PERIGO NA FLORESTA

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Classificação: 16 anos – conteúdo inerente ao show

Gênero/categoria: Sobrenatural/aventura/ação/mistério/drama/relações familiares.

Sinopse: "Eu nunca desistirei de Sam, assim como ele jamais desistiria de mim. Você nos conhece. Se ele não está aqui, é porque algo de muito, muito ruim aconteceu e eu não vou ficar sentado esperando..."

NOTA: Este texto também andou perdido no limbo por causa daquele santo vírus que fez a festa no meu PC. Felizmente, existem pessoas com poderes maiores que dessas coisinhas virtuais dos infernos. Obrigada aos meus queridos salvadores!

NOTA(2): Sem beta. Todos os erros pertencem a mim e a mais ninguém.

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Capítulo 1 :

A névoa densa cobriu a floresta de repente, causando uma queda brusca na temperatura e dificultando a visão. Mal podiam ver o céu, por entre os troncos altos. O ar rarefeito tornava o corpo mais pesado e dificultava a respiração, principalmente quando se carregava aquelas mochilas pesadas nas costas.

_ Sam? – Dean agarrava-se às raízes expostas, subindo a encosta íngreme, logo atrás do irmão.

_ O que é?

_ Eu já te disse que odeio acampar?

_ Umas dez vezes nos últimos cinco minutos – o rapaz moreno continuava a subir, sem olhar para trás.

_ Você já percebeu que está esfriando muito?

_ Já. Por isso disse pra você usar um casaco mais pesado. Mas você, senhor-super-macho-de-plantão, não ia me ouvir, não é mesmo?

_ Eu não uso aquelas coisas fofas. De jeito nenhum. Coisa de fresco...

_ Então cala a boca e anda. Precisamos arranjar um lugar para acampar antes que anoiteça.

_É bom mesmo, Sammy. Não estou a fim de congelar o meu belo traseiro nessa droga de montanha.

O estado do humor de Dean Winchester ia de mal a pior na medida em que a temperatura descia e a luz do dia rareava.

Sam avistou uma abertura na rocha alguns metros acima do ponto onde se encontravam. Cutucou o alto da cabeça do irmão e indicou, num gesto, a direção. Apressaram o ritmo e alcançaram a entrada de uma pequena gruta.

Na abertura estreita, mal havia espaço para passarem por ela. Do lado de dentro, o ambiente era um pouco maior.

Havia um cheiro estranho e incômodo naquele lugar. Um misto de terra molhada, mofo e madeira apodrecida. Pelo menos, estariam protegidos do sereno e do vento frio da noite. Sem falar dos animais.

Dean recolheu uns poucos galhos secos que estavam espalhados pelo chão do lado de fora, retornou e montou uma pequena fogueira no centro da caverna.

O mais moço já havia depositado as mochilas pesadas ao fundo e preparava um círculo de pedras ao redor do fogo que o mais velho acendia. Arrumou os dois sacos de dormir, um de cada lado da fogueira, para aproveitarem melhor o calor e colocou duas latas de sopa sobre as chamas.

O dia, lá fora, tinha acabado. Não havia lua ou estrelas e o sereno caía do céu numa garoa grossa, quase chuva.

Os irmãos guardaram as lanternas. Precisavam economizar as pilhas para uma emergência.

Comeram toda a sopa e enfiaram-se nos sacos de dormir.

A temperatura caíra bastante e a sensação térmica era ainda pior.

_ Eu odeio frio! – Dean grunhiu debaixo do cobertor.

_ Você já disse isso. – Sam continuou lendo, sem dar importância ao comentário do irmão.

_ Pois eu vou continuar repetindo até enfiar dentro dessa sua cabeça dura: EU-O-DEI-O-FRI-O!

_ Eu ouvi, Dean. Agora cala a boca e dorme, está bem?

_ Está lendo o que? – o mais velho percebeu o interesse do irmão na caderneta de anotações.

_ Umas notas sobre o caso.

_ Tinha que ser. O caso...- puxou o cobertor até o alto da cabeça _ Grande porcaria! Um caso que nem sabemos ainda se é um caso.

