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- Eu... obrigado, John. – o médico acariciou-lhe o rosto e beijou-o de leve nos lábios, um toque breve e casto, visando apenas reassegurar o outro de sua constância.
- Se você tiver qualquer coisa lhe incomodando, Sherlock, fale. Essa é a única regra que eu coloco no nosso relacionamento: sempre seja sincero sobre o que estiver lhe incomodando, certo? – Sherlock assentiu, e avançou para envolver John nos braços, segurando-o por um instante como se sua vida dependesse disso. – Está pronto para ir pra casa? – Sherlock soltou-se dele s sorriu.
- Sim. Vamos pra casa, John.
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PARTE I – ROUTINE, SWEET ROUTINE 1
O sol se punha quando John e Sherlock desceram do táxi em frente ao 221B da Baker Street. Eles passaram a viagem inteira conversando em voz baixa, e Sherlock ia dissecando detalhes de um dos casos de arquivo que Dimmock deixara para ele, enquanto John abria a porta do prédio. O flat da Sra. Hudson estava escuro e silencioso, e eles se congratularam por terem escapado dos olhos curiosos da vizinha. Eles subiram as escadas lado a lado, os dedos entrelaçados, e quando entraram na cozinha, Sherlock virou-se para John com um sorriso mínimo.
- Você se deu conta de que nós nunca nos beijamos na nossa própria casa? – John ergueu as sobrancelhas, enquanto abria a geladeira para guardar a sacola com o jantar dos dois.
- Ora, ora... – ele falou, aproximando-se de Sherlock e tomando a mão dele – parece que nós temos que retificar isso, não é? - Ele conduziu o detetive até o sofá onde ele passava as longas horas entre um caso e outro afundado, e sentou-se ao lado dele, tomando-lhe o rosto afilado nas mãos. Durante um tempo os dois apenas se olharam, e John impressionou-se com a facilidade com que conseguia ler as emoções naqueles olhos tão claros e belos. Ele viu as pupilas dilataram-se, e a respiração de Sherlock tornar-se mais rápida e superficial à medida que ele ia aproximando o rosto. E então ele fechou os olhos, no momento em que os lábios se tocaram, o pensamento de qualquer outra coisa que não aquela boca ampla e bem desenhada banido de sua mente. As mãos de Sherlock seguravam sua cintura, e suas próprias mãos continuavam segurando e acariciando o rosto do detetive. O beijo, que começara lânguido e carinhoso, logo tornou-se faminto e feroz, as línguas dançando uma em torno da outra, e as mãos buscando a pele morna escondida sob as roupas. Sherlock não perdeu tempo em sentar-se no colo de John, os dedos desfazendo rapidamente os botões da camisa vermelha, arrancando um gemido profundo do doutor. Ele rompeu o beijo para tirar a própria camiseta, e logo a boca de John estava em seu pescoço, e descia em beijos rápidos pelo seu peito. Ele fechou os olhos e jogou a cabeça para trás, sobrecarregado pelas sensações que a boca de John em seus mamilos e as mãos habilidosas que iam desfazendo seu cinto lhe provocavam, quando...
- Meninos, vocês deixaram a porta do prédio destrancada e a do flat escancarada! E se... Oh, CÉUS! – O grito da Sra. Hudson ao ver os dois sentados no sofá, sem camisa, Sherlock no colo de John, com os olhos fechados e a cabeça jogada para trás em deleite enquanto o outro atacava seu pescoço com os lábios e tentava abrir-lhe os jeans justos, arrancou-lhes da névoa de luxúria, e eles pularam do sofá, tentando recompor as roupas e esconder suas mais que evidentes ereções. – Me desculpem, eu não queria... interromper nada. – A senhoria estava vermelha, mas havia um sorriso formando-se no canto de sua boca. – Eu vi a porta aberta e vim perguntar se vocês gostariam de um chá, e algo para comer, mas já que estão... ocupados... – John alisou a frente da camisa e pigarreou.
- Chá seria adorável, Sra. Hudson. A senhora poderia nos contar como foi o final de semana com a sua irmã. – A vizinha sorriu e assentiu.
