Super Drive
Avisos:- Heero Pov , AU, tentativa de humor (como sempre "), Fluflly, Sap, Presença de Baterias, Baixos, Guitarras e todas essas coisas boas
Casais:- futuramente, 12, possível 34 (mas não vou garantir)
Spoilers:- Nada! Esse fic é spoiler-free.
Disclaimer:- Ontem, eu e Duo fomos a uma loja de guitarras para testar os equipamentos. Nos empolgamos com algumas delas e no final de nosso pequeno show, quebramos nossos instrumentos como autênticos roqueiros que somos. Mas as guitarras não eram nossas, e eram muito caras...$$, tão caras que eu tive que vender meus direitos autorais para poder pagar o estrago ...portanto, por mais que eu tenha me divertido, eu ainda não sou dona dos Garotos Gundam e nem nada relacionado sobre a série. Isso aqui é um trabalho de ficção sem fins lucrativos (infelizmente TT)
Quanto ao fic:- Ok, antes que alguém fique confuso, vamos a umas poucas informações que vem muito a calhar. Isso NÃO é uma songfic. Pronto, isso já ajuda bastante. Quem conhece o meu estilo de escrita sabe que eu utilizo as músicas apenas e tão somente como base para nomes dos fics, e também como meu esqueleto pessoal que pode ou não (como muitos de vocês já puderam notar) ser coerente com o conteúdo do capítulo. Eu sempre uso um parágrafo da música logo no inicio da fic, e esse padrão repete-se aqui. A diferença que ira apresentar-se nesse fic em particular, é que em muitos capítulos letras de OUTRAS músicas irão aparecer no meio da trama. Não se engane, nenhuma dessas será a musica que nomeia o fic. Essas outras musicas são parte IMPORTANTE da trama, razão pela qual eu estarei colocando a tradução delas no pé de página dos respectivos capítulos nos quais elas aparecerem.
Acredito que isso deixe a questão esclarecida.
Em mais uma pequena nota, eu estarei usando a versão traduzida da música "Super Drive" nos trechos que utilizo no início da fic, simplesmente por que eu sei que muito mais gente é capaz de entender inglês, do que japonês (língua original da música). Ufa! " já chega né?
...e é claro que a música "Super Drive" não me pertence TT
Agradecimentos a Lien Li por ser uma beta na velocidade da luz e pelos ótimos comentários
"Without noticing a thing,
we casually bumped into one other
Drawing closer to gentleness with each other,
the hide-and-seek goes on
that's right"
Fazer parte de uma banda não é particularmente fácil. Claro que pode parecer fácil, quando se tem um pequeno grupo, que une-se periodicamente em uma garagem qualquer, para fazer covers manjados de músicas da moda, e que uma vez ou outra, toca em um bar para um bando de amigos.
Porém, quando existem gravadoras, contratos, empresários e muito dinheiro envolvidos na equação, a coisa muda completamente de figura.
E quando sua banda – depois de anos de trabalho duro, cumprindo o papel do grupo de garagem por tempo o suficiente para finalmente conseguir um contrato – repentinamente vê-se sem um vocalista... esse é o momento em que você percebe o quão realmente complicado é fazer música para a indústria, ao invés da sua roda seleta de amigos.
Mas eu devo explicações antes de apresentar todo o problema que nos assombrava no momento, afinal, as dimensões de dito problema, eram muito maiores, uma vez que se levasse em consideração, todos os fatos que nos colocaram na estrada pela qual corríamos agora.
Em meu aniversário de quinze anos, fui presenteado com um dos mais inesperados objetos, partindo de uma das mais inesperadas pessoas. Minha mãe me deu uma guitarra. Ser presenteado por minha mãe não era a parte estranha daquela situação, mas sim, o fato de que o presente era nada mais nada menos do que uma guitarra. Um instrumento musical. Algo pelo qual eu não havia jamais demonstrado qualquer interesse.
Minha mãe explicou-me que aquela guitarra havia pertencido a meu pai, e esse fato sozinho, despertou minha atenção subitamente para o equipamento.
