Vernalagnia (s.f.); clima romântico provocado pela primavera.

Putrefato (adj.); que se encontra em estado de apodrecimento.


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Capítulo 01 – Weltschmerz

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Algo estalou e o rapaz não precisou se virar para saber que Sakura havia obtido sucesso ao violar a cabine de controle com um pé de cabra. Ele dissera que seria mais tranquilo se tivessem roubado as chaves, depois de já terem invadido o parque de diversões fora de seu horário de funcionamento e todo o resto que haviam feito dentro daqueles últimos meses.

Levantou as sobrancelhas. Aquele lugar estava demasiado apodrecido e todas suas cores berrantes de outrora alegria se apresentavam completamente desbotadas. Talvez tenha sido a escolha certa – sem segurança – no máximo haveria alguns marginais fazendo dali seu mercadinho e point de ilegalidade e nem isso eles encontraram. Nada. Nem sabia se a roda-gigante funcionaria, contudo aquela mulher insistia em dizer que "o parque está aberto, tinha pessoas aqui de tarde".

O moço moreno, dos olhos perturbadoramente negros, sabia que deveria sentir algum pesar em vê-la tão ansiosa, o nervosismo fazendo-a ficar paranóica e pensar em toda possibilidade como um possível sedativo para viver mais um amanhã e a impedir de ter a paz eterna – juntos, descobririam o que há por trás da morte. Ora, e acreditava que ela jamais pudesse se arrepender da escolha, no entanto nunca saberia. Confiava nelas, em tais escolhas, e em todos seus fios de cabelo coralinos, não importasse se sua médica estivesse o viciando em drogas. Ele também sabia que de uma maneira sublime e sem substâncias psicoativas, fazia-a viciar nele – era sua cocaína.

- Sasuke-kun.

Estava se sentindo tão em paz e aquele sorriso falsificado dela era tão bonito, dava-lhe uma calmaria melhor que toda morfina que Sakura pudesse ter injetado em sua veia. Ela pegou a mão dele com força, ainda que a leve tremedeira dela desse ar de hesitação dentro d'aquela atmosfera calma e contemplativa que perpassavam seus olhos. Não importava.

- Assim que a roda estiver funcionando, saio correndo e entramos juntos, ok?

- Não precisa se preocupar com tudo, Sakura. Eu não entraria em outro, sentaremos no mesmo banco.

Assim o fizeram e uma vez dentro da roda-gigante ela acendeu seu cigarro, vício gravado desde seu primeiro ano na faculdade de Medicina. Foi lá onde se conheceram, embora só fossem ter maior contato quando a moça sofresse diversos processos legais e tivesse contratado o homem logo ali para entortar os fatos e caberem dentro do formato da lei que a protegeria.

Uma vontade fugaz passou dentro do seu peito e, culpa fosse aquela proximidade dos dois, segurou a mão macia de Sakura. Ah, aqueles olhos esverdeados não tão saturados como os seus, poderiam alojar um universo inteiro.

Surpresa, ela o olha tentando usufruir de toda a plenitude que ele lhe causava. Sóbrio ou não, Sasuke sempre fora um ponto seguro, não precisava existir qualquer outra pessoa se não apenas ele. Admirava seu controle e sensatez nos anos conturbados que passaram. Sua confiança enquanto ambos pediam demissão de suas carreiras estáveis. E o por que era a causa dos problemas no casamento dela, isso era certo, mas bastava apenas olhar Sasuke que entendia de uma forma com que palavras fossem dispensáveis, a tamanha magnitude que ele causava dentro de si. Soprou a fumaça e fitou o céu estrelado de olhos fechados, sorrindo intimamente. Estava tudo bem se não o tinha para si, ela poder passar seus últimos instantes com ele e morrerem juntos bastava por quantas vidas pudesse viver – se essa coisa de encarnação rolasse a sério.

- Vamos.

Puxou-o para avisar que queria ficar bem na beirada do banco, os pesos de ambos gradativamente virando alguns graus da cabine vermelha envelhecida. Ela tinha tirado os sapatos antes de entrar e se vestia o mais comum possível. Já ele, de terno, parecia o advogado que é. Sakura soltou uma risada pelas narinas.

- Eu trouxe uma arma, se der errado para algum de nós. – disse constatando que o percurso não era assim tão grande assim e se eles trombassem em outros bancos... poderiam, infelizmente, sobreviver. – Ou se você quiser que n...

Não era do feitio dela, querê-lo apenas calado, tanto que aquele fora o primeiro beijo que roubara de Sasuke e não ele os lábios dela. Apenas doía como suas lágrimas escapavam incontroláveis e ruborizavam e salgavam seu rosto. Tudo na sua vida resumia nele, não importasse se vivessem um infortúnio em vida ou uma salvação em morte.

Por que era tão fácil para ela que nele causava um aborrecimento e mal estar. Inclinou-se tanto que caiu. "Droga, acho que me apaixonei." Foi o que pensou enquanto não sentia mais ela e o mundo. Sua queda durou poucos instantes, alguns segundos nos quais pensara apenas nisso. Sem palavras mais para descrever sensação alguma, apenas seu sangue manchava esparramado o chão de terra. Ainda quente.

Imaginando por quanto poderia passar em prisão apenas por aquele contato ínfimo, Sakura observa o corpo dele ao chão, alguns vários metros de distância. Morto – ainda assim o tinha, ainda era dela. Havia hesitado no último instante e não saltou junto.

Pegou a mochila em mãos e buscou uma arma, a dele. Assassinato, invasão, adultério e mais o que tivesse se esquecido de ter cometido – o que pudessem usar para fazer da sua vida um desagrado completo. Apesar de tudo, sentia-se incapaz de cometer suicídio.

"Se eu morrer, me esquecerei de você?" lamentou Sakura.


Weltschmerz – uma palavra que só existe na língua alemã. Welt, mundo. Schmerz, dor. Inventado por Jean Paul, denota um sentimento experimentado por quem entende que a realidade física jamais pode satisfazer as exigências da mente (créditos da Wikipédia).