Nota: Os personagens de Naruto não me pertencem, pertencem ao seu criador Kishimoto Masashi e empresas licenciadas. Fic sem fins lucrativos a não ser diversão. Feito de fã para fã.
Uma boa leitura a todos!
Open your eyes
Capítulo I: Luz e trevas
O rapaz caminhou até a janela, nu e no escuro do quarto. O barulho e as luzes vindas lá de baixo o incomodavam, mas não mais do que o sonho que havia acabado de ter. Sasuke havia despertado suado e tremendo, atemorizado, como se ainda fosse um garotinho. Os anos haviam se passado e, no entanto aqueles pesadelos continuavam a perturbá-lo constantemente. Olhos vermelhos, olhos cor de sangue, os olhos do irmão mais velho, e sua família morta numa poça de sangue. O demônio que o perseguia em sonhos se chamava Uchiha Itachi, mas ele era mais que um personagem obscuro criado por sua mente. Ele era real. Itachi havia matado toda a família, mas o havia poupado, um menino de sete anos. Nunca o haviam encontrado e nunca Sasuke conseguiu entender o porquê daquilo. Por que Itachi o havia poupado? Por quê? Não havia um porquê. Não se explica por que alguém decide matar toda a sua família numa noite qualquer. Nem mesmo depois de anos de terapia forçada, Sasuke conseguiu compreender aquilo ou perdoar o irmão. Itachi havia lhe arrancado tudo o que tinha, como iria conseguir perdoá-lo? Tudo o que queria era vingança e sabia que um dia a teria. Encontraria Itachi, lhe arrancaria os olhos e depois o coração. A luz iria esvaecer de seus olhos vermelhos e só lhe restaria trevas, as mesmas trevas que havia plantado em seus olhos de criança.
-Sasuke-kun?
A loira o chamou da cama, nua e despenteada, tanto quanto a cama estava bagunçada. Ainda que seus olhos estivessem piores e não conseguisse ver com clareza, Sasuke sabia o quanto Ino era bonita e o quanto aquela visão era tentadora devido ao tanto de vezes que já a havia tocado. Conhecia-a pelo tato, mas ainda conseguia apreciar o fulgor de seus olhos cor de safira quando estavam colados um no outro e a fazia gemer. Gostava da coragem dela, de sempre fitá-lo nos olhos quando muitos mais temiam fazer. Sakura sempre evitava seus olhos.
Ainda sim não gostava de Ino, não como ela esperava que gostasse.
Ino, embora fosse difícil acreditar, chefiava o setor de homicídios de Tóquio e talvez por esse mesmo motivo ainda continuassem a se encontrar sempre que vinha à capital. Qualquer fagulha de esperança que envolvesse o paradeiro de Itachi lhe interessava e Ino era uma ferramenta para isso, ainda que falha. Ino nunca tinha nada a lhe contar sobre Itachi. Ninguém tinha. Todavia, Sasuke conhecia outros meios para conseguir o que queria. E conseguiria o que queria, ainda que precisasse utilizar de meios ilícitos para isso.
Quando não se afastou da enorme janela de vidro, Ino se levantou e caminhou até onde estava.
Loira, linda, nua e manhosa como uma gata no cio, ela se aproximou, com passos suaves como se sequer tocassem o chão. Ino sabia o poder que sua beleza exercia sobre os homens e sabia usá-lo muito bem, mas isso também era um fardo na profissão que havia escolhido. Tinha de lidar com a escória, e a escória a via como uma puta, loira e gostosa que pensava ter poder suficiente para trancafiá-la no fundo de uma cela. Não uma, nem duas, e nem três, mas centenas de vezes ela havia se queixado sobre como não a respeitavam. Primeiro por ser mulher, e depois por ser uma mulher bonita. Ino era boa no que fazia apesar de sua falha com Itachi, entretanto era constantemente alvo não somente do lixo que recolhia das ruas, mas também da mídia. Sempre havia algum repórter pronto a lhe apontar falhas ou até mesmo colegas de profissão, e obviamente que não sobre sua aparência. Quando algum ladrãozinho dito como pé-de-chinelo escapava depois de tentar estuprar uma balconista, Ino era apontada como: "A loira gostosa realmente tem mais peito do que cérebro!"; mas quando prendia um serial killer, ninguém, absolutamente ninguém, aplaudia. Havia prendido ainda há pouco um serial killer conhecido como Hidan, um homem perigoso que aparentemente participava de uma espécie de seita que envolvia morte, sangue e corpos mutilados.
Ino o beijou.
-Parece perturbado. –ela murmurou acariciando-lhe o rosto com carinho. –Talvez eu não tenha lhe dado... atenção suficiente. Relaxe. Mas não muito.
Ino riu, um risinho malicioso que tintilou em seus ouvidos. Suas mãos outrora em seu peito deslizaram perigosamente por seu abdômen e além dele. Ino também era boa naquilo, pensou Sasuke quando sentiu os lábios macios da loira se juntarem à brincadeira.
Ino era sua válvula de escape e o deixaria tão cansado que seria incapaz de voltar a sonhar.
Ledo engano.
Os pesadelos sempre retornariam, cedo ou tarde.
Dessa vez cedo demais.
...
O túnel era escuro e infinitamente longo, seu teto baixo para um adulto, mas ainda sim o atravessou. Com seus passos de menino lentos por causa do medo, demorou a encontrar a saída, uma pequena fresta luminosa no fim do longo corredor pedregoso e lamacento. Seus olhos já haviam se acostumado com a escuridão quando enfim a luz os invadiu e cegou. Cobriu os olhos com o antebraço protegendo-os da claridade e só então olhou para a paisagem que se estendia à sua frente. O que via era diferente de tudo o que um dia havia visto na vida, sua pequena vida de criança. Era lindo, indescritível com palavras, e havia compensado valentemente suprimir o medo de atravessar aquele longo corredor escuro. Ali tudo era luz e o medo não tinha espaço, tão pouco as trevas. Estava envolto em luz, e atravessou uma trilha de luz, estreita e sinuosa até vislumbrar um jardim silencioso.