Meu pai havia morrido em um acidente de carro quando eu possuía apenas quatro anos de idade, e sendo que eu era muito jovem, mal conseguia me lembrar dos momentos que havíamos dividido juntos, e mesmo sua face era apenas uma lembrança vaga em minha mente. Portanto, todo e qualquer pedaço de informação que eu sentisse que fosse capaz de me aproximar a memória de meu pai, era agarrado por mim com as duas mãos.
Naquele dia, eu vim a descobrir que papai fazia parte de uma banda, e que, durante o período da gravação de seu disco, ele conhecera minha mãe. Mamãe trabalhava como médica, e estava apenas de passagem pela cidade, prestando serviços voluntários a um hospital das proximidades do estúdio aonde ele gravava.
Eles conheceram-se através de um acidente envolvendo duas pessoas correndo sem prestar atenção, e uma embaraçosa quantidade de café manchando o jaleco impecavelmente branco de minha mãe. E, apesar da desastrosa primeira impressão, e de um primeiro encontro forçado pela obrigatoriedade da compra de um novo uniforme, por insistência de meu pai, os encontros que se seguiram a este acabaram por tornar-se muito mais agradáveis, e depois, muito mais freqüentes.
Em questão de poucos meses, eles haviam tornado-se um casal inseparável, e quando minha mãe soube que teria de retornar a sua cidade natal, para voltar a trabalhar para o hospital do qual ela era oficialmente contratada, meu pai simplesmente acompanhou-a, deixando atrás de si o sonho da música, fama e sucesso, e vislumbrando a sua frente, um futuro ao lado da pessoa que ele amava, este, parecendo-lhe a escolha mais lógica a seu coração.
Pouco tempo depois, eles casaram-se, e cerca de um ano mais tarde eu nasci.
Mamãe afirmou que papai jamais havia deixado de amar a música, apesar de ter abandonado o grupo, e que muitas vezes, ela havia sentido ciúme daquela guitarra, por saber que aquela era provavelmente a segunda paixão da vida do homem que ela amava.
Porém, o que assegurava seu coração, era a certeza de que a primeira paixão da vida dele era ela. Ela e eu, as duas coisas mais importantes da vida de meu pai.
Mamãe me contou que desde aqueles tempos ele dizia ter intenções de, um dia, me ensinar a tocar guitarra, para que no futuro eu pudesse realizar o sonho dele, aquele que ele tinha abandonado pela família, aquele que, sem qualquer tipo de arrependimento ou mágoa, ainda ocupava um espaço em seu coração, um espaço confortavelmente abrigado na certeza de que um dia, pelas mãos de seu filho, aquele sonho tornaria-se realidade.
A emoção nas palavras e no gesto de minha mãe despertaram em mim o início de um sentimento que cresceu com uma velocidade impressionante. Inicialmente, tudo o que senti pelo instrumento que agora podia chamar de meu, era uma enorme fascinação. Aquela guitarra havia pertencido a meu pai, e além disso, era um equipamento de qualidade superior – coisa que até mesmo um leigo como eu podia notar, apenas de olhar para ela – mas, mesmo naquela primeira noite, que passei apenas a estudar meu presente, pensando exatamente o que viria a fazer com ele, a resposta já estava clara em minha mente.
Eu realizaria o sonho de meu pai.
E foi esse sentimento que fez com que, em poucos meses, eu descobrisse uma avassaladora paixão pela música. Uma paixão que eu jamais tinha sentido em toda a vida, um amor que eu provavelmente jamais viria a sentir por mais nada que viesse a cruzar meu caminho.
Mamãe me matriculou em uma das melhores escolas de música da cidade, e o professor lhe chamou em poucas semanas, fascinado com a facilidade com a qual eu havia dominado os primeiros passos do aprendizado do instrumento. Assim, não muito tempo depois, troquei de turma, sendo passado diretamente para a seleta sala de estudantes avançados.
