Em Milão pertence parcialmente a Miranda Lee! Quanto aos personagens, uns pertencem a Miranda Lee e outros a J.K. Rowling.
Em Milão
Lily esperou a reação da mãe sentindo-se tensa. Não poderia ser boa. Mais uma vez, porém, lembrou a si mesma que a mãe nunca aprovara nenhuma de suas decisões.
Não que Lily tivesse o hábito de ser desafiadora. Ela apenas contrariara a vontade da mãe poucas vezes durante seus vinte e um anos de vida, e, na maioria das vezes, haviam sido transgressões secretas, como ler com uma lanterna sob os cobertores à noite ou passar batom no momento em que virava a esquina no caminho para a escola...
Sua única decisão realmente desafiadora fora tornar-se aprendiz em um grande hotel de Sídnei em vez de cursar Direito na universidade, mudando-se em seguida para um pequeno apartamento em Bond, o que fizera no ano anterior, para viver sozinha.
Mas nenhuma dessas decisões havia sido tão importante quanto planejar o casamento em um cartório de registros, uma cerimônia que aconteceria na manhã seguinte, sem contar uma única palavra à mãe até aquele momento.
A tensão crescia no íntimo de Lily enquanto ela esperava que a mãe dissesse alguma coisa. Mas Lisa Evans limitou-se a ficar sentada à mesa do jardim, fumando, completamente silenciosa.
A tortura do silêncio não era uma tática que sua mãe adotava com frequência. Ela era uma mulher perspicaz e muito inteligente, com mente aguda e língua ferina, que usava para destilar argumentos extremamente lógicos sempre que queria. Lisa tinha idéias bem definidas sobre tudo, mas especialmente sobre o papel e os direitos da mulher moderna.
Advogada que se especializara em casos de discriminação, ela era uma expert quando se tratava de defender a causa feminista. Aos quarenta e dois anos, depois de dois divórcios, tornara-se uma mãe intransigente e uma mulher que odiava o sexo oposto com todo fervor.
Lily não sabia por que ainda a amava. A mulher era impossível. Abrira mão de dois bons maridos, e a partir de então passara a se ocupar da vida sentimental da filha adolescente, o que quase enlouquecera Lily. Nenhum de seus namorados jamais fora capaz de agradar Lisa Evans. Sempre havia alguma coisa errada com eles.
Justamente por isso, Lily evitara sistematicamente levar James para conhecer a mãe desde que o conhecera. Ela não queria correr o risco de estragar aquele que sabia ser o amor de sua vida.
Mas as coisas tinham progredido de maneira irreversível, chegando a um ponto em que era impossível continuar ocultando os fatos de Lisa. O casamento com James estava prestes a se tornar um fait accompli, um fato consumado.
Lily tinha considerado a idéia de só contar à mãe depois que tudo estivesse consumado, mas chegara à conclusão de que isso seria excessivamente cruel. Naquele instante, porém, começava a achar que talvez esse houvesse sido o menor dos males.
Seu estômago contorceu-se quando viu a mãe finalmente apagar o cigarro no cinzeiro de cerâmica e erguer a cabeça para fixá-la com gélidos olhos verdes.
— O casamento foi idéia sua, Lily? — ela perguntou friamente. — Ou dele?
— Na verdade, foi dele — Lily teve prazer em anunciar.
Os dois estavam sob o luar quando James fizera a proposta, logo depois de saber sobre o bebê. Naquele momento descobrira que ele realmente a amava, e não estava somente à procura de diversão.
Sua mãe sempre dissera que as ações valiam mais do que palavras. Bem, na mente de Lily, casamento envolvia amor e comprometimento. Não era apenas fisicamente que James a queria... Algo que a mãe sempre dissera em relação aos seus namorados anteriores.
Lily imaginava se era isso o que sua mãe pensava de si mesma no passado. Que os homens em sua vida haviam ficado cegos por sua aparência, e que nenhum deles jamais amara a verdadeira Lisa. Quando jovem Lisa fora uma mulher estonteante, com longos cabelos ruivos, pele perfeita, grandes olhos verdes, lábios carnudos e um corpo que parecia ter sido concebido para o pecado. Com frequência, diziam a Lily que ela lembrava muito a mãe quando jovem.
De qualquer forma, os anos haviam sido inclementes com Lisa Evans. O vício do fumo envelhecera-lhe a pele, e a amargura provocara-lhe rugas ao redor dos olhos e da boca. Os cabelos, outrora longos, estavam agora cortados bem curtos e suas raízes eram grisalhas. Feminista convicta, a mãe de Lily nunca ia ao cabeleireiro nem usava maquiagem. Também estava demasiadamente magra na opinião da filha, talvez por viver basicamente de cigarros e café. A saúde da mãe deixava Lily preocupada.
