Capítulo Um

Mais uma daquelas tardes silenciosas se passara. O sol, que não tinha conseguido espreitar por detrás das nuvens o dia inteiro, começava a pôr-se, e aquela seria a hora em que os elementos da Ordem se começariam a juntar para a reunião de sexta-feira. Ginny achava aquilo extremamente penoso. Tinha de ficar a ouvir toda aquela gente falar dos relatórios, dos planos e das missões futuras, sem poder contribuir verdadeiramente. E isto porquê? Porque o Senhor Harry Potter não consegue trabalhar sabendo que ela estaria em missão, o que equivalia a estar em grande perigo. E alguém quis ouvi-la? Não, porque apesar de ela ter potencial e muitas capacidades para ajudar, era muito mais importante o que ele andava a fazer. Ginny não se incomodava com isso. Só se sentia meio largada ali como um objecto que ficou para vir buscar mais tarde. Isso e o tempo que tinha consigo própria davam-lhe espaço para questionar muita coisa, inclusive ela e Harry. E quando Draco chegou, a coisa descambou completamente.

Sentiu-se acordar daquele monólogo interior por Draco que sorria divertido com a cena. Ginny, provavelmente, deveria ter um olhar muito idiota na cara, enquanto Remus Lupin tentava chamar a sua atenção, abanando uma mão na sua frente.

- Ginny, estou a tentar perguntar-te se está tudo bem pra ti. – Remus tinha o cenho franzido com uma mistura de preocupação e descrença, enquanto Draco começava a tentar esconder o riso, falhando mal e porcamente.

- Tudo bem pra mim o quê? – "Eu tenho de deixar de fazer estas figuras na frente de toda a gente" pensou Ginny desgostosa, lançando um olhar reprovador para Draco. Ginny estava cada vez mais espantada com a "relação" que se tinha estabelecido entre os dois, logo que ele chegou. Draco não podia sair dali e ela raramente tinha oportunidade disso. Uma coisa levou a outra e quando se deu conta, os dois já tinham intimidade suficiente para falarem de pessoas que tinham perdido na guerra. Ele, os pais; ela, um irmão. Já se entendiam ao ponto de olharem um para o outro e saberem o que o outro queria dizer. O que ainda era mais absurdo, sendo que Draco só tinha entrado naquela casa há cerca de oito semanas. Ele também aprecia um pouco surpreso com aquilo.

- Não tens estado na mesma sala que eu, pois não? A altura chegou. Contactei-me com Hermione e a altura chegou. – Os olhos de Remus brilhavam de expectativa. – O que Ron, Harry e Hermione andaram a fazer durante este tempo todo acabou finalmente. E chegou a altura de irmos directos ao "assunto". Esta vai ser a altura mais perigosa para se andar pelas ruas, por isso, vocês vão ter que se decidir onde vão ficar durante as próximas semanas. – Remus dirigia-se agora a Draco. – Como já conversámos Draco, não nos serviria de muito ter-te connosco durante este período, lá fora. Como fazes mais falta aqui, sugiro que fiques com Ginny e a Senhora Weasley, se elas assim decidirem. – olhou como se quisesse subentender alguma coisa, mas Ginny não percebeu.

- Nem eu esperava sair tão cedo daqui – Disse Draco irónico.

- Terão ainda algum tempo para decidir onde ficar, talvez alguns dias, Ginny.

- Não me parece que haja algum sitio mais seguro para ficar durante esse tempo que a Ordem, Remus. Mas também não estou preocupada com isso. Gostava de poder ajudar agora. – Ginny disse, deixando escapar num leve tom de súplica.

- Não é que não possas ajudar, mas dificultarias algumas "partes" de toda a operação.

