão do outro lado estavam a fritar seu cérebro. O Nara não era disso antes... Mesmo que naquelas horas ele conseguisse bolar mil estratégias de como entrar lá dentro, e todas com alguma chance de funcionar. Mas não teria coragem nenhuma de levar alguma delas a cabo. Ele não era o Naruto.

Fora, que vez ou outra, aquele sonho em que ela o "expulsava" voltava aos seus pensamentos.

O colégio masculino tinha um enorme pátio sem cobertura. O sol e a chuva costumavam brincar muito com formas geométricas pintadas no chão. Lugar melhor para se observar nuvens, só no telhado de casa.

Mas ele agora mais invejava as nuvens do que as admirava. Elas sempre cruzam sem pressa o céu, zombeteiras. Tão livres...

Plash!

Só uma folha de caderno. Uma folha, até certo ponto, cuidadosamente dobrada. Isso bastou para que Shikamaru se abaixasse e abrisse o papel. A julgar pelas experiências no mês de agosto, eles nunca paravam alí por acaso. Nunca mesmo.

Faz tempo que a gente não se vê. Duas semanas para mim sempre é muito, pô.

Como já sei que você não vai tomar a iniciativa, saiba que vou estar em uma praça perto do seu colégio, às 5 da tarde. Você sabe qual é.

Você só vai descobrir o que é olhar nuvens de verdade se vier aqui.

Mizuno Tayuya

É, ela também gostava de nuvens. Passara a andar muito com a prima desde que descobrira isso. Às vezes, iam os três – ele, ela e Chouji – passear por aí. Mesmo que o colega sempre acabasse meio deslocado por não esconder a antipatia pela garota. Não esconder o suficiente, ao menos.

Se bem que o próprio Shikamaru também desconfiava muito de Tayuya. Não é normal descobrir um parente assim, do nada. Ela estava deitada na grama irregular da pracinha enquanto ele ficava jogado em um banquinho. O cabelo dela devia ser tingido. Não era aquele ruivo bonito, era algo bem água-de-salsicha. Ela cansou de mordiscar a caneta. O plástico já trincara todo mesmo...

Ela e o Nara até que eram bem parecidos.

- Posso te perguntar uma coisa?

- Sim.

- Quem é a moça, Shikamaru-san?

Ele arregalou os olhos. Até tu, Brutus!

- Por acaso... – ela se levantou e se deitou, rápida mas cuidadosa, por cima das costas dele. Não que ele não se fosse se assustar com a lascividade do gesto - ... a moça sou eu?

- E por que seria você? – Pelo menos, ganhara uma rota de fuga. Dependendo da resposta.

- É o que as pessoas dizem. – Ela nem se moveu. Duas risadinhas baixas. Deu para Shikamaru ver duas pessoas com calças vermelhas e casaco xadrez cinza andando por perto. Tinha que se levantar. Mesmo que Tayuya parecesse pesar uma tonelada. – Ei!

- Isso não é questão do que as pessoas falam ou não – Conseguiu! Postou-se frente a frente com a garota – Elas geralmente não sabem nada da vida dos outros, apenas especulam. E não é muito bom colocar lenha na fogueira delas, a não ser que você queira muito que aconteça o que "todo mundo diz".

- Está insinuando que eu sinto algo por você, por acaso?

- Isso você é quem sabe.

Tayuya riu.

- Eu apenas gosto da cara azeda que você faz nessas horas. É a minha favorita!

- Devia se contentar apenas com a do Chouji.

- O segurador de vela? Pode ser – ela relaxou um pouco a postura. Cruzou as pernas como se ainda estivesse no chão – Eu sei que você não gosta muito do olhar alheio, e tudo bem, vou deixá-lo em paz quando a isso. Mas imagino que você vai querer muito a atenção de todo mundo na hora de apresentar sua querida namorada. Está guardando o momento certo.

- Tsc... Eu sei lá se vai haver momento certo – afinal, ela é tão abstrata...

- Então admite que está apaixonado! Hehe, eu tenho que te dar os parabéns por conseguir se apaixonar e ao mesmo tempo não parecer um imbecil – Tayuya sorria – Mas ainda dá tempo de dar mancada, principalmente na hora crucial.

- ...

- Eu sei que você nunca beijou ninguém, seu burro.

- E daí?

- E daí que...

- EI, SR. CABELO DE ESPANADOR! PRECISO FALAR COM VOCÊ, 'TTEBAYO!

