7 PECADOS
Ira:
(intenso sentimento de raiva, ódio, rancor)
Lindo dia. Tempo fechado, nem sombra de sol, um frio do caramba, e um clima totalmente melancólico. Além de ser Segunda-Feira.
Ou seja, uma maravilha, para uma maluca. Em outras épocas, épocas normais, eu acharia o dia péssimo e pensaria seriamente em matar todas as aulas e ficar dormindo, mas no final acabaria saindo arrastada da cama pensando "Bem, um dia não pode ser tãão ruim...", e sairia para ver uma bateria de aulas chatas e monótonas, riria uma ou duas vezes de alguma piada sem graça e iria dormir muito cedo, isso se os deveres de casa permitissem.
Mas, ao contrário de todos esses dias e da total normalidade, eu acordei super bem disposta, e, logo que o despertador tocou, eu me levantei, nem me incomodando com o maldito barulho, que eu tanto odeio.
Certa vez me disseram que, quando a pessoa está apaixonada, o mundo fica um lugar mais bonito. Eu não acreditei em uma palavra do que aquela pessoa me disse, pois com um mundo como o nosso nem o amor platônico daria solução. Mas hoje tive que dar o braço a torcer. O final de semana havia sido perfeito. Finalmente Lílian Evans deu o braço a torcer, e cedeu aos encantos de James Potter, que não são poucos... Pude verificar cada um deles.
Isso quase foi manchete do jornal semanal. Sorte que eu confisquei antes de ser publicado, monitoria tem lá as suas vantagens, também.
Então. Fiquei com James, gostei, amei, blá-blá-blá, e achei que nada mais poderia dar errado, que o mundo era realmente um lugar bonito, onde todas as pessoas eram boas.
Eu não sabia como estava enganada.
- Sofiaaaaaaaaa... - Tadinha, ela não merece pagar pela minha felicidade, mas fazer o quê? Dizem que não faz bem guardar o sentimento para si próprio. Sabe, eu sempre falei o que sentia. Bem, claro, tem a exceção: de que eu gostava do James havia um ano e meio, mas eu nunca tinha contado pra ninguém. Até a semana passada, quando eu contei pra Sofia. Mas eu não o tratava como tal, então, não era uma mentira tão grande assim. Mas, fora isso, nada; absolutamente nada. Você pode ver, sou uma pessoa muito aberta. Completamente aberta. Praticamente um livro largado no vento. - Hora de acordar!
- Que horas são?- Aquilo que se levantou da cama da minha amiga, definitivamente não era a minha amiga. Parecia mais um leão com a maquiagem mal feita e borrada, ou seja, não estava nem de longe bonita, mas nem de longe mesmo. A uns 19 quilômetros, talvez. Deve ser porque ela, Remo e o Sirius festejaram brincando de "Vira-Vira", ontem à noite. Vira-Vira é aquela brincadeira que a pessoa enche o copo com uma bebida qualquer e depois vai virando de uma vez, enquanto os outros cantam "vira, vira, vira, vira, vira, vira, virôôô...", e assim por diante. Ganha quem conseguir beber mais copos. A disputa estava acirrada, já que durou das 8 da noite à 1 hora da manhã. Isso por que, quando eu cheguei às nove, da minha ronda de monitoria, eles já não estavam no seu juízo normal. Se bem que nenhum desses três realmente tem juízo. Incluindo o Remo, pode ter certeza. - Seis... O quê? VOCÊ ME ACORDOU UMA HORA ANTES DO HORÁRIO? Ai... Cacete, minha cabeça. - E voltou a deitar, segurando a cabeça entre as mãos.
- Credo, Sofia, um dia tão bonito... Ótimo para se aproveitar cada instante dele...
-Cara, o James te fez mal. Afetou todos os poucos neurônios deficientes que você tinha... - Ela se levantou com extrema dificuldade, se apoiando na cama, e arriscou uma olhada pela janela, mas logo voltou a fechar os olhos e muito, mas muito devagar, foi andando para o banheiro. - Bonito, o dia está no mínimo horroroso... Cacete, maldita ressaca... Parece que tem alguém jogando Snap Explosivo na minha cabeça...
- Nossa, 'tá bonito sim.
- Não, Lílian. Não está, não...
- 'Tá bom, ele não está lindo. Mas também não está horroroso, né?
- Ele está horroroso.
- Está apenas com qualidades diferentes das quais a maioria gosta... Mais simpático...
- Ele está horroroso, medonho, deformado, amaldiçoado, terrível, péssimo e nem de muito, muito longe, possui qualidades.
- Mas...