Ginny assentiu, sem grande ânimo para responder verbalmente. Sabia que aquela guerra já ela tinha perdido mesmo antes de entrar para a Ordem. Sentiu os olhos de Draco, do outro lado na mesa, a fitarem-na. Ela tinha a certeza de que ele sabia o que ela estava a sentir. Ele também era obrigado a ficar ali, sem poder sair. Apesar disso, Ginny não achava que ele queria sair pelas mesmas razões que ela. Draco já não se importava com o rumo da Guerra, mais precisamente, quantas pessoas morreriam ou quem venceria. Ele apenas queria viver a sua vida, sem ter que tomar partidos, sem ter que prestar contas a alguém. Por não ter pensado assim desde o princípio é que se encontrava naquela situação difícil. A sua primeira escolha e mais óbvia queria vê-lo morto pela traição, e a segunda, embora o protegesse, não confiava nele, nem que ele entregasse a sua varinha. Por causa disso, tinha de se esconder como um rato, tinha perdido a sua fortuna e a sua família e não tinha como se livrar daquela confusão senão aliar-se ao Escolhido.

Com a reunião terminada, Ginny retirou-se para a biblioteca. Não ia lá para passar as tardes a ler. Quando calhava pegava num livro cuja capa lhe tivesse chamado a atenção. O que lhe atraia àquele salão era o facto dela e Draco sempre se encontrarem lá e acabarem sempre por terem longas conversas, em que se picavam um pouco, um ao outro, e se 'entendiam'. Aquilo fazia-lhe bem. E, naquele momento, ela precisava falar com alguém, mais precisamente, com ele.

- Ginevra, o que pretendes fazer quando isto tudo acabar? – Ele adiantou-se a ela ao entrar, na divisão e sentar-se num dos sofás junto à lareira, em frente a ela. Ele, definitivamente, não ia perder a mania de lhe chamar Ginevra. Ele não achava muita graça ao "Ginny" de toda a gente.

- Não sei, ainda não tinha pensado nisso. Provavelmente vou querer acabar de vez os meus estudos. Talvez seguir advocacia… Não sei bem…- Ginny surpreendeu-se com a pergunta. Era sempre ela quem iniciava a conversa e raramente falavam do futuro.

- E o santo Potter, não entra nesses planos? - Ele levantou uma sobrancelha, divertido.

Ginny ficou meio sem acção. Tinha entrado em terrenos perigosos.

- Bem... Esse assunto não é da tua conta, ok! – Sim, era melhor parar por ali.

-Mas eu acho que o Potter já pensou muito bem nisso. Ouvi a sua mãe agora mesmo a comentar com Tonks, o quão orgulhosa vai ficar de ter um genro como Harry Potter. Ela tem mesmo um grave problema, coitada. Vê-se mesmo a quem saíste.

-Minha mãe fala muito Draco. Eu, de momento, não tenho nada com Harry. Ele mesmo acabou tudo quando se foi embora. – Ginny respondeu sinceramente, ignorando o último comentário. Ainda se lembrava da cena com alguma amargura. A mania de Harry de ser nobre. Mas agora já a encarava de outra maneira.

- E tu pareces lamentar bastante, pelo que vejo. Ele continua com todos os cuidados contigo como se tivessem tudo o que havia para ter – Disse isto com uma certa frieza na voz. Olhava a mulher à sua frente com uma admiração e respeito crescente. Apesar de estar ali fechada há quase meses, bem mais tempo que ele, continuava relativamente calma. Se fosse ele já teria enlouquecido há muito. O que o preocupava, contudo, eram os sentimentos e o calor que o assolavam cada vez que sentia o perfume dos cabelos dela ou ela deixava escapar a voz com um tom um pouco mais rouco que o normal. Então, pensar que podia vir a ficar com ela, durante um bom período, naquela casa, praticamente sozinhos... Não podia deixar de reparar na intensidade dos arrepios provocados por esse facto. A frase seguinte foi sibilada mais para si que outra coisa. – Potter é muito idiota, mesmo.

- O que disseste?

- Nada de mais. – Ele suspirou.

- Eu não lamento nada. O que aconteceu tinha de acontecer. Harry é um herói imbecilmente nobre. Se acontecesse de outra maneira não poderia chamar Harry de Harry. E eu não tenho nada com ele. – disse definitivamente.

