Disclaimer: Kuru-sensei que está rico agora, então subentendesse que Saint Seiya pertence a ele. Até porque se fosse meu seria Gold Saints, Seiya e Saori não existiriam e Camus e Milo seriam os principais. Sem fins lucrativos.
N/A: Para aqueles que costumam ler minhas fics, devem ter se acostumado com Camus de cabelo preto. Mas em alguns projetos de fics (bem salvadinhos aqui ;-P) ele está ruivo e depois de analisar um por um eu entendi o porquê. Toda vez que faço Camus ruivo é porque ele tem algo de diferente, excêntrico talvez, que chame a atenção! Quando o projeto moreno, é porque suas ações ditam sua personalidade mas sem necessitar da aparência ou porque ele é simplesmente...comum! Em todo caso, aqui ele está ruivíssimo! Também optei por olhos castanho-azulados, como os de uma amiga minha: ao redor da pupila é meio castanho e em seguida é azul. Tipo um ovo frito XP.
Todos os nomes dos personagens são os originais de Kuru-sensei, os sobrenomes pertencem a alguém real correspondente ao país natal (nada como uma boa pesquisa ;-P), exceto o de Camus ("de Merville" é criação minha), e o de Milo (Milo Ventimiglia é um ator).
Enjoy it!
Parfum
Parte I
-O brasileiro, naturalizado português, Aldebaran Carvalho, dono da Martifer Solar comprou 60 da empresa Pontus Euxinus, principal representante do segmento de mercado fotovoltaico. A Martifer Solar já está presente em Portugal, Espanha, Itália, Bélgica, Estados Unidos, Angola e agora Grécia. Poderia falar um pouco mais Senhor Carvalho?(1)
-Claro. – ele sorriu para a simpática repórter e voltou-se com calma para a câmera. – Como você já disse adquirimos cerca de 60 do capital da Pontus Euxinus. Conversei pessoalmente com Milo Ventimiglia, o dono, e fiquei sabendo do estado de quase falência que a empresa se encontrava. É claro que o mercado grego é de especial relevância estratégica para o Grupo Martifer. Acreditamos no potencial deste país e na Pontus Euxinus, combinando a experiência das duas empresas cresceremos na Grécia com as diretrizes da Martifer.
-O senhor...
-Desliga essa porcaria.
O homem sorriu sarcástico e clicou o botão vermelho do controle remoto ao seu lado. Olhou de esguelha para o loiro que ainda olhava a tela escura, como se quisesse adivinhar a programação sem ligar a televisão.
-Se você ligar agora creio que ainda dá pra pegar a mocinha dizendo não conseguiu te contatar para falar sobre a rentável aliança entre vocês dois. – segurou uma gargalhada na garganta, sabia que não era muito seguro para sua vida.
-Cala a boca, Orfeu. – ele se levantou e pegou um copinho de café fumegante no balcão. – Eu odeio Aldebaran Carvalho que primeiro faz concorrência desleal, vem com esse papinho cínico de que conversou comigo, qual a opção que eu tive pra não ter de fechar a Pontus? Odeio esse Shura Ripalda que veio com a maior cara de coitadinho pedir emprego e depois vai abanar o rabo pra Martifer. Odeio Sebastian Baroncelli, que nos fez acreditar que estávamos bem o tempo inteiro, como um conselheiro que só diz o que queremos ouvir por trás de uma máscara de mentiras.
-Só se for uma máscara da morte, Aiolos quase morreu por culpa dele. – Orfeu completou, agora assumindo ares mais sérios. – Ao menos esse italiano fascista está preso agora.
Milo bufou e amassou o copinho de plástico, jogando-o com raiva no lixeiro.
-Italianos, espanhóis, brasileiros. Não agüento mais, odeio esses estrangeiros!
Orfeu voltou a sorrir, como que o ódio do amigo o lembrasse de algo.
-Você odeia muita gente. Mas não é porque um francês o esnobou que os franceses são todos esnobes.
-Que é que tem a ver francês com a história toda Orfeu? – o loiro perguntou franzindo as sobrancelhas, aumentando ainda mais a desconfiança quando o também grego encheu outro copinho de café. Orfeu odiava café.