- Está bem, meus queridos. Volto em breve, e vocês podem me contar o que aconteceu por aqui no final de semana. – ela piscou para Sherlock, que corou de uma forma que John não achava humanamente possível. – E eu vou bater antes de entrar, de agora em diante. – ela saiu, fechando a porta do flat atrás de si. Sherlock jogou-se no sofá a todo comprimento, escondendo o rosto nas mãos. John sentou-se no chão e encostou a cabeça no abdômen plano do detetive, virando o rosto para encontrar os olhos claros, num misto de constrangimento e diversão.
- Por que será que eu tenho a impressão de que não vai ser a última vez em que alguém nos pega em uma situação comprometedora?
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Fiel à sua palavra, a Sra. Hudson bateu na porta ao retornar, meia hora depois, com chá, sanduíches e um prato de biscoitos de amêndoas, que foram prontamente atacados por Sherlock. Ela deu um tapa brincalhão na mão dele e serviu o chá para os três, sentando-se na poltrona de John e olhando sobre a xícara o par, que dividia a outra poltrona, John no assento e Sherlock encarapitado em um dos braços.
- Então... – a senhoria quebrou o silêncio embaraçado – como isso começou? – Sherlock fez menção de falar, sem dúvida pronto a despejar em detalhes o final de semana, mas foi cortado por uma cotovelada bem aplicada na coxa. John olhou-o com a testa franzida, num olhar que claramente dizia "Limites, Sherlock!". Ele suspirou e apresentou a versão condensada.
- Nós... conversamos. Nos demos conta de nossos sentimentos e agimos de acordo. – ele estendeu a mão e, timidamente, segurou a de John, que sorriu para ele sobre o sanduíche que comia.
- Bem, já era hora! – a Sra. Hudson respondeu – Só vocês dois ainda não tinham se dado conta, mesmo. – os dois olharam a vizinha num silêncio atônito. – Ora, rapazes, pensem um pouco! Vocês ficam, às vezes, se encarando por quase um minuto inteiro, esquecendo que tem outras pessoas em volta. Estão sempre se tocando de alguma forma. E eu não preciso nem falar sobre tudo o que você aguenta, John. – ela lançou um olhar meio exasperado, meio terno, para Sherlock. – Se não houvesse algum sentimento forte por trás de tudo, não acho que você aguentaria polegares na geladeira, pulmões na banheira e afrodisíaco no açucareiro. – Sherlock teve a decência de aparentar embaraço.
- Sinto muito por isso, Sra. Hudson. – ele murmurou, num tom contrito. Ela balançou a cabeça com um sorriso, mordiscando a ponta de um biscoito.
- E o seu final de semana, Sra. Hudson? Como está sua irmã? – John perguntou, educadamente. A senhoria reparou que ele acariciava os nós dos dedos de Sherlock com o polegar num gesto inconsciente, o que a fez sorrir.
- Fabulosa, simplesmente fabulosa. Ela é avó, finalmente! Minha sobrinha teve um menino há duas semanas. – Sherlock beijou os cabelos de John e desculpou-se com a Sra. Hudson, indo cuidar dos experimentos que negligenciara durante aquele final de semana, enquanto os outros dois ficaram conversando sobre o sobrinho-neto da Sra. Hudson, bem como sobre o futuro sobrinho ou sobrinha de John. Durante mais ou menos uma hora eles conversaram, até a senhoria desculpar-se, dizendo-se exausta, e despedir-se de seus rapazes. John levou a vizinha até a porta, e tomou o cuidado de tranca-la. Ele escorou-se no umbral da cozinha e ficou observando enquanto Sherlock balançava um tubo de ensaio cheio de um líquido púrpura contra a luz, parecendo contrariado com a reação que se desencadeava.
- Você ia contar a história inteira, não ia? – Sherlock virou-se e encarou John através dos óculos de segurança por um momento, dando de ombros. – Filtros, Sherlock. Certas coisas não são apropriadas para se compartilhar. – o detetive colocou o tubo em um suporte e começou a tomar notas.