- Então porque deixas que ele aja como se tivesse?

Olharam-se durante algum tempo, numa competição feroz de quem desviaria o olhar primeiro. Ginny teve tempo de reparar na cor da íris dos olhos dele. Era feita de vários tons azuis e cinzentos, parecia quase irreal.

- Não tenho que te dar explicações Malfoy. – Ginny irritou-se, desviando o olhar. Sabia que era verdade e que ela, muitas vezes, deixava-se conduzir por Harry. E também sabia que aquilo estava cada vez mais perigoso. Desde quando tinha aquele embrulho no estômago ao olhar para o Malfoy? Sim, havia algum tempo que aquilo acontecia…

-Estou a ver que é um assunto delicado. – Ele, definitivamente, devia querer chegar a algum lado com aquilo. Ginny já estava a sentir falta dos habituais confrontos de quem respondia pior. Era menos incómodo.

- E tu o que pretendes fazer depois disto? - Ginny tentou desviar a conversa.

- Sempre gostei de uma casa que os meus pais tinham, no sul de França. Era onde passava os meus belíssimos Verões e onde o meu pai tinha a regra de que nenhum Comensal, para além dele, claro, ponha lá os pés. Foi dos poucos bens que escapou ao Ministério.

Draco levantou-se e procurou um livro numa estante mais afastada, no piso superior. Ginny não conseguiu evitar olhar para o modo como a sua camisola preta lhe assentava perfeitamente nas suas costas bem constituídas. Draco voltou e sentou-se no mesmo sofá de Ginny, um pouco afastado dela. Carregava consigo um livro. Parecia daqueles catálogos de viagens, mas bem mais grosso. Abriu o livro numa página e passou-lho.

- É esta a casa. Foi considerada uma das mais belas casas da Europa. – Ele parecia muito satisfeito com isso. Ginny sentiu-se ligeiramente inchada. Ele estava a partilhar com ela algo que parecia ser muito importante para ele. Olhando bem para as figuras, não ficou espantada com o facto de que "aquilo" não ser uma casa. Era um palacete dos mais "dignos" que se poderia ver por esse mundo fora. Os portões enormes, a calçada a formar uma larga estrada com alguns cem metros antes de se chegar a uma fonte impecavelmente branca, tudo isto rodeado por relva fresca e verdejante. A casa nem tinha comentários possíveis. Era pura e simplesmente magnífica.

-Percebes agora o que eu sinto quando olho para a tua "casa"? – A costumeira ironia na voz de Draco fez Ginny fechar a cara. - Estás convidada para passar uns tempos lá, se quiseres.

-Hum… Não sei o que os meus pais iriam achar disso. – E Ginny esteve para completar "meus pais e Harry", mas pela cara de Draco, achou melhor não.

-És maior e vacinada, Ginevra. – disse num tom debochado.

- Mas devo-lhes satisfações.

- Tu é que sabes. – disse simplesmente.

Ginny entreteve-se a folhear algumas páginas do livro. Havia casas realmente lindas ali. Ginny parou bruscamente, olhando esbugalhada para uma página. Draco olhou para ela, franzindo o cenho, surpreendendo-se ao perceber que ela, mesmo assim era linda. Aproximou-se um pouco dela para ver. No cimo da página vinha em letras garrafais "Mansão Potter". Draco olhou para ela desgostoso, já sem nem espreitar o resto.

- Não sabia que o Harry tinha uma Mansão. – Folheou o resto. Havia imensas fotos de cada canto da Mansão. Era linda sim, mas Ginny sabia que não se comparava à de Draco. O pior era que tinha a certeza de que há dois mês atrás não pensaria assim.

Draco encostou-se no sofá suspirando. Ginny olhou para ele. Apercebeu-se de que tinha, de alguma maneira, incomodado Draco.

- Eu não posso assegurar que eu e Harry acabámos de vez, Draco. Mas eu posso dizer que não é minha intenção voltar para ele, depois da guerra. – Ginny já não olhava para ele agora. Não saiba porque lhe tinha dito aquilo. Ainda nem tinha admitido aquilo para si própria.