-Essa sua gravata é terrível, Milo. Estou querendo dizer que não é só com gregos que se faz uma guerra. – ele ficou segurando o café, parado na frente do chefe que o olhava com estranheza. Chefe este sentia que poderia imaginar o que ele queria com aquela conversa absurda.
-E você não toma café, Orfeu. O que tem a ver francês com a história toda? – repetiu debilmente, vendo o ar de quem sabe de alguma coisa que o amigo ostentava.
-Existe uma certa... entidade, que parece interessada em nos ajudar. Ela costuma fazer empréstimos...
-De onde é? – Milo cortou seco, finalmente compreendendo. Recebeu um olhar de reprovação.
-Apenas escute. É um tipo de empresa acionária...
-De onde é, cacete? – o loiro perguntou mais em tom de ordem que de pergunta. Orfeu suspirou profundamente.
-O dono é francês e a sede original é na França, mas o segmento ativo fica na Noruega.
-Dane-se.
Milo passou por Orfeu sem nem querer escutar mais. Já tivera experiências suficientes com estrangeiros quer queriam lhe "ajudar". O outro grego o alcançou rapidamente, tentando acompanhar o ritmo do presidente e não derrubar o café.
-Por favor, eu falei com o pessoal, vai ser muito melhor pra Pontus, Milo!
O rapaz em questão "24 anos e me sinto tão velho" parou de repente e voltou-se para o outro apenas um ano mais novo, porém bem mais baixo.
-Sem. Mais. Estrangeiros. Nessa. Merda. De. Empresa.
Orfeu expressou sua indignação com o olhar intimidante. Por mais encolerizado que
Milo estivesse, os olhos azuis claros de Orfeu tinham seu poder.
-Não sabia que havia se tornado xenofóbico. Pode ter maturidade suficiente para avaliar a situação profissionalmente? – ele perguntou num tom falsamente suave, os olhos brilhando muito. O loiro bufou, resignado. – Que bom. Sente-se aí. – Esperou Milo acomodar-se e ao menos parecer estar prestando atenção.
-Escute. Essa é uma empresa do tipo acionária. O risco de falir é quase nulo, a menos que todos os investimentos caiam também, o que é quase impossível, uma vez que nenhum deles é na mesma área, e estão dispostos no mundo todo. Fiz contato com algumas das pessoas que participaram das transições. Entre eles estão indústrias dos mais variados tipos e portes e todos têm altas recomendações. O capital é parte investido e parte emprestado. Como tem grande influência nas Bolsas, a parte investida tende a render, é claro que com ajuda da empresa requerente. Quando já estão bem, a parte que lhes coube como empréstimo é devolvida e uma pequena porcentagem das ações vai para as contas da investidora, nada de muito relevante para a empresa. Fiz minhas pesquisas, Milo. Nós precisamos apenas confiar neles e fazer nossa parte, e a Pontus Euxinus é totalmente nossa de novo.
O grego manteve-se em silêncio. Processava tanta informação que sentiu até uma dor no cérebro. Conseguiu balbuciar:
-E afinal, quem são esses caras?
Orfeu ficou com uma expressão estranha, e se Milo tivesse parado para analisar melhor, teria percebido que ele continha a todo custo um sorriso. Entregou o copinho de café para o loiro.
-Beba. – quando o presidente inclinou o líquido escuro pela boca ele respondeu. – Trata-se do Grupo de Merville. – Milo entornou o café, derramando em si mesmo.
"Ao menos ele tira essa gravata horrorosa."
Afinal, Milo sabia nada de moda.
-O.o-
Passava sorrindo pelos corredores cinzentos. "Ajeitadinha, mas precisa de uma decoração melhor". Já estava acostumado com os olhares em si. Não era bem o tipo de pessoa comum.
Pegou a si mesmo observando atentamente um rapaz de cabelos castanhos e olhos verdes que parecia meio chateado. "Como todo mundo por aqui, o clima é de pura infelicidade". Viu o rapaz olhar em sua direção e não resistiu em sorrir-lhe. Ele pareceu um tanto encabulado.