- Lílian, cala a boca. - E bateu a porta do banheiro. Nossa, como as pessoas podem acordar tão mal-humoradas, não? Que ira pós-ressaca ela tem...
X-X-X-X-X-X-X-X-X-X-X-X
Após muito tempo esperando a completa lesma da Sofia, conseguimos descer para o café da manhã, mais cedo do que de costume. Mas, pelo jeito, a escola toda resolvera acordar mais tarde hoje, porque se vimos 3 pessoas pelos corredores, foi muito. Não tinha ninguém, nadica de nada. Até o Pirraça estava sonolento, para você ver o grau que a coisa estava. Crítico.
- Hoje tem aula, certo? - Perguntei a Sofia, enquanto me servia de suco e avistava umas três pessoas da Lufa-Lufa se dirigindo para sua respectiva mesa de café da manhã.
- É bom pra você que tenha. - E me lançou um olhar de profundo ódio. Nota mental: nunca mais acordar a Sofia quando ela está de ressaca. É prejudicial para a saúde alheia.
Fiquei "quietinha" no meu canto enquanto terminava meu mingau,cantarolando umas musiquinhas de comercial trouxa, o que fez a Sofia me lançar mais olhares de raiva.
Terminei o mingau, mas a fome ainda persistia. Resolvi investir nas torradas, mas quando ergui a mão perdi a fome. Meu estômago deu um solavanco quando olhei para a porta: o quarteto mais badalado da escola acabava de entrar no Salão, sendo guiado por ninguém menos que James Potter. Desisti das torradas e sentei, quietinha. Mal respirava.
Fiquei meio incerta sobre o que fazer. Tratá-lo normalmente, como um amigo, ou me jogar por cima das mesas e lhe dar um beijo daqueles que só se vê em cinema? Mesmo eu sendo adepta da segunda opção, fiquei no meu canto, esperando ele ter a iniciativa.
- Pra quem tava toda serelepe, três segundos atrás, até que você ficou bem quietinha, agora, heim.. .- Comentou Sofia.
- Impressão sua... – Respondi, tentando ser a mais natural possível. Até estendi as mãos para apoiar na mesa, o que não foi uma boa idéia, já que tinha o meu copo de suco no caminho. Fechei os olhos pedindo paciência; o dia já começou animado. Meu uniforme nunca mais será o mesmo...
- Sonhando comigo, Srta. Evans? - Dei um pulo da cadeira, espalhando mais suco ainda pelo lugar, se é que isso era possível. Olhei para o lado e encarei o motivo da minha falta de fome: com os cabelos molhados, cheirando a loção de barba e menta, com um sorriso de canto de lábio. Eu não consigo ser tão completa, assim, logo de manhã cedo, principalmente antes das sete da manhã. Preciso descobrir que truque é esse...
- Precisava do susto? – Comentei, buscando minha varinha na bolsa, e com um rápido feitiço eu já estava limpa novamente. Ahá, quem disse que suco de abóbora manchava foi um grande mentiroso. Ou, então, não conhecia magia. - Bom dia, não?
- Ah, sim, bom dia! - Ele cumprimentou, e me deu um selinho. Plim, plim! Problema resolvido. - Cara, eu estou morrendo de fome...
- Bom dia, meninos - Cumprimentei os outros três, e recebi meros muxoxos em resposta. Sirius e Remo não agüentaram falar... Ressaca, sabe? Já o Pedro estava de boca cheia. Já perdi a fome. Dos cinco amigos que me cercam, três estão impossibilitados de falar devido a dor de cabeça, um está a todo instante de boca cheia, e o outro... Bem, acho que eu não quero muito conversar com ele no momento.
Eu estou parecendo uma tarada, veja só!
Mas bem, pensando bem no caso, conversar com o James nesse instante pode não fazer bem para o meu estômago de adolescente-no-primeiro-beijo. Eu provavelmente criaria uma úlcera em dez minutos. Melhor eu trabalhar mais nesse aspecto do nosso relacionamento.
- Bom dia, James! - A toda saltitante Úrsula veio dar bom dia para o James.
O problema com o meu estômago já foi superado. Superadíssimo, por sinal.
Passei a mão pelas costa da cadeira dele, e comecei a mexer nas mexas da nuca. Ele me olhou enviesado, e deu um aceno para a Úrsula. Já ela me olhou como se eu fosse um trasgo, e eu encarei-a com a cara mais sonsa do mundo. Mas aí o nosso duelo foi interrompido.
- Pedro, eu fisguei a torrada primeiro. - Argumentou Sofia, que estava com o garfo preso em uma torrada, juntamente com o garfo do Pedro.