_ É justamente por isso que precisamos repassar as informações. Muita coisa não se encaixa. Há algo muito errado nisso tudo, você não acha? – o outro não respondeu _ Dean? – silêncio _ Dean, está ouvindo? – nada _ Durma, seu chato. Só assim poderei trabalhar em paz.

***

Quando o sol raiou, não fazia muito tempo que Sam tinha adormecido.

"Odeio frio" Dean repetiu, em pensamento, antes de abrir os olhos.

"Odeio a vida selvagem" Seus olhos começavam a acostumar-se com a luz do dia. Soltou um bocejo longo e barulhento.

"Odeio dormir no chão duro e gelado" Suas costas ardiam e as articulações estalavam.

"E eu te odeio" Sua atenção voltou-se para o irmão mais novo, que ainda dormia.

O mais velho dos irmãos enrolou seu saco de dormir e amarrou-o sobre a mochila de lona, encheu uma caneca de alumínio com água e colocou-a sobre o braseiro. Buscou no bolso lateral da mochila, um pacote de café instantâneo.

_ Está na hora de acordar, Bela Adormecida. – Bateu, sem qualquer cuidado na perna do caçula, fazendo-o saltar de susto.

_ Mas que merda, Dean! –Sam apertou os olhos e esfregou as têmporas com os indicadores _ Precisa ser tão estúpido?

_ Deixa de frescura, Sammy. Pula fora daí logo. Quero sair dessa droga de montanha hoje.

_ Por que a pressa?

_ Já deu uma boa olhada lá fora, garoto? – ofereceu parte do café que misturou na caneca, ao irmão, que o aceitou _ Vai nevar logo. Eu não estou a fim de esperar pelos primeiros flocos, você sabe...

_ É, eu sei. Você odeia frio. Já sei.

_ Então beba logo o seu café e levante o traseiro daí. Vamos dar o fora – continuou guardando todos os objetos e pertences nas mochilas _ Estamos ficando sem tempo. Ainda precisamos terminar de contornar a montanha até a trilha de descida.

Não mais que 15 minutos depois, os rapazes estavam de volta à estreita trilha que levava à reserva dos Yanktons.

O ar estava gelado e a respiração se condensava diante do rosto, a cada passo.

Pedras salientes e raízes expostas serviam de apoio pelo caminho. Escorregar no terreno úmido não era uma boa opção.

Depois de uma hora sob uma chuva fina que os ensopava até os ossos, estavam mais próximos do planalto que os levaria à estrada, onde tinham deixado o Impala estacionado.

O vento começou a soprar com mais força.

Mal conseguiam manter os olhos abertos devido às rajadas geladas de chuva fina que açoitavam a pele.

A névoa baixa escondia as armadilhas do solo.

Dean não percebeu o desnível no chão e perdeu, momentaneamente, o equilíbrio. Procurou, em vão, algo em que pudesse se agarrar, mas a sensação de estar caindo invadia sua mente. Estava caindo e não teve tempo sequer de gritar por socorro. O som ficou preso, entalado, no meio da garganta.

_ Dean! – Sam agarrou a mão do irmão, ainda suspensa no ar e segurou firme, com toda força de que era capaz.

Samuel desceu o corpo, quase deitando-se no pequeno espaço rochoso por onde antes, caminhavam. Precisava sustentar o peso do irmão. Não poderia deixá-lo cair. Seu braço estava tencionado ao máximo, tremendo, mediante o esforço para manter seus dedos atados ao pulso de Dean, enquanto a mão esquerda segurava nas raízes mais grossas, dando-lhe alguma firmeza.

O terreno estava extremamente úmido e escorregadio. Pedaços de rochas e lama se desprendiam a cada tentativa do mais velho de fincar as botas numa protuberância para conseguir apoio. Abaixo dos pés do caçador, a montanha entrava num declive quase vertical. Uns cinquenta metros de queda que terminavam num muro de troncos sólidos de árvores centenárias. Um pensamento funesto passou pela mente dos dois rapazes. Era claro que, sobrevivendo à queda, o choque com as árvores custaria ao irmão mais velho de Samuel um bom par de ossos quebrados.

_ Ei, Sammy, você está seguro aí?