Não havia nenhum estudante por perto. Afirmação inválida. Naruto adorava abusar da criatividade quando se esquecia do nome dos outros. E a Tayuya se encolhendo e morrendo de rir. Extremamente constrangedor.

- C-como é... que é? – ela mal falava. Nem deve ter escutado o "Espera só um minuto" do Shikamaru. Na pior das hipóteses, nem deve ter notado ele se afastar – Essa foi ótima! – uma mulher com carrinho de bebê até olhou estranho para ela.

Fez que ia passar direto por Naruto, mas agarrou-lhe o braço. Arrastou-o até perto de uma árvore, quase na beira da calçada.

- Espero que não invente de usar esses apelidos na escola ou eu não respondo por mim...

- T-T-T-Tá bom! – o sorriso não saiu do rosto de Naruto, mas ficou bem amarelo. Isso bastou para que passasse um pouco da raiva do Nara – Eu falei com a Ino!

- Quem?

- A sua garota, cara! – Naruto nem esperou a confusão chegar à cara do outro e continuou – Na quarta-feira, ela vai com a Hinata até o portão do nosso colégio. E você tem que estar lá, é a sua chance de ouro! Agora dê licença que senão o tio do ramen vai fechar...

- Ei! Peraí... – "Ino?" – Naruto, você tem que me explicar essa história direito!

- Quarta-feira! Não se esqueça, 'ttebayo! – Ele já estava longe.

Mizuno Tayuya escutara tudo, escondida atrás das lixeiras.

ooo

Aniversários são uma bênção. Festas surpresas também. Se bem que surpreendente mesmo era ver Shikamaru pensando dessa forma.

Tinha dormido no meio da aula, como sempre. Só que desta vez acabara sonhando de novo com aquela festa. Fuso. Roca... E, a cada reprise desse sonho, ele ganha mais algum detalhe macabro. Desta vez, a coisa não havia sumido. Ela ia atacar Ino com o fuso. A ponta desfocada de tão brilhante...

O rosto da criatura não lhe era assim tão estranho...

- SURPRESAAA!

Chouji e os outros meninos da sala o salvaram.

ooo

Atenção! Você está sonhando agora.

- É frustrante – o ambiente é coloridamente sóbrio. Vermelho vinho, amarelo queimado, azul envelhecido e tons pastéis. Você está vendo tudo do teto. Você deve ser um lustre – Eu vou fazer as lições de casa, lá está ele. Eu vou comprar algumas coisas nas lojas, lá está ele. Vou só ajudar a minha mãe a fazer o trabalho da cozinha ou a cuidar da floricultura, lá está ele de novo! Parece até que ele está aqui, agora.

Você vê Sakura trocar o disco da vitrola. Mais jazz. Ela está usando um vestido tomara-que-caia branco com enormes bolas pretas, a saia bufante e curta. Cartola na cabeça. Ino está com um enorme vestido vermelho-escuro, cheio de laços.

(Ela vai sufocar com aquele colarinho que mais parece a boca de uma garrafa)

- É tipo... Tipo você olha pra mim e o vê? – Naruto estava com uma postura tão correta que só podia ser brincadeira. Usava um terno marrom, bigode postiço e arrancava as folhas do bloquinho que iam sendo preenchidas (rapidamente). A mão dele convulsiona, dá uns giros loucos...

- Não... – ela debochou – Nara Shikamaru é muito diferente de você. Eu sei de muitas coisas sobre ele.

- Através dos sonhos?

- Pois é. Sonho com ele quase toda noite.

- Você acha que ele é real?

- Quero dançar tango!

A música mudou. Ino se levanta do divã e Naruto da cadeira. Eles se dão as mãos e começam a dançar um bom tango argentino. Agora você pode ver que a saia da Ino tem uma fenda lateral. Ela combina muito bem com os laços. Você é um abajur.

- Por que está fazendo isso?

(Ué? Mas não foi ela quem quis dançar?)

- Todo psiquiatra*** também é louco – o bigode do Naruto está caindo. Você vai pegar quando descolar? – Ainda acha que ele está aqui?

(Sakura está dançando com Chouji nos fundos da sala. Você está girando. Tango é muito bom!)

- Ele não dança bem.

- O que acha que ele vai fazer quando souber sobre nós dois? – o corpo dele se dobra para trás. Ela está inclinada sobre ele. Posição básica. E então ela lança Naruto para o alto e ele atravessa o teto. O bigode no chão.

(A "câmera" cai bem na frente dela. Está piscando REC no canto inferior direito.)

-Acho que ele vai, tipo... – Ino responde - fazer assim!

