Eu não possuo Percy Jackson etc. Primeira tentativa com o ship.

Ficlet escrita para Fernanda Monteiro através do PFF.

Cúmplices na ruína

O céu estava dividido. De um lado a imensidão azul-petróleo que lentamente ganhava espaço, pontilhada de esferas brilhantes; do outro uma confusão de nuvens e pedaços do empíreo cristalino que terminavam num degradê alaranjado atrás das montanhas. O cenário todo parecia a pintura de um artista depressivo onde um mar revoltoso e suas ondas de escuridão engoliam toda a esperança do mundo.

Sentado na ponta do penhasco, seus pés balançando na face do abismo, Nico pensou que aquilo servia de metáfora para várias coisas — a cisão entre os deuses do Olimpo e a outra batalha que ocorria naquele momento em seu cérebro, cujos sussurros, apesar de seus esforços constantes para ignorá-los, permaneciam chamando sua atenção para um problema que o rapaz considerava frívolo. Ainda assim, di Angelo não podia controlar os poderes do amor (e, nesse caso, o sentido era literal), como Eros havia dito; qualquer desfecho para aquela história seria contraproducente e o levaria à derrota.

O que eles não esperavam era que Nico, apesar da pouca idade, já tinha há muito se acostumado com o fracasso.

O farfalhar suspeito de pés se arrastando às suas costas denunciou a presença de outra pessoa. Ele olhou através dos ombros e encontrou um garoto subindo lentamente a encosta. Vestia jeans surradas, com manchas de terra nos joelhos, a camiseta do acampamento pendurada no torso suado e bronzeado. Mantinha no rosto uma expressão que podia ser de dor e cansaço; seus olhos, no entanto, continuavam anunciando aquela mesma malícia infantil que o incomodava.

— Parece que não consegui ser silencioso — disse, sentando-se sem ser convidado.

— Você nunca é, Valdez.

Um eufemismo grosseiro. Leo Valdez era tão discreto quanto um hecatônquiro em roupas de banho.

Nico permaneceu deitado de olhos fechados, sentindo aquele desconforto mental que acontecia quando alguém o observava, esperando pacientemente a ocasião em que seu silêncio seria quebrado, o que não demorou a acontecer. A voz arrastada saiu mais próxima do que esperava. Ele sentiu a respiração quente em seu pescoço.

— Sobre Percy...

— Eu não quero falar sobre Percy — ele encarou o outro. — Eu não quero falar sobre nada, Valdez.

Aquele assunto ainda o afetava como a queimação da pele em carne viva. Percy. Jason deixando escapar seu segredo. Os olhares de todos. Vergonha. Nico tinha sumido do acampamento durante um ano inteiro e voltado só havia uma semana. O filho de Poseidon ainda tinha tentado falar com ele — ou no mínimo demonstrara aquela intenção —, mas ele fora mais rápido e escapara. Aquilo tudo era muito recente.

Nico sabia que Leo não tinha a intenção de irritá-lo. Na verdade, o que o irritava no garoto era exatamente essa capacidade de ser leviano com piadas e comentários descabidos nos momentos mais inesperados, essa veia pulsante de inabilidade social. De certa forma eram parecidos, embora Nico preferisse lidar com as pessoas de outra forma. Geralmente as ignorando e rechaçando, como tentava fazer agora.

Leo piscou, seus grandes cílios batendo bem próximos, os olhos brilhando de forma suspeita. Ele soltou o ar de seus pulmões num suspiro profundo e, virando o rosto e simulando a intenção de se levantar, voltou-se para Nico rapidamente e roubou-lhe um beijo.

Nico gelou. Ainda teve tempo de ver o pedaço de um sorriso enquanto o filho de Hefesto corria.

E agora mais essa.

Ele deitou-se novamente, a grama pinicando suas costas.

"Hades, você é o pior pai de todos."

Ficou remoendo seu azar enquanto o céu finalmente se tornava negro e as sombras engoliam tudo completamente.