Havia muitas árvores e plantas, assim como um pequeno laguinho onde esperava encontrar carpas coloridas. O menino se abaixou na orla do pequeno lago, mas não encontrou nenhuma carpa. A água transparente apenas refletiu seus olhos e cabelos negros o fazendo pensar que aquilo devia ser errado. Era um intruso ali com seus olhos e cabelos embebidos em trevas. Estava num mundo de prata e luz, não de escuridão. Um ruído o atraiu e o menino se voltou para trás. Não muito longe dali havia uma casa de telhados pontiagudos e suas portas de papel haviam sido abertas com brusquidão. Uma voz de homem gritou uma dúzia de palavras que não conseguiu compreender, mas que sabia serem de ira. E então tudo voltou ao silencio de antes. O menino se aproximou cauteloso escondendo-se entre as muitas árvores e plantas estranhas, todas elas embebidas em luz. Era como se, a cada passo que desse contra aquele mundo de luz, seus olhos fossem se abrindo para novas cores e seres. O que antes parecia lhe cegar tamanho brilho, agora ficava cada vez mais nítido.
Sob a sombra de uma imensa árvore branca, a maior que já havia visto, havia um tapete de flores azuis como o céu, o que era estranho já que rosas não cresciam assim. Sim rosas, mas rosas azuis, tão perfumadas que chegavam a atordoá-lo com seu doce perfume. E entre as rosas havia uma menina, o que deduziu por duas coisas. Primeiro, por causa das suas roupas. Ela vestia um quimono prata e pérola, tão enfeitado que mais parecia pertencer a uma boneca. E segundo, ela estava chorando. Meninos não choram. Decidido, aproximou-se como um gato travesso. Não gostava de ver ninguém chorando, muito menos uma menina. Aquilo era chato, meninas também, mas estava curioso quanto àquela. Quando a menina enfim percebeu-o ali e o fitou com suas bochechas rosadas e olhos lacrimosos, tão assustada quanto poderia ficar, Sasuke concluiu que aquela era a menina mais estranha que já havia visto.
-Q-quem, q-quem é... v-você? –ela indagou gaguejante e Sasuke pensou que um coelho assustado seria mais corajoso do que ela.
Por um bom tempo, Sasuke apenas observou a menina com seus astutos olhos escuros. Ela realmente era estranha, pensou. Sua pele era branca feito mármore polido, os lábios pequenos e rosados em formato de coração, e os cabelos escuros e curtos. Mas os cabelos dela eram de um escuro diferente do seu, algo que o fazia lembrar-se de um tom de índigo muito escuro, e também nas rosas daquele jardim. Concluiu que o cabelo da menina era tão estranho quanto ela. Aquilo o fez pensar nela como uma intrusa também, mas seus olhos compensavam toda e qualquer escuridão existente em seus cabelos. Olhos perolados, tão brancos como os de alguém cego, mas Sasuke sabia que ela enxergava e muito bem, por isso mesmo estava com tanto medo. Havia acabado de descobri-lo ali, um intruso no seu mundo de luz, e que ainda por cima a havia visto chorar. Sasuke teria odiado que o vissem chorar, ainda que não o fizesse. Itachi havia lhe dito que só as garotinhas e os fracos choravam.
-Q-quem, q-quem...
-Por que você está chorando? –Sasuke a interrompeu e a menina fungou.
-Eu, eu... q-quem, quem; a garota recomeçou, mas outra vez foi interrompida.
-Só os fracos e as meninas choram; disse-lhe Sasuke antes de se sentar à sua frente, a menina recuou temendo aquela aproximação.
-Eu, eu... Eu s-sou, s-sou uma m-menina! –disse por fim deixando claro que ele havia lhe ofendido. Sasuke rolou os olhos.
-É uma menina, e uma menina fraca, sei disso, mas não foi isso o que te perguntei. O que te perguntei foi por que você estava chorando; completou.
A menina mordeu o lábio e então suspirou. Sasuke se perguntou se ela iria lhe bater ou então xingar, quem sabe expulsá-lo dali, mas tudo o que a garota fez foi murmurar chorosa e ressentida.
-M-meu pai diz a mesma c-coisa.
-O que?
-Q-que sou f-fraca; respondeu diante do olhar indagador do menino. –É por isso que eu estava chorando.
Sasuke sequer pensou para responder.
-Ele te diz isso porque é o que você é; respondeu e o brilho que viu tremeluzir nos olhos da garota o fez pensar que dessa vez ela iria lhe bater de verdade. Ele teria batido.
-Por que eu gaguejo? –a menina indagou de cabeça baixa.
-E porque você chora; disse-lhe Sasuke.
-Choro porque gaguejo; justificou-se a menina.
-E gagueja porque chora; rebateu Sasuke e estranhamente a menina riu. –Qual foi a graça nisso? –indagou sério, as sobrancelhas franzindo-se num vinco fundo.
-Qual é o seu nome? –indagou a garota enquanto limpava o rosto com as costas das mãos.
Sasuke ponderou circunspecto, mas então respondeu.
-Sasuke.
-Sasuke; a menina pronunciou o seu nome como se quisesse guardá-lo na memória. –Promete que voltará para me visitar, Sasuke-kun?
Sasuke piscou confuso.
-Eu nem sei o seu nome; murmurou e a menina voltou a rir.
-Direi quando voltar para me visitar... Promete?
-Prometo.
