"E então eu menti para aquele heroizinho de meia-tigela dizendo que meu plano não daria certo se, de fato, ele não tivesse vindo atrás daquela garçonete bulímica."
O vilão que estava a contar sua mais última, e aparentemente cômica, peripécia, segurava, em uma das mãos, uma taça de vinho caro - cortesia do anfitrião - da qual Flug já havia provado e se desfeito discretamente em uma vaso de planta. Estavam ele, o vilão, e mais quatro convidados. Todos conhecidos por alguns de seus feitos e conquistas horripilantes e vilanescas. Flug, com sua máscara habitual de saco cor escura, apresentou-se como um cientista maligno de um outro vilão a qual não se encontrava no recinto - e se uniu a conversa para que não fosse julgado como suspeito de nada que viesse a acontecer.
"Típico deles, sempre indo atrás das damas em perigo. A maior fraqueza deles e, ao mesmo tempo, nosso principal plano B." comentou outro vilão do círculo.
O cientista concordou com a cabeça, ainda que relutante, para se enturmar. Apesar de sua ética estar revirando os olhos e tendo uma discussão séria com seus valores morais.
"Tsch," Ouviu-se um reclamar. "Amadores."
Entreolharam-se.
"Não lhe culpo de usar iscas bobas para atrair seu inimigo," Todos focaram seus olhos em um ser elegantemente negro, com uma pele literalmente escura e um terno breu como o mesmo. Sua voz era rouca e profunda, como se sons estivessem desesperadamente tentando sair dos confins de sua laringe. "... afinal, todo principiante ou vilão inábil usufrui dessa pequena fraqueza constantemente."
Este ser, de cartola e bengala, com um sorriso arrepiante de dentes pontiagudos e pupilas finas como de um gato arisco, olhava para o vilão em questão com desdém e humor. Sua presença era ameaçadoramente atraente, notou Flug.
O vilão franziu o cenho e pôs a taça de vinho na bandeja de um garçom que passava.
"Quem você pens-" Começou o vilão, mas foi interrompido por um dos outros convidados que encontrava-se na roda. Uma mão havia pousado sobre seu ombro e o apertado transmitindo um recado calado.
Nem mais um segundo depois, apareceu o anfitrião do baile, com um sorriso ganancioso no rosto pálido e fino. De nome difícil de se pronunciar, popularizou-se sob o codinome de Lorde Lúrido Vil.
Lorde Vil era, de fato, um iniciante, porém estupidamente rico. - Flug recordou a história que seu irmão havia lhe contado antes que eles se infiltrassem no baile.
"Não é nada fácil conseguir mercadoria de caras como esse tal de Lorde Vil. Sua clientela é bastante específica e normalmente listada pelos fornecedores com cadastro e tudo o mais." Disse seu irmão enquanto estavam preparando todas as escutas e microfones em seus trajes "A equipe de combatentes que nos contratou está do lado dos mocinhos, então dessa vez vamos ter que se passar por vilões."
Não que isso importasse, porque o negócio deles não tinha lado. O cientista e seu irmão Slug comandavam um laboratório de equipamentos diversificados para todos os tipos de funções, principalmente equipamentos de espionagem e armadilhas. Em algumas ocasiões eles ainda eram contratados como infiltrantes para obter dados e informações - o qual receberiam ainda mais pela mão de obra.
Não havia um única pessoa que os conhecia pessoalmente pelo serviço que prestavam, por esse motivo, agir em ambos os lados tornava as coisas ainda mais fáceis.
"Temos que entrar lá e obter o máximo de informações possível sobre quem é seu principal fornecedor e sua localização, e onde fica o laboratório e o estoque de matéria-prima." Terminando de ajustar seu terno e gravata sobre o microfone, Slug puxou sua máscara de saco e a colocou sobre a cabeça. "Não é complicado, mas pode ser um pouco trabalhoso, então Flug - " Virou para olhar seu irmão, que imitou seu gesto assim que havia terminado de botar seu próprio saco na cabeça. " cuidado com os vilões mais velhos, e não se envolva em nada que eu não consiga te salvar, por favor."