Draco virou-se para ela, pôs um braço nas costas do sofá e aproximou-se, inclinando-se para ela. Estavam o mais próximos que já tinha estado até então. Ginny conseguia ver uma veia do pescoço de Draco pulsar mais rapidamente sob a pele pálida dele. Ele tinha um perfume mesmo inebriante.

- Ainda não percebi o que viste naquele cabeçudo…- Ginny percebeu uma linguagem corporal diferente da normal. Para além das frases não terminadas, a atenção totalmente focada nela, o gesticular muito próximo. Aquilo estava a deixá-la nervosa. Pegou no livro que jazia no seu colo e tentou colocá-lo na mesa, do outro lado de Draco. Tocou, sem querer, nas suas mãos alvas. Parecia lhe que tinha acabado de levar um choque e olharam-se durante alguns instantes só para se aperceberam que ambos tinham sentido aquilo. Foi então que Draco fez algo inesperado e pegou nas mãos de Ginny. Ele queria fazer aquilo há muito tempo. Desagradava-lhe o verniz a descascar mas havia algo naquelas mãos que o faziam querer tocar, havia lago nela que o fazia querer aproximar-se, no seu jeito, nos seus movimentos. "Potter é mesmo um imbecil", concluiu mais uma vez naquele dia. Olharam-se uma vez mais, decorando cada detalhe, um do outro e fazendo o estômago de ambos dar um mortal. Draco pode explorar a maciez das mãos de Ginny, esperando uma reacção desta. Mas Ginny apenas olhava para ele à espera do que viria a seguir. Sentia-se esmagada pela intensidade nos olhos dele. Ele desviou os olhos dela e pegou numa madeixa do cabelo ruivo e inspirou profundamente. O cheiro era algo que ele não poderia descrever. Não era um simples cabelo cheiroso e bem lavado, tinha mais alguma coisa lá. Um cheiro que Draco não esqueceria tão facilmente. Ginny não descolava os olhos dos deles, observando cada reacção nos seus olhos. Draco baixou um pouco a cabeça e colou a boca e o nariz no pescoço dela. O mesmo cheiro. "Divino", pensou Draco. Ginny ficou espantada pelo facto dos lábios e da cara dele serem tão quentes. Ela iria jurar que pela pele tão alva que ele ostentava, ele seria muito mais frio. Foi então que Draco se decidiu por fazer o que queria há já algum tempo. Aproximou-se de vagar e colou os seus lábios aos dela. Primeiro mantiveram ambos os olhos abertos e depois Ginny foi a primeira a fechá-los deixando Draco à vontade para admirar as sardas que tanto charme lhe davam. Draco desistiu das mãos dela e agarrou a cara dela de cada lado, afundando as mãos no seu cabelo ruivo. Aquilo parecia tão certo. Ginny estava prestes a fazer o mesmo e entregar-se completamente ao beijo, quando ouviram o barulho da maçaneta rodar, na outra ponta da divisão.

- Ginny…- Remus apareceu na porta. Parou, com a maçaneta ainda na mão, ao ver a posição comprometedora das mãos de Draco ainda na cara de Ginny, apesar do beijo se ter rompido imediatamente antes da porta se abrir. - Harry, Hermione e Ron chegaram.

Ginny abriu um sorriso e levantou-se imediatamente, esquecendo o constrangimento de há momentos, mas ainda atordoada com o cheiro e olhar de Draco. Olhou para trás para Draco, antes de passar por Remus, tentando dizer sem palavras que falaria com ele depois. Estranhou quando Remus não a acompanhou.

N/A: Aqui estou eu como autora, sim porque as outras são todas traduções P Ah, ganhei vergonha na cara e resolvi vir com o que é feito exclusivamente por mim.
O que posso dizer mais... Esta é uma NC em várias cenas, principalmente entre, Draco e Ginny, como é óbvio, mas essas cenas vão acontecer mais lá para o meio da história.

Enjoy