_ Estou bem, Dean. Só não larga a minha mão.

_ Parece que esse não é mesmo nosso dia de sorte. – Voltou os olhos para baixo e sentiu a cabeça girar. Dean nunca fora muito fã de altura _ Está um bocado escorregadio aqui.

_ Dean, consegue mexer o outro braço?

_ Acho que sim. No que está pensando?

_ Veja se consegue soltar a mochila. Não vou conseguir segurar todo esse peso por muito tempo, cara.

_ Estou soltando, Sam – Dean pressionou a fivela, liberando a alça do lado esquerdo _ Oh, merda!

_ Vamos lá, vamos lá! – A fivela da outra alça não abria e Sam podia sentir o terreno começar a ceder sob seu corpo.

_ Não dá! Essa porra está emperrada!- Um tanto de lama e pedras desceu, rolando por cima do rapaz _ Vai desmoronar, Sam. Me solta e volta pras rochas!

_ Nem pensar! Eu não vou te largar!

_ Anda, Sam! – A chuva estava apertando _Faz o que estou mandando ou cairemos os dois!

_ Então vamos cair os dois.

_ Seu idiota!!! – Dean soltou a mão do irmão _ Larga, Sam! Agora!!!

_ Você está maluco???

Antes que qualquer um dos dois pudesse esboçar uma reação, o terreno cedeu, num rio de lama morro abaixo.

O caçula sentiu o pulso do irmão escapar-lhe das mãos. O terror de ver Dean escorregar, sendo dragado por uma onda lamacenta, passava diante de seus olhos em câmera lenta. Por sorte, Sam estava ainda seguro às raízes. Seus olhos saltavam-lhe das órbitas. A boca seca, não permitia quem som algum saísse por ela. Esticou o quanto pôde, o braço livre, na tentativa infantil de alcançar o outro. Estava paralisado. Aterrorizado. Uma onda de dor e medo invadiu o coração do jovem Samuel. Já não mais ouvia a voz do irmão.

***

O mais velho começou a escorregar devagar. A todo custo, tentava firmar mãos e pernas em algum lugar, em vão. A terra pesada, molhada e repleta de pequenas pedras e restos de vegetação açoitavam seu corpo. Ergueu a cabeça o quanto pôde e, a última coisa que viu, foi seu irmão mais novo agarrado às raízes que saíam das frestas de uma rocha, encravada no meio do declive.

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Sam escorregou por uns três ou quatro metros à direita de onde Dean caíra. Sentiu seus joelhos baterem na saliência e segurou firme na rocha. Enroscou a mão direita nas raízes e rezou para ter força suficiente para sustentar o peso de seu próprio corpo. Precisava manter-se a salvo. Precisava continuar vivo e inteiro para resgatar seu irmão.

Se alguém poderia sobreviver a toda aquela loucura, esse alguém era Dean e esse pensamento era o que mantinha a sanidade do mais jovem. Era o que fazia crescer dentro de seu peito, a determinação em sobreviver. Era a sua vez de ser forte. Sua vez de ser heróico e fazer o que fosse necessário para salvar a vida de seu irmão.

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Ele ainda estava caindo. Podia sentir, apesar de estar totalmente envolvido por toda aquela lama gelada. Estava começando a ter dificuldade para respirar. Dor. Uma dor forte se seguiu ao baque surdo. Seu corpo tinha sido atirado contra alguma coisa. Um bom bocado de terra passou por ele e, graças a Deus, seus braços ficaram estendidos para um lado e as pernas para o outro. O tórax absorveu todo o impacto, impedindo que continuasse descendo. Parecia uma árvore. Ainda não conseguia ver nada. Seu rosto estava coberto de lama e suas narinas estavam sendo invadidas de forma assustadora.

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Muitos metros acima, Sam lutava para manter-se equilibrado. A rocha estava se tornando perigosamente escorregadia. Era urgente sair dali para um terreno mais firme. Não poderia socorrer Dean se acabasse soterrado também. Voltou o rosto para o outro lado, o oposto ao sentido em que haviam caído, e varreu o espaço com o olhar. Nenhum sinal de Dean. Nenhum movimento, exceto pela terra que ainda se acomodava em alguns pontos.

