Encostado do lado de fora do Audi, Theon Greyjoy puxou um cigarro do bolso do terno negro e o acendeu, protegendo-o com uma das mãos e franzindo ligeiramente o cenho. A fumaça invadiu sua boca, seu cérebro, e ele inclinou a cabeça para cima quando a expeliu pelos lábios. Os olhos escuros seguiram a nuvem cinzenta que o cigarro acabara de criar, e ele quase sorriu, preferindo, surpreendentemente, manter-se com o cenho franzido.

Tragou novamente, pensando no problema que praticamente todas as famílias de Porto Real enfrentavam com a morte de Robert Baratheon naquela manhã, o chefe do crime organizado na cidade. A mulher dele confirmou ser um acidente de caça, entretanto Theon achava bastante interessante alguém como Robert ser assassinado no meio da floresta, com um tiro certeiro na cabeça e fora da temporada de caça, ser chamado de acidente. A guerra pelo controle dos negócios estava quase começando, e Theon, que trabalhava para os Stark, sabia que aquilo tomaria proporções gigantescas em pouco tempo. A cidade inteira era uma imensa panela de pressão e era uma questão de dias até a merda estourar.

E vai respingar para todos os lados, Robb sabe que vai. Theon expeliu mais uma vez a fumaça e olhou o relógio de pulso impacientemente como sempre fazia. Quando não estava metido num tiroteio com os homens dos Stark, num bar enchendo a cara ou fodendo alguma puta de rua, Theon Greyjoy era chofer de Sansa Stark. Os outros o chamavam por apelidos idiotas – não na sua frente, é lógico -, todavia o rapaz não se importava nem um pouco; isso só demonstrava a confiança que Robb depositava nele.

Estacionado na rua em frente à faculdade de Porto Real, Theon olhou despreocupadamente para os dois lados, pensando que poderia ser atacado de qualquer maneira por qualquer família e amaldiçoou aquele atraso – característico - de Sansa. Alguns estudantes saíram pelas portas duplas do imenso prédio de tijolos vermelhos e desceram as escadarias, mas Theon não viu quem procurava em nenhum lugar. O movimento se abrandou aos poucos, e quando as escadas ficaram quase vazias, Sansa Stark empurrou uma das portas.

Os cabelos ruivos estavam soltos, enfeitados apenas por duas pequenas tranças que se uniam na parte posterior da cabeça. A blusa era leve, deixando a pele pálida do ombro à mostra. Ela ria para aquela amiga, Margaery Tyrell, e as duas pareciam conversar animadamente sobre algum assunto bastante interessante. Ainda observando as duas – que agora se despediam -,Theon rapidamente atirou o cigarro no chão e o esmagou com o sapato; Sansa sempre reclamava do cheiro que o fumo deixava no carro quando não estava mandando mensagens de texto para Jeyne Poole ou fazendo qualquer outra coisa naquele maldito celular.

- Vamos? Tenho muitas peças pra ajustar hoje à tarde – sem erguer os olhos ou sorrir, ela entregou a ele a bolsa e uma pequena valise de couro marrom que deveria estar cheia de roupas. – E mais tarde vou me encontrar com Jeyne no shopping.
- Como quiser – ele retrucou num tom entediado.

Theon colocou a valise no banco traseiro e estava dando a volta para abrir a porta do carona, mas desistiu quando pneus cantaram e um Mercedes vermelho conversível dobrou a rua, parando a poucos metros de onde o Audi estava estacionado. Os ouvidos treinados de rapaz fizeram sua cabeça se voltar quase que automaticamente na direção do som. A porta do Mercedes se abriu e Joffrey Baratheon saiu do conversível, tirando o par de óculos escuros que escondiam seu rosto e sorrindo para Sansa, que se iluminou ao ver o namorado do outro lado da rua.

A família inteira dos Stark era contra o namoro – contra o namorado, na verdade -, contudo Sansa vivia afirmando que Joffrey era um amor, um cavalheiro, um deus, e todos tiveram de aceitar, porque proibir certamente seria pior. Mas como os Stark queriam ter certeza de que o rapaz não passaria dos limites, Robb pediu a Theon que ficasse de olho no casal só para se certificar, e Theon, é claro, estava presente em todos os encontros – apesar de Sansa nem sonhar com isso.

A ruiva estava indo em direção ao namorado, mas Theon subitamente segurou o braço dela, e a garota virou-se com uma fúria genuína presente nos olhos azuis. Ele lançou um olhar rápido ao outro lado da rua e percebeu que Joffrey franziu ligeiramente o cenho. Voltou sua atenção para a ruiva.

- Entre no carro – ele sussurrou, abrindo a porta do motorista.
- O que você está fazendo?! – a voz dela estava banhada em irritação. Se debateu para tentar se livrar do aperto, mas seus esforços foram infrutíferos. – Joffrey veio me buscar, me solte imediatamente!

Duas SUV negras vieram pelo outro lado da rua e estacionaram repentinamente. De dentro delas desceram homens vestidos com ternos elegantes e com pistolas automáticas nas mãos. Theon grunhiu e empurrou Sansa para o outro lado do carro ao mesmo tempo em sacava a arma que mantinha escondida num coldre de ombro. Abriu a porta traseira para usar como cobertura no exato instante em que ouviu disparos e gritos. Pessoas começaram a fugir na rua e Sansa estava petrificada ao lado da porta do carona.

- Entre na porra do carro! – ele gritou, e ela demorou para entender que estava no meio de um tiroteio. – Entra, porra, entra!