Foi aonde conheci Trowa Barton. Trowa era um estudante de baixo, e falava muito pouco, menos ainda do que eu. Sempre me considerei uma pessoa econômica em termos de vocabulário, mas Trowa conseguia ser ainda mais silencioso do que eu. Claro, isso não apresentava nenhum problema para ele, porque todas as vezes em que ele começava a tocar para o público, o local abruptamente tornava-se silencioso.
Ele possuía esse poder quase mágico de encher uma sala unicamente com o som que tirava de seu instrumento, preenchendo todos os espaços, dentro e fora das mentes daqueles que tinham o privilégio de ouvi-lo tocando. Apesar disso, raras eram as ocasiões em que podíamos todos aproveitar o talento dele, já que ele era realmente reservado, mesmo quanto a sua óbvia habilidade extraordinária.
Foi essa capacidade incrível de Trowa que me atraiu a ele primeiramente, e, como que testando territórios antes de cair de cabeça no que poderia ser um grande erro, aproximei-me dele, aproveitando-me do ambiente em que nos encontrávamos para tentar descobrir um pouco mais da maneira como ele conseguia fazer com que seu instrumento parecesse parte integrante dele mesmo.
Para minha surpresa, meu esforço na direção de uma amizade foi muito bem recebido por Trowa e, em poucos meses de convivência contínua – uma vez que as aulas da turma avançada davam-se quatro vezes por semana – tornamo-nos bons amigos. Posso dizer hoje, que algumas técnicas das quais me orgulho imensamente de ter desenvolvido, tiveram uma colaboração gigantesca da parte dele, de todas as dicas, e da enorme quantidade de apoio e confiança que ele dedicava a mim, e que eu lhe oferecia igualmente em troca.
Depois de cerca de dois anos na escola, eu percebi que aquele lugar já não tinha nada mais a oferecer a minha formação. E assim, com o apoio de mamãe e a companhia de Trowa na mesma jornada, fizemos os testes para entrar no conservatório da cidade. Com as recomendações que possuíamos e nossas habilidades, esta acabou por provar-se uma tarefa surpreendentemente simples.
Ambos conquistamos nossa entrada em dezembro, e no início do ano seguinte começamos as aulas no enorme prédio do instituto.
Foi lá que conhecemos Quatre. Quatre era um estudante de piano clássico, e já estava na instituição a cerca de dois anos. Ele era um aluno de certa forma diferente. Diferente, porque não participava dos treinos e das aulas com os outros estudantes. Ele fazia seus próprios horários de aula, e isso parecia incomodar os outros alunos. Um pequeno mistério rondava a sua entrada no local, sendo que muitos diziam que ele havia conseguido sua posição graças a contribuições de sua rica família para o instituto, mas todos esses boatos eram puramente especulações sem fundamento real.
Trowa e eu, apesar de não dar atenção para toda a comoção em volta do garoto loiro, não podíamos ignorar também uma certa vontade de descobrir o mistério a respeito de seus horários especiais de aula. Mas o que sentíamos era puramente curiosidade.
Porém, depois de dois meses de nossa entrada, um acidente nos levou a descobrir exatamente a razão pela qual Quatre possuía o privilégio de estudar nas horas que bem entendesse. Uma noite, tendo esquecido uma de suas partituras em sala, Trowa pediu que eu o acompanhasse até o instituto durante a noite. Os alunos tinham autorização para entrar nos territórios da escola em qualquer hora antes das nove da noite, e apesar de estarmos próximos a esse horário, nossa visita seria muito breve.
Nesse fatídico dia, tivemos a oportunidade de - após entrar na sala sem qualquer aviso para pegar a partitura esquecida - pela primeira vez, ouvir Quatre fazendo o que ele certamente sabia fazer de melhor: tocar piano. Suas mãos praticamente sobrevoavam as teclas como que por vontade própria, e o som produzido era uma explosão incrível de energia misturado com canção. Uma verdadeira experiência.