Sasuke havia despertado com Ino lhe tocando o braço com gentileza, mas se irritou mesmo assim. A loira havia lhe interrompido o sonho, o mesmo sonho que vinha tendo desde os sete anos de idade, o sonho com a menina dos olhos perolados e seu mundo de luz. E o mais estranho não era isso, era os sonhos nunca se repetirem, exceto aquele, no que se conheciam. Hinata, era esse o seu nome, e ele sempre voltava para visitá-la como havia prometido. Era divertido voltar àquele mundo de luz, onde havia sempre uma nova aventura, mas tudo ruíra na noite em que seus pais haviam morrido. Nunca mais havia voltado ao mundo de luz em que Hinata vivia, mas naquela noite fatídica, ela havia tentado lhe avisar sobre a tormenta sangrenta prestes a cair sobre sua família. Ainda se lembrava dos olhos assustados dela quando lhe contou que tinha um irmão mais velho e qual era o seu nome. Ela havia se aproximado e sussurrado em seu ouvido: "Volte, sua família corre perigo, o corvo de olhos vermelhos a cerca!"
Ainda se lembrava do sopro úmido e doce dela no seu ouvido e da forma como havia gritado e brigado com ela. Havia lhe dito que nunca mais voltaria para visitá-la porque ela era uma mentirosa. Itachi? Seu irmão e seu sangue? Ele jamais faria mal a ninguém, muito menos à sua família. Mas então Sasuke acordou em meio a gritos de terror e sangue. Havia descido as escadas e se deparado com os pais, mortos numa poça de sangue. Era o corvo e ele jazia sobre eles, vigilante, tal qual uma gárgula. Seus olhos eram vermelhos como sangue, e não restavam dúvidas de que Hinata nunca havia mentido.
Sasuke realmente nunca conseguiu compreender aquilo, por que Itachi havia feito o que fez e também o porquê de nunca mais visitar Hinata em seus sonhos. Depois daquilo desejou mais do que tudo voltar a vê-la, mas nunca mais conseguiu falar com ela. Com grande nostalgia revivia as memórias das aventuras que haviam tido juntos e às vezes tinha aquele sonho, o sonho repetido, o sonho em que a conhecia.
-Preciso ir embora; a loira lhe disse enquanto se vestia e Sasuke a espiava pelo canto dos olhos, em parte porque ainda estava irritado com ela, e em parte porque queria voltar a dormir. –Parece que encontramos outro doido nas ruas. Tenten acabou de me ligar contando que podem ter encontrado o tal cúmplice daquele maníaco que prendemos a semana passada.
-Hidan? –Sasuke indagou preguiçoso, o rosto enterrado contra os travesseiros. O serial killer que tanto havia dado trabalho a loira? É claro que se recordava, o país inteiro se recordava.
-Exatamente; ela confirmou enquanto fechava a blusa branca de botões sobre o sutiã de renda. Com a mesma rapidez puxou a saia preta e justa que chegava até a altura dos joelhos. –Aquele maldito não pode ter agido sozinho, disso eu tenho certeza. O que ele fazia... Céus! Não dá para fazer tudo aquilo sozinho! –suspirou e então alisou as roupas. –E então, como estou? Pronta para interrogar um assassino?
Sasuke suspirou pesadamente. Linda, mesmo com aquele cabelo bagunçado.
-Oh, não faça essa carinha! –ela riu e então se sentou na cama beijando-o levemente nos lábios, suas unhas compridas e pintadas de vermelho lhe arranharam as costas enquanto o acarinhava. –Sempre que faz essa carinha de cachorro abandonado eu vou parar na sua cama.
-O que eu sei que você adora; Sasuke murmurou em resposta cerrando os olhos devido ao sono e ela riu.
-É, adoro, mas tenho pressa agora; Ino beijou-o carinhosamente no topo da cabeça e então se afastou. –Tenho mesmo que ir, mas caso você pretenda ficar mais alguns dias na capital, a gente podia combinar e, não sei, quem sabe...
-Volto para casa amanhã, Ino.
-Ok. Até a próxima então. Ja ne!
Sasuke a viu sair pela porta abandonando-o na escuridão e solidão do quarto de hotel. Havia visto o tênue brilho de decepção nos olhos azuis da loira, mas nunca havia prometido nada a Ino, nada além daquilo que tinham. Talvez fosse a hora de terminarem com aquilo também, assim como havia decidido por fim no seu relacionamento com Sakura há alguns anos. Aquele olhar, aquele olhar de decepção, não o queria ver em Ino também. Sempre seria uma decepção para qualquer mulher porque já estava comprometido com algo muito maior, sua vingança.
Itachi, sua vingança, ter o coração daquele demônio de olhos vermelhos entre as mãos. Esmagá-lo! Era somente por isso que tinha coragem de se levantar todos os dias.
Sakura estava de plantão àquela noite, atarefada, mas sentiu-se imensamente feliz quando Naruto apareceu na cantina do hospital. Tinha alguns minutos de folga e tomava sua décima dose de café forte. Tudo o que precisava naquele momento era de um rosto conhecido e de um amigo. Naruto a abraçou apertado com seus braços de pugilista e sentiu vontade de nunca mais soltá-lo, o que obviamente fez. Metade das enfermeiras e residentes estavam ali cobiçosamente fitando o loiro, como sempre faziam. Naruto era o campeão daquela temporada, um campeão lindo e loiro de olhos azuis. Havia cuidado dele tantas vezes depois de uma luta. E em todas às vezes havia um rebuliço no hospital. Fotógrafos dos principais jornais da cidade, enfermeiras assanhadas e fãs histéricos. No entanto, vez ou outra ele fazia aquilo, aparecia sem avisar. Era como se ele não se importasse com o que causava ao lhe fazer àquelas visitas ou então não percebesse. Provavelmente a segunda opção, já que Naruto seguramente era mais popular do que pensava.
