It's Gonna Rain
Andando suavemente, tchau, tchau.
Mas indo logo, tchau, tchau
Esse trovão que parece um leão
Força uma pausa,
Por que?
É... Logo vai chover.
Havia um limite para tudo, até mesmo para o nível de tolerância que estava disposto a demonstrar. A coroa repousava sobre sua cabeça e junto com ela toda responsabilidade de assumir seu direito de sangue como o novo Senhor do Fogo. Havia um limite...Havia um limite até mesmo para gratidão.
A guerra havia acabado e ele estava mais do que disposto a negociar e ceder a todo tipo de estratégia política, mas...Havia certos pontos que não estavam abertos a discussão.
Queria não ter visto a cena...Queria que Mai tivesse a capacidade de desconectá-lo do restante do mundo, ou atraí-lo o bastante para que ele não tivesse visto aquele beijo, ou ao menos não ter se sentido tão severamente ofendido. Mas ele havia visto e era isso o que incomodava tanto. Não o fato do Avatar ter sentimentos por uma garota, ou tê-la beijado diante de soldados, nobres e civis dos três reinos. O que incomodava era a sensação de que seu valoroso amigo estava lhe roubando algo.
Era absurdo. Tinha plena consciência disso, mas nem sempre racionalidade condiz com a dobra do fogo. Não tinha sentimentos serenos, ou um temperamento dado a longos e metódicos pensamentos a respeito de cada ato, ao menos não quando o assunto em questão dizia respeito ao coração.
A verdade é que...A verdade é que seus olhos se ocupavam de segui-la onde quer que estivesse. Se estavam num mesmo ambiente, por mais cheio que estivesse, Zuko sabia exatamente aonde ela estaria. Sentia um prazer quase obsceno quando a via em seu treinamento, executando seus movimentos fluidos e harmoniosos como ondas sobre a superfície plácida de um lado. E acima de tudo, era aquela mania dela em discutir e contestar cada uma das atitudes dele que o atraia tanto.
O temperamento difícil, a determinação e os humores explosivos pareciam incompatíveis com a dobra de água. Ele sempre teve a errônea idéia de que tal elemento aflorava em seus mestres a perseverança, o equilíbrio, o controle emocional, mas ela desafiava tudo isso. Não era como um lago tranqüilo, ou um rio estável. Ela era o mar e depois de tanto tempo exposto e entregue ao balanço das ondas, ele suspeitava que já vinha se afogando lentamente há tempos.
Como Senhor do Fogo ele tinha sua honra. Ela pertencia a outro, enquanto ele próprio estava comprometido, mas...Aquele beijo havia mudado alguma coisa. Havia mudado tudo.
Por um tempo ele tentou ignorar a idéia de que ela não passava de uma garota. Nova de mais para atrair a atenção de alguém como ele, mas aquilo não passava de uma desculpa esfarrapada. Até Mai havia reparado que quando ele encarava a dobradora de água, seus olhos cor de âmbar queimavam numa chama dividida entre a admiração honrosa e...Desejo, puro, simples, feroz e lascivo.
Quando pensava nela sentia seu próprio mundo se consumir em chamas que fugiam ao seu controle. Vê-la era uma tortura constante. Um simples dialogo o levava às raias do descontrole e ao mesmo tempo...Um toque, um toque e ele sentia tudo a sua volta desaparecer como uma miragem e tudo o que existia era o tom sublime do azul que coloria os olhos dela.
Mai devia ter sido um obstáculo mais significante, devia ter colocado algum juízo dentro da cabeça dele e o obrigado a pensar em seus deveres ao invés de permitir a tentação se aproximasse como uma velha conhecida. Zuko agora estava dividido entre a gratidão e a raiva pela atitude dela, mas tinha que admitir que ao desmanchar o noivado, Mai havia retirado um grande peso das costas dele.
Não demorou muito para que a notícia se espalhasse e para evitar um confronto desnecessário ele e o pai dela, Mai havia assumido um romance com um nobre menor da Nação do Fogo, o que Zuko suspeitava não ser exatamente uma mentira. Não podia culpá-la por sucumbir às atenções de outro pretendente quando ele mesmo admitia que havia negligenciado a antiga noiva por tempo de mais.