Ao entrar na recepção do andar superior deparou-se com outros dois homens, um tanto mais velhos, conversando baixo com alguns papéis nas mãos. "Papéis e mais papéis, gostaria de saber o que o chefinho pensaria de tanto desmatamento desnecessário". Aproximou-se aproveitando a distração alheia para avaliar o produto. Um tinha cabelo castanho-claro, quase loiro e olhos que variavam de azul para verde. O outro, reparando bem, era uma cópia do rapaz do térreo, só que parecia ser mais firme (física e psicologicamente). Apagou esses pensamentos ao chegar perto.
-Com licença, onde posso falar com o Sr. Ventimiglia?
-O.o-
-Milo?
Ele levantou o olhar para encontrar o de Aiolos.
-O... advogado representante do Grupo de Merville chegou.
Arqueou as sobrancelhas e passou os dedos nelas, alinhando os fios loiros.
-Entre com ele.
-Senhor, ah, Frederich?
-Na verdade é Fredrik. Mas não me chame assim, use Eliasch ou Afrodite.
Milo só pôde arregalar os olhos ao ver a figura que entrara em sua sala, acompanhada por Saga, Aiolos e Orfeu. Não era de se esperar um homem com compridos e ondulados cabelos loiro platinados e corpo tão... andrógino. Se não tivesse ouvido o nome masculino "Aliás, Fredrik é nome que se dê a alguém que só nasce uma vez, pelos céus?" e a voz varonil teria apresentado seus cumprimentos à senhorita. O tal estendeu a mão e depois de um instante atordoado, Milo retribuiu.
-Sou Fredrik Eliasch, mas pode me chamar de Afrodite se não conseguir pronunciar. – ele disse enquanto sentava, sorrindo. – Sou o advogado responsável pelos negócios do Grupo de Merville, e me mandaram aqui porque o senhor queria falar com algum representante não é?
Milo confirmou com a cabeça e depois quase se estapeou pela falta de tato.
-Por favor, este é Orfeu Theodorakis, Saga Pólon e Aiolos Aertes. O senhor aceita algo para beber, ah...
-Não, Tack så mycket.(3) E esqueça o senhor, sim? Então... Milo, do que quer tratar?
O advogado não parecia se sentir deslocado estando na Grécia, numa empresa rigorosamente grega, entre quatro veteranos gregos. Respondeu tudo o que Milo perguntou, deixando claro como eles iriam proceder dali em diante. Aproveitou também para elucidar que não poderia ficar vindo à Grécia sempre, já que o Grupo de Merville tinha muitos investimentos mais, ou seja, representantes da Pontus teriam de visitar a Noruega, mais precisamente a capital Oslo, onde ficava a sede.
Antes que Afrodite saísse, Milo o questionou sobre algo que achava crucial:
-Eu também pretendo falar pessoalmente com o seu presidente, Fredrik, como poderia encontrá-lo?
O sueco (como já havia esclarecido) parou para pensar pela primeira vez. Abaixou os olhos e como que tivesse tomado uma decisão, sorriu para ele.
-O senhor pode entrar em contato com o nosso diretor, Isaak Stubb ou o presidente, Mime Lilloe. Meu patrão acompanha todos os processos detalhadamente, mas não trabalha diretamente na empresa. Um dos dois fornecerá o endereço, eu realmente não tenho autorização para tanto.
-Ele não mora na França?
Afrodite deu uma risada baixa.
-Bom, sua casa fica em Paris.
Deixando os gregos meio confusos, despediu-se e retirou-se.
-O.o-
Por mais apaixonado que fosse por Atenas e suas belas colunas em ruínas, tinha de admitir que Oslo era uma cidade linda. O relógio da torre da Câmara Municipal apontava 10:50h e tinha marcado para às 11:00h. Aproveitou para apreciar melhor Slottsparken. O parque da Câmara tinha uma grande área verde, onde algumas pessoas sentavam para fazer piquenique ou simplesmente conversar. As avenidas visíveis eram bem trabalhadas e muito organizadas. Andou até o outro lado, Dronningparken. Na avenida defronte a ele estava o prédio espelhado com o letreiro discreto: de Merville.