-E então? Fiquei sabendo que o teme veio para a capital.
-E como soube disso, Naruto? –indagou-lhe Sakura.
-Ino me contou; disse o loiro e Sakura suspirou. Naruto sentiu-se envergonhado e burro por ter mencionado aquilo. Aquilo havia sido muita insensibilidade de sua parte, concluiu. –Desculpe-me, Sakura-chan, é que eu, eu esqueci que... que...
-Que agora eles dormem juntos? –Sakura o interrompeu num sorriso triste. –Eu não, Naruto. Já faz três anos que eu sei disso, então não precisa ficar envergonhado por isso. Sasuke e eu terminamos e ele dorme com a Ino toda vez que vem para a capital. Ponto.
-Mas isso não quer dizer que não doa; o loiro murmurou infeliz.
-É, dói, mas não mais do que saber que ele está realmente perdendo a visão; a médica suspirou deprimida. –Examinei os olhos dele hoje de manhã.
-Quer dizer que ele está pior? –indagou Naruto ajeitando-se na cadeira.
-Bem pior; respondeu-lhe Sakura. –Ele não mostrou melhora alguma comparado aos exames anteriores, e parece mesmo estar rumo à cegueira total. Isso me deixa de mãos atadas e desesperada, Naruto. Eu tenho tentado todos esses anos, procurado, mas não acho uma causa que explique a doença do Sasuke. Não há nada na medicina atual que explique o que acontece com os olhos dele, tão pouco algo que seja capaz de ao menos retardar o processo. Sinto-me... Impotente, Naruto; completou a médica deixando que a cabeça caísse contra as mãos tamanha exaustão.
-Sakura-chan? –Naruto a chamou e a médica o fitou. –Você tem feito tudo o que podia fazer por ele, eu sei disso e ele também.
-Eu sei, mas... Isso não tem sido o bastante, não é? –Sakura gesticulou infeliz. Diziam-lhe que era uma das mais brilhantes estudantes de medicina quando estava na faculdade e depois que seria uma médica promissora, no entanto, tudo o que sentia agora era uma imensa agonia, como se tudo o que havia aprendido não valesse absolutamente nada. Sentia-se um imenso fracasso, essa era a verdade. –Eu não quero que ele me odeie por isso, Naruto; desabafou. –Ele nunca me amou, mas eu não quero que ele me odeie por ter fracassado onde disse que triunfaria. Eu prometi a ele que conseguiria curá-lo, eu... prometi.
Naruto a fitou por um longo instante de silêncio e Sakura sentiu-se mergulhando de encontro àquele profundo mar azul. Não havia mais ninguém no mundo com quem conseguisse se abrir daquele jeito.
-Nem sempre conseguimos cumprir as nossas promessas, Sakura-chan; Naruto enfim respondeu e havia um brilho diferente em seus olhos, intenso, porém infeliz.
-Naruto; Sakura ponderou, conhecia e muito bem aquele olhar.
-Eu ainda quero te beijar, agora, mesmo tendo te prometido que nunca mais faria isso. Também estou prestes a quebrar promessas e fracassar, mas... Por todos os deuses, não se culpe! Deixe que eu me culpe por você, por te amar e por também desejar a cura do Sasuke.
-Naruto...
Sakura não conteve o nó que lhe subiu pela garganta e começou a chorar. Naruto a abraçou e consolou, como sempre. E como sempre, ela nada tinha para lhe dar.
Ino adentrou a delegacia apressadamente jogando a bolsa em cima da mesa. Sentou-se na beirada da mesa do escritório e então discou no telefone o número de Tenten. Instantes depois a jovem policial apareceu junto de Lee, seu parceiro nas ruas. Tenten com seus coques e Lee com suas enormes sobrancelhas, mas aqueles eram os melhores policiais da cidade chefiados pelo detetive Gai. Lee estava com o braço engessado e um enorme hematoma no canto da boca, mas Tenten parecia estar bem.
-O que houve aqui? Por que me ligaram no meio da noite, e na minha noite de folga? –indagou a loira de braços cruzados e sobrancelhas unidas. –Espero que seja realmente importante; completou pensando que se não fosse faria picadinho deles por atrapalhar sua noite com Sasuke.
Foi Lee quem resolveu falar.
-Ele parece um demônio, Yamanaka-sama! Quase me quebrou uma costela e tentou matar Tenten-san; explicou o sempre respeitoso Lee, talvez um dos únicos homens a respeitá-la ali.
-Tenten? –Ino se voltou para a morena que se arrastou numa expressão de dor. A mulher segurava o lado esquerdo do corpo.
-Encontramos o rapaz num beco depois de uma chamada de tentativa de estupro. Provavelmente era aquele mesmo sujeito da semana retrasada, o que fugiu. Ele costuma entrar para assaltar lojas de conveniência e na maioria das vezes faz mais do que isso quando encontra uma mulher sozinha; Tenten fez uma pausa com os punhos cerrados.
-Continue, Tenten; instigou-a Ino.
-Pescamos um peixe maior, senhora. O rapaz que capturamos não se trata desse estuprador, conheço o maldito covarde que vem aterrorizando esse tipo de loja há alguns meses. Aquele rapaz, o que encontramos no beco, só de olhar nos olhos dele eu soube que ele não era esse tipo de homem. Ele tem...; Tenten ponderou mordendo o lábio. –Um olhar maligno, senhora, mas de um jeito diferente. Frio e calculista como estivesse seguindo ordens restritas. Já vi assassinos e loucos demais nessa vida para não reconhecer um quando o vejo. Ele é um assassino contratado, tenho certeza. E, no entanto, há algo que não se encaixa nessa história, tão pouco faça sentido. Esse rapaz também roubou a loja, mas não levou o que costumeiramente os ladrões levam.