O fim do noivado trouxe ao palácio um clima tenso e austero. Seus súditos se preocupavam com a necessidade de um herdeiro para o trono, enquanto seus amigos se preocupavam com os sentimentos feridos dele. Que sentimentos? Mai era uma amiga muito melhor do que ele tinha o direito de querer e foi o bom senso dela que minimizou o desastre de toda situação. Aquela foi a separação mais providencial de todas, mas todos acreditavam piamente que ele estava de coração partido. Ledo engano.
Aang parecia determinado a animá-lo, assim como Sokka, o que só servia para asseverar o peso em sua consciência todas as vezes que seus olhos cruzavam com os de Katara. A única que não se manifestava sobre o assunto era Toph. A dobradora de terra preferia deixá-lo a sós com seus problemas, mesmo que Zuko tivesse certeza de que ela era quem melhor entendia a delicadeza da situação.
Naquele contesto, o pior era receber de Katara olhares de piedade, enquanto ele tentava disfarçar seus próprios olhares de interesse dirigidos a ela.
Não bastava ter magoado Mai, desejar a garota de seu amigo, ou ter se permitido sucumbir a esse sentimento sem grande resistência...A dificuldade era óbvia. Dizia respeito à própria natureza de ambos. Ele era o Senhor do Fogo e ela uma mestra da dobra de água.
Odeio a chuva. Tchau, tchau.
Queria ficar mais um pouco, mas tchau, tchau.
No momento em que esse contentamento se tornou a dor
da partida,
O leão fez com que me apressasse.
Claro! Não, é um incômodo!
Vai chover!
Ainda que, na melhor das hipóteses, aquele devaneio acabasse levando-os a algum lugar, como a Nação do Fogo encararia a idéia de seu Senhor se envolver com uma estrangeira, ao ponto de ter a insana idéia de tomá-la como sua lady?
A Senhora do Fogo, uma mestre da dobra de água. Era uma piada de mal gosto...Era quase um sonho impossível.
Ele teria algum tempo até o jantar, talvez tomasse um banho para relaxar e clarear as idéias. Talvez isso o distraísse o bastante.
Ele se dirigiu ao quarto de banho, na esperança de encontra água quente, óleos perfumados e talvez uma massagem após o banho. Sentia o chão aquecido de baixo dos seus pés e a fumaça que turvava a visão. Sândalo, jasmim e flor de laranjeira. O cheiro forte causava tonturas, como se ele estivesse dentro de um sonho delirante.
Aos poucos seus olhos se acostumavam com a fumaça e conseguiam distinguir a formas a sua volta. O som da água corrente era como música, fazia com que ele pensasse nela. As fontes termais abasteciam o palácio com a água quente. Aquele era o lugar onde fogo e água se encontravam e coexistiam harmoniosamente. Aquilo quase lhe dava esperanças.
Entre a névoa de vapor seus olhos captaram algo que não devia estar ali. Algo, ou alguém...A figura baixa, delgada, de movimentos fluidos e ágeis. A pele morena despida de qualquer traje, qualquer impedimento a visão dele. Não precisava ser um gênio para saber quem era. Ela movia os braços sobre a superfície liquida, formando ondas, jatos, controlando e dobrando a água ao seu bel prazer como algum tipo de divindade.
A sorte é que ela estava de costas para ele. Teria sido desconcertante vê-la cara a cara e se deparar com sua nudez sem ter uma explicação boa o bastante para justificar sua presença ali. Zuko se perguntou por que nenhuma criada estava presente para ajudá-la a cuidar das unhas, lavar seus cabelos, ou perfumar sua pele com óleos aromáticos...
Claro que ela não iria querer nada disso. Katara se orgulhava de ser uma garota independente. Uma garota teimosa e simplória da Tribo da Água. Ela não era uma nobre da Nação do Fogo. Não era como Mai ou Azula.
Ele deu as costas a ela, determinado a sair dali antes que fosse descoberto. Acidentalmente, percebeu que havia pisada nas roupas limpas que estavam dobradas sobre o chão. Azul e branco, como tudo aquilo que ela usava. Azul...Uma cor serena de mais para condizer com o temperamento dela. Vermelho lhe cairia muito melhor.