— Creio que você, sendo tão romântica, nem sequer considerou a possibilidade de um aborto — Lisa murmurou.
Naquele momento Lily quase a odiou.
— Não considerei isso nem por um instante — disse indignada. — Eu amo James, mãe. Com todo meu coração.
— Não tenho nenhuma dúvida sobre isso, querida — Lisa replicou, mantendo, porém, uma expressão nitidamente cínica — Por que mais uma garota inteligente dormiria com um homem sem usar proteção? Só não entendo por que o sujeito não pensou nisso...
Lily de maneira nenhuma iria admitir que ficara instantaneamente tão atraída por James a ponto de deixar-se levar pelo impulso. Apesar de ser estúpido, não quisera interromper o amado naquela primeira noite para falar sobre métodos contraceptivos. Além disso, não imaginava estar em seu período fértil. A mesma coisa havia acontecido noite após noite na semana seguinte.
Mas, obviamente, Lily se enganara. Quando seu ciclo não chegou no fim daquela primeira semana maravilhosa, ela não entrou em pânico. Entretanto, os dias foram passando em crescente tensão, até que, finalmente, um teste de gravidez confirmou que Lily ia ter um bebê. Nunca tivera intenção de lançar mão de qualquer artifício para forçar James a se casar. Na verdade, apenas agira de maneira inacreditavelmente estúpida!
E ele fora maravilhoso ao saber da notícia, não ficando nem um pouco irritado, na verdade, James a confortara e a acariciara enquanto ela chorava, parecendo uma rocha sólida e firme ao ouvi-la confessar que não sabia o que fazer.
— Não se preocupe, mi micetta — ele murmurara suavemente, abraçando-a. Sempre a chamava daquele jeito. A palavra significava "gatinha". James dizia que ela agia como uma gata depois que faziam amor, aninhando-se em seu peito como uma pequena felina. — Vamos nos casar logo que for possível. Mas não será uma grande cerimônia. E temo que, pelo menos agora, não poderemos ter uma lua-de-mel. Não disponho de tempo para isso no momento.
Só mais tarde ela se sentiria culpada por ter decepcionado James, mas não em seus braços, nunca quando ele a chamava de sua micetta.
Também se sentia culpada agora. Não sobre James, e sim quanto à mãe. Lisa provavelmente sentia-se magoada por ser a última a saber de tudo.
Mas Lily recusava-se a pedir desculpas. Não podia baixar a guarda. Sabia que, se fizesse aquilo, Lisa Evans à atacaria direto na jugular.
— Então... O que seu futuro marido faz para viver? — a mãe perguntou abruptamente.
— Ele é empresário. A companhia da família dele comercializa produtos italianos em todo o mundo. James está prestes a abrir um escritório e um armazém aqui em Sídnei.
— Ora, ora... — Lisa murmurou. — E onde encontrou esse... James? Ele não me parece ser seu tipo usual de namorado.
— James esteve vivendo em uma suíte do Majestic até conseguir comprar uma casa — Lily disse, observando o efeito que tal informação provocaria.
O Majestic era um dos hotéis mais caros de Sídnei, um lugar luxuoso com vista para a baía e a Opera House, que sempre hospedava celebridades das artes e da política internacional. Lily já trabalhava no lugar havia seis meses quando, em fevereiro, em uma noite quente de verão, cerca de dois meses antes, ergueu os olhos da tela do computador e viu pela primeira vez o rosto incrivelmente sexy de James.
— Qual é o nome completo dele? — Lisa indagou secamente. — Quero saber quem é este homem ótimo e bem-sucedido chamado James, que engravidou minha filha mas não teve coragem de vir até aqui me encarar.
— Ele queria vir — Lily protestou. — Fui eu que insisti em vir sozinha primeiro.
— Verdade?
— Sim, verdade. O nome dele é James Potter — ela anunciou com orgulho. Sabia que aquele era o nome de uma família muito tradicional. James tinha lhe contado que vários de seus ancestrais eram pessoas célebres na Itália. Um deles, do qual James descendia em linha direta, fora um importante poeta no século dezoito.
— Ele é italiano? — Lisa perguntou horrorizada.
Lily foi pega de surpresa pela reação da mãe.
— Bem... sim. Ele nasceu em Milão. Mas fala inglês perfeitamente — apressou-se em acrescentar. — Viajou muito com os pais quando era criança. Ele estudou em Harvard, depois trabalhou durante alguns anos em Nova York, Londres e Paris. E agora está aqui, em Sídnei. Na verdade, quase não tem sotaque. — Apenas o bastante para ser muito, muito sexy.
— O sotaque dele não é problema, Lily — a mãe replicou. — Com ou sem sotaque, o homem é um italiano.
— E qual e o problema com isso?