Trowa e eu nos entreolhamos diante da cena diante de nós. O garoto loiro tocava com os olhos fechados, parecendo estar sendo possuído pela música. Sem que disséssemos uma palavra sequer um ao outro, soubemos naquele exato momento o porque de Quatre ter aulas separadamente dos outros alunos de piano. Uma das explicações era que ele provavelmente envergonharia a todos com seu talento. Outra delas era que ninguém conseguiria tocar qualquer outra coisa diante da melodia que saia de seus dedos como a coisa mais natural do mundo.
Após muitos minutos de nossa observação inicialmente involuntária, Quatre pareceu finalmente perceber a presença de intrusos em sua sessão particular . Quando ele abriu seus olhos azuis e os virou em nossa direção, eu pensei que seriamos expulsos imediatamente daquela sala e – caso os boatos estivessem corretos – também do instituto.
Mas então ele fez a coisa mais inesperada possível. Ele sorriu. E a expressão era tão aberta e honesta que me vi instintivamente lançando-lhe um pequeno sorriso de volta, e em seguida, notei pelo canto de meus olhos que Trowa fazia o mesmo ao meu lado. Naquele momento eu soube que nós três nos tornaríamos grandes amigos, e os meses que se seguiram provaram que eu estivera certo.
Depois de um ano de estudo no instituto, mudei-me junto a Trowa para um apartamento nas proximidades da escola. Eu sentia muito ter de abandonar o lar que eu e mamãe havíamos dividido desde que me conhecia por um ser humano, mas eu já possuía dezoito anos, e além da facilidade que meu novo lar me oferecia para que eu estudasse, eu sabia que minha mãe apoiava a minha decisão de tentar me soltar dela. Minha vontade de, mesmo que devagar, tentar construir uma vida que fosse somente minha.
Pouco tempo depois da mudança, Trowa e eu passamos a tocar em um dos quartos de nosso apartamento. Escolhemos o maior dos cômodos para transformar em um mini-estúdio com os equipamentos que nos fossem necessários, enquanto dividíamos o outro quarto para dormir.
Quatre ocasionalmente juntava-se para tocar conosco em nossa casa, e depois de obtermos resultados satisfatoriamente agradáveis, nossos encontros em trio tornaram-se uma constante.
Um dia, durante um de nossos ensaios, encontrei-me estranhamente atraído por um som que era completamente adverso ao que produzíamos dentro da sala. Era um som um pouco mais baixo, mas muito poderoso, e percebi que ele acompanhava o ritmo exato daquilo que estávamos tocando. Ignorei a sensação, chegando a conclusão que aquele som existia apenas e tão somente em minha cabeça.
Duas semanas depois porém, eu pensei que se aquilo existia apenas em minha cabeça, então eu precisava urgentemente de tratamento, porque não era possível que minha mente estivesse conjurando acompanhamentos perfeitos de bateria para absolutamente tudo aquilo que tocávamos. Eu não tocava bateria, eu tocava guitarra. Eu não sabia sequer segurar em um par de baquetas. Seria eu, algum tipo de gênio musical sem ter conhecimento disso?
A confusão diante daquilo me irritou, fazendo com que eu parasse de tocar imediatamente. Meus dois amigos pararam logo em seguida, curiosos quanto aos meus motivos para ter parado daquela forma. E o fato de que o som da bateria parou um segundo depois dos dedos de Quatre deixarem as teclas do piano, me deixou ainda mais confuso diante do que estava acontecendo. De onde vinha aquele som?
'O que é isso?', falei finalmente, olhando para meus amigos enquanto jogava meus braços para o alto, sinalizando o estúdio a nossa volta.
'Er...', Quatre achou uma certa quantidade de graça em minha atitude inusitada, ' eu diria que é um estúdio certo? Do contrário, por que estaríamos tocando?', ele terminou com uma pequena risada, que foi acompanhada por um sorriso da parte de Trowa.
'Não', respondi, ignorando o olhar levemente confuso que os dois me direcionavam no momento, 'não é disso que estou falando.'
'Então, do que você está falando?', perguntou Trowa.