Zuko pegou a muda de roupa e saiu do quarto de banho. No meio do caminho para seus aposentos, cuidou de ordenar a duas criadas que se ocupassem da tarefa de auxiliar a dobradora de água em seu banho e providenciassem roupas adequadas para ela. De preferência roupas tradicionais da Corte da Nação do Fogo.
Era uma bobagem, mas ele não tinha dúvidas de que a visão dela com aquelas roupas causaria uma grande comoção entre seus amigos. Era algo que ele estava disposto a tolerar apenas para ter um capricho seu satisfeito. Ao menos poderia olhá-la e fazer de conta que aquele sonho era possível.
Ele estava vagamente consciente de que seu tempo com ela estava se esgotando. Logo Katara retornaria para sua tribo e dificilmente voltaria à Nação do Fogo. Tudo o que ele queria era ter um motivo para mantê-la ali por mais tempo, talvez pelo resto da vida.
Se ao menos Aang não tivesse se colocado no meio do caminho, Zuko poderia até mesmo encontrar uma boa desculpa para cortejá-la. Poderia negociar diretamente com o pai dela e pedir sua mão com o argumento de que tal união seria perfeita para demonstrar o início de uma nova era. Uma era de boa vontade e harmonia entre as quatro nações. Aquele seria um belo discurso...Aquilo poderia até mesmo convencer seus compatriotas, mas Aang continuava sendo um problema.
Foi informado ao longo do dia que Aang e Sokka haviam se retirado do palácio para visitar uma vila próxima à capital e que voltariam em alguns dias. Toph havia partido no dia anterior, voltando para sua casa na Nação da Terra. Isso significava que a única companhia que ele teria para o jantar naquela noite seria Katara e só os espíritos poderiam dizer o quanto aquilo era perigoso.
Talvez fosse uma oportunidade...Ou pelo menos era o que ele preferia pensar enquanto bebia seu chá pacientemente, enquanto esperava a refeição ser servida em sua sala privativa.
Infelizmente sua paz durou pouco. Ele ouviu os passos pesados e os resmungos muito antes dela entrar na sala. Zuko bebeu mais um gole do chá enquanto preparava os ouvidos para as reclamações que viriam a seguir. Estava ficando irritantemente parecido com seu tio.
Ela entrou na sala privada como se fosse um tornado. Talvez tsunami fosse a expressão correta.
A chuva já apagou seu álibi?
Ele já se esqueceu?
Já nos separamos?
"É tudo culpa da chuva", tento me convencer disso.
- Que idéia foi essa? – isso era um progresso. Ser o Senhor do Fogo tinha lá suas vantagens. Pessoas não podem simplesmente ignorar a hierarquia e a boa educação e Katara havia aprendido isso bem rápido.
- Eu não sei do que está falando. – ele disse deixando a xícara de chá de lado e se virando para encará-la. Estava certo. Vermelho parecia condizer muito mais com ela do que o azul pálido das Tribos dá Água.
- Duas criadas! DUAS criadas pra me esfregar como se eu fosse algum tipo de criança incompetente que não sabe nem mesmo tomar um banho sozinha! – ela disse com os pulsos cerrados. Parecia ter dificuldade com as mangas longas do traje que usava e também com o comprimento da saia longa – E as minhas roupas! Onde estão as minhas roupas? Que tipo de anfitrião é você pra ficar sumindo com os pertences de um convidado assim? – ele respirou fundo.
- Gostaria de um pouco de chá antes do jantar? – ele ofereceu e teve que se controlar pra não rir da expressão furiosa dela. Tinha que admitir que gostava desses pequenos momentos.
- Você ouviu uma única palavra do que eu disse? – ela perguntou contrariada.
- Eu ouvi todas elas, mas visto que está visivelmente alterada, talvez fosse melhor se sentar, tomar um chá e então eu poderei responder a todas as suas perguntas. – ele disse sério, enquanto apontava o lugar preparado para ela de frente para ele.
Dando-se por vencia, Katara sentou-se diante dele enquanto Zuko lhe servia uma xícara de chá. Ela respirou fundo, ainda enfurecida, tentando ignorar o sorriso discreto de vitória que ele tinha no rosto. Ela bebeu um gole, sentindo a língua queimar, assim como os lábios. Imediatamente ela baixou a xícara.