Ino franziu as sobrancelhas.
-E o que foi que ele roubou?
-Dropes de canela. Não levou uma única moeda do caixa, senhora; Tenten deu de ombros como se também não conseguisse acreditar naquilo. Lee assentiu com a cabeça igualmente descrente. A morena resolveu continuar. –Quebrou o pescoço do velho, o gerente da loja, e fugiu. O velho estava esperando a polícia chegar para dizer como valentemente havia espantado o estuprador que queria fazer mal à sua filha. Quando chegamos encontramos somente o velho morto com um bastão de baseball ao seu lado e a moça aterrorizada de medo.
A cabeça de Ino latejava e foi obrigada a massagear as têmporas enquanto digeria toda aquela informação.
-Suponho que ainda haja mais? Já que até agora nada disso o liga a Hidan, que foi o motivo de vocês terem interrompido a minha noite de folga; indagou Ino e Tenten retomou a palavra.
-Exatamente; disse-lhe Tenten sob o olhar atento da loira. –Todos nós sabemos o quanto Hidan era descuidado e deixava pistas por onde passava. Esse homem parece ser o oposto dele, senhora, mas há algo que irremediavelmente o liga a Hidan. Ele estava próximo à cena do crime, o último que Hidan cometeu antes de ser capturado. Câmeras de segurança o flagraram em outros três lugares que também haviam sido cenas de crimes cometidos por Hidan.
-Ok; anuiu Ino. –Mas isso ainda não o inocenta de ter tentado estuprar a moça também. Como sabe que não foi ele quem tentou violentar a garota?
-Ela me descreveu ambos os homens, o que tinha tentado violentá-la, e o que havia matado seu pai, e eram homens diferentes, senhora; Tenten explicou.
Ino sentia-se cansada, muito cansada. Olhou para Lee com seu braço na tipoia e depois para Tenten.
-Em resumo, esse homem ainda quebrou o braço dele e tentou te matar? –Tenten levou os dedos finos até o pescoço por puro instinto e só então Ino notou as marcas rochas de dedos ali, um aperto de aço que certamente poderia tê-la matado.
-Ele realmente se parece muito com o tal de Hidan, senhora; Lee deu um passo à frente. –Não fisicamente é claro, nem na sua falta de educação utilizando-se de palavras grosseiras e hostis, até porque ele não disse uma única palavra desde que chegou, mas no brilho sinistro que tem nos olhos. Uma coisa eu lhe digo, senhora, Tenten-san tem razão no que diz, ele é um assassino e verá tal coisa assim que botar seus olhos nele.
Ino suspirou outra vez massageando as têmporas.
-Quer dizer que pegamos um ladrão de doces, gentil, mas com sede de sangue? Isso? A cada palavra que me dizem mais essa história me parece bizarra e doentia. Quero ver esse homem agora! –ordenou.
-Nós a acompanharemos, senhora; disse-lhe Lee, mas Ino o interrompeu.
-Tenten me acompanha já que parece estar em estado melhor do que o seu. Você descansa, agente Lee! Volte para casa, está dispensado pelo resto da noite; ordenou e o rapaz mesmo querendo discordar baixou os olhos e deixou que as duas mulheres passassem.
Enquanto atravessavam os corredores frios da carceragem e Tenten a punha a par dos demais acontecimentos, Ino só conseguia pensar em Sasuke e no quanto ainda gostaria de estar com ele. Esse desejo tão logo evaporou quando se recordou de que aquele homem que haviam capturado poderia ser o cúmplice do tal Hidan. Hidan, além de um assassino vil e perigoso, era mais do que grosseiro. Lee havia sido gentil em poupar seus ouvidos com adjetivos que fariam verdadeiramente jus ao assassino. Ainda se recordava de como havia sido interrogar aquele maldito psicopata.
"Wow! É esse o inferno pra onde disseram que iam me levar? Se soubesse teria vindo de bom grado e sem algemas. Vamos lá sua puta loira, tire logo essa roupa e abra já essas pernas pra que eu possa fodê-la bem gostoso! Não vê que já estou todo duro? Vamos, vou te fazer gemer de verdade antes de te sacrificar ao grande Jashin-sama! Ele certamente vai adorar receber o seu lindo corpo como oferenda..."
Hidan era apenas mais um que a via daquele jeito, mas o que incomodava Ino era o porquê um homem jovem e bonito – porque Hidan era um homem bonito – se entregasse a tais práticas cruéis e sem propósito. Qualquer mulher se derreteria por ele enquanto mantivesse aquela maldita boca fechada, mas ele as preferia mortas em poças de sangue. E isso certamente lhe era de grande ajuda, não devia ser difícil atrair novas vítimas.
E pela graça dos deuses, ele já não estava mais ali. Havia sido levado para a última cela da carceragem, uma que quase nunca usavam, longe o suficiente para que Ino não precisasse ouvir a sua voz. E claro, para que não soubesse que seu possível cúmplice havia sido capturado, cúmplice que ele dizia não ter. Isso era estritamente necessário para o decorrer do caso.
-Aí está ele, senhora; Tenten apontou o monte cinzento dentro da cela.
-Deixe-nos a sós, Tenten. Quero falar com ele sozinha; disse-lhe Ino observando o perfil cinzento do rapaz encolhido no chão e enrolado num cobertor velho.
-Como quiser, senhora; Tenten anuiu e Ino a dispensou pelo resto da noite também.