Revirando os olhos uma última vez, Flug fechou o porta malas do carro e bipou o alarme.
"Ora, Ora, Ora. Vejam o que temos aqui." Disse Lorde Vil assim que se aproximou o suficientemente para entrar na conversa engajada e interrompida dos vilões na roda ao qual o cientista estava. "Dois novatos, dois experientes, um cientista e um ancião" Brincou com a última palavra, enrolando-a na ponta da língua como uma brincadeira bem humorada. Continuou com seu sorriso de canto.
O ser maligno e bem vestido, apoiado em sua bengala, fitou com seriedade o mais novo integrante da roda com um sorriso congelado em seu rosto.
"Sinto lhe informar que errou sua conta, novato." Respondeu o demônio ajustando seu monóculos com delicadeza e precisão, descongelando seu sorriso para abri-lo mais, mostrando seu dentes afiados.
"Peço por gentileza que não me menospreze na presença de tantos convidados, Sr. Black Hat." Enquanto alguns outros vilões se entre-olhavam pela descoberta da face por trás do nome conhecido, Lorde Vil abaixou a cabeça com, claramente, respeito e continuou "Afinal, o senhor é um dos meus fornecedores mais importantes e meu negócio certamente é um sucesso graças a você." Terminou esboçando um sorriso falso e humorado, sabendo que enaltecimento era a saída mais perfeita para uma discussão com a personificação do horror.
"Bajulação não lhe cai bem, mas é gratificante ser reconhecido." O ser demoníaco deu de ombros e tomou mais um gole do líquido de sua taça, a qual Flug tem uma leve impressão de não ser vinho.
A ideia não agradou seus nervos.
O vilão anterior, ao qual aparentemente havia sido insultado de inábil pelo, agora descoberto, maior vilão já conhecido, iniciou outra discussão com o anfitrião do baile, optando - com toda a razão do mundo - deixar quieto o insulto.
O cientista tomou essa deixa para então notar a figura marcante e sombria a poucos metros de si, sob o famoso nome de Black Hat. O qual era um dos principais fornecedores de Lorde Lúdico Vil - descobriu.
1 Ponto para Flug.
"Quem você disse que era mesmo?" Escutou a voz rouca mais perto do que esperada. O demônio provavelmente havia se movido para perto enquanto Flug se debatia sobre como descobrir mais informações do mesmo.
"Ah- Me chamo Dr. Permisto, sou o cientista chefe do Tenente Coronel Devasso." apurou-se para responder assim que conseguiu se lembrar das informações a qual carregada com o disfarce "É um grande prazer te conhecer, Sr. Black Hat." estendeu a mão, congelando-a no lugar ao notar que o mesmo o encarava questionável.
Antes que Flug pudesse suar frio, o demônio em pessoa sorriu novamente com aquelas duas fileiras de dentes afiados e ameaçadores, e apertou-lhe a mão em resposta.
"O prazer é todo meu, Doutor." Abriu ainda mais o sorriso.
E Flug notou que as pupilas reptilianas e avermelhadas de Black Hat se contraíram lascivamente quando, ao convidá-lo para uma taça de vinho em outro canto do salão, o mesmo disse sim.
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4 Pontos para Slug.
"Hmmm, e onde você disse que ficava o laboratório mesmo?" Perguntou Slug encostado em uma parede detalhada com esculturas artesanais, segurando uma das taças de vinho oferecidas pelos garçons.
"Fica perto de Guadalajara, dentro de uma mansão relativamente grande. Aposto que você ia adorar, eu sempre tomo conta para que o espaço seja do agrado de meus funcionários e convidados de honra." Soou libidinoso o ser de terno branco e cartola apoiado ao seu lado.
"Aposto que sim." Sorriu Slug travesso, brincando com a gravata azul do demônio escuro com quem conversava e anotou mentalmente - 5 Pontos para mim.
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"Devasso te paga bem?"