O jovem Winchester puxou o ar com força, focalizando o objetivo: Salvar sua pele para resgatar o irmão. Fincou a ponta da bota direita numa pequena rocha e empurrou o corpo para cima, em direção ao que sobrara da trilha pedregosa. A distância entre um ponto e outro não era grande, mas dadas as circunstâncias, parecia o fim do mundo.

Longos minutos de esforço e tensão foram gastos no pequeno percurso até a segurança.

Deitado sobre a rocha sólida, o rapaz suplicava por oxigênio e alguns momentos de descanso. Seu peito arfava descompassadamente e suas mão doíam. Deixou os braços caírem ao longo do corpo, inerte.

A chuva fina ainda caía e uma névoa densa cobria todo o solo e parte da vegetação, como uma colcha de algodão. Um tapete branco que se estendia por centenas de metros.

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Umidade e frio.

Escuridão.

Abrir os olhos nunca fora difícil para ele, nem mesmo depois de uma ressaca. Algo estava muito errado, porque Dean simplesmente não conseguia abrir seus olhos. Forçava as pálpebras, mas elas estavam pesadas, endurecidas, como se uma parede quisesse impedir que o mais velho dos Winchester tomasse contato com o mundo exterior.

Respirar também era um problema. Havia muita pressão nas costas e no peito. Sua cabeça estava meio enterrada, podia sentir. Estava confuso. Sentia dor e uma dormência esquisita. Tudo estava muito confuso e aquela falta de ar o estava enlouquecendo. Estava decido a não morrer sufocado debaixo da terra. Era um caçador. Morreria como um homem, de pé. Não soterrado numa montanha gelada, vencido por um monte de lama. De jeito nenhum.

Num esforço sobre humano, Dean conseguiu forçar a cabeça para fora, o suficiente para expirar com força, liberando as narinas e apanhando o ar. Ar fresco. Ar puro, entrando em seus pulmões.

Estava agradecido por respirar novamente,mesmo que ainda com certa dificuldade.

Queria voltar-se e verificar se Sam estava bem, se tinha conseguido escapar do deslizamento, mas seu corpo não obedecia. Seus membros estavam imobilizados sob o solo. Mal podia sustentar a cabeça do lado de fora.

Sentiu uma onda fria percorrer todo o seu corpo. Forçou as pálpebras novamente, repetidas vezes, permitindo que seus olhos percebessem a luz.

Conforme o terreno se acomodava, crescia a pressão exercida sobre o corpo do rapaz, dificultando-lhe a respiração e o pouco oxigênio em seus pulmões, começava a apresentar seus efeitos. Pequenos pontos negros surgiram diante de seus olhos. A luta contra a inconsciência era desleal.

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Sam foi trazido de volta à realidade, de seu breve descanso, pelas gotas geladas que teimavam em cair do céu. "Merda!" Estava perdendo tempo. Não havia tempo para descanso. Empurrou o corpo para cima, com a ajuda dos cotovelos e, de pé, avaliou a situação.

A descida era muito íngreme e, naquele ponto em especial, não existiam árvores nas quais pudesse se apoiar. A saída seria arriscar-se por entre as rochas que apareciam aqui e ali.

Samuel laminou os olhos, buscando sinais de seu irmão, mas a névoa não estava facilitando em nada sua busca. Muito pelo contrário. Então, traçou uma linha imaginária do ponto onde estava e onde Dean começara a cair. Com muita sorte, seu irmão teria rolado morro abaixo em linha reta.

O rapaz moreno iniciou a descida, calcando os pés no terreno mais firme e agarrando-se ao que estivesse à mão. Vez por outra, gritava a plenos pulmões o nome do mais velho. Tudo bem que era querer demais que, depois de tudo aquilo, Dean ainda tivesse forças para responder, se estivesse vivo, mas por Deus, isso era tudo o que Sam mais queria. Era a esperança de encontrá-lo com vida que o movia. A esperança, a última que morre, mesmo naquela família.

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Dezenas de metros abaixo, Dean forçou-se a abrir os olhos mais uma vez. Suas pálpebras pesavam uma tonelada. Tinha certeza de que tinha ouvido uma voz : a voz de Sam.