Foi relativamente fácil atravessar a Drammensveien. Apresentou-se na elegante recepção do térreo e foi autorizado a subir o elevador. Parou no sétimo andar apenas para encontrar uma espécie de salão parecido com o da Pontus Euxinus, com um pequeno balcão de recepção (mais uma!), uma saleta de espera e várias portas.
Encaminhou-se para a recepcionista, pedindo para falar com Mime Lilloe. Aparentemente as coisas ali não funcionavam assim, pois ela dirigiu-lhe um olhar de escárnio.
-E quem deseja? – ela perguntou com um sorriso irritante.
-Milo Ventimiglia. – falou de uma vez só.
-E o que deseja?
-Sou o dono da Pontus Euxinus, da Grécia. Posso falar com o Sr. Lilloe? – falou rangendo os dentes, desejando mandar os "pronome interrogativo + deseja" dela para onde mereciam.
-O senhor marcou o horário?
Milo fechou os olhos um momento, respirando fundo.
-Tenho sim, cheguei dois minutos antes se quer saber – respondeu ironicamente.
-O Sr. Lilloe não está.
O grego teve que apertar muito a pasta contra a lateral do corpo para não atirá-la na cara da recepcionista.
-Então o Sr. Stubb.
-O senhor marcou com quem afina...
-Bare(4), pare de atormentar o senhor, mulher!
Milo virou-se e deu de cara com um loirinho de olhos azuis, parecendo ser mais novo que ele próprio.
-Venha ao meu escritório, por favor.
Acompanhou o loiro até a sala dele. Esperou que o outro falasse.
-God Morgen(5), sou Hyoga Yukida. Desculpe-me pelos maus modos da secretária. Mas, o senhor quer falar com quem exatamente? Nem Mime nem Isaak estão aqui.
Milo explicou-lhe a conversa que tivera com Afrodite. Hyoga franziu as sobrancelhas e olhou para baixo, repetindo o gesto do advogado.
-Fredrik acertou em mandá-lo aqui. É de seu interesse conversar pessoalmente com o dono?
-Gosto de saber com quem estou trabalhando. – disse empertigando-se na cadeira. Hyoga sorriu levemente.
-O Monsieur de Merville é meu tio. O senhor está com sorte, ele está... passando uma temporada aqui na cidade. Eu apenas tenho de falar com ele antes.
Esperou alguns minutos para que Hyoga voltasse.
-Pode ir lá hoje, a hora que quiser Sr. Ventimiglia. Ahn... tem algum papel para anotar o endereço? Não tenho algum.
-Não tem papel? – ele perguntou perplexo. O edifício era um luxo só, e eles não tinham uma mísera folha de papel?! Só não esperava um sorriso divertido do loirinho.
-Meu tio não concorda com tanta papelada, então arrumou diversas saídas para que não usássemos papel. Será muito difícil encontrar algum aqui.
Ainda meio embaraçado anotou o endereço e agradeceu ao loirinho, não esquecendo de lançar um olhar cortante para a recepcionista ao sair.
Pierre Camus de Merville se encontrava em Helgesens gate, por trás do Sofienbergparken, relativamente afastado de onde estava. Como Hyoga dissera que podia ir quando quisesse, almoçou antes e ainda descansou cerca de meia hora, para então ir ter com o francês.
Chegou ao Sofienbergparken, mas ninguém sabia dizer onde morava Pierre de Merville. Quando finalmente achou a casa, passou diversos minutos tocando a campainha sem que ninguém viesse atender. Já estava desistindo quando alguém lhe tocou o ombro.
O ruivo usava um blusão azul e calça cinza, estava com o rosto ligeiramente suado e tinha as madeixas bordô presas em uma trança, mostrando os fones de ouvido brancos. Aparentemente ele estava correndo.
-Algum problema?
Tinha a voz grave, porém suave. Os olhos eram azuis escuros (destacados na pele alva e sardenta), e o encaravam interrogativos.
-Ahn... eu... – respirou fundo, fazia papel de imbecil – Eu gostaria de falar com o Monsieur de Merville.