O silêncio caiu pesadamente entre a delegada e a cela, mas o rapaz continuou deitado e enrolado ao cobertor. Haviam tentado lhe arrancar seu nome, quem era, e o que pretendia fazer depois de visitar cenas de crimes ainda não resolvidos, assaltar uma loja de conveniência, quebrar o pescoço de um velho, e quase assassinar dois policiais, mas o rapaz havia se mantido no mais completo silêncio. Tentaram do jeito fácil e tentaram do jeito difícil, mas nada arrancaram dele, nem mesmo gritos de dor. E com Ibiki Morino no comando, Ino podia dizer que o rapaz ou era um lunático masoquista como Hidan, ou então alguém que realmente poderiam chamar de super-homem. Um homem sem nome, sem passado, e também sem voz. Ino estava curiosa. Na falta de um nome e depois do que havia feito a Lee e Tenten, haviam lhe apelidado de esfinge. Aloira estava realmente curiosa em saber por que.
-Sente-se, descubra o rosto, e fale comigo; ordenou e pensou que ele não fosse obedecer, mas obedeceu. Só esperava que dessa vez não fosse tão difícil quanto havia sido com Hidan.
O cobertor puído foi jogado para o lado finalmente revelando quem era a tal esfinge e o porquê do apelido. Era um homem jovem, de pele clara e cabelos cor de fogo, mas não foi o que realmente chamou à atenção de Ino. O que havia lhe chamado à atenção eram seus olhos verdes apáticos e frios, lâminas afiadas, tal qual a haviam prevenido. Outra coisa que havia lhe chamado à atenção era aquela tatuagem vermelha em sua testa. Depois de observá-la atentamente descobriu se tratar do kanji amor, o que só tornava aquilo ainda mais estranho. Quem é que tatuaria o kanji amor na testa? Pensar num assassino com aquela tatuagem era ainda mais perturbador. Perturbador? Perturbador era o quanto aquele homem era bonito mesmo com aquela marca rocha e feia no canto da boca. E aqueles certamente eram lábios para serem beijados! Mesmo machucado, sujo e mal vestido, ele era bonito, bonito demais. Ino sentia a sua cabeça latejar. Não precisava de outro assassino louco e bonito.
-Como se chama? –indagou mirando-o sentado no chão frio e recostado contra a parede da cela, os braços repousados sobre os joelhos dobrados. Os dedos dele eram finos e longos. Era estranho pensar que aquelas mãos, quase que delicadas, tivessem feito tamanho estrago. As mãos dele faziam-na pensar em mãos de alguém que passa o dia todo no escritório, ou então nas de um artista, como Sasuke, mas não nas de um assassino. –De onde veio? O que pretendia fazer depois de assassinar meus dois policiais? –indagou a loira repetindo as mesmas perguntas que haviam feito ao rapaz mais cedo.
Ele a mirou tão profundamente que Ino sentiu-se acuada, ainda que não o tivesse demonstrado.
Decifra-me ou te devoro!
Conseguia sentir aquela frase não dita perambulando entre as grades da cela. E não conseguiu reprimir o arrepio terrível e intenso que lhe subiu pela espinha, como se mãos invisíveis se apertassem em seu pescoço. Era como se ele realmente fosse uma esfinge, mas Ino não saberia dizer se conseguiria resolver seu enigma.
O instante de silêncio se foi, e os lábios do rapaz enfim se moveram libertando o som grave e monocórdico de sua voz que encheu a cela.
-Uma pergunta de cada vez.
-Ok; a loira se aproximou da cela sem desviar seus olhos dos dele, sentia-se incapaz de fazê-lo. –Seu nome?
-Gaara, Sabaku no Gaara.
Sasuke havia chegado em casa no inicio da manhã e tão logo havia se trancado no quarto, não no quarto de dormir, mas no que lhe servia de ateliê. Ultimamente passava mais tempo ali do que em qualquer outro lugar da casa. Às vezes até dormia ali, entre tubos de tinta e cavaletes de pintura. Sempre havia gostado de pintar e até havia conseguido ganhar algum dinheiro com isso, um dinheiro que não precisava sendo o único herdeiro de toda a fortuna Uchiha, mas estava longe de ser um conceituado artista plástico. Havia se formado, mas nunca se preocupou em botar em prática o que havia lapidado nos inúmeros cursos que havia feito. Havia viajado o mundo, aprendido arte nas melhores escolas europeias e também nas melhores do Japão, no entanto, estava ali, no interior de sua terra natal e isolado do mundo. Havia os que o chamavam de gênio, que gostariam muito de poder contar com sua presença e sua arte nos melhores salões e exposições, mas Sasuke nunca quisera isso. Tinha ciúmes de seus quadros como se fossem filhos ou então amantes e tinha dificuldade em se separar deles. E ultimamente suas pinturas eram lúgubres e obscuras, o que talvez não agradasse o público.
Estava preso em seu último quadro há seis meses e havia descartado uma dúzia de telas iguais antes de se contentar com aquela, mas ainda sim sempre que olhava para a pintura sentia que ainda faltava alguma coisa. Soaria ridículo se contasse a alguém o que estava tentando retratar, até mesmo a Naruto que era o seu melhor amigo, ou então a Ino que já havia lhe servido de modelo, mas sentia aquela necessidade como a que tinha de respirar. Estava tentando recriar o cenário do sonho, seu sonho de menino onde encontrava a garota dos olhos perolados. Quando era criança e ainda sonhava com ela, sentia que ela ia crescer junto com ele e por isso agora a estava retratando como uma mulher e não como uma menina. O problema era que não sabia como ela seria adulta. Seus cabelos teriam crescido? Seus olhos certamente ainda seriam os mesmos, mas era como se não pudesse retratar seu rosto. Sabia como era o da menina, mas não o da mulher. Se ainda fizesse terapia e contasse isso ao seu terapeuta, certamente o internaria num manicômio. Havia sido liberado de tal tormento somente quando parou de falar de sonhos com uma menina num mundo de luz e do aviso que ela havia lhe dado, sobre o irmão ser um corvo de olhos vermelhos. Aos quinze anos vestiu uma máscara, escondeu seus reais sentimentos, e disse ter enterrado o irmão e a morte dos pais. Isso o livrou do tormento das sessões de terapia e fez dele um rapaz popular no colégio, na faculdade, e também com as garotas, mas ninguém nunca o conheceu de verdade. Era a máscara que viam, uma manobra para incubar seu ódio e pensamentos confusos até que a hora de definitivamente mostrar seu verdadeiro eu fosse propícia. O dia em que encontrasse Itachi e o matasse, esse seria o dia em que descobririam o verdadeiro Sasuke. Naruto tinha medo desse dia, ele sabia, conhecia o seu verdadeiro eu, e por isso mesmo o considerava seu único e verdadeiro amigo. Ele podia ser idiota na grande maioria das vezes, mas não ria do seu ódio e desejo de vingança porque sabia que cumpriria aquela promessa, de ver o irmão mais velho numa poça de sangue, ainda que isso levasse toda uma vida.