- Bom, eu não saberia, John. Sociopata, lembra? – ele deu um sorriso pequeno, sem tirar os olhos do caderno.
- Sociopata, uma ova. – o tom de John era carinhoso – Você só não se incomoda de aprender as regras de civilidade e boa convivência em sociedade. – ele desencostou-se do umbral e foi até a mesa, apoiando as mãos espalmadas contra a borda. – Okay, está na hora de estabelecermos os limites referentes à parte pública do nosso relacionamento. E também sobre algumas coisas particulares. – Sherlock ergueu os olhos de suas notas, parecendo curioso. Ele largou o caderno ao lado do microscópio e cruzou os braços, a coluna reta, escorado contra o balcão da cozinha.
- Prossiga, John. – John ergueu a cabeça para encara-lo com um sorriso doce. Ele sabia bem o que aquela postura significava; Sherlock ia ouvi-lo, mas cada proposição que não lhe agradasse seria rebatida com sua lógica irrefutável e argumentos esmagadores.
- Muito bem. Primeiro: quão público você quer que esse relacionamento seja? – Sherlock pareceu surpreso, mas antes que pudesse falar, John captou o porquê e continuou – Sim, você, Sherlock. Eu estou acostumado a ter relacionamentos, e estou mais do que habituado a que as pessoas presumam que somos um casal. – ele falou, com um sorrisinho – Além do mais, as pessoas mais importantes e mais presentes nas nossas vidas já sabem: Harry, Mycroft, Clara, Greg e a Sra. Hudson, que é praticamente da família. Se você preferir manter nosso namoro privado, eu não me oponho. – Sherlock olhou-o em silêncio por um instante, e respirou fundo antes de falar.
- Eu... eu realmente não faço ideia. Como você disse, todas as pessoas importantes em nossas vidas já sabem. Eu não quero esconder de ninguém o que nós temos, mas também não sou a pessoa mais afeita a demonstrações públicas de afeto. Deixemos da maneira mais simples: se alguém perguntar se estamos juntos, respondemos. Se sentirmos vontade de expressarmos nosso afeto de maneira física, nós faremos. – o sorriso de Sherlock era malicioso quando inclinou a cabeça e encarou John, estreitando os olhos. – Se bem que o senhor, Doutor Watson, me parece muito afeito a expressões físicas de carinho. – John corou de leve, mas não desviou o olhar.
- Eu não sou um adolescente, Sherlock, eu posso muito bem controlar meus impulsos, obrigado. Segundo tópico, então: durante os casos. – Sherlock assentiu, sentindo que ali seria onde ele teria que conquistar terreno com unhas e dentes. – Enquanto você estiver envolvido em algum caso, continuamos como sempre. – John nunca deixava de surpreendê-lo, o detetive pensou, e não foi rápido o suficiente para esconder sua reação, que arrancou uma risada leve do médico. – Sherlock, eu já disse que não quero que você mude. Você ainda vai ter que aturar minhas reclamações e reprimendas, como sempre. Mas se você precisar passar quatro dias sem dormir, vivendo a base de café, afundado nesse bendito sofá, por causa do trabalho, eu não vou lhe impedir. Mas no momento em que o caso for encerrado, eu vou arrastar seu traseiro pra casa, te enfiar uma refeição decente garganta abaixo e colocar você na cama; e não vou querer ouvir nenhuma reclamação, nenhum resmungo, nada. Entendido? – Sherlock assentiu, calado, ainda um pouco surpreso. – Ótimo. Terceiro: por favor, Sherlock... o que nós fazemos na intimidade do nosso quarto não é assunto de conversas. – o detetive fez menção de falar, e foi, mais uma vez, cortado – E quando eu digo quarto, eu incluo sala, cozinha, banheiro, escritório, corredor ou qualquer lugar onde nos engajarmos em atividades físicas. – Sherlock encarou-o com uma sobrancelha erguida, o canto da boca torcendo-se em um sorriso sardônico onde era possível ver a semelhança com Mycroft. – O que foi?