'Eu vou te mostrar', falei, arrumando a alça de minha guitarra no ombro, pronto para começar a tocar novamente. 'Quatre', falei para chamar sua atenção, ' vamos tocar a partitura da página sete'
'Certo', ele concordou com um aceno de sua cabeça, e em seguida começou a tocar. Depois dele fazer uma breve introdução, que aproveitei para diminuir a potência do som de meu instrumento, entrei em minha deixa, e imediatamente o som de bateria entrou comigo, em compasso perfeito com a canção.
'É disso que estou falando!', conclui, continuando por mais alguns momentos, antes de parar novamente.
'Você está falando do som de bateria?', Trowa comentou.
'Sim, estou! Você notou também?', perguntei, feliz com o fato de não estar parecendo com algum tipo de louco diante da situação completamente estranha na qual estávamos naquele momento.
'Eu já notei isso há algumas semanas', ele respondeu, casualmente.
'E por que não falou nada???', perguntei, espantado com a calma dele diante daquele fato.
'Eu não pensei que fosse importante', ele falou, com ainda mais calma, abaixando a cabeça para afinar uma das cordas de seu baixo.
Às vezes a aparente indiferença de Trowa quanto a algumas coisa chegava a ser impressionante.
'Eu também notei', Quatre falou, interrompendo meus pensamentos, 'mas não comentei nada, por que pensei que...bem...sendo bem honesto com você Heero, eu pensei que eu estivesse ouvindo essa percussão dentro de minha cabeça apenas', ele terminou, parecendo levemente envergonhado da confissão.
'Eu também!', respondi, e notei o sorriso de meu amigo alargar-se diante de mais uma entre tantas similaridades que havíamos descoberto entre nós desde que havíamos nos conhecido.
'Mas...', agora foi a vez de Trowa de interromper, 'de onde exatamente vem o som?'
'Eu não sei...', respondi sinceramente, afinal, eu tinha acabado de descobrir que minha cabeça não era a responsável por aquele som, portanto, o primeiro lugar suspeito de minha lista tinha acabado de ser riscado.
'Nós podemos descobrir isso...amanh', Quatre falou, bocejando, gesto que indicava que era hora dele se retirar. 'Deixem tudo comigo, e não se preocupem, pois amanhã mesmo descobriremos isso'.
E no dia seguinte, colocamos em ação um plano para descobrir a origem da bateria que vinha nos acompanhando. Quatre alugou do instituto uma aparelhagem para gravação, nada muito grande, mas era um aparelho potente o suficiente para o que tínhamos em mente.
Tocamos uma de nossas músicas, deixando que a canção fosse gravada pelo mecanismo. Certo como o dia, a bateria entrou em ação, acompanhando nosso ritmo com a precisão de sempre.
Chegando ao fim da música, deixamos que a gravação tomasse nossos lugares na tarefa de tocar, e partimos para a missão de procurar a origem do som estranho. Notamos de cara que ele partia de fora de nossa sala, porque o som não estava reproduzido na gravação, ou seja, não era forte o suficiente para que tivesse sido captado pelo gravador.
Mas ele estava próximo. E depois de quatro repetições, finalmente percebemos que o som vinha de fora e...de baixo. Isso só podia significar que alguém estava tocando no apartamento debaixo do nosso.
Em um tipo de consenso silencioso, desligamos a aparelhagem e dirigimo-nos ao apartamento número cinco, no andar inferior, e exatamente abaixo do nosso. Tenho certeza de que nenhum dos três tinha sequer a vaga idéia do que diríamos a pessoa que possivelmente vinha ensaiando conosco por quase três semanas agora, mas isso não nos impedia.
Quatre tocou a campainha, e esperamos alguns poucos momentos até que a porta fosse amplamente aberta por um jovem chinês, sem camisa, de cabelos negros, e olhos mais negros ainda. A primeira coisa que notamos, foi a enorme bateria colocada no centro da sala principal do apartamento.
Ele simplesmente nos olhou, enquanto olhávamos dele para o instrumento, e antes que o momento desconfortável prolongasse-se, ele falou com um tom de voz levemente sarcástico, enquanto rodava uma das baquetas entre os dedos de sua mão, 'Vocês estão um pouco repetitivos hoje', ele então sorriu, 'falta de repertório?'
