Emoções nunca foram o forte daquele casal. Até havia quem duvidasse que eles as tivessem. Quando descobriram que não podiam ter filhos, Bellatrix não derramou uma lágrima sequer e Rodolphus não disse uma única palavra. Eles tinham uma espécie de acordo: na casa deles, emoções não eram citadas.

Ou, pelo menos, até aquele dia.

Era dia primeiro de novembro. Bellatrix levantou no horário de sempre e, com os feitiços de sempre, preparou o café da manhã que sempre era servido na casa dos Lestrange. Depois da breve refeição, eles perceberam uma perturbação no fogo da lareira. Uma cabeça sem corpo estava encarando os dois.

- Rodolphus – disse a cabeça – Você leu o Profeta de hoje?

- Ainda não – o outro respondeu – Estava prestes a fazer isso.

- Então você ainda não soube?

- Soube do quê? – Bellatrix perguntou interessada na conversa.

- Dizem que ontem a noite Ele foi atas dos Potter – a cabeça continuou, num tom sombrio – E que ele foi derrotado.

E, antes que qualquer um dos dois tivesse chance de dizer alguma coisa, a cabeça sumiu da lareira.

Como Ele poderia ter sido derrotado por aquela família ridícula? Um bruxo, uma sangue-ruim e um bebê? Que estrago eles poderiam ter feito?

Eles definitivamente não eram páreo para o Maior Bruxo da História.

- Rodolphus – Bellatrix falou nervosa – Pegue logo esse jornal!

Esse foi o primeiro sinal de que algo estava errado. Bellatrix era normalmente uma mulher controlada. Todos os episódios em que ela se alterava tinham explicações altamente plausíveis.

Rodolphus puxou o jornal do bico da coruja que acabara de entrar na cozinha e entregou a ela uma moeda dourada, muito mais do que ele normalmente entregava. Ele também estava nervoso.

A primeira página do jornal trazia a foto de uma casa em ruínas abaixo da manchete em letras garrafais: "O Mundo Bruxo pode, outra vez, dormir em paz". A notícia em si contava que, na noite anterior, o Bruxo das Trevas que todos temiam tinha sido derrotado. Não por Albus Dumbledore ou membros da Ordem da Fênix, como alguns diziam que seria, mas por um bebê de apenas um ano, Harry Potter.

Rodolphus deu uma risada nervosa, aquela era a notícia mais absurda que ele já tinha lido. Um bebê de um ano derrotando Aquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado. Ridículo.

Bellatrix já tinha entendido, pela reação do marido, que a cabeça que estivera há pouco na lareira não estava mentindo. Com a manga levantada, ela tocava a marca tatuada à fogo no antebraço como se, por algum passe de mágica, ela fosse começar a queimar. Como sempre fazia quando Ele queria vê-los.

Mas era inútil. Porque eles sabiam que, dessa vez, o Profeta não estava inventando coisas.

- Rodolphus – Ela disse perdendo a compostura – A sua marca, ela também desbotou?

O marido, que não tinha levantado a manga até aquele momento, ficou estático por um segundo. Obviamente que a Marca esclareceria tudo.

- Sim – ele respondeu lívido – Então, deve ser verdade.

- Talvez seja.

Bellatrix não falou muito durante o resto do dia, Rodolphus também não quebrou o silêncio. Nenhum dos dois sentiu a marca sequer formigar e, com o passar das horas, isso ia criando um certo desespero nos dois.

Na hora do jantar, enquanto comiam a mesma comida de sempre – qualquer coisa especial era guardada para quando Ele estivesse lá – Bellatrix deidiu quebrar o silêncio.

- Querido – ela disse sem a menor emoção – Você é feliz?

Rodolphus não respondeu imediatamente. Deu uma garfada na torta em sua frente e tomou um gole do vinho antes de responder num tom frio.

- Sou. E você?

- Eu serei – ela disse levemente alterada – Desde que nós terminemos o trabalho dele – e pegou a varinha enquanto se dirigia para a porta.