Aquela chuva fina lavava a lama de seu rosto.

Concentrou toda a sua atenção nos sons ao redor.

Ah, ele sabia! Lá estava outra vez. Alguém gritando seu nome. Aquela voz inconfundível se aproximava. A voz que enchia seu coração de esperança e felicidade. Sam estava vivo. Vivo e vindo resgatá-lo. Só precisava aguentar e esperar. Continuaria lutando e esperando, porque Sam estava a caminho.

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O terreno instável dificultava a descida.

A cada passo, mais um grito,na esperança de que Dean o ouvisse e pudesse responder, guiando-o ao seu encontro.

O frio cortava sua carne, atravessando as roupas e os longos cabelos ensopados, grudavam-lhe na testa.

Gritou novamente.

Ainda não conseguia enxergar um palmo à frente do nariz por causa do nevoeiro. Nunca tinha visto um nevoeiro tão forte em meio à chuva.

Continuou descendo devagar, com atenção redobrada a qualquer som ou movimento.

O ar gelado invadia-lhe os pulmões, causando desconforto. Os olhos ardiam. Estava cansado. Muito. Mas não era hora de pensar no quanto seu corpo necessitava de calor. Precisava sim, concentrar-se no mais importante. Dean jamais desistiria de procurá-lo e não seria ele,Sam, que deixaria seu irmão desamparado.

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A voz de Sam estava muito próxima. Tão próxima que Dean poderia jurar que, a qualquer momento, seu irmão acabaria pisando em sua cabeça.

Estava confuso, cansado e congelado.

Ouviu mais um grito. Claro. Alto e forte.

Precisava reunir as últimas gotas de energia para alertar Sam de sua presença. Alertá-lo para sua localização. Era sua única chance.

Sentiu a pressão aumentar sobre suas costas e ouviu o som de algo afundando na lama, seguido por mais um grito.

_ S...Sa...Sam... – Usou até o último suspiro para elevar a voz além de um sussurro.

_ Dean? – Sam acreditou ter ouvido a voz do irmão mais velho _ Dean, você está aqui? Onde você está? – Parou e escutou.

_ A... aq... aqui...- Estava ferrado. Total e completamente ferrado. Não tinha mais voz. Agora era rezar para que Sam tivesse percebido a direção do som em meio à toda aquela neblina.

Sam apoiou-se num tronco e apurou, mais uma vez a audição. Sua bota esbarrou em algo junto ao solo e ouviu, claramente, um gemido, fazendo-o abaixar-se e reparar no que estava ali.

_ Oh, meu Deus... – O rapaz caiu sobre os joelhos, rente ao rosto do irmão e passou-lhe a mão pela face, retirando o restante da lama _ Você está bem? – Certo, era uma pergunta retórica para um sujeito que estava enterrado até o pescoço, mas não houve como evitar _ Meu Deus... Meu Deus, Dean... – Levou a mão até a artéria, no pescoço do mais velho e, só então, expirou aliviado ao verificar a pulsação _ Graças a Deus, cara, você ainda está vivo. Vou te tirar daí, está bem? Tenha calma. Só não morra, okay? Aguenta só mais um pouquinho.

Cavar com as próprias mãos não era algo a que Sam Winchester estivesse acostumado, mas elas eram a única ferramenta de que dispunha para salvar a vida de seu irmão. Então, não reclamaria. Apenas fez o que deveria e começou a cavar o mais rápido que podia ao redor do corpo de Dean.

A chuva diminuíra, o que era um alívio, mas o nevoeiro não dava trégua.

Sam nunca pensou que seria capaz de sentir calor naquela geladeira a céu aberto, mas a adrenalina corria por suas veias intensamente, enquanto cavava. O suor começara a correr por seu rosto.

Os braços e o tronco do mais velho estavam livres.