Quatre sorriu amplamente de volta, sendo acompanhado pelas expressões sempre mais discretas de meu rosto e do de Trowa, e desse dia em seguinte, Wufei – esse era o nome de nosso vizinho – juntou-se oficialmente aos ensaios da banda.
Tornamo-nos esse tipo de item inseparável, uma coisa difícil de explicar ou de compreender a não ser que você visse, ou sentisse o mesmo que nós.
Provavelmente formávamos um dos grupos mais visualmente diferentes, e até mesmo estranhos, de todos os tempos. Mas uma coisa maior nos unia, uma força poderosa e arrebatadora que agia como um laço invisível apertando-se cada vez mais a nossa volta. O amor pela música.
Mas havia algo mais...e eu vim descobrir o que era isso, apenas cerca de quatro meses depois da entrada de Wufei em nossas vidas, em um dos momentos mais felizes e tristes de toda a minha existência.
No espaço absurdamente curto de um mês, minha vida virou completamente de pernas para o ar. De uma forma quase mágica, fomos abordados por uma gravadora. E não era qualquer gravadora, era uma gravadora grande. Muito grande na verdade. A 'Oz Records' não era uma empresa a qual, QUALQUER artista em sã consciência viraria as costas. E assim, passada a nossa surpresa inicial diante da proposta feita por eles, eu e meus amigos caímos de cabeça no projeto que seria a maior empreitada de nossas vidas, dentro e fora da banda.
Porém, as coisas fora da banda não caminhavam tão bem para mim. Mamãe caiu muito doente, e antes mesmo que eu conseguisse amarrar minha mente envolta da idéia de que ela não viveria para sempre, ela se foi. E a partida foi tão rápida e repentina, que foi como se meu chão tivesse sido retirado de mim, e eu simplesmente me deixei cair na escuridão que se tornou meu mundo.
Diante da confusão que tomou conta de mim pela morte de minha mãe, eu me vi questionando meus motivos. Meus motivos para agir, meus motivos para viver, meus motivos para tocar. Por que eu tocaria agora? Ela não estava mais aqui para ver eu realizar o sonho perdido de meu pai. Não havia mais razão para levar aquilo adiante, já que não haveriam testemunhas.
Caí em uma depressão assustadoramente profunda, e foi nesse momento que eu descobri, da mais inesperada das formas, quais eram os VERDADEIROS laços que me ligavam a Trowa, Quatre e Wufei.
Eles me visitavam regularmente, trazendo-me novas partituras que eu me recusava a olhar, trazendo comida que eu beliscava apenas para manter-me acordado por poucas horas e tentando fazer com que eu me interessasse por qualquer coisa.
Em um dos incontáveis momentos que me vi rodeado por eles, em mais uma vã tentativa de me animar, o telefone de Quatre tocou. Notei vagamente que o assunto era provavelmente sério, por conta da expressão concentrada que ele possuía em sua face, e algumas palavras depois, descobri exatamente com quem ele estava falando. Era nosso empresário no telefone.
'Não, ele não está melhor...', ele dizia, '...não, nós não vamos deixá-lo aqui para ensaiar...', ele continuou, e eu notei que ele olhava para Trowa e Wufei em busca de confirmação do que ele estava afirmando, ao que meus dois amigos responderam com firmes acenos de suas cabeças.
'...não....não vamos deixá-lo e isso é ponto final!', ele falou, mais energicamente, e em seguida olhou seriamente para os outros dois, que seguraram seu olhar certo, com olhares igualmente confiantes. 'E não importa o que aconteça com nosso contrato...nosso amigo é nossa prioridade!', ele exclamou, antes de desligar o telefone com um movimento rápido.
A afirmação de Quatre, de alguma forma que me tirou de meu transe, e diante daquela revelação, da verdade sobre o que aquelas pessoas realmente significavam pra mim, fui tomado novamente pela inconsciência, que havia se tornado um estado normal para mim durante aqueles dias tão confusos.