(Vocês se beijaram!)

ooo

Ino acordou ainda sentindo o gosto dele nos lábios. Deve ser a ansiedade.

ooo

Fim de horário. Não estava dormindo, só estava pensando. Será que dava para o sujeito parar de cutucá-lo?

- Diz logo o que você quer, Chouji – No segundo seguinte, um movimento em direção a uma carteira próxima. O amigo se sentara.

- É verdade que a Tayuya vai passar uns dias na sua casa?

- Você fala isso como se fosse o fim do mundo...

Chouji começou a remexer na própria mochila, a procura de algum pacote de batatinhas – Como se houvesse alguma ainda. Estava nervoso.

- Ela fica agindo como se gostasse de mim, mas já percebi que não é nada disso. E nem é para chamar a atenção das pessoas também – falou – É como se estivesse armando algum plano muito sórdido ou sei lá... Ontem fiquei sabendo que o cachorrinho que ela comprou do Kiba, bem, ela matou.

- Gasp! Mais um motivo para você não ficar assim tão perto dela!

- Vai ser só hoje e amanhã, tempo o suficiente para eu descobrir quais são as intenções da problemática. – rodou uma caneta na mão - E já conheço o bastante da Tayuya para prever algo do que ela pode fazer... Ela vai ficar sob controle.

"Não vai não..."

- Se eu fosse você, esquecia isso por hora e pensava que hoje a sua loirinha vai aparecer! Não é hoje?

- Acho que você não devia ter contado para o Naruto sobre os meus sonhos.

- E eu não contei. Só falei que você estava gostando de uma garota loira e ele disse que conhecia alguém que pode ser ela. Se chama Yamanaka Ino, cara. Você me contou uma vez que também sonhou com esse nome!

- ...

- E ela já deve estar te esperando lá fora.

- Tsc... Uma das coisas chatas disso tudo é que vou ter que cruzar aquele corredor enooooooorme de novo... – resmungou enquanto se levantava, muito devagar, da carteira. Pegou a pasta em seguida – Você vai me dar um pouco de apoio moral, pelo visto.

Cabeça baixa, mãos sobre os joelhos.

- Chouji?

- Hoje não, tá? Pendências amorosas, só com os envolvidos – os olhos dele brilhavam de uma forma muito estranha. Não dava para ver isso. A voz meio rouca.

- Hum... Dor de barriga, não é? – virou-se para a porta – Então tá.

Saiu.

Não, não era isso. Chouji tentou gritar, por Kami-sama, que não era isso. Seu corpo não se movia. Tentou-se concentrar e enviar um alerta para Haruno Sakura, mas até isso estava difícil. Não podia deixar Shikamaru ir sozinho até lá fora.

Nunca ficou com tanto medo. Sabia perfeitamente o que estava acontecendo. Droga!

Os corredores ficam atulhados de alunos naquela hora. Shikamaru tentou desanuviar pensando no quanto seria difícil seguir contra a corrente. Todos indo para a saída. Menos Lee, que voltava para buscar um caderno que esquecera na sala e agora sofria pacas.

O clima estava ameno lá fora. O rapaz encostou na parede e ficou olhando para frente. O constante passa-passa de estudantes não o atrapalhava. O portão do colégio feminino ainda fechado, mas dava para ver as alunas ansiosas para sair por trás do mosaico de vidro colorido.

Enquanto isso, um carro estacionava na esquina. Shikamaru ficou ainda mais nervoso quando o viu, não esperava que eles fossem chegar tão cedo. Eles nunca chegavam cedo. Tayuya desceu do automóvel e ficou encostada à porta aberta.

Que esperassem!

Mas até que as coisas estavam se desenrolando rápido. O portão foi aberto logo em seguida. Um rio de boinas azuis invadindo a avenida e se misturando com os casacos acinzentados. A visão de sempre. Os pares se formando. Sasuke no hidrante esperando a Srta. Loiro-Queimado. Neji de mãos dadas com a mocinha dos coques. Naruto esperando Hinata na calçada do outro lado.

E o loirinho enfim pôde receber a namorada, que veio junto com outra garota.

De cabelos rosas.

Que logo voltou para dentro do prédio.

As mãos de Shikamaru crispavam enterradas nos bolsos da calça. Naruto e a namorada estavam se afastando do local. Ficaram conversando debaixo de uma árvore. Mais um minuto. Nada. E mais um, e mais um. E Tayuya ainda perto do carro, parecendo que o via do ponto onde estava. Combinação de frustração e pressão nunca resulta em coisas boas.