- Como foi que minhas roupas sumiram de lá e por que duas criadas apareceram no meio do meu banho? – ela perguntou.
- A casa de banho é um ambiente comum, e como você está hospedada numa ala normalmente designada aos membros da família real, é adequado que tenha criadas por perto, não só para ajudá-la, como também para alertá-la e vesti-la rapidamente caso algum desavisado entre enquanto estiver se lavando. – ele disse sério.
- E você só teria uma maneira de saber dessas coisas. – ela rangeu os dentes – Você me viu tomando banho?
- Achei que a casa de banho estava vazia e se você estivesse acompanhada das criadas isso não teria acontecido. – ele disse imediatamente – Mas eu juro pela minha honra que não vi nada! – ela cerrou os punhos mais uma vez, repousando-os sobre o colo.
- E quanto as minhas roupas? Não tinha o direito de desaparecer com elas! O que diabos estava pensando? – ela resmungou.
- Estavam muito gastas.
- Isso é problema meu, não seu! Oh todo poderoso Senhor do Fogo! – ela retrucou.
- Um simples obrigado seria o suficiente. – ele disse contrariado. Era tão difícil assim aceitar um presente?
- Obrigado pelo que? Por sumir com meus pertences? – ela esbravejou ainda mais.
- Não. Um obrigado pelas roupas novas que acabo de lhe dar de presente, mas se não são do seu agrado posso mandar alguém procurar por algo que lhe pareça mais adequado. – a resposta pareceu forçar um pouco de bom senso dentro da cabeça dela e Katara ficou subitamente calada. Ela se resignou a beber o chá.
Recados vindos dele? Nada, nada.
Lições aprendidas com a chuva? Também nada, nada.
Se meus sentimentos se parecessem com o clima inglês,
Volúvel, seria muito
reconfortante... Mas acontece o oposto.
Vai chover!
O silêncio pesou entre eles por longos segundos e o único som ouvido era o barulho da porcelana sendo colocada sobre a mesa.
- Sinto muito. – ela finalmente disse como uma criança arrependida de uma travessura.
- Desculpas aceitas. – ele respondeu encarando-a diretamente por um momento – Eu estava falando sério. Se as roupas não são do seu agrado, basta dizer e providenciarei para que receba outras, mas... Espero que não faça isso. Elas ficam muito bem em você. – o comentário pareceu deixá-la constrangida.
- Obrigada pelo presente. – ela respondeu sem muitas opções – É só que...Não sei, não parece certo.
- O que? – ele perguntou enquanto criados retiravam o jogo de porcelana, substituído-o pelo jantar dos dois.
- Vermelho, preto, dourado...Eu me sinto a sua irmã dentro dessas roupas. É como se essa não fosse eu. – ela respondeu.
- Sou obrigado a discordar. – Zuko disse – Já usou roupas típicas da Nação do Fogo antes e vermelho combina muito mais com o seu temperamento do que o azul pacífico das Tribos da Água. Às vezes tenho a impressão de que você nasceu na Nação errada.
- O que quer dizer? – ela arqueou uma sobrancelha.
- Seu temperamento é...Apaixonado de mais pra condizer com água. Essa é uma característica muito mais pertinente ao fogo. – mais uma vez ela ficou constrangida.
- Se queria me dar roupas, poderia ter sido algo mais simples, não trajes tão...Sofisticados. – ela disse chamando a atenção para a gola alta e as mangas compridas, para os detalhes dourados, o bordado delicado da barra e a faixa de seda. Era de fato algo sofisticado e a última mulher a se vestir daquela forma dentro daquele palácio foi sua mãe.
- É uma convidada real. São roupas adequadas a corte. – ele respondeu.
- Sabe...Eu não vou ficar muito tempo por aqui. – ela respondeu voltando sua atenção para a comida – Quando poderei usar essa roupa outra vez? Não na minha tribo, com toda certeza. – aquilo o desanimou.
- Há uma data definida? – ele perguntou – Já sabe quando voltará pra casa?
- Em uma semana, talvez menos. – ela respondeu.
- Tão cedo... – ele falou num sussurro – Por que não foi visitar o vilarejo com Aang e seu irmão?