Naquele dia sonhei com meu pai. Em meu devaneio, ele era apenas uma sombra, uma figura sem rosto, mas eu sabia que era ele, sem dúvida alguma, era ele. Papai me falou, em uma voz suave, para que eu não desistisse, para que eu fosse atrás do que eu queria, não importava os obstáculos que a vida colocasse em meu caminho.
Acordei horas depois, voltando a realidade com uma clareza de mente e espírito que não sentia a muito tempo.
Meus olhos cansados e desfocados pousaram sobre a guitarra apoiada sobre minha cama, e naquele momento eu soube.
Soube que não estava seguindo o sonho de meu pai e nem de ninguém. Aquela era MINHA paixão, MEU destino, MEU sonho. E nada e nem ninguém me tiraria aquilo. Aquela coisa tão preciosa que era somente da minha pessoa, e que, ao mesmo tempo, eu dividia com as pessoas mais importantes de minha vida.
No dia seguinte, eu estava de volta ao ensaios.
Todos ficaram espantados com minha súbita recuperação, mas não fui questionado por nenhum deles. Se existiam pessoas que podiam compreender minhas razões, essas pessoas eram meus companheiros de banda, meus melhores amigos.
Algum tempo depois, uma nova figura juntou-se ao grupo nos ensaios. Zechs, o vocalista, era um homem um pouco mais velho do que todos nós, loiro, com uma voz poderosa e suave ao mesmo tempo, e extremamente atraente. Ele era o aluno top das aulas de canto do instituto, que Quatre, Trowa e eu freqüentávamos, e nosso empresário, o Sr. Treize, parecia gostar muito dele.
Parecia gostar tanto, que isso veio a gerar alguns... problemas.
Apenas quatro meses depois de nossos ensaios contínuos, para que pudéssemos logo entrar em estúdio para gravar o primeiro single do cd, Zechs inesperadamente deixou a banda.
Seu relacionamento com o resto de nós, apesar de um pouco distante, comparado ao que esboçávamos um pelo outro, não era nada desagradável. Já, seu relacionamento com nosso empresário, depois de uma briga que os separou de forma bastante brusca, parecia caminhar de mal a pior.
E pior foi o que aconteceu. E ele nos deixou.
E isso nos leva a situação na qual nos encontramos nesse exato momento. A apenas dois meses da gravação de nosso primeiro single, sem a letra da música – porque Zechs, além de cantor, era o compositor das letras, e levou-as consigo – sem vocalista, e sem saída a não ser procurar por um substituto a altura o mais rápido o possível.
Como eu disse, a vida no meio musical realmente não é tão glamurosa e extraordinária quanto pode parecer a primeira vista.
E, diante da situação quase desesperadora na qual nos encontrávamos, Quatre veio com a salvação. Ou essa era sua premissa, já que eu, tinha uma idéia muito diferente da figura da salvação.
Três dias depois do sumiço de Zechs, fomos apresentados a Duo Maxwell, o possível novo vocalista da banda.
E possivelmente uma das pessoas mais estranhas de toda a face da Terra.
Duo tinha o cabelo mais longo que eu já havia visto em um ser do sexo masculino... recapitulando, em um ser qualquer, e uma atitude irritantemente alegre e ativa. O homem não andava, ele praticamente pulava, fazendo com que a longuíssima trança, que caia pelas suas costas, pulasse e balançasse de um lado para o outro.
Toda essa felicidade, todo aquele brilho sem razão aparente, me incomodava. E as primeiras três horas que passamos no mesmo cômodo – tempo que ele passou conversando com Treize a respeito de seu contrato - sem que sequer tivéssemos trocado qualquer palavra, fez com que eu sentisse que não gostasse dele.
Portanto, quando as mãos dele e de nosso empresário finalmente fecharam-se em um sinal claro de acordo, eu não pude evitar o suspiro que me escapou, diante da premissa de ter que conviver com aquela pessoa pela maior parte de meu tempo daqui para frente.
Com alguma sorte, talvez meus amigos me apoiassem na decisão de que houvesse mais pesquisa para a escolha de um novo vocalista, e toda aquela situação fosse resolvida.