Apesar de não conseguir concatenar bem os pensamentos, momentos de lucidez se pronunciavam, permitindo-lhe acompanhar a ação do caçula. Sentiu um par de mãos puxarem seus braços e seu corpo deslizou para fora da terra molhada. O oxigênio invadiu seus pulmões, num sopro de vida. Era muito bom poder respirar novamente. Alguém estava dizendo alguma coisa. Tinha certeza de que era a voz de Sam, mas daí a compreender o sentido das palavras, ia uma enorme distância. Sentiu as pernas livres. Livres e dormentes. Um formigamento subiu-lhe até o meio das costas. Alguém continuava falando com ele lá fora. Estava sendo arrastado, podia sentir. Queria poder abrir os malditos olhos e levantar-se dali, mas quem disse que seu corpo obedecia aos comandos do cérebro?

Sam puxou com toda força e, literalmente, arrancou Dean de dentro da terra. Arrastou-o por alguns metros para um conjunto de árvores próximo, que pôde perceber num breve momento em que o nevoeiro se abriu.

A casca grossa de uma árvore centenária amparou os corpos cansados dos irmãos.

Sam deixou-se escorregar até o chão, recostado no tronco áspero, mantendo Dean de encontro a seu peito. O ar passou doendo por sua garganta e ficou um pouco mais dentro dos pulmões, até que expirou. Limpou o mostrador do relógio e resmungou, contrariado, ao verificar que quase a metade do dia já tinha passado. Perdera muito tempo na descida e na busca. Ambos precisavam de calor e cuidados. Suas mãos estavam congelando. Seus dedos, esfolados, sangravam e ardiam terrivelmente, mas o pior de tudo era a expressão vazia no rosto de seu irmão, a palidez e o movimento quase imperceptível da sua respiração.

Apesar da estiagem, a temperatura caíra bastante. Pequenos cristais de gelo começavam a se formar sobre a vegetação.

Os olhos de Samuel pesaram, revelando o quanto seu corpo necessitava de um instante de repouso, mas antes que a exaustão o vencesse, um alarme soou dentro do cérebroi do rapaz, fazendo-o despertar. Era urgente tirar Dean daquele lugar e aquecê-lo antes que entrasse em hipotermia profunda. Se seu irmão estivesse consciente, tudo seria mais fácil. Ambos sairiam daquele inferno congelado com facilidade, mas esse não era o caso. Sam precisava lidar com os fatos, pensar rápido e agir mais rapidamente ainda.

Ainda sentado, analisou o espaço ao redor. A névoa começava a se dissipar. Continuava sem muitas opções. Se ao menos tivesse a mochila,mas ela tinha ficado lá no alto, com o facão, os cobertores térmicos, a comida e a droga do kit de primeiros socorros. Beleza. Não era muito longe, mas subir até onde a deixara em meio a toda aquela lama estava fora de cogitação. Perderia um tempo precioso e, talvez, nem pudesse encontrá-la. Melhor seria colocar seu irmão sobre as costas e descer, em direção à estrada. Com sorte, mas muita sorte mesmo, não estariam tão longe. Pensou que Dean não hesitaria em carregá-lo até onde fosse necessário, sobre os próprios ombros para mantê-lo a salvo, então, era o que faria também. Era a sua vez de salvar a pele de seu irmão, só para variar.

Apesar de mais baixo, Dean não era exatamente o cara mais leve do mundo, principalmente com as roupas encharcadas e cobertas de lama e certamente, depois dessa demonstração de heroísmo, Sam precisaria de uma boa dose de analgésicos e relaxantes musculares.

Segurando firmemente as pernas do mais velho, que tinha o corpo dobrado sobre seu ombro esquerdo, Samuel continuou descendo a montanha lenta e cuidadosamente, usando os troncos mais próximos como apoio. Estava ficando cansado demais.

Quando o nevoeiro se dissipou por completo, o coração do jovem Winchester se encolheu todo dentro do peito, feito um camundongo acuado. Viu que ainda havia uma distância enorme a percorrer até o sopé da montanha, onde tinham deixado o Impala e suas pernas tremiam, em espasmos musculares. Não poderia continuar com aquilo por muito tempo.

Mais adiante, Sam acomodou o irmão junto a um arbusto e sentou-se ao lado dele, recuperando o fôlego. O que não daria por uma maca ou por uma faca afiada com que pudesse improvisar uma com galhos e tiras de tecido. Sentia que não conseguiria prosseguir com a carga que carregava.