O ruivo piscou e ficou analisando o rosto do grego com o olhar glacial.
-Entendo. Venha comigo.
Eles entraram na casa e Milo sentou-se no sofá simples. Na verdade, toda a decoração
era bastante discreta. Esperou um pouco e o ruivo voltou agora com o cabelo solto e molhado, e quando chegou perto sentiu um aroma de hortelã vindo dele. Reparou que contra a luz mais concentrada da lâmpada os olhos dele adquiriam um tom castanho-avermelhado mais para o centro, embora o azul permanecesse.
-Pode me acompanhar, por favor?
Milo o seguiu, notando o modo peculiar que o outro arranhava os "erres". Foram para uma sala mais rebaixada, e qual não foi a surpresa de Milo ao perceber que o local era uma espécie de "laboratório". Vários vidros e tubos de ensaio e até uma retorta adornavam o local, e diversos frasquinhos coloridos rodeavam a parte superior da sala numa prateleira.
O ruivo o indicou uma cadeira alta atrás de um balcão e Milo sentou devagar, olhando muito desconfiado ao redor.
-Pode me passar o conta-gotas, por favor?
O grego entregou o objeto, sentindo a raiva aflorar. Estava sendo tratado como idiota o dia inteiro!
-Onde está o Monsieur de Merville? Eu realmente preciso conversar com ele.
Sentiu o peso dos olhos azuis/vermelhos em si. O ruivo sorriu levemente.
-Para se manter uma conversa, dois precisam falar. Como foi o senhor que... solicitou a minha presença, acho que seria mais adequado que o senhor começasse.
-Quê? – o loiro piscou atordoado, franzindo a testa. O sotaque francês acentuava nas frases mais longas.
-Está falando com Pierre Camus de Merville. Pode me chamar de Camus.
Milo precisou de vários segundos para assimilar que aquele ruivo quase largado era o dono do famoso Grupo de Merville, morava naquela casa pequenininha e o levara para conversar sobre negócios num laboratório!
-Prazer conhecer... Monsieur. – decidiu não ligar para a aparência do homem "Aparências enganam!" – Não seria mais... como posso dizer... apropriado... se nós fôssemos para o seu escritório ou... – ficou desconcertado ao se submeter ao escrutínio daqueles olhos tão singulares. O azul mesclava-se a nesgas do castanho e davam um quê selvagem a seu dono.
-Sinto muito, eu não tenho escritório. Não há problema em ficarmos aqui.
Engoliu em seco, sentindo que havia levado um corte. Já estava engolindo todo o seu orgulho ao pedir ajuda a um estrangeiro, mas aquela indiferença estava fazendo o seu sentimento mais companheiro fazer o caminho de volta. Antes que tecesse um comentário malcriado ele observou com mais atenção o que o francês fazia.
-É algum experimento? – perguntou não conseguindo esconder a curiosidade.
Na verdade tinha se preparado psicologicamente para receber outra resposta seca, então foi um choque encarar aqueles olhos tão exóticos que agora emitiam um brilho de satisfação.
-En réalitè non(6). Estou fazendo uma nova fórmula para perfume.
-É perfumista? – agora já nem se lembrava de estar com raiva. Que homem estranho!
-Mais uma vez não. É só um hobby. Pegue este aqui.
Passou-lhe um frasco que estava ao alcance. Era um líquido azul. Borrifou um pouco em um pulso e cheirou profundamente. Era um perfume excelente!
- δικό μας!(7) Por que você não vende esses perfumes? – indagou realmente curioso, devolvendo o vidro.
-Já disse que é um hobby. – devolveu com aquele tom novamente, fazendo Milo entreabrir um pouco a boca. Quem aquele francês enjoado pensava que era? Primeiro parecia que não estava nem aí pra ele, depois o trata como uma criança bobona, depois é simpático para logo em seguida voltar a enxotá-lo. Era possível que existisse homem mais controverso? Na cabeça do grego, não.
- O que faz nas horas livres, Milo?