Mas um momento depois de Duo virar-se para nós, eu vi minha esperança aos poucos ir por água abaixo. Quatre o cumprimentou com um longo abraço e um sorriso dos mais brilhantes. Ok, eles já se conheciam previamente, então aquele comportamento não era realmente uma surpresa.
Trowa sacudiu a mão dele, respondendo a seu comprimento sem nenhum traço de hostilidade, e finalmente Wufei, após cumprimenta-lo, pareceu levemente irritado ao ver que Duo pegara suas baquetas de cima da bateria.
Talvez ainda houvesse esperança.
'Você acha que pode com elas?', Wufei falou sarcasticamente.
'Veremos se elas podem comigo!', o outro rapaz respondeu, com um sorriso desafiador no rosto, e eu notei os olhos de Wufei brilharem com a perspectiva da competição, e com o calor do desafio.
Droga, realmente não havia esperança.
Antes que aquela figura saltitante viesse se apresentar a mim, resolvi me retirar da sala, dirigindo-me ao bebedouro. Quem sabe, quando eu voltasse, ele já tivesse desistido da idéia de se apresentar pra mim e pudéssemos pular tudo aquilo para a parte em que simplesmente nos ignoraríamos.
Foi um grande erro de minha parte. Porque quando retornei para dentro da grande sala do estúdio que havíamos alugado exclusivamente para nossos ensaios, toda a força de meu corpo junta não seria capaz de me fazer ignorar aquela pessoa. Ele estava segurando uma guitarra.
A MINHA guitarra.
Entrei na sala, e ao ver a cena dele, guitarra no colo, despreocupadamente passando sua mão pelas curvas do instrumento, fui consumido por uma onda de raiva. Quem ele pensava que era afinal?
Marchei em sua direção retirando-lhe o instrumento bruscamente, e ao mesmo tempo, chamando sua atenção para minha presença. Seus olhos chocados encontraram os meus, e tornaram-se estranhamente calmos, mesmo diante do olhar de ódio puro que eu lhe lançava no momento.
'É uma Stratocaster?[1]', ele perguntou, como se fossemos velhos conhecidos.
'É sim', respondi com meu melhor tom frio, enquanto limpava qualquer mancha que aquelas mãos possivelmente pudessem ter deixado em meu precioso instrumento de trabalho.
'Somos um pouco possessivos com ela, não?', ele respondeu, com um sorriso malicioso, e tudo que ele recebeu em troca foi um olhar ainda mais congelante da minha parte, uma indicação clara de que eu não havia apreciado o comentário.
Mesmo assim, seu sorriso permaneceu intacto em sua face, como se eu estivesse lhe oferecendo flores, ou chocolates, e não um olhar que prometia a morte.
'Eu sou Duo Maxwell, é um prazer', ele falou, esticando sua mão.
'Eu sou Heero Yuy', respondi, sem esticar minha própria mão para responder ao comprimento. Minha resposta vocal tinha sido uma reação educada automática.
Aquela situação não estava nem sequer próxima de ser um prazer pra mim.
Mas não havia nada que eu podia fazer.
E a partir daquele dia, eu teria de aprender a lidar com o inferno que seria conviver com Duo Maxwell como o novo vocalista de nossa banda, a 'Wings'.
Seria realmente uma longa estrada a percorrer.
Fim do Capitulo 1
[1] A Stratocaster, para quem não sabe (provavelmente a maioria das pessoas) é uma guitarra Fender (Ah sim, nesse fic só vão aparecer guitarras Fenders..hehehe, elas são as guitarras mais fodas do mundo /) e é também um dos modelos de guitarras mais tradicionais que existem. Eu estarei colocando uma foto no site para quem quiser vê-la.
E É L"GICO que quase todo mundo deve ter sacado exatamente de onde eu tirei a idéia para o instrumento que cada um dos Gundam Boys iria tocar nessa fic. Tirei de uma foto oficial deles (foto liiiinnnnnnnda), que vocês também poderão checar no site!
