1939

Resumo: O início do programa de exterminação nazista. Um médico cruel, com vergonha de sua origem. Um jovem e exótico cigano. Ódio. Amor. Fuga e morte. DarkLemon. Deathfic. Shaka/Mu. AU. Não recomendado para menores de dezoito anos.

Disclaimer de sempre: Saint Seiya não me pertence, são propriedade do tio Kurumada, Toei e etc.

Capítulo 1

Sempre fora capaz de deixar os lugares sem olhar para trás. Acreditava que viver consistia em seguir em frente, sempre. Talvez por isto, tenha sido o único a não se abalar com a viagem cansativa. Era também o único na carroceria do veículo que não carregava a estrela amarela nos casacos.

Uma garotinha de olhos violeta o observava, admirada. Ergueu a mãozinha para tocar nos finos fios lavanda, mas foi recebeu uma repreensão da mãe e recuou.

- Ester! - O exótico homem observou a mesma cor nos olhos da mãe temerosa. Sorriu, sabendo bem que não se tratava de um temor cuja causa fosse ele.

- Tudo bem, Ester. - Murmurou.

Apiedava-se daquelas pobres almas. Quanto não teriam deixado para trás? Ele não se importava porque não tinha nada, nada...Nada senão a vida errante. Aliás, sentia-se quase imune ao sofrimento, já calejado por lágrimas e torturas. Jamais fora de fato aceito em qualquer lugar, então aquele homens não o alienavam de nada. Não poderia ser tão ruim. Não para ele. Engoliu em seco, ao imaginar o que poderia testemunhar.

Ester finalmente tocara os fios lilases, admirada. Pela primeira vez nas longas horas de estrada, sorriu. O homem fechara os olhos. Aquilo lhe bastava. Dispensando as palavras, aquela criança lhe dizia que ele não era o monstro que a maioria esmagadora das pessoas pintava.

Quantas horas teriam viajado? Forçava sua mente a focar-se em coisas banais, como a temperatura, o tempo de viagem, como faria qualquer outro viajante em outras circunstâncias.

O automóvel parou bruscamente. Os lampejos de intuição de Mu diziam-lhe que tudo dali para a frente seria daquela forma, brusca e cruel. Não se importava mais. Entregar-se-ia à morte por inanição ou frio, como tantos outros.

Puxou um lenço branco de um de seus bolsos, tranformando-o em um jasmim. Entregou-o a Ester, que observava a flor, admirada.

- Então você é um bruxo mesmo, moço?

- É isso o que dizem? - Ele arqueou os pequenos pontos de sua testa.

- É.

- Nunca me falaram isso...Mas isto foi apenas um truque, nada de bruxarias.

A garota não parecia acreditar muito no que o homem dizia, mas pelo menos, ele tornava a trajetória mais suportável. Menos assustadora.

E crueldade foi o que o Mu obteve, quando dois soldados aproximaram-se dele, jogando-o no chão, com desprezo. Desprezo e ódio por algo que sequer era uma causa. Diziam que era inaceitável, e a maioria, desesperada, se via obrigada a concordar com a barbárie de um líder completamente ensandecido.

O silêncio que se abatera sobre eles era quebrado apenas pela marcha lenta e fúnebre do prisioneiros, e pelos golpes e impropérios dirigidos àquela criatura tão diferente de tudo o que qualquer um ali vira na vida.

Em pouco tempo, tornara-se uma atração envergonhada, embora seu orgulho acentuado jamais admitisse. Os cabelos lilases cobriam apenas parcialmente a nudez, a pele alva reluzindo como uma pequena lua. Um pequeno foco de luz em meio ao inferno. Um foco de luz imobilizado, acorrentado.

Ergueu a cabeça ao escutar a marcha típica, ríspida. Quem o encarava daquela vez, era um homem que ele desconhecia. Era o exemplo do ideal que aqueles insanos buscavam: cabelos loiríssimos, olhos de um azul claro perturbador, e a pele quase tão alva quanto a sua. Reparou, porém, que aquele outro não vestia-se com os uniformes dos oficiais.

Os olhos azuis faiscaram perigosamente, fazendo Mu recuar como podia. Era uma pena que seu olho inchado pelos chutes o impedisse de vislumbrar melhor o loiro. Pelo pouco que via, ele parecia belíssimo. Se as circunstâncias fossem outras...


Escuro. Escuridão e morte reinavam absolutos naquele local, ao lado da crueza e da indiferença. E aquele silêncio pesado. Mesmo ele, o responsável por muitas daquelas mortes, prestava-se a quase apiedar-se. Quase.

Percorreu o recinto com o olhar, admirando cada qual de suas "obras". Para ele, nenhuma vida daquelas valia muito. Na verdade, ele julgava que eram meros animais de laboratório. Por pouco tempo. As mãos irônicas do destino já trabalhavam a trama de sua vida em um sentido oposto...

Frieza era o pré-requisito básico para a sobrevivência. Ele não admitiria jamais apenas sobreviver. Era um caçador em busca da presa perfeita. Foi com frieza que olhou para o insubordinado que ousara pronunciar aquele nome profano, vergonhoso.

- Shaka...

Um sonoro tapa, um filete de sangue. A altivez reconquistada.

- Não ouse pronunciar este...nome novamente. Isto, se não quiser acordar envenenado.

- Como quiser. Mas há algo aqui que pode interessar ao senhor, doutor.

- Bem melhor assim.

O outro assentiu e engoliu em seco. Naquele lugar, tudo era insuportável. Shaka o era em proporções dantescas, não sabia como os mais próximos conseguiam suportar a mera presença do "doutor" arrogante, que se achava um deus.

- Onde está?

O homem mais novo apontou para a área quase deserta, próxima a uma das enormes valas. Era possível? Mesmo sob a luz enfraquecida, ele pôde divisar longos cabelos lilases, e uma pele quase tão alva quando a neve em que o corpo esguio e fragilizado se estendia.