- Depois de tanto tempo viajando, acho que eu queria um pouco de estabilidade antes de voltar pro Pólo Sul. – ela respondeu – E também por que...Achei que você precisaria de companhia pra distraí-lo. Você parece...Você parece tão perturbado nos últimos dias. Calado, preocupado, eu não sei direito. Eu sei que o rompimento do noivado mexeu muito com você, mas foi melhor ter acontecido agora, enquanto ainda havia tempo de desmanchar tudo. – sem se dar conta, ele colocou sua mão sobre a dela, fazendo Katara arregalar os olhos em resposta.
- Eu agradeço a sua preocupação, mas eu estou bem. – ele respondeu serenamente.
- Não está. – ela rebateu – Sei que não está.
- O fim do noivado não foi exatamente um motivo de grande tristeza. Eu já não sentia por Mai a mesma coisa que senti quando o compromisso foi firmado. Meu único arrependimento foi ter magoado uma pessoa que foi tão importante na minha vida. Eu a negligenciei e ela encontrou outra pessoa pra cuidar de suas necessidades. Não a culpo por ter achado alguém melhor do que eu nesse sentido.
- Você tende a ser muito severo consigo mesmo. – ela respondeu – Não importa o que pense agora, dificilmente alguém poderia ser tão bom quanto você.
- Essa afirmação teria parecido um delírio há algum tempo atrás. – ele respondeu – Acho que o Avatar tem mesmo o poder de mudar o mundo.
Ela se calou mais uma vez e Zuko entendeu que aquele era um sinal de que a conversa devia parar por ali. Eles voltaram a comer em silêncio até que os pratos estivessem vazios.
Zuko se levantou e caminhou até ela, estendendo-lhe a mão para ajudá-la a se levantar. Katara aceitou a ajuda e o braço que ele oferecia num convite silencioso a uma caminhada.
Foram até a varanda e olharam o céu. Nuvens se acumulavam, pesadas e ameaçadoras, anunciando uma tempestade. Raios cortavam o céu quando os primeiros pingos começaram a cair, encharcando o solo dos jardins. A água era familiar a ela, era parte dela, mas tantos raios traziam a lembrança de Ozai e Azula a mente dela.
Havia uma sensação implícita de que ela estava aprisionada ali, presa numa jaula de chamas e raios que traziam um calor sufocante ao seu corpo e turvando sua visão com fumaça. Aquela tempestade parecia ameaçadora de algum modo. Aquela tempestade era o sinal de algo grande...
A chuva fez minha febre voltar,
Mas ele de repente se lembrou de mim.
Fomos conduzidos até aqui,
É tudo culpa da chuva, sim, graças a ela.
- Essa tempestade parece que vai durar algum tempo. – Zuko quebrou o silêncio – O que fará quando voltar pra casa?
- Eu não sei. – ela respondeu em tom baixo – Tudo agora parece...
- Vazio. – ele completou – Eu sei. A guerra acabou e tudo parece sem sentido agora.
- Você tem uma nação pra governar. Dificilmente sua existência é sem sentido. – ela respondeu.
- Governar sozinho. – ele disse – Não sei nem por onde começar, mas meus conselheiros insistem que o primeiro passo é encontrar uma outra noiva.
- Tão cedo? – ela perguntou.
- A Nação do Fogo precisa da segurança de um herdeiro o quanto antes. – ele disse parecendo exausto – O coração tem pouca importância nesses casos.
- Parece algo muito triste de se pensar. – ela disse – Foi assim com seus pais? Um casamento arranjado?
- Sim. E provavelmente é o que acontecerá comigo. – ele respondeu – A menos que eu possa apresentar uma candidata a tempo. Alguém de minha própria escolha e um bom motivo para que ela seja a próxima Senhora do Fogo.
Mais uma vez silêncio entre eles, enquanto a chuva engrossava.
- Isso pode atrapalhar a viagem de vocês. – Zuko disse.
- O que? – ela perguntou distraída.
- A chuva. Pode demorar dias para passar. – ele respondeu – Você e Aang estão fazendo...Planos?
- Planos? – ela parecia ainda mais confusa.
- Pro futuro. Os dois...Juntos. – ele perguntou.