— Pelo menos agora estou entendendo por que ele vai se casar com você — Lisa murmurou. — Um homem australiano teria fugido da obrigação. Os italianos tradicionalmente são muito ciosos com esse tipo de coisa... quero dizer, filhos, se é que me entende. Mas espero que saiba, Lily, como eles costumam tratar as mulheres a partir do momento em que colocam uma aliança em seus dedos, transformando-as em esposas. Como se fossem cidadãs de segunda classe. As esposas italianas são tratadas como escravas e parideiras de filhos...
— James não é assim! — Lily defendeu-o, e suas feições tornaram-se imediatamente furiosas. Era muita petulância de sua mãe criticar o homem sem nem ao menos conhecê-lo. — E você está enganada sobre os homens italianos. Sua opinião é ignorante, muito ofensiva!
Ela sabia disso porque a melhor amiga que tivera no colégio era italiana, e seu pai era um homem maravilhoso. Lily adorava passar as tardes na casa de Antonia. O ambiente ali era muito melhor do que em sua casa. Nada de tensão ou discussões... apenas conforto, intimidade e amor.
— Não seja ridícula — Lisa disparou. ― Todos os homens são iguais, basta que você lhes dê oportunidade. Mas o chauvinismo é uma norma entre os italianos. Eles se acham deuses em seu próprio âmbito familiar e exigem ser tratados como tal. Mulheres italianas aprenderam a suportar isso, pois cresceram com valores e expectativas diferentes. Mas você não é italiana, Lily. Você é australiana, e também é minha filha. Existe mais de mim em você do que imagina, quer queira ou não. Ele vai fazer sua vida parecer miserável. Guarde minhas palavras.
— Você está errada! — Brooke replicou indignada. — James não vai me fazer sofrer... nem eu a ele. E eu não sou como você. Em nenhum sentido. E para mim, James é um deus. Nada é bom o bastante para ele. Nunca vou fazê-lo me deixar, como você fez com papai, com suas discussões e críticas constantes. Não me admira o fato de ele tê-la deixado. Vou dar a meu marido tudo o que ele quiser. Estarei a seu lado sempre que ele precisar.
— Vai se tornar companheira de quarto dele, é isso que quer dizer.
— Nada disso. Serei esposa dele!
— É a mesma coisa, aos olhos de certos homens.
Lily meneou a cabeça, acometida por um misto de desespero e frustração.
— Você não faz a menor idéia do que é preciso para fazer um homem feliz. Nunca fez.
— Não mesmo, se isso significasse que eu deveria suprimir cada pensamento, desejo e opinião que tinha em mente. Você é uma garota inteligente, Lily. E muito teimosa também... Se acredita que basta se doar totalmente a alguém para conquistar a felicidade, então vai ter uma surpresa mais cedo ou mais tarde.
Não houve resposta. Lily limitou-se a cerrar os dentes e contar até dez.
— Vai comparecer ao meu casamento ou não? — finalmente perguntou.
— Isso faria alguma diferença?
Um pesado suspiro escapou dos lábios de Lily.
— Claro que faria diferença. Queria que você estivesse lá. Você é minha mãe.
— Então estarei lá. Como também estarei ao seu lado quando a lua-de-mel acabar... E esse dia chegará, Lily. Pode acreditar em mim.
— James e eu nunca iremos nos divorciar, nunca!
— Diz isso agora — Lisa murmurou, acendendo outro cigarro. — Veremos quais serão suas palavras daqui a cinco anos.
— A resposta será a mesma.
— Espero sinceramente que sim, querida. Agora... — A mulher tragou o cigarro, deixando a fumaça escapar lentamente. — Vou conhecer esse italiano ou não? — Seus lábios curvaram-se em um sorriso matreiro. — Presumo que seja bonito... Nunca a vi sair com um homem feio, não você, querida.
O queixo de Lily ergueu-se perceptivelmente.
— Ele é muito bonito.
— Então vá buscá-lo. Estou começando a ficar curiosa sobre esse tal James Potter.
Era Lily quem sorria quando levou James à presença da mãe, abraçando-o de forma possessiva e protetora. Sorria por saber que seu futuro marido não era apenas bonito. Ele era magnífico, em todos os sentidos.
Um homem de trinta e dois anos, maduro e sofisticado, bem alto para um mediterrâneo, com um corpo perfeito e um rosto que provocaria a inveja de muitos astros do cinema. Lily considerava-o o homem mais lindo que já vira.
Mas o comportamento dele era o que mais impressionava. A perfeição no trajar, os movimentos firmes, mas graciosos...
O sorriso de Lily acentuou-se quando ela notou a expressão espantada da mãe, que estava literalmente surpresa.
— Este é James, mãe — ela apresentou, fingindo casualidade estreitando ainda mais o abraço possessivo no noivo.
Lisa Evans, pela primeira vez na vida, ficou completamente sem palavras.