- Cara Sofia, EU fisguei primeiro. - Retrucou o outro. Meu queixo caiu. Eu-não-acredito.
- Hahaha. Você é tão engraçado. Agora me dá a torrada.
- Não dou não. Quem vai ter que ceder é você! - Desafiou o Maroto. Coitado, acho que ele não arrumou um bom dia para mexer com a Sofia. Não escolheu mesmo. Eu pude ver seus olhos se estreitando, e a ruga se formando em sua testa. E quando essa ruga se forma, sai da frente, que atrás vem a Sofia.
- Pedrinho, presta bem atenção: eu não estou em um bom dia, então, FAÇA O FAVOR DE ME DAR ESSA TORRADA!
- Não dou, não! - bateu pé o menino.
- Ah, me dá sim. - fisgou com mais vontade a torrada no prato. Dava pra ver faíscas saindo dos olhos dos dois.
- Não dou, não. Não dou mesmo! - Pedro fez cara de desafio, e apoiou a mão livre na mesa, se inclinando para a menina. Sofia apenas sorriu enviesada. Agora vinha bomba. Olhei ao meu redor, procurando um lugar seguro para me esconder. E qual não foi a minha surpresa ao perceber que todo o salão olhava o duelo pela torrada, inclusive os professores.
- Isso vai dar merda... - James resmungou do meu lado. Sofia apoiou um dos joelhos na mesa, e com a mão livre tirou a varinha das vestes.
- Olha aqui, Pedro: ou você me dá essa torrada imediatamente, ou eu vou ser obrigada a te azarar! E olha que eu não estou nem um pouco preocupada em receber uma semana de detenção. - E com os dentes cerrados, com os olhos quase fechados e com a raiva estampada no rosto, Pedro, vulgo Rabicho, respondeu:
- Está bem, fique com a sua maldita torrada. – E, dando-se por vencido, se sentou emburrado na mesa. Todo mundo sabe que ele não tem capacidade de enfrentar um duelo com a Sofia.
O salão todo, ainda espantado com o ocorrido, voltou, aos poucos, ao burburinho normal. Já Sofia comeu sua torrada como se nada houvesse acontecido. Ergui as sobrancelhas.
"Nunca cutuque um leão mal-humorado. Muito menos uma mulher de ressaca."
- Mas, então... Não sabia que você era tão ciumenta, Lily... - James comentou, enquanto puxava a cadeira para minha beira e passava o braço pelo meu encosto.
- Quem disse que eu sou? - Ergui as sobrancelhas.
- Não é?- Instigou ele, fazendo brotar um minúsculo sorriso em seus lábios.
- Nem um pouco. Alguma dúvida? - Menti descaradamente, e ele sabia disso.
- De forma alguma! Aquele olhar mortífero foi apenas um agradável "bom dia" para Úrsula...
- Nada que ela não merecesse... - Cedi, mal-humorada.
- 'Tô gostando de ver, Lily: cuidando do que é seu... Isso pode ser uma coisa recíproca, certo? Porque eu também não gosto do jeito que o... - apenas ergui as sobrancelhas.
- James Potter?
- Sim, meu amor?
- Vamos para aula. - Me levantei e sai.
- 'Tá bom, 'tá bom, eu retiro o que eu disse. Mas que falta de romantismo você, heim...
X-X-X-X-X-X-X-X-X
Depois do pequeno "desentendimento", nos reconciliamos (oh, jura?), e eu fui, com muito pesar no coração, para minha aula intensiva de Poções. Já o James foi para DCAT, pois, esse ano, cada aluno podia escolher uma matéria para fazer o intensivo. Foi uma aula longa, gigantescamente trabalhosa, e com tantos detalhes que quase fiquei louca. Todas as partículas do meu insignificante ser almejavam o almoço. E, quanto mais eu desejava, mais devagar a hora parecia passar, pelo menos isso me parecia. A Sofia concordava comigo em gênero, numero e grau.
Trrrrrrrriiiiiiiiimmm.
- Aleluia! - ouvi murmurarem ao meu lado. É, pelo visto a aula estava realmente comprida.
Finalmente livres! Saímos praticamente correndo das masmorras, em direção ao tão esperado almoço. Comecei a comer, faminta, mas sempre atenta a quem entrava e saía do salão, esperando ver um certo moreno. E ele não apareceu para o almoço. A minha pulguinha de estimação se alojou atrás da minha orelha, e começou a me importunar. Tentei desviar a atenção para outras coisas, mas a todo momento meus olhos se desviavam para a porta. Quando nos levantamos, Sofia , que já reparara no meu desconforto, tentou me consolar.