- Quintas-feiras alternadas, John. – o médico pareceu confuso por um momento, mas lembrou-se: noite de pub com Greg. Ainda assim, não parecia ver o problema. Sherlock suspirou antes de prosseguir – Lestrade deu a entender que você fica muito... falante depois do terceiro pint. Aparentemente, ele ouviu descrições detalhadas de todas as suas namoradas. – John empalideceu e deixou-se cair em uma das cadeiras da cozinha, batendo a cabeça contra a mesa e provocando um pequeno abalo nos experimentos correntes.
- Me mate agora, Sherlock. Pegue a minha pistola e me mate agora.
- Deixe de ser dramático, John. Além do que, - ele deu um sorriso maléfico – vai ser divertido se você deixar algo escapar para ele, e ele acabar deixando escapar para Mycroft. Vai ser bem feito, depois do incidente do elevador da Yard. – Sherlock fez uma careta ao lembrar de quando deu de cara com o irmão e o cunhado em um momento bastante íntimo num dos elevadores da NSY. Ele passara três semanas sem conseguir encarar Greg, e precisou de um triplo assassinato e uma fraude de seguro muito bem elaborada para deletar a imagem de sua mente. – Mais alguma coisa que precisemos discutir? – John ergueu a cabeça, apoiando o queixo na mesa para voltar a encarar Sherlock.
- Na verdade, tem sim. – Sherlock fez sinal para que ele prosseguisse, e John abriu um sorriso travesso. – Meu quarto ou o seu?
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O quarto de Sherlock acabou sendo escolhido, especialmente pela vantagem de não ter dois lances de escada no caminho. Depois de um jantar tardio, os dois recolheram-se ao quarto do detetive, que, surpreendentemente, era organizado e limpo de maneira quase espartana.
- Eu não consigo entender. – John falou, enquanto arrumava seus travesseiros no lado da cama mais próximo da porta; velhos hábitos não morrem. – Como pode você transformar o flat inteiro num chiqueiro, mas seu quarto ser mais arrumado do que o meu?
- Nos raros momentos em que eu durmo, - a voz de Sherlock chegou, vinda do banheiro – prefiro fazê-lo num ambiente organizado. É cientificamente comprovado que isso leva a um sono mais tranquilo e, portanto, mais reparador. – ele voltou ao quarto, vestindo apenas a calça do pijama, e sorriu ao ver como John havia arrumado a cama, puxando o corpo do outro para aninhar-se entre seus braços. – Sempre o soldado, não é, Capitão Watson? – ele sussurrou, depositando beijos leves em torno da orelha de John, as mãos deslizando por baixo da regata que ele usava para dormir, acariciando a pele das costas lentamente, as pontas dos dedos traçando as cicatrizes. O médico soltou um suspiro satisfeito, apoiando a testa no ombro do detetive, as mãos enlaçando a cintura estreita. – Hora de ir pra cama, John. – Sherlock empurrou-o contra o colchão, rindo, e atirou-se do lado dele, beijando-o carinhosamente. John abraçou-o e puxou-o contra si, aprofundando o beijo, sentindo-se derreter contra o corpo esguio e morno. Ele rompeu o beijo e acariciou o rosto de Sherlock, sorrindo levemente.