Não podia mais ficar por muito tempo. Nem sinal da loira. A torneira começando a fechar. Será que a perdeu enquanto prestava atenção nos outros casaizinhos. Então por que Naruto ainda continuava no mesmo lugar, e parecendo se divertir? Emburrado, saiu do lugar e começou a descer as escadas. Nunca teve grandes problemas para jogar a toalha quando precisasse.

Embora, naquela ocasião, isso estivesse doendo mais do que Shikamaru imaginava.

Não demorou muito para chegar perto do carro. Viu Shikaku no volante. O outro banco da frente estava vazio. Ótimo. Pelo menos, ninguém brigaria com ele por causa da demora. Nem Tayuya o faria, ele sabia.

- Está atrasado, priminho – só um comentário básico, claro.

Ela deu um espaço para que ele pudesse dizer algo, mas Shikamaru não fez proveito disso. Apesar esperou que a garota entrasse para, em seguida, fazer o mesmo. Apoiou uma das mãos no vidro aberto e...

- EI! VOCÊ AÍ!... – Uma voz escandalosa. De garota. – ESPERA UM MINUTO AÍ!

Não. Dá. Para. Acreditar...

ooo

Atenção! Você está sonhando agora.

Você achou que não era contigo. Afinal, ela estava bem longe ainda. Tão longe quanto sempre esteve, não é verdade?

(Você vira o rosto devagar. Você vê Naruto, Hinata e Sakura. Você vê o sorriso no rosto desta última. Você vê Chouji finalmente chegar na entrada do seu colégio. Ele mentiu para você. Mas você não está pensando em nada disso.)

Tem uma garota correndo na sua direção. Você a conhece há um bom tempo. Ela é aquela sua garota que primeiro era só cabelo, e depois voz, um corpo e finalmente um rosto. Ela se chama Yamanaka Ino. Agora você nunca mais vai se esquecer do nome dela. Nunca mais.

Ela está do jeito como você a viu na primeira vez. Com o uniforme do colégio dela. De fato, eles são um desperdício – Ou é por que ela está de casaco? Você consegue ver os dois olhos dela porque aquela mecha de fios loiros que ela traz na frente está balançando de um lado para o outro. Como é que aquela boina não cai?

(O rosto dela está todo distorcido pela correria. Será que ele vai virar fumaça se você tocar nele?)

- Ei, vamos logo!

(Uma mão no seu braço.)

Ela ainda está longe. Daqui a pouco ela chega mais perto. Por que não está usando uma bicicleta, Ino? Será que dá tempo de você pedir a do Naruto emprestada? Não dá.

(Você entra no carro.

E vai embora.)

ooo

- COMO É QUE VOCÊ FOI CAPAZ DE FAZER UMA COISA DESSAS, DATTEBAYO! – Naruto não se conteve, indignadíssimo, enquanto Ino para e apoia as mãos nos joelhos, ofegante. O carro acabava de ganhar a outra rua.

.

.Continua


N/A: Misturar ShikaIno com "A Bela Adormecida" é uma ideia que eu já tinha desde os tempos da Roma Antiga. É enorme a lista de histórias que a minha cabecinha concebeu com base nesse plot, e uma delas até chegou a ter dois capítulos (sem contar o prólogo) digitados no Word. Só não terminei de desenvolvê-la por que o tempo passou e a ideia já não me agradava mais.

No fim das contas, postar "Once Upon a Dream" me deixar com um vago sentimento de luto até. Pelos milhares de plots que poderiam estar aqui nesta página agora. Mas, enfim... Otowa, deixe de besteiras!

Gostaram? Querem favoritar? Críticas? É só deixar reviews. Afinal, o tempo que levarei para postar o 2º capítulo vai depender muito da quantidade de mensagens que aparecerem na caixinha desta fanfic, jajaja! *dá o seu melhor sorriso estilo Malévola*

ooo

*Sacanear alguém.

**Eu não pude deixar de fazer isso! Trata-se de uma referência a "Ace Wo Nerae!", um dos meus animes favoritos. Nele, a protagonista (Oka Hiromi) é vista pelo treinador do clube de tênis (Munakata Jin) como uma garota de grande talento para o esporte. A partir daí, vocês já devem imaginar – Não vou dar mais spoilers!

***Sei que o correto nesta situação não é psiquiatra. Porém, aquele era um sonho, com seus toques de seriedade-nem-um-pouco-levada-à-sério. Sei que alguns já devem ter sacado isso, mas achei pertinente colocar a observação aqui por ser este um dos pontos em que a beta me chamou a atenção.

ooo