- Relaxa, Lily, deve ter acontecido alguma coisa. Mas, em todo caso, você encontra com ele na aula, certo?
- É, certo... – Respondi, tentando, em vão, fazer o que ela pedia.
Ele não apareceu na aula. O que fez a pulga atrás da minha orelha ficar vibrante. Agora nada tirava da minha cabeça que alguma coisa grave havia acontecido. Sofia tentou me fazer prestar atenção na aula, mas suas tentativas foram inúteis. Minha mente girava em busca da causa do desaparecimento do James, e, principalmente, se teria sido por minha causa.
Em meio ao meu devaneio, o sinal tocou, anunciado o fim das aulas. Como estava sem fome, resolvi ir direto ao dormitório deixar as minhas coisas e depois voltar ao Salão Principal, para ver se encontrava o James por lá.
Quando entrei na sala comunal – que estava vazia – vi um cocuruto de cabelos arrepiados, em uma poltrona virada para janela, de costas para a saída do retrato. Minha sensação de alívio por ver a forma familiar foi embora tão rápido quanto chegou. Ao me virar para falar com ele, vi uma das expressões que tive certeza que não esqueceria tão rápido: James estava com os olhos levemente vermelhos, seus cabelos num total desalinho, como se tivessem sido mexidos insistentemente, e seu rosto estava fechado, atarracado, com uma grande expressão de tristeza e rancor.
- James...? - Estiquei a mão para tocar seu ombro, mas, ao perceber o meu movimento, ele deu um pulo da cadeira, como se quisesse ficar o mais longe possível de mim. Seu rosto ficou indecifrável quando me encarou.
- Você! – reagiu, ele, em um tom acusatório.
- Meu Deus, o que houve? – alguém morreu, só pode! Minha cabeça dava voltas e voltas, tentado decifrar o que estava acontecendo.
- O que houve? O que houve? Você ainda tem a cara de pau de me perguntar o que houve? - Meu alarme interno começou a apitar.
- Hei! Calma lá! Será que dá pra me explicar o que está acontecendo?
- O que está...? - ele me olhava como se nunca tivesse me visto. Suspirou e abaixou a cabeça, balançando-a negativamente. Quando ele reergueu a cabeça, vi raiva no seu olhar, e aquilo fez meu estômago se contrair. - Como você é cínica! Falsa, mentirosa...
- Opa, opa, opa. Pode ir parando por aí...
- Parando por aí porra nenhuma! Eu é que fui burro em acreditar que algum dia a gente podia dar certo...
- Como...?
- Realmente, a tão certinha Lílian Evans nunca ficaria com um Maroto. Era realmente surreal demais... Mas, agora... Agora eu tenho repulsa de você!
- Qual é, James! Será que dá pra falar alguma coisa com nexo?
- Alguma coisa com nexo? - ele falava como se não acreditasse no que estava ouvindo. - Descarada o suficiente para se fazer de santa! Por Merlin, como eu tenho nojo de você!
- Vem cá, em um dia me faz juras de amor, e no outro está me tratando como lixo? - Mesmo com meu alarme interno explodindo, eu não agüentei. Aquilo foi a gota d'água. - Vem cá, Potter - O uso do sobrenome fez seus olhos mostrarem o espanto por me ver chamando daquela forma tão impessoal, mas logo voltaram a se estreitar de raiva. - Eu não sou uma dessas aí, que você pega e joga fora como uma piranha qualquer, tá?
- Jura? - respondeu ele, cínico. - Você não é uma dessas... Você é muito pior! Me usou como um souvenir, apenas de fachada... Não liga se os outros têm coração, sentimento... -Meus olhos agora se enchiam de lágrimas, e eu tentando segurá-las só piorava a situação.
- Em primeiro lugar: dê motivos para ofender alguém. Não ofenda só por que não sabe como terminar de uma maneira humana...
- Você..
- Em segundo lugar: - alterei minha voz, tentando ignorar as grossas lágrimas que desabavam sobre o meu rosto. – Você não é ninguém para dizer o que eu sou e o que eu não sou. Ninguém! Piranhas são aquelas que correm atrás de você, coisa que eu NUNCA fiz na vida. E em terceiro lugar: eu nunca te usaria com fachada. Você, agora percebo muito bem, não é algo que se tenha para se orgulhar!
E virando as costas, com as lágrimas caindo no uniforme, fui correndo para o meu dormitório. Confusa e totalmente desnorteada, me joguei na cama, tendo apenas um pensamento em mente: como tudo no meu dia, que parecia muito bom e promissor, virou uma verdadeira desgraça.