- Você não faz ideia do quão lindo você é, Lockie. – ele acariciou as bochechas que se tingiam levemente de vermelho, correndo as pontas dos dedos pelas maçãs do rosto angulosas, pela mandíbula forte, traçando o contorno dos lábios cheios. – Seus olhos, seus lábios, seus cabelos, sua pele... você é estonteante. É muito difícil manter minhas mãos longe de você. – Sherlock sorriu, levemente constrangido, ainda sem saber como reagir diante das demonstrações de carinho de John. Ele escondeu o rosto nos cabelos do médico, beijando-lhe o topo da cabeça repetidamente, enquanto o abraçava com força. John deu uma risada leve. – Você fica uma gracinha quando está embaraçado. – ele ergueu o rosto e capturou os lábios de Sherlock, beijando-o lentamente, a língua explorando cuidadosamente cada canto da boca que o fascinava, as mãos traçando padrões no peito liso, descendo em direção aos quadris estreitos e puxando-os contra os seus. Sherlock gemeu em meio ao beijo, começando a esfregar-se contra John, sentindo-o enrijecer sob a calça de algodão. Ele aumentou o ritmo, pressionando-se mais ao sentir a própria excitação crescer sob o beijo duro e o toque das mãos de John em sua pele nua. John girou o corpo sem separar sua boca da do outro, deitando-se sobre Sherlock, montando sobre o quadril dele, sem parar de movimentar-se. Os dois ofegavam em meio ao beijo, e o detetive agarrava-se ao outro desesperadamente, sobrecarregado pelas sensações. Ele rompeu o beijo, encarando John, que o olhava com olhos escurecidos de luxúria e uma expressão que colocava fogo nas veias de Sherlock.
- J-John... se você continuar assim...
- Fale, Lockie. – John comandou, a voz rouca, enquanto mordia de leve o ombro de Sherlock, sem interromper o movimento de seus quadris, fazendo o máximo para controlar a onda de prazer que se construía aos poucos em seu interior, querendo primeiro ver Sherlock desmanchar-se sob ele.
- Eu... eu vou... – o detetive mordia o lábio inferior, os olhos fechados, a cabeça jogada para trás, os quadris acompanhando os movimentos de John, as mãos apertando-se cada vez mais na cintura do médico. John movimentou-se mais rápido, pressionando-se com mais força contra o corpo do outro, até que o corpo de Sherlock deu um tranco, seus olhos abrindo-se como se ele tivesse levado um choque de mil Volts, e o detetive agarrou-se a ele com mais força ainda. – John! – ele soltou-se sobre a cama, ofegante, o corpo tomado por espasmos. Por alguns gloriosos instantes, sua mente esteve completamente em branco, seu cérebro inundado apenas pelas sensações, pelas emoções. John continuou movimentando-se por mais alguns segundos, antes de deixar seu próprio orgasmo arrebata-lo, enquanto ele beijava Sherlock possessivamente. Ele deixou-se cair ao lado de Sherlock, ofegante, segurando uma das mãos do detetive entre as suas. Quando sua respiração normalizou-se e seu corpo acalmou-se, Sherlock virou o rosto para John com um sorriso tolo. – Então... um banho antes de dormir?
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Quando o alarme do celular tocou indecentemente cedo, John enterrou a cabeça sob o travesseiro com um gemido. Ele havia prometido levar Sherlock até St. Bart's antes do seu expediente na clínica – e nas segundas, ele fazia jornada dupla. Virou-se preguiçosamente, apenas para encontrar o outro lado da cama vazio. Ele grunhiu, exasperado; Sherlock era pior que uma criança na manhã de Natal. Com dificuldade, ele arrastou-se para fora da cama em direção ao banheiro. Ele tinha tempo para uma ducha rápida antes de fazer a barba, e talvez conseguisse convencer Sherlock a esperar que ele tomasse o café da manhã. Mas ele não colocava muita fé nisso.
O médico desceu as escadas, vindo do seu quarto depois de vestir-se, pensando que teria que conversar com Sherlock a possibilidade de mudar algumas de suas roupas para o quarto de baixo; ia ser infernal ter que encarar as escadas todas as vezes que precisasse trocar de roupa. Ele encontrou Sherlock na sala de estar, já vestido em um dos seus habituais ternos ajustados, com uma camisa azul clara que destacava seus olhos, digitando rapidamente em seu laptop. O do próprio detetive para variar, John pensou, divertido.
- Bom dia. – ele falou, inclinando-se para beijar os cachos negros ainda úmidos do banho. Sherlock virou-se, sorrindo, e deu-lhe um beijo leve nos lábios.
- Bom dia, John. Temos tempo para uma xícara de chá, se você quiser. – John riu de leve enquanto se dirigia à cozinha, ligando a chaleira e preparando duas canecas; ele sabia que Sherlock só tomava chá se ele preparasse, o mimado.