Ouvi-lo chamando o seu nome o fez acordar. Na verdade, foi mais o nome do que o chamado em si. Seu turbilhão de pensamentos já chegara ao ponto de achar que o ruivo sequer sabia seu nome. Mas depois parou para pensar na pergunta e ficou meio aturdido.
-Nas... horas livres eu... bem, ultimamente tenho tido pouquíssimas horas livres mas... Bom, sempre que posso eu saio para me divertir. Não fico só pensando em trabalho. Gosto bastante de ir ao cinema e... dançar Hassápiko.(8) – não soube o que fez falar tanto. Talvez tenha sido o fato de que Camus realmente estava prestando atenção no que dizia. Muita atenção.
-Você realmente sente prazer em fazer isso?
Milo ficou engasgado. Prazer? O que ele queria dizer com prazer? E aonde diabos aquela conversa ia chegar?
-Eu não entendi.
O ruivo piscou novamente, como que ligando o "efeito encanto". Milo ficou preso aos olhos dele, e inconscientemente abaixara um pouco a cabeça quando Camus fez o mesmo, como se pudesse ver aquele azul exótico por trás dos fios vermelhos.
-Está me dizendo que quando tem tempo sai para se divertir. Isso é bom, mas e quanto ao resto dos dias? – falou baixo e em tom displicente.
O silêncio perdurou longos minutos. Aparentemente quando perguntava algo gostava de ser respondido antes de qualquer coisa, porque não se manifestou novamente e muito menos Milo. O grego contentara-se em assistir o francês manipular vários ingredientes na mistura, que agora tinha um tom amarelado. Quando ele pôs para esquentar um agradável aroma, ainda muito tímido, impregnou a sala. O presidente não pôde deixar de comparar o cheiro a pétalas de flores molhadas. Lembrava-se de sua mãe que adorava flores, por isso conhecia bem essas coisas.
-Para quem faz esses perfumes? – questionou em voz baixa, após ter ignorado a pergunta anterior.
-Para quem eu quiser. – respondeu também em voz baixa. – Dedico-me a isso pelo menos algum tempo por dia. Nem que sejam dez minutos. Não faz algo do tipo?
-Por que essa necessidade?
-Você só sabe perguntar e não responde nada, Pequeno Príncipe?
Pela primeira vez na vida Milo sentiu o rosto esquentar de forma assustadora. Não era nenhum leigo, ora essa, fora comparado ao personagem questionador de Saint-Exupéry. E ele sequer conseguia definir se o tom de voz que Camus usara tinha sido positivo ou negativo. Era simplesmente um comentário, como uma fala de teatro sem rubrica.
-Desculpe – murmurou se sentindo um inseto.
Mais uma vez o silêncio.
-Porque eu ficaria louco se não o fizesse.
-Como?
Camus ergueu a cabeça, encarando profundamente o loiro.
-Seu eu não dedicasse ao menos dez minutos do meu dia a algo de que realmente gosto de fazer ficaria louco. (9)
Foi aí que Milo entendeu. Ele entendia perfeitamente o que Camus sentia. Era... a necessidade de sentir que havia outra coisa que não o trabalho que merecesse a própria atenção. Ficou apenas observando a produção de mais um perfume. Subitamente o outro lhe assustou ao quebrar a ausência de sons com sua voz grave.
-Quando o seu vôo parte?
A mudança brusca de assunto o deixou pasmado.
-A-amanhã de manhã.
-Deveria conhecer a cidade. Oslo é realmente bonita.
Demorou ainda algum tempo para entender que nas entrelinhas ele tinha dito "Fora!". Despediu-se um tanto desajeitado. À medida que se afastava de Sofienbergparken a sua racionalidade adormecida voltou à tona. Que diabos foi aquilo?
-O.o-
-Odiei.
Orfeu arqueou as sobrancelhas.
-É só isso que tem a dizer, Mister President?
Milo bufou, arrumando de qualquer jeito as folhas do contrato dentro da gaveta da escrivaninha. Passara os últimos 40 minutos analisando folha por folha, para ter certeza de que nas cláusulas não estavam incluídas as relações com o dono do Grupo de Merville. "Para você aprender. Todos, todos SEM EXCEÇÃO tentaram avisar subliminarmente que esse homem era maluco. Mas a cabeça dura insistiu em conhecer o Rei do Mundo."