Agora? Agora estava ficando cego! Sakura havia lhe dito que o ajudaria e que não iria permitir que a luz fugisse de seus olhos, mas Sasuke sabia que não era verdade. A cada dia sua visão estava pior, e isso havia começado no dia da morte dos pais, depois de mirar os olhos cor de sangue do irmão, mas ninguém acreditaria se dissesse. Havia aprendido isso nas sessões de terapia. Não tinha medo de ficar cego, havia sido cego a tudo à sua volta que não incluísse sua vingança e Itachi. Havia sido cego ao amor de Sakura. Havia sido cego ao que poderia ter com Ino, certamente que muito mais do que eventuais encontros tórridos num quarto de hotel. Havia sido cego aos pedidos de Naruto para voltar para a luz e esquecer-se das trevas em que a vingança estava. Não tinha medo de apagar de vez tudo aquilo e se envolver por inteiro na escuridão. Não precisaria de seus olhos para encontrar Itachi, só de seu ódio e sua ira. Mas... Ainda queria terminar aquele quadro.
Queria retratar Hinata e seu mundo de luz, antes que enfim toda a luz se esvaísse de sua vida.
E ali estava ele, mirando aquele quadro, outra vez sem saber como finalizá-lo. Havia o grande carvalho branco com suas folhas prateadas e quase translúcidas a bailar com o vento. Havia as portas de papel da casa dela ao fundo e longe. Havia o magnífico tapete de rosas azuis sobre o chão e ela no centro disso tudo. Uma mulher sem rosto com longos cabelos índigo e o mais lindo quimono prateado...
-Droga!
Sasuke jogou o pincel contra a tela e ele escorregou deixando uma veia de tinta prata do pescoço ao colo da imagem. O pincel caiu no chão e o manchou também, mas Sasuke não se importou. Ainda com as mãos sujas de tinta se jogou em cima do sofá macio no canto do quarto. Sua cabeça doía e seus olhos não conseguiam ver que horas eram no relógio na parede. Sabia que era tarde porque a noite escura cobria a janela. Havia passado o dia todo ali, mas o que importava?
Fechou os olhos e tão logo adormeceu.
...
Escuro, frio, úmido. O corredor era imensamente longo, estreito, baixo demais para alguém adulto atravessar de pé, mas ainda sim a garota se arrastava feito uma doninha. Suas roupas estavam em frangalhos e seu rosto marcado de lágrimas e sangue. Estava cheia de machucados, cortes, hematomas, mas ainda sim corria, corria desesperadamente. Tropeçava, caía, levantava, se arrastava, uma cena no mínimo digna de pena. Sasuke conhecia aquele lugar e conhecia aquela mulher. Aquela era Hinata! Ela chorava e se arrastava pelo mesmo túnel que tantas vezes havia percorrido para encontrá-la no seu mundo de luz. Dessa vez, no entanto, era ela quem percorria aquele caminho, um caminho inverso. A luz era deixada para trás e ela seguia para a escuridão. Sasuke sentiu vontade de gritar e lhe pedir para voltar, mas não conseguia. Queria ajudá-la e não podia. Aquilo o enchia de desgosto, de ira, e de impotência. Havia desejado tanto voltar a sonhar com ela, mas nunca quis um sonho como aquele, um pesadelo. Queria acordar, mas não conseguia, mesmo sabendo que estava sonhando. Ela tinha medo, medo demais, um medo sobre-humano, e aquilo estava sendo pior do que sonhar com os olhos vermelhos de Itachi. Algo a perseguia, mas não sabia dizer o que ou de onde vinha, só sabia que ela sentia um imenso pavor e desespero.
Ela gritou quando algo se prendeu em sua perna e Sasuke enfim despertou.
Estava outra vez suado e com o coração batendo desesperado contra o peito. Levantou-se sobressaltado e então deslizou as mãos entre os cabelos negros e sedosos. Sentia que havia gritado também, só esperava não ter acordado os poucos serviçais que cuidavam da mansão. Olhou para o relógio outra vez sem conseguir ver mais que um borrão e depois para a janela. Tudo que o via era o manto negro da noite do lado de fora. Deixou-se cair novamente no sofá, mas voltou a saltar assustado quando ouviu o barulho de vidro sendo quebrado. Olhou pela janela e para a distante silhueta da estufa de vidro longe dali. Aquilo definitivamente era estranho, pensar que alguém invadiria logo a estufa ao invés da mansão. Entretanto, sua maior fortuna com toda certeza estava naquela estufa.
Sem pensar, Sasuke saiu e rumou até a estufa, descalço e com as roupas sujas de tinta. O sensato seria chamar os serviçais, os seguranças, ou até mesmo a policia, mas... Chamaria quem? O casal de velhos que cuidava da mansão? Já os seguranças, os poucos que tinha, nunca vinham até a estufa. Aquilo o fez pensar num comentário esdrúxulo de Naruto:
"Você parece o Batman, teme! Morar sozinho aqui? Só falta um mordomo e a batcaverna! Você... você não tem uma batcaverna, tem?"
