I. CRESCER
Todos a encaravam esperando por uma resposta, mas ela já não conseguia encontrar sequer um resquício de voz e manifestar os sentimentos que aquela notícia lhe despertara.
- Wendy, querida, você ouviu o que seu pai disse? – a Sra. Darling perguntou, preocupada, enquanto pousava carinhosamente as costas da mão na testa da filha.
- Eu... Eu – ela gaguejou nervosa – Eu não quero me casar! Não agora!
O Sr. Darling levantou-se da cadeira e postou-se a caminhar de um lado para o outro da sala, com as mãos unidas à suas costas, bufando.
- Eu sou tão nova para me casar! – ela continuou, tentando convencer os pais e a tia de que estava certa.
- Querida, você está prestes a completar dezessete anos, já é uma moça feita. Esse baile de debutantes no sábado atrairá ótimos pretendentes para você.
A calma e a convicção com que a mãe colocava os fatos parecia tornar tudo mais simples e correto. Parecia. Mas Wendy não queria. Não queria abandonar sua infância, ser entregue a um estranho como esposa, deixar de ver os pais e os irmãos todos os dias. Os irmãos. O que John e Michael dirão? Ficarão sem minhas histórias! Com certeza me apoiarão na decisão de não casar, ela pensava. Mas no fundo sabia que a opinião de seus irmãos de nada adiantaria enquanto seu pai tivesse a certeza de que o casamento era a melhor solução. Sentia-se revoltada por ser usada para fins econômicos. Wendy sempre foi muito perspicaz e sabia que o casamento era uma desculpa para aumentar o poder aquisitivo da família e assim quitarem as dívidas. Os bancos estavam passando por dificuldades e o pai de Wendy, sendo um bancário, depositava todas as suas esperanças de prosperidade econômica na filha.
- Não vou casar e ponto final – ela disse, decidida.
- Vai fazer o que eu achar que é melhor para você! – desta vez foi o pai quem falou, virando-se irritado para a filha e a mulher. Wendy deu um passo a frente e disse, teimosamente:
- Não vai me obrigar, sabe que não quero!
- Se for preciso, tenha a certeza de que obrigarei! – ele gritou, a impaciência estampada em seus olhos negros – Fará o que eu mandar. Basta – ele acrescentou, quando viu que os lábios da filha abriam-se para contestá-lo.
As lágrimas de raiva escorriam pelo rosto da garota e ela deixou a sala correndo, subiu as escadas e entrou no quarto, batendo a porta atrás de si. John e Michael estavam sentados em suas respectivas camas, esperando que a irmã chegasse e lhes contasse uma história antes de deitarem. Assim que os garotos viram que a irmã chorava, aproximaram-se dela e a abraçaram.
- O que houve Wendy? Por que chora? – perguntou o caçula, agarrado às suas pernas.
- Mamãe e papai querem que eu me case.
- Não! – os dois protestaram, em coro.
Um barulho vindo da janela pôde ser ouvido, como se o próprio vento protestasse contra a decisão injusta que os pais haviam tomado. A garota avisou que aquela noite não haveria histórias, pois estava chateada e cansada, e os dois acenaram afirmativamente e deitaram-se. Wendy apagou as luzes do quarto e permaneceu parada no escuro por alguns instantes. As cortinas da janela estavam abertas, deixando que a luz da lua invadisse o quarto, iluminando fracamente a mobília. No caminho para sua cama, ela passou os dedos de leve em cima da sua cômoda. A cômoda. Nela havia uma pequena gaveta trancada, que Wendy não tinha coragem de abrir, não depois de seu sonho. Sim, sabia que era um sonho, mas ele havia sido tão real que abrir a gaveta e descobrir que a sombra não se encontrava mais ali, que não havia sequer existido, lhe deixava com um aperto no coração. Fechou os olhos e tentou lembrar-se do sonho, procurando qualquer pista de que havia sido real.
Já fazia duas noites que Wendy ouvira os latidos fortes de Naná, sua cadela-babá, ecoando pelas paredes do quarto, porém, quando entrou, a janela fechou-se com tamanha força que ali ficara presa uma sombra, a sombra de um rapaz. A sombra de Peter Pan. Wendy costumava contar a aventuras de Peter a seus irmãos e desconfiava que ele a visitava algumas vezes, sentia sua presença enquanto dormia e, por esse motivo, sempre deixava a janela aberta durante a noite. Lembrando-se disso, dirigiu-se até a janela e a abriu, sentindo a brisa fria da noite em seu rosto. É inútil me prender a sonhos fantasiosos, nada me salvará desse casamento, ela pensou, Peter não me salvará desse casamento. E assim, deixando a janela aberta, deitou-se em sua cama, afundou a cabeça em seus travesseiros e adormeceu.