- Bem...- ela desviou o rosto – Acho que não quero pensar em planos por enquanto. E ele ainda é tão novo...Às vezes...Às vezes isso parece uma má idéia. Acho que é algo que acabará acontecendo quando voltarmos pra Tribo da Água.
- E se você não voltasse? – ele só percebeu sua ousadia quando já era tarde – Digo...Você é jovem, viveu a vida inteira na sua vila. Por que não esperar um pouco mais, conhecer coisas sem se preocupar com esse tipo de responsabilidade, ou com uma guerra...Só pra...Pra ter certeza de que essa é a decisão certa.
- Eu abri mão de quase tudo para viver uma aventura com ele...Meu povo, minha tribo, minha família...Tudo. – ela respondeu – Se eu o deixasse agora, seria como virar as costas pra tudo o que eu sou definitivamente. Eu seria como uma Nômade do Ar. Eu devia ser estável, como um lago, um rio que segue seu curso. É o que eu sou, não é? Feita de água.
- Eu insisto. – ele disse ficando ao lado dela, encarando a chuva pesada que caía – Nasceu no país errado, dobra o elemento errado, e ainda que seja feita de água...Basta olhar para esta tempestade, ou para o mar, para os maremotos. Não há serenidade nessas coisas, há força, poder, há... Se não é isso o que quer, então por que aceitar? Não se conforme com o que tem nas mãos, vá em frente e faça aquilo que quer, antes que perceba que viveu uma vida com medo de buscar algo diferente daquilo que o mundo insiste em dizer que é o certo pra você.
- A vidente disse que eu me casaria com um dobrador poderoso. – ela disse – Não parece ter muito sentido lutar contra o destino.
- Cada um faz seu próprio destino. – Zuko insistiu. Aquele pensamento para ele era quase um mantra.
- A água segue seu curso. – ela insistiu – É o certo.
- Se eu fosse um dobrador de terra, desviaria o curso dos rios. Se fosse um mestre do ar, afastaria nuvens. Se dominasse a água, congelaria um lago inteiro. – ele disse teimoso.
- Mas você não é nada disso. É o Senhor do Fogo e essa é a minha vida. Não é como se minha vida fossem um punhado de peças de roupa velhas, que você pode simplesmente substituir por novas. O que o todo poderoso Senhor do Fogo pode fazer para mudar o curso da água, para mudar meu destino?
Aquilo era a coisa errada a se dizer. Aquilo era tudo o que Katara jamais deveria ter feito. Ele era o Senhor do Fogo, ele era poderoso, ele havia mudado o próprio destino e o faria de novo se preciso fosse. E ele a queria...Ele a teria.
- Eu atearia fogo à chuva. – foi o que ela ouviu antes de sentir seu corpo ser cercado pelos braços fortes e seu peito colidir com o dele. A mão firme lhe segurando pela nuca e a boca sedenta que buscava pela dela num beijo de fogo. Paixão era algo inato aos mestres do fogo. O mundo estava em chamas, a despeito da chuva, a despeito do dom dela transformar as gotas pesadas da tempestade em anéis de água circulando ambos os corpos, ou de pingos que congelavam nos galhos das árvores, adornando-as com pingentes cristalinos, sem que nenhum dos dois notasse.
Estava chovendo e a chuva estava em chamas.
A chuva chama as pessoas e some com elas,
Um mago mais poderoso que qualquer um, né?
Estamos sempre sendo iludidos,
Será que tudo vai começar com a chuva?Vai chover!
Nota da autora: Estréia no fandom e eu confesso que não vi a série toda XP. Bem, antes de mais nada, eu estou assistindo o desenho desde o início agora e fazendo o possível pra desenvolver os personagens de acordo com a forma que foram construídos no original. Obviamente, esse não é um empreendimento garantido, até porque, dificilmente o Zuko trairia a amizade do Aang. O problema é que...Zuko e Katara parecem um casal que faz muito mais sentido do que deixar ela com o Aang, ou deizar o Zuko com a Mai (que guria esquisita!). A música que inspirou a escrever essa fic foi Set Fire To The Rain, da Adele, mas a música que eu coloquei neste capítulo se chama It's Gonna Rain e foi um dos temas de encerramento de Samurai X, composição Bonnie Pink.
Espero que gostem e comentem.
Bjus
Bee