Sasuke rolou os olhos.
Tinham quinze anos quando Naruto lhe disse aquilo.
Entretanto, só podia ser o imenso cão branco do vizinho. O bicho era tão grande que ninguém duvidava que conseguisse escalar e pular os altos muros da mansão. Não seria a primeira vez, mas ia matar aquele animal malcriado e pulguento caso tivesse feito mais do que invadir a estufa. E claro, seu dono também. Nunca havia gostado do Inuzuka mesmo. Sasuke chegou a sorrir com a ideia, mais outro pensamento sombrio lhe turvou a mente. Podia ser Itachi, quem sabe ele tivesse retornado para completar o que não havia terminado há alguns anos. Seus dentes rangeram e seus punhos se cerraram. Seria bom demais, não seria? Reencontrar aquele demônio de olhos vermelhos depois de tanto tê-lo procurado? Sasuke caminhou sobre a grama fofa e úmida até que a luz vinda da estufa tornou-a mais nítida. Deu a volta pela estrutura e não demorou a encontrar um dos vidros quebrados. Havia sangue ali o que só comprovava sua teoria sobre o cachorro. Nenhum ladrão ou invasor se jogaria desse jeito contra o vidro. Bastava abrir a porta e adentrar a estufa. O ruído de algo se arrastando dentro da estufa o fez cerrar os olhos. Deu a volta e a adentrou. Assim que abriu a porta um cheiro doce de rosas invadiu suas narinas. Aquelas eram rosas azuis, uma variação genética e cara sendo cultivada ali, e também o seu tesouro. Estava escuro, exceto pelas fracas luzes de emergência que haviam se acendido depois de ter aberto a porta. Ao quebrar o vidro, o maldito cachorro devia ter danificado parte do sistema de energia da estufa. Caminhou devagar desviando de um ou outro vaso quebrado e amaldiçoando o cão do Inuzuka quando voltou a ouvir o barulho de algo se arrastando no escuro. Dessa vez o ruído veio junto de um gemido, um gemido de dor que certamente não provinha de um cachorro.
-Quem está aí? –indagou Sasuke enquanto agarrava uma pá próxima e a prendia firmemente entre os dedos. Teve de tatear as cegas em busca da pá e naquele momento, mais do que nunca sentiu o peso de estar perdendo a visão.
De novo o barulho e outro gemido. Uma pilha de vasos se quebrou depois de se estatelar ruidosamente no chão. A criatura que se arrastava e gemia havia se alojado debaixo de uma mesa cheia de mudas de rosas azuis. Sasuke correu até ela antes que destruísse o resto da estufa. Parou quando com seus olhos turvos distinguiu uma silhueta humana se encolhendo sob a mesa e protegendo a cabeça com ambos os braços. Aproximou-se um pouco mais e só então percebeu o rastro escuro de sangue no chão. Aquela cor rubra? Talvez ainda conseguisse vê-la mesmo quando já estivesse totalmente cego. Aquela era a cor de Itachi e também de sua vingança. Aproximou-se um pouco mais. Aquela criatura que ali estava jazia suja e machucada, concluiu mesmo sem conseguir visualizá-la direito. Tinha um longo corte no antebraço e outros pelas pernas, de onde sangue quente escorria desenhando longas estrias carmim sobre a pele branca. Jogou a pá no chão assustando ainda mais a criatura que agora sabia se tratar de uma mulher. Cabelos longos e escuros, emaranhados e sujos, e insinuação de um seio sob os braços levantados contra a cabeça. Estava ficando cego, mas ainda podia ver que aquilo não era um cachorro. Aquilo o fez pensar no sonho que havia acabado de ter. Talvez ainda estivesse sonhando. Isso explicaria porque aquela mulher naquele estado deplorável se escondia na sua estufa.
Um frio estranho lhe percorreu o estômago enquanto pensando nisso se abaixava até a mulher. Estava a poucos passos dela agora.
-Hei? O que está fazendo aqui? –indagou tentando soar o menos intimidador possível, mesmo que aquela fosse uma intrusa. Ela claramente tinha medo dele e aquilo o incomodava.
A mulher se enrolou ainda mais o que não permitia a Sasuke ver seu rosto. Puxou-a pelos pulsos e obrigou-a sair dali para fitá-lo. Odiava quando o evitavam daquele jeito. Outra vez sentiu aquele arrepio estranho e as entranhas congelarem. Conhecia aquele rosto. Mas... De onde? A mulher, por sua vez, continuava de olhos fechados e cabeça baixa, a farta franja escura e lisa cobrindo-lhe os olhos. Simplesmente não conseguia olhar para ele. Aquilo o irritou.
-Olhe para mim! –ordenou.
E ela olhou.
Seus olhos de longas pestanas se abriram e tudo o que Sasuke viu foi luz.
O mundo foi invadido de luz e Sasuke sentiu-se cego.
Cego pela luz dos olhos dela...
Continua...
N/a: Sei que prometi finalizar minhas outras fanfics antes de postar qualquer outra coisa, mas essa ideia maluca me surgiu do nada e foi tomando forma e ganhando vida. Ela ia acabar me sufocando se eu não a libertasse, digamos assim. Espero que tenham gostado, e já lhes aviso que, ainda que SasukexHina seja o casal principal, muitos outros também farão suas ilustres aparições. Acho que GaaraxIno já ficou muito na cara, né? Mas eles com toda certeza não serão os únicos.
E eu quero reviews, ok?
Sem reviews, sem atualizações também.
Feito? XD
Bjus e até a próxima!
Ja ne! ^^