_ Dean? – tocou o rosto do mais velho, na tentativa de despertá-lo _ Cara, está me ouvindo? – Sacudiu-o um pouco mais forte _ Vamos lá, irmão. Precisa me ajudar. Não vou conseguir fazer isso sozinho- Um movimento. Um mínimo movimento do outro, o animou _ É isso aí, mano velho! Vamos lá! Você consegue, vamos.

O caçador era perfeitamente capaz de ouvir a voz suplicante de seu irmão caçula, mas abrir completamente os olhos e firmar a visão não era tarefa das mais fáceis naquele momento. Havia um véu diante de seus olhos que, por mais que piscasse, teimava em permanecer ali. Estava tudo muito nublado, muito confuso.

_ Sammy? – a voz saiu arrastada, em fragmentos, quase inaudível.

_ Estou aqui, Dean. – Ouvi-lo pronunciar seu nome era um alívio _ Como você está?

_ Ó...óti...mo... – tossiu, fazendo uma careta de dor – Como se fosse... atropelado... – o esforço para falar o deixava meio tonto.

_ E você foi, mano- Sam sorriu, exibindo as covinhas _ Mas vai ficar tudo bem. Nós vamos sair dessa. Sempre saímos, não é? Você só precisa me ajudar. Acha que pode ficar de pé?

_ Eu... Eu não... sei...- Ainda estava atordoado e com a visão embaralhada, mas se Sam precisava de sua ajuda, se poria de pé, de qualquer jeito _ Acho... que... sim... – puxou o corpo mais para cima e ergueu a mão _ Me ajuda... a levan...tar...

_Certo – segurou firme no antebraço de Dean, servindo-lhe de alavanca _ Vá com calma. Deixe que eu faça força.

_ Tá... – Dean firmou o pé esquerdo no chão e impulsionou o corpo. Quando o irmão o trouxe para cima, sua cabeça deu voltas e o mundo inteiro girou também, mas o mais moço não o deixou cair.

_ E então? – Samuel esperou que Dean recobrasse o equilíbrio _ Melhor?

_ Vamos. – Não havia muita força na voz do irmão, mas uma determinação toda dele.

Retomaram o caminho de descida a passos lentos.

Sam amparava o irmão, sustentando boa parte de seu peso, enquanto Dean fazia o seu melhor para suportar as dores que irradiavam das pernas até a altura das costelas. Cada passo parecia uma estocada.

O caçula percebeu as expressões que se desenhavam no rosto do outro e os gemidos abafados que escapavam vez por outra de sua boca, por um movimento mais brusco.

A preocupação tomava conta de Samuel. Não era do feitio de seu irmão demonstrar sua dor. Muito pelo contrário. Dean seria capaz de correr uma maratona, sangrando, caso fosse necessário, sem dizer uma palavra. E o que o rapaz via, diante de seus olhos, era um rosto azulado, com rachaduras nos lábios, de um homem que já tinha passado de seu limite.

_ Só mais um pouco, Dean. Só mais um pouquinho e ficaremos bem.

_ Sammy...- Tossiu, novamente, manchando a camisa com respingos vermelhos _ Eu... não... sei... se....

Dean perdeu a consciência, mais uma vez, desabando de encontro ao chão.

Sam não conseguiu contê-lo. Estava exausto. Deixou-se dobrar sobre os joelhos e, com as mãos espalmadas sobre o chão gelado, esperou que sua cabeça parasse de girar. Estava totalmente batido. Não conseguia se mover. Não conseguia pensar com clareza. Um líquido amargo subiu-lhe pela garganta e não conseguiu segurar aquela vontade incontrolável de chorar.

A luz do dia começava a escassear, assim como a esperança de sobreviverem àquele pesadelo.

CONTINUA...

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Nota(3): Quanto à questão levantada pela nanafics sobre a mochila de Dean, ela deve ter ficado perdida no meio do lamaçal durante a queda. Na minha cabeça, nem pensei que esse fato pudesse ser importante, mas é. Eles estão, literalmente, num mato sem cachorro.

Sem beta, essas coisas acontecem e pequenos detalhes acabam passando despercebidos.

Valeu, nana, pelo toque!

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