-Ele não disse coisa com coisa se você quer saber. O cara não tem papel, não tem escritório, e não tem juízo!
-E afinal, o que te deixou tão incomodado? O juízo (ou a falta, como preferir) dele é contagioso e você se sentiu ameaçado? – o outro grego perguntou não contendo um
tom ironicamente sério.
-Vá ao inferno Theodorakis!
-Que gentil de sua parte. Mas vem cá, quem não disse coisa com coisa foi você, o que tem a ver você trabalhar demais com os perfumes?
Em tom contrariado e meio resmungado ele explicou o que o francês dissera sobre o hobby. O que Milo não esperava é que Orfeu ficasse interessado.
-Hmm, interessante. Bom, depois do almoço fale comigo que eu tenho algo para lhe mostrar, certo? Fui!
A surpresa maior veio realmente após a refeição. O grego pôs um baralho nas mãos do presidente.
-Orfeu... o que diabos é isso?
-Nossa, está pior do que eu imaginava, nunca jogou cartas Mister President?
-Eu SEI o que é isso – o loiro respondeu incrédulo – eu quero saber para quê você me deu um baralho.
-ASSIM está melhor! – o outro retrucou sorridente – Bom... – juntou as mãos teatralmente – Já que todos concordam que você precisa de um passatempo, aqui vai: castelo de cartas!
Silêncio.
-Castelo de cartas. – Milo repetiu secamente.
-Exato. – Orfeu ignorou o to do outro, sem desmanchar o sorriso.
-E quem disse que eu vou parar para fazer um castelinho de cartas? – ele indagou desdenhoso. Orfeu ergueu uma sobrancelha, ficando sério.
-Eu disse.
Havia qualquer coisa incontestável na voz de Orfeu.
-O.o-
Desamarrou a gravata e jogou em um canto da sala, tendo o mesmo destino os sapatos e as meias. Abriu todos os botões da camisa e afrouxou o cinto de modo que a calça não ficasse apertada, mas também não caísse nos joelhos. Tirou uma lata de cerveja da geladeira e jogou-se de qualquer jeito no sofá, os cachos dourados espalhando-se desleixadamente no estofado verde-musgo. Ao tentar se ajeitar melhor sentiu um volume no bolso. Sentiu ganas de atirar o baralho longe quando o desembolsou. Mais por medo de Orfeu do que por consideração apenas largou o pacotinho ao seu lado.
Olhou em volta. Nada pra fazer. Não tinha sequer um cd ou DVD, que diabos! Mas ele dava um jeito nisso rapidinho. Ligou o computador e entrou num site de música. Certo, montou uma lista e baixou tudo, pondo para tocar em seguida. A primeira música era uma porcaria. A segunda era até razoável, não quis nem escutar a terceira e pulou direto para a quarta. Boazinha. Ligou o repeat. Pura birra. O baralho jazia ao lado do
sofá.
A latinha de cerveja já estava seca há séculos, mas ainda a sacudia como que tentando extrair as últimas gotas. O baralho jazia ao lado do sofá.
"Mas que diabos."
Seu olhar era constantemente atraído para as cartas, cujo tema era um aquário com dois peixes coloridos. "Só pode ser piada mesmo".
Sentou no chão resignado. Era guerra? À guerra!
Embaralhou as cartas diversas vezes até achar que estavam boas o suficiente. Pegou duas e apanhou durante um longo minuto para deixá-las em pé em forma de telhado. Quando partiu para a segunda combinação as mãos tremeram e as quatro cartas caíram.
-SACO! – praguejou em bom som. Qualquer um ficaria desanimado, sem vontade de cantar uma canção, mas por Deus este é Milo Ventimiglia! – Essa porcaria não me vencer!