A pergunta pegou Flug de surpresa, não só porque ele não estava preparado para ter essa informação tão específica. Mas havia se passado literalmente 10 minutos de silêncio entre ambos a ponto do cientista se perguntar se ele deveria puxar assunto ou fugir para o banheiro antes que o demônio abrisse uma cratera no chão que o engolisse por ser uma companhia tão miserável e tediosa.
Flug respirou fundo antes de responder, recompôs seus nervos e fingiu ser o mais sincero possível, tentando ignorar o fato de que sua companhia era um demônio ancião mundialmente conhecido e temido.
"Ninguém paga um cientista com doutorado o tanto que ele de fato merece." Suspirou e sorriu de leve.
Não deixava de ser verdade, tanto com heróis quanto com vilões, nenhum chefe que Flug já teve desde de sua graduação foram bons o suficiente ou pagaram o necessário para suas pesquisas - Flug sempre tirava parte da pesquisa do bolso, ou de empréstimos de banco, até que Slug o convenceu de abandonar tudo e abrir uma empresa, sem vínculos morais, juntos.
"É… acho que você tem razão." Comentou o demônio. "Mas se me permite comentar," continuou, chamando a atenção do cientista "antigamente era muito pior. Na época em que vocês decidiram que queimar uns aos outros era normal, eu não podia se quer contratar alguém, que construísse qualquer coisa para destruir uma mísera cidadela, que um de vocês ia lá e queimava o coitado."
Flug riu.
E riu muito.
Quando decidiu parar de rir e limpar seus olhos por debaixo do saco, voltou a olhar o ser maligno que lhe fazia companhia, notando que o mesmo esboçava um sorriso de canto.
"E depois?" perguntou bem humorado "conseguiu um cientista ou se vingou de todo mundo?"
O demônio esperou o garçom terminar de abastecer sua taça do líquido pastoso do qual vinha tomando o encontro inteiro, degustou em um pequeno gole antes de responder, olhando para flug.
"Lancei a peste bubônica."
Flug segurava sua barriga por causa da dor de tanto gargalhar.
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Slug já não sabia mais quantos pontos tinha, só sabia que o suficiente já havia sido gravado.
E o que estava prestes a acontecer não era da conta de mais ninguém.
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Naquele momento da noite, já havia passado das 22hs e muitos vilões já haviam ido embora, mas uma grande parte deles estavam ainda bebendo e conversando alto, rindo e se sentindo completamente a vontade. Não era exceção para Black Hat e Flug. Estavam ambos tão a vontade que nem mais pareciam ser desconhecidos.
O demônio, sinistro e preto como o céu daquela noite sem estrelas, havia dobrado ambas as mangas compridas de sua camisa social rubi vibrante e já desfeito sua gravata, seu blazer há tempos posto nas costas da cadeira. E o cientista, muito parecido, havia também retirado suas luvas e desfeito parte dos botões de sua blusa interna cor branca - também já sem blazer.
"Nossa, eu detestava aquele cara, ele era um babaca." Black Hat ria confortavelmente, dando uma tragada em seu cigarro. "Ele não podia se quer admirar alguém que isso subia pra cabeça dele, e transformava aquilo em uma idolatria ridícula e nada profissional." Apoiou-se nas costas da cadeira, descruzou e cruzou as pernas novamente trocando-as de posição. Inclinando-se mais para perto do cientista que esboçava um sorriso gigante em seu rosto já corado de tanto rir, e de álcool, claro. "Sério, antes de mim tinha um cara chamado Vladimir Lenine, ou alguma coisa assim, que, sério, era como uma paixão secreta dele."
Rindo abertamente, Flug não conseguiu conter uma surpresa no tom da voz "Nãããão, o Lênin?!"
"É," Respondeu soltando a fumaça finalmente " acho que é pelo menos, nem lembro mais." Deu de ombros o ser sombrio levemente corado pela quantidade de álcool ingerida.
"A gente está falando do mesmo cara?" Perguntou o cientista limpando os resquícios de lágrimas que teimavam em voltar toda vez que sua companhia resolvia responder com algo engraçado, que, sinceramente, podia ser qualquer coisa, porque nesse momento tudo era motivo para dar risada.