- Droga, esqueci que não temos pão. Queria pelo menos uma torrada, antes de sair. – John resmungou, chateado. Estava desligando a chaleira quando sentiu uma mão em sua cintura, e uma caixa de biscoitos salgados de gergelim foi colocado a sua frente.
- Isso serve? – Sherlock perguntou, e John virou-se para encará-lo – A Sra. Hudson sempre traz um pacote desses para mim quando visita a irmã, porque ela sabe que eu gosto de comê-los com o chá, e não vendem em nenhum lugar aqui perto... – ele foi interrompido pelo toque dos lábios de John nos seus, e sorriu – Vou tomar isso como um sim.
Após um café da manhã tomado em um silêncio confortável, eles logos saíram e tomaram um táxi rumo à St. Bart's. Sherlock trazia consigo uma pequena sacola escura, e por mais que estivesse curioso para saber o que havia dentro dela, John achou melhor não perguntar; não lhe agradava a ideia de passar o dia inteiro preocupado com os estragos que Sherlock podia fazer na morgue, e em tudo o que ele podia convencer a pobre Molly a fazer. Involuntariamente, ele sentiu uma fisgada de ciúme ao pensar na maneira que Sherlock manipulava a pobre garota, aproveitando a atração que ela sentia por ele. Ele virou-se para Sherlock, que segurava levemente sua mão direita.
- Sherlock. – O detetive virou-se para ele, e o médico prosseguiu, em um tom monocórdio – Você não vai flertar com a Molly para que ela seja conivente com seus experimentos. – Sherlock inclinou a cabeça, um ar curioso nos olhos, até que um sorriso pequeno brotou-lhe nos lábios.
- Oh. – ele apertou a mão de John levemente, acariciando o dorso com o polegar – Está bem. Mas eu posso falar pra ela que o novo chefe de patologia forense está tentando chama-la pra sair há semanas e ela não se deu conta?
- Sherlock... – John grunhiu, exasperado. – Tente não perturbar a coitada da garota. Ela ainda fica mortificada ao lembrar toda a confusão com aquele maluco do Moriarty. – Como sempre, ao ouvir aquele nome, ele viu a tensão construir-se sobre os ombros de Sherlock. Inclinou-se e deu-lhe um beijo leve no rosto, mudando o assunto – Eu vou trabalhar até as oito, pelo menos. Você vai passar o dia inteiro na morgue?
- Não. Vou fazer alguns testes, recolher amostras e voltar para trabalhar em casa. Preciso de sossego, e não do interminável fluxo de conversa miúda da Molly.- ele carranqueou, arrancando uma risada de John.
Ao chegarem a St. Bart's, a recepcionista apenas entregou-lhes os passes de trabalho, sem preocupar-se com assinaturas. As excentricidades de Sherlock já faziam parte da rotina do hospital-escola há alguns anos, e seu trabalho constante com Lestrade lhe garantia os mesmos privilégios de acesso da polícia (também não era nenhum inconveniente o fato de seu irmão mais velho ser um dos maiores benfeitores da instituição). Sherlock entrou na morgue como se o lugar lhe pertencesse, indo direto até o pequeno escritório onde Molly normalmente ficava, assustando a legista, que estava absorta na leitura de um grosso volume.
- Sherlock! Você me assustou. – ela reclamou. – Ah, olá, doutor Watson.
- Olá, Molly. – ele sorriu – E quantas vezes ainda tenho que pedir que você me chame de John? – ela corou e murmurou um pedido de desculpas, e ele balançou a cabeça, virando-se para o detetive. – Sherlock, se você precisar que eu traga alguma coisa pra casa à noite, mande uma mensagem. Ligue apenas se algo urgente acontecer. – Sherlock fez menção de falar, e John cortou-o – Não, entediado não conta como urgência. – o detetive deu um sorriso enviesado.
