O inverno em Asther. Não poderia haver coisa mais bonita no universo inteiro, a não ser talvez a primavera. Aquele reino, onde parecia sempre fazer sol, coberto pela neve branquíssima, que se cristalizava como um açúcar brilhante e muito doce. Cobrindo as casas, as árvores, todo o reino. Menos o palácio.
A família real é orgulhosa demais para se permitir igualar aos plebeus. Se a neve caí em toda a parte, não é digna de macular e poderoso palácio, grande e majestoso, onde moram a realeza, seus familiares e os criados. Estes, limitam-se a observar a beleza do reino do alto e segurança de seus tronos, vivendo a fantasia de que tudo é perfeito e que estão bem como estão.
Isso é pura mentira.
Se esconder atrás de um nome, de uma coroa. Onde está a honra disto? Eu não sei. Apenas fingimos que está tudo bem. Damos corda a ilusão que vai nos tragando aos poucos. Nos consumindo. Tomando todo os últimos vestígios de humanidade que ainda temos. E nós nos acomodamos.
Lembro de invejar Alan. Invejar o amor que vivia e a coragem que tinha de ir contra tudo e contra todos. Também invejei Aili, menina corajosa, encarou a poderosa rinha, mãe de meu querido irmão, apenas para poder permanecer ao lado de quem ela ama. A verdade é que até hoje eu os invejo. E indo contra meus próprios conselhos, eu também me acomodei. Hoje, quem se esconde atrás de um nome, coroa e falsos sorrisos, sou eu. Rei Jeile. Soa bem. Bem demais para meu gosto. Ao lado de noivas que não amo, mas aprecio por aparência.
Não é isso que eu quero.
Observo belas e infinitas flores desabrocharem ao meu redor. Alan, Aili, Razard... Todos crescendo, melhorando, se tornando pessoas dignas. Se tornando humanos dignos. E eu? Eu fico para trás, só observando. Não tenho coragem para acompanhá-los. Gostaria que fosse com eles. Você merece mais do que tem. Mais do que deseja.
Sei que por mais forte que seja o que sinto, eu não sou o que você quer. Deve ser uma maldição de Asther, afinal. Eu o desejo, você a deseja, e ela se diverte conosco. Por alguma razão, nunca consegui chamá-la de mãe. 'Rainha' é uma boa atribuição para aquela mulher. Ela era digna de sua coroa, seu manto e seu trono.
Eu não sou.
Me perdoe, Lei.
Saudações,
Jeile.