"Eu deixei dúvidas?" Black Hat franziu o cenho levemente e o encarou profundamente, cortando momentaneamente o clima que estava ali a um segundo atrás.
Flug sentiu um arrepio percorrer sua coluna vertebral, e respirou fundo. Não sabia exatamente o que sentir, medo? incomodação? alguma coisa mais carnal?
Os olhos avermelhados do demônio fitavam os seus sobre os óculos como se o hipnotizassem.
Flug estava realmente em dúvida.
"... Josef S-Stalin?" Perguntou o cientista relutantemente, não gostando muito do silêncio que pairava entre os dois.
Na verdade nada parecia estar certo entre os dois, tipo, ar, espaço, qualquer coisa que estivesse separando eles.
Jesus Cristo, o álcool estava afetando.
Black Hat sorriu com aquelas duas fileiras perfeitamente simétricas de caninos que poderiam rasgar qualquer coisa que ousasse pousar entre eles.
O cientista mordeu seus lábios por dentro da sacola.
"O primeiro nome dele era Josef?" Brincou o demônio elegantemente, com uma voz aparentemente ainda mais rouca, dando mais um trago de seu cigarro. "Enfim, depois que a esposa dele - que era confidente do cara - se suicidou, rolou uma briga e pelo jeito não se falaram mais." terminou soltando o ar e admirando o líquido em sua taça.
"Hmmm, então o senhor teve influência direta com a segunda guerra mundial, aparentemente." Comentou o cientista apoiando-se em um dos braços da cadeira com seu cotovelo, ousando inclinar-se.
"Confesso que a idéia de ignorar a Ucrânia durante ela foi minha." Acenou com a cabeça de um lado para o outro como se contemplasse a lembrança, terminando o líquido que a algum tempo estava ainda para ser bebido.
Depositando a taça sobre qualquer coisa que a apoiasse próxima, Black Hat voltou a sua posição anterior, notando que o cientista havia se aproximado ainda mais. Sorriu maliciosamente.
"E você, Doutor Premisto?" Perguntou a criatura para o cientista ao seu lado, claramente alterado pelo álcool.
"Hm?" Indagou.
"Alguma invenção, feito, proeza, peripécia?" Soltou a última palavra com humor, relembrando ambos do demérito do outro vilão mais cedo daquela noite.
"Ah, sim!" Disse o cientista tentando lembrar de algo que fosse no mínimo interessante comparado com as histórias fantásticas que escutará durante boa parte da noite. "Hmm, eu construí um aparato de anti-gravidade semana passada…?" terminou como se estivesse em dúvida de que o assunto fosse interessar sua companhia, esperando uma resposta para alterar ou continuar a história.
Black Hat arqueou uma sobrancelha.
"Achei que Tenente Coronel Devasso só elaborava armas de fogo." Disse.
…Flug, seu idiota.
"Sim, sim. Claro." Apressou-se para corrigir o que dissera "Esse protótipo é na verdade só um projeto novo que eu fiz durante… um período curto de tempo livre que eu tive..." terminou, coçando sua nuca por debaixo do saco que cobria sua cabeça.
Black Hat, fumando enquanto olhava o cientista se explicar, sorriu com humor contido.
"Então você tem tempo livre constantemente?" Perguntou sem desfazer seu sorriso e contato visual.
Já a algum tempo afetado pelo álcool em seu sangue, Flug respirou fundo tomando coragem para investir em uma pequena chance que lia no ar.
"Não tanto quanto gostaria." disse "Então eu normalmente tento aproveitar o máximo da oportunidade que me dão." terminou, estudando-o com as pálpebras entreabertas.
E se estivesse certo...
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Colocando sua camisa social, Slug sentiu ser abraçado por trás.
"Não quer ficar mais uns minutos?" Ronronou o demônio seminu sorrindo contra sua nuca, depositando ali um carinhoso beijo. "Talvez dar uma volta pelo jardim no palácio?"
"Não." respondeu Slug, terminando de abotoar sua camisa social.