- E excitado? – John sentiu o rosto queimar, mas acabou rindo junto com Sherlock, balançando a cabeça. – Está bem, está bem. Eu não vou atrapalhar seu precioso dia de trabalho, a não ser que algo grave aconteça; ou que apareça um caso. – absortos em sua pequena troca de farpas, eles não notaram que Molly os encarava com a boca aberta e o rosto vermelho. Sherlock aproximou-se de John e ajeitou a gola da camisa dele, inclinando-se e dando um beijo breve nos lábios dele. – Vá logo antes que eu mude de ideia. – ele murmurou, contra os lábios de John, que riu e beijou-o de volta.
- Comporte-se. – só então ele pareceu lembrar-se da presença de Molly, que ainda estava parada atrás deles, a boca aberta como um peixinho dourado fora do aquário. – Até outro dia, Molly. – ela piscou ao ouvir o próprio nome, o tom de vermelho do rosto aprofundando-se, e balançou a cabeça, como que acordando de um transe.
- A-até mais, dou-John. – depois que John saiu, ela virou-se para Sherlock, que pendurava seu paletó atrás da porta. – O que diabos foi isso? Aliás, - ela perguntou, em choque, apontando para o ponto onde a gola da camisa de Sherlock abria-se, revelando uma marca proeminente em tons de vermelho e roxo na junção do pescoço com o ombro esquerdo – o que diabos é isso? – Sherlock recolheu a sacola que largara no chão, e observou Molly com um sorriso pequeno no canto dos lábios.
- Eu acredito, Molly, que o termo atualmente utilizado é "chupão". Agora, você não teria por acaso nenhuma vítima de câncer disponível, teria? – Molly balançou a cabeça, incrédula e um pouco desapontada.
- Então, vocês estão juntos agora? – ela perguntou, numa voz pequena, e foi com um aperto no coração que ela viu as feições de Sherlock suavizarem-se por um instante ao lembrar-se de John.
- Sim, Molly. Estamos juntos. Sim, juntos como em namorados. Não, não vou entrar em detalhes sobre isso. Então, alguma vítima de câncer? – ela pigarreou antes de continuar, sem conseguir encará-lo.
- Tenho um homem de 43 anos, câncer de próstata, uma jovem de 19, câncer ósseo, e um senhor de 72, câncer na laringe. Mas essa não foi a causa mortis, ele foi baleado num assalto a banco. – ainda de cabeça baixa, ela pegou as chaves do necrotério e a prancheta com as fichas. – Quer ver os três?
- Por favor. – Sherlock hesitou por um momento. – Molly... você conhece o doutor Kubrick, da patologia forense? – ela encarou-o confusa.
- Eddie? Claro, nós costumamos ter o mesmo horário de almoço. Você vai precisar de algo dele?
- Na verdade, sim. – ele tirou as chaves e a prancheta das mãos dela, abrindo a porta – Ele vem tentando criar coragem para convidá-la há semanas, mas você estava cega aos avanços do pobre rapaz. Vá até o laboratório e convide ele pra tomar um café depois do expediente. – ele saiu e olhou para Molly com uma piscadela. – De nada.
Ele fechou a porta do escritório, deixando uma Molly corada e sem palavras atrás de si.
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John chegou à clínica com alguns minutos de atraso; o trânsito em Londres era realmente infernal nas segundas-feiras. Seu primeiro paciente – um senhor octogenário que era completamente contra qualquer tipo de remédios, e acreditava que uma xícara de caldo de carne e uma taça de conhaque curavam desde resfriados até câncer terminal – já o aguardava, um pouco irritado pelo atraso. John não demorou a dobrá-lo, com seu jeito tranquilo e bem humorado, e logo atendia num ritmo regular os pacientes daquela manhã. Era quase uma da tarde quando ele finalmente teve uma pausa nas consultas agendadas. Ele correu até a cafeteria no outro lado da rua e pegou um sanduíche, voltando para comê-lo na sala de descanso da clínica. Sarah estava lá, tomando uma xícara de chá e lendo o jornal. Ela sorriu para ele sobre a borda da xícara.
- Hey, John. Teve um bom final de semana? – John sorriu de leve enquanto servia-se de chá, indo sentar-se ao lado da colega.