Extensos minutos se passaram até que conseguiu formar quatro telhadinhos em fileira. Estava deitado de bruços no chão, a fronte suada com uma expressão vitoriosa. Colocou as cartas deitadas nos vãos entre os telhados. Respirou fundo. Agora se preparou psicologicamente para pôr outro telhadinho já no segundo patamar do castelo. Mas quando pousou as duas cartas posicionadas um barulho estridente o assustou e toda a sua criação foi ao chão. Ficou ainda uns segundos estagnado, olhando incrédulo para o monte de cartas, até que um insistente telefone o despertou.
"Ah, eu vou matar quem me atrapalhou..."
Tirou o fone do gancho e chegou a abrir a boca para mandar o infeliz ao inferno, mas o alguém do outro lado da linha foi adiantado:
-PODE ME DIZER O QUE FAZ O GRUPO DE MERVILLE NOS RELATÓRIOS DE TRANSAÇÃO ACIONÁRIA DA MARTIFER?
-Oh, isso. – Milo mudou totalmente o tom. Sentiu uma satisfação sádica crescer em seu interior ao ouvir o profundo desagrado na voz de Aldebaran.
-Você só tem isso para dizer? Oh isso? – Aldebaran tinha a voz trêmula e carregada.
-Bom... – o presidente sorriu, analisando com profundo interesse as unhas da mão esquerda – Eu não poderia perder um contrato desse calibre não é mesmo Sr. Carvalho?
-Escute aqui Ventimiglia... – agora ele timbrava ameaça – É melhor falar agora o que está pretendendo. Achei que tínhamos um contrato! Não pode fazer as coisas sem o meu visto, por direito a empresa é minha.
-Não deixe os contribuintes ouvirem isso Sr. Carvalho! – ele retrucou sem conseguir destoar de seu escárnio. – Afinal, se eles decidirem não investir mais aqui, eu serei obrigado... – parou por um momento, tentando se fazer soar verdadeiro até para si mesmo. – serei obrigado a fechar a Pontus. Sairei com as minhas ações. Acho que isso acabaria em prejuízo para o senhor não é?
Silêncio no outro lado da linha. A ansiedade de Milo já estava a níveis estratosféricos, queria saber se seu joguete estava funcionando.
-Eu não quero... não vou deixar isso acontecer, está me ouvindo? Vou tomar providências quanto a isso!
Respirou fundo ao ouvir o apitozinho irritante de final de ligação. Ficou observando o telefone, já no gancho. Então ouviu a música que repetia pela enésima vez. Já ia tirar do repeat quando reparou no título. Glory days de Bruce Springsteen. Olhou então para o monte de cartas de aquário espalhadas no chão. Se Aldebaran tivesse ligado pelo menos dez minutos antes, provavelmente ele teria ficado sem resposta para tudo que ele dissesse. Mas agora ele estava estranhamente relaxado. Sentou-se novamente, e pegou mais duas cartas, arranjando-as. Era guerra? À guerra!
CONTINUA...
-O.o-
N/A: Ok! O objetivo era uma one-shot, mas eu me empolguei e virou uma "two-shot" huaskhuask. Em todo caso, apenas aperte essa setinha que aponta pra direita e siga o curso!
– A Martifer Solar realmente existe, mas comprou a empresa grega PVI. Algumas frases do Deba só foram transcritas da entrevista que o vice-presidente Jorge Martins deu. A partir daí foi tudo da minha cabeça ;-P.
– O nome Pontus Euxinus foi tirado da definição de "Grego Pôntico" do Dicionário Aurélio: Dialeto do grego moderno derivado do ático. Originalmente falado nas costas da Anatólia (Turquia) banhadas pelo mar Negro (antigo Pontus Euxinus) ...
– Muito obrigado em sueco. By tradutor online
– Basta em norueguês. By tradutor online
– Bom dia em noruguês. By tradutor online
– Na verdade não em francês. By tradutor online.
– Nossa! Em grego. By tradutor online.
– Hassapiko é uma dança popular grega em que os dançarinos se vestem como marinheiros (calça preta, camisa branca e lenço vermelho na cintura), havendo também pessoas em volta num círculo, com o joelho no chão e batendo palmas.
– Ok, admito! Camus aqui foi um perfeito plágio de Rei Orrin, personagem pertencente a Christopher Paolini e que diz mais ou menos isso em "Eldest". Não resisti!