Se desvinculou do abraço para que pudesse procurar pelas suas calças. Quando a encontrou, agachou-se para pegar. Sentiu algo levantar sua blusa, descobrindo sua cueca e, logo, deixando a mostra a silhueta de suas nádegas. Slug levantou-se rápido antes que o ser de estatura maior tivesse chance de algo.
Encarou-o por trás de um ombro.
O demônio sorriu maliciosamente e arqueou ambas as sobrancelhas simultaneamente.
Slug franziu. "Essa noite já acabou para você."
"Trabalhe pra mim." Disse White Hat.
O cientista revirou os olhos, nenhum pouco humorado.
"Já sou cientista de alguém, lembra?" Respondeu, vestindo suas calças.
Seu braço foi puxado, assustando o cientista. Colidindo de frente com o peito do ser escuro, que havia fechado a cara mas ainda esboçava gentileza. Encarava profundamente os olhos de Slug por dentro de seus óculos, fitando com atenção como se tentasse descobrir algo.
Que, assim que se recuperou da surpresa, franziu incomodado com atitude do outro.
"Me. Solta." Disse o cientista ríspido.
White Hat o soltou, e, sem pensar duas vezes, Slug colocou seus sapatos sociais, recolheu seu blazer e saiu pela porta do quarto.
A criatura, assim que viu a porta se fechar, suspirou. Estalou os dedos e seu traje reapareceu em si mesmo, deixando uma fina cortina de fumaça cinza claro no ar. Colocando a mão em seu bolso, White Hat retirou um aparato minúsculo e quase ignorável, franziu as sobrancelhas uma última vez em desgosto e quebrou o item entre dois dedos antes de se retirar do quarto.
-:-:-:-
E não, assim como a maior parte das escolhas de sua curta vida, ele não estava nada certo.
"Se eu te pagasse três mil reais por mês, você trabalharia para mim?"
Flug se desmoronou completamente começando pelo seu equilíbrio no braço da cadeira. Só de pensar seu rosto avermelhou-se de vergonha e arrependimento. Não dava para acreditar em uma coisa dessas. O clima estava perfeito para um convite, um beijo, um qualquer coisa. Menos um tapa na cara como essa.
E em menos de um segundo, Flug respirou fundo e saiu completamente de encabulado para puto.
"O-oq-voc-" Bufou sem saber direito o que responder "É sério?! I-Isso nem chega no piso salarial!" Não percebia que o tom de sua voz havia aumentado consideravelmente "Q-quer saber, já está tarde e eu preciso ir agora." levantou rápido de seu lugar, recolhendo seu blazer e pensando em uma maneira ainda mais rápida de encontrar seu irmão, e dar o fora dali.
Black Hat perdeu completamente o sorriso ao ouvir a primeira resposta do outro, nem sequer notando que seu cigarro já havia queimado completamente em sua mão. Não, ele não podia deixar o cientista ir assim. Não depois de investir nele a noite inteira.
Flug sentiu-se ser agarrado pela cintura com algo muito parecido a um tentáculo sem ventosas. E ser levantado a não muitos centímetros do chão - o impossibilitando de fugir. Olhou por cima do ombro, notando que o dito tentáculo havia vindo diretamente de sua companhia anterior, o qual não esboçava uma faceta muito agradável.
Engoliu a seco ao ver o demônio levantar-se da cadeira e a se aproximar.
"Não ouse fugir." Suas pupilas afinadas o perseguiam "Eu ainda não consegui o que queria." Sua voz rouca podia ser sentida pelos nervos à flor da pele do cientista, e a aproximação acentuada não ajudava em nada seu arrepio.
"Então estamos quites" respondeu ríspido, sentindo uma pontada de dor onde o tentáculo apertava-o ainda mais.
Não estava preparado para a velocidade em que sentiu seu corpo virar, o assustando. Mas certamente, sentir seu peito confrontar o corpo do demônio, agora, a sua frente, era ainda mais desconcertante.
Ainda mais porque o clima não era exatamente o que Flug desejava, e ainda sim seu corpo respondia só de teimosia.