Theon apertou a arma com força, e ao ouvir a porta do Audi bater, indicando que Sansa cumprira sua ordem, ele mirou num dos homens, mas acabou errando o tiro e esmigalhando o vidro dianteiro de uma das caminhonetes. Rosnou um palavrão e chechou com uma olhadela se a ruiva estava bem. Ela olhava fixamente para frente, os olhos arregalados, e Theon virou o rosto para descobrir o que a intrigava tanto. Percebeu que o temor dela tinha um certo fundamento: Joffrey vinha caminhando na direção deles com uma pistola erguida. Ótimo, era só o que nos faltava. Os tiros dos homens dos Lannister acertaram o porta-malas e a placa do Audi, fazendo Theon grunhir.

- Se abaixa, se abaixa! – gritou para Sansa.

Rapidamente fechou a porta que havia aberto para usar de cobertura e jogou-se para dentro do carro, dando partida ainda com sua porta do motorista aberta. Passou por Joffrey, que atônito com o súbito movimento do carro, atirou-se para trás do conversível e disparou contra o Audi. Theon tentou atirar nos pneus da Mercedes, contudo sua mira acabou acertando a lateral do carro do namorado da ruiva e o vidro dianteiro, estilhaçando-o e fazendo os cacos se espalharem pelo asfalto. Afundou o pé no acelerador e dobrou a esquina cantando os pneus do Audi.

Conforme o carro ia ganhando velocidade, os prédios de Porto Real passavam como um borrão na visão de Theon. Ergueu os olhos escuros para o espelho retrovisor e praguejou ao perceber que as duas SUV negras os seguiam de perto, assim como a Mercedes vermelha de Joffrey que vinha logo atrás.

- O que está acontecendo?! – Sansa gritou, uma expressão de assombro dominando cada músculo de sua face.
- Não sei, mas eles querem você – um disparo esmigalhou o vidro traseiro do Audi e Sansa gritou novamente. – Abaixa a cabeça!

Com os olhos grudados no espelho retrovisor e nos carros que os perseguiam, Theon apertou ainda mais o acelerador do carro, conquistando todas as curvas que subitamente iam aparecendo pelo caminho. A perseguição seguia sem trégua, e por mais que o rapaz tentasse despistar os homens dos Lannister, eles sempre reapareciam.

- Que merda, que merda! – ouviu o próprio celular tocar e sabendo muito bem que era, atendeu. – Deu uma merda muito imensa, Robb. Os Lannister tentaram pegar Sansa na porta da faculdade e agora estão nos seguindo.
- Theon, cuidado! – Sansa gritou.

Uma das SUV estava emparelhando com eles e o homem no banco do carona empunhava um revólver para fora da janela. Theon cerrou os dentes e deixando o telefone cair, girou o volante com ambas as mãos, chocando a lateral do Audi com a do carro dos Lannister. Sansa gritava. A caminhonete negra vacilou momentaneamente, o homem armado deixou o revólver cair e Theon aproveitou para sacar a pistola de seu coldre e disparar contra o motorista. A SUV perdeu completamente o controle e ziguezagueou pela rua, afastando-se do Audi, e bateu na outra caminhonete que transportava o resto dos Lannister. O choque foi violento e bloqueou boa parte do caminho, mas Joffrey desviou rapidamente e continuou seguindo o Audi negro.

- Robb? – Theon pegou o telefone novamente, e ao ouvir a voz do ruivo, assentiu mais um vez. – O tempo fechou. Vou levá-la à... sim, isso. Mas antes preciso... exato. Eu ligo quando chegarmos lá e fizermos a troca. Não se preocupe.

E desligou o celular. Checou mais uma vez o espelho retrovisor e viu Joffrey segui-los de perto. Continuou em alta velocidade, decidido a brincar um pouco com o herdeiro dos Baratheon. Assim que alcançaram a Avenida do Aço, Theon acelerou o máximo que o carro conseguia e sorrindo com o canto dos lábios, virou bruscamente o volante e puxou o freio de mão. O Audi girou no asfalto, erguendo uma fumaça branca dos pneus. Joffrey afundou os pés no freio e se abaixou no exato momento em que sua Mercedes era atingida pelos tiros da pistola de Theon. Os pedestres gritavam e corriam para longe dos tiros.

- Pare de atirar no meu namorado! – Sansa gritou, tentando puxar o braço esquerdo do rapaz para dentro do carro, porém ele simplesmente a afastou com a mão direita e continuou a disparar. – Pare! Estou mandando você parar, Theon!

Mas ele foi surdo à todas as súplicas da ruiva. Quando finalmente descarregou o pente nos pneus e no capô do conversível, atirou a arma no banco traseiro, deu ré calmamente e seguiu pela avenida, ganhando mais velocidade a cada instante que passava.

- Você está bem? – Theon perguntou numa voz relativamente despreocupada, fixando toda sua atenção na rua em que seguiam.
- É claro que não estou bem! – a voz de Sansa estava completamente esganiçada. - Você acabou de descarregar uma arma em cima do meu namorado! Pare o carro que vou descer imediatamente!

Ele sorriu com o canto dos lábios, ligou o rádio e olhou para ela.

- Não hoje, Sansa.

E continuou o caminho até o local que combinara com Robb, aumentando o volume do rádio cada vez que a ruiva pedia para descer. Ela resistiu durante uns dez minutos, mas acabou imergindo num silêncio furioso, e o resto da viagem foi embalado apenas pelas músicas do rádio e os suspiros irritados de Sansa.