- Nada mal. E você? – Sarah olhou-o por um tempo e largou a xícara na mesa, cruzando os braços.
- Okay, pode falar: qual o nome dela? – ele ergueu o olhar do sanduíche, uma sobrancelha erguida, mas sentia o rosto esquentando. Maldita Sarah, que praticamente conseguia farejar quando alguém tinha se dado bem.
- Não sei do que você está falando. – ele respondeu, com um sorriso de canto, sabendo que isso só ia atiça-la ainda mais. Não tinha ideia de qual ia ser a reação de sua ex ao fato de estar saindo com um homem; ou melhor, ao fato de estar saindo com Sherlock, que fora o estopim do fim do relacionamento. Ela nunca parecera particularmente ressentida com o detetive depois do término do namoro com John; as excentricidades de Sherlock pareciam mais diverti-la do que exaspera-la. Como se invocado por pensamento, seu celular recebeu uma mensagem do próprio.
John, estou sem amônia. Pode trazer à noite? - SH
Banheiro, embaixo da pia, garrafa azul. – John
Ele voltou-se para Sarah, e viu que ela a olhava com um sorrisinho.
- Não me distraia, Watson. Dá pra ver que você está de namorada nova. Desembuche. – John riu e esfregou a nuca, pensando em como ia quebrar as novidades para Sarah.
- Você vê, não é exatamente uma pessoa nova... – e foi interrompido pelo celular.
Por que você escondeu a minha amônia? – SH
Porque ela estava na geladeira, ao lado do leite. Armazenada em uma outra garrafa de leite. Eu quase coloquei amônia no meu chá. – John
Está bem. Obrigado. – SH
E desculpe. – SH
Tudo bem. Vejo você à noite. - John
Amo você. – John
- As mensagens são dela? – ela olhara por cima do ombro de John e vira a última mensagem que ele enviara - É aquela advogada que tinha o buldogue, ou talvez a professorinha de jardim de infância?
- Não, Sarah. É... Deus, como eu vou contar isso pra você? – ele riu e apoiou a testa na mão, um pouco constrangido. – Você lembra da nossa última briga, antes de decidirmos que estávamos melhor como amigos? – ela franziu a testa, tentando recordar-se.
- Vagamente. O que isso tem a ver?
- Então, você vê... – novamente o celular tocou, e Sarah foi mais rápida que John, pegando o celular de cima da mesa e correndo para a outra ponta da sala. – SARAH! – a médica riu e leu a mensagem recebida.
Também amo você. Traga leite. – SH
Sarah ficou em silêncio por um instante, olhando para John, embasbacada.
- Pode devolver meu celular, Sarah? – ele pediu, a voz suave. Ela entregou o aparelho em silêncio. Ele leu a mensagem com um sorriso pequeno e guardou-o no bolso dos jeans. – Satisfez sua curiosidade?
- Desculpe, John. – ela respondeu, a voz contida, sem querer encará-lo – Foi inapropriado.
- Você realmente sente muito, ou apenas sente por ter descoberto que é Sherlock a pessoa com quem estou? – ele perguntou, uma ponta de mágoa transparecendo na voz. – Sarah... você é uma das pessoas em quem eu mais confio. É a única ex-namorada com quem mantive contato amigável, e não foi só por causa do trabalho; nós nos entendemos. Não totalmente, mas ainda assim... sempre nos demos bem. Você sempre soube a extensão do meu carinho por Sherlock; isso é só a evolução natural deste sentimento. – ele ficou em silêncio por alguns instantes, olhando para a cabeça abaixada da colega. – Ele me faz feliz, Sarah. E como minha amiga, eu espero que você fique feliz por mim. – Pegando o resto de seu sanduíche, ele saiu da sala de descanso sem dizer mais nada.
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N/A: E começa a parte final da trilogia The Science of Seduction ^^ Essa fic é mais focada no cotidiano dos dois -vai ter situações engraçadas, absurdas, angst, sexy... de tudo um pouco. Espero que apreciem o/
Vai ser postada no mesmo ritmo das anteriores, um capítulo por semana ^.^
Until next week,
Eowin