Maldito álcool.
E… cheiro de colônia masculina misturado com fumaça?
"Eu vim a procura de um cientista." Disse Black Hat com a seriedade que somente um ser ameaçadoramente repugnante conseguiria. "E eu não pretendo ir embora sem um." Rangeu os dentes perfeitamente afiados enquanto encarava os olhos suplicantes de medo, ou seja lá o que estivesse misturado com isso, dentro daqueles óculos redondos de armação grossa.
"Que pena, precisamos ir agora." Ambos escutaram uma terceira voz dizer.
Black Hat franziu enquanto desviou seus olhos pela primeira vez para encarar o intruso da discussão. Flug suspirou aliviado.
Slug, com suas vestes completamente desarrumadas, sacou uma pequena agulha de dentro de sua gravata e mirou nitidamente para o tentáculo envolta de seu irmão. Jogou, acertando-o em cheio.
Black Hat sentiu uma pontada de choque elétrico percorrer o tentáculo onde foi acertado e ir de encontro com sua coluna vertebral, assustando-se por estar despreparado. O mesmo membro atingido recolheu-se para dentro do corpo negro como breu, e Flug correu para o lado de seu irmão assim que seus pés tocaram o chão.
Slug, sem perder tempo, puxou Flug para fora do salão principal em direção ao estacionamento.
"Como você ousa?!" gritou indignado o demônio de cartola preta, enfurecendo-se enquanto olhava - ao mesmo tempo confuso - os dois irmãos quase idênticos, correrem para longe.
Quando chegaram ao carro alugado estacionado metros a frente, entraram rapidamente e Slug, o motorista, apressou-se para retirá-los do local. "Desculpa atrapalhar seu encontro, mas já consegui o que viemos buscar."
Flug, no banco do carona, cobriu seu rosto com ambas as mãos, por de baixo de sua máscara, enquanto gritava internamente consigo mesmo sobre todas as escolhas infelizes daquela noite.
"Não rolou nada." Confessou tristemente.
Slug olhou de canto para seu irmão dois minutos mais novo. Optando por ignorar o fato de que o ser maligno, - ao qual Flug escolheu ter companhia durante a maior parte da noite - era literalmente parecido com a sua própria escolha de acompanhante.
"... você merece coisa melhor." Comentou, franzindo como se as palavras estivessem servido para si mesmo.
-:-:-:-
White Hat apareceu de trás de um pilar branco de sustentação, próximo a seu irmão ainda enfurecido no lugar, com uma taça de vinho branco em mãos.
"Uma graça seu acompanhante." Sorriu em meio a um gole, vendo seu irmão bufar de raiva.
Black Hat recompôs-se, voltando a sentar-se e cruzando os braços, "Companhia," bateu os pés impacientemente " e não acompanhante." terminou a explicação curta, acendendo mais um cigarro.
"Hmmm," Começou seu irmão bem humorado. "Que pena para você, não é mesmo?" Brincou, sentando na cadeira anteriormente ocupada por Flug.
Black Hat arqueou uma sobrancelha desconfiado de seu irmão, um tanto quanto humorado demais para seu gosto. White Hat retribuiu o olhar aumentando ainda mais seu sorriso, e tomou mais um gole de seu vinho branco.
O ser demoníaco de blusa cor rubi franziu e de olhos semicerrados julgou seu irmão. "Você cruzou?"
Riu abertamente o demônio de terno branco. "Felizmente sim. Mas não tanto quanto eu gostaria."
"Argh." Expressou nojo, seu irmão fumante.
"Você não tem direito de me julgar" White Hat retrucou brincando com o líquido em sua taça. "Mas enfim," mudou de assunto, após tomar mais um gole "conseguiu contratar algum cientista de seu agrado?"
O demônio de cartola preta bufou de raiva tragando uma última vez e queimando o braço da cadeira com a ponta do cigarro. Levantando-se e desaparecendo em uma cortina de fumaça negra.
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Nota da Autora:
Tudo o que eu queria era escrever umas One-Shots, juro.
Aceito Beta-Readers.
