N/A: Olá. Estou começando com um n/a para explicar sobre a fic, o começo dela está escrito a cerca de seis meses e funciona de um modo diferente, seus cáp. são adaptados do livro Jogos de sedução, por Lynne Grahan, junto com idéias muito minhas e depois não há mais nenhum traço, proposital, do livro. Espero que curtam.
Ps:Os cáp são um tanto longos e a censura é de 14 anos.

I. Desilusão

- A srta. BonVoin pediu para você voltar para casa imediatamente. Disse que era urgente! - a telefonista do escritório falou ofegante. - Espero que não sejam más notícias. Ela nem me esperou passar a ligação. Bateu o telefone.

Nicole Labback pagou o táxi e subiu depressa a escada do apartamento que dividia com Emanurele BonVoin.

'Será que fomos roubadas? Ou alguém da família sofreu um acidente? Ou algo aconteceu comYam?' - pensava Nicole enquanto subia as escadas.

Sua imaginação criara as mais diversas situações desde que recebera o recado de Emanuele.
Atravessou o corredor com o coração disparado e abriu a porta do apartamento. Assim que entrou, ficou desorientada com o som alto. O mais recente disco de Phill Collins tocava no último volume. Um sapato azul, de salto alto, estava jogado no carpete.

- Manu? - Nicole chamou, preocupada, relanceando o olhar pela sala. A porta do quarto estava parcialmente aberta. Com medo de encontrar um ladrão, empurrou-a com cuidado. – Manu? - chamou mais uma vez.

Só então percebeu o casal seminu que se abraçava e se beijava sobre a cama desarrumada.

- Nick?! - a prima gritou assustada. Sentou-se de chofre. Os cabelos loiros caíam desalinhados pelo rosto e os olhos verdes arregalaram-se de horror.

Envergonhada e arrependida de ter entrado no quarto, Nicole ia sair quando seu olhar pousou na cama. Então ficou paralisada. Descobrir a identidade do acompanhante de sua prima foi como um soco no estômago. Sentiu como se dedos cruéis esmagassem seu coração e pulmões, impedindo-a de respirar.

- Oh, não! - Yam gemeu, agarrando a camisa e pulando da cama com expressão desolada.

Emanuele procurava sua blusa no meio dos travesseiros.

- Por que não está no trabalho? - perguntou ela, aos gritos.

- Você telefonou! Deixou um recado para eu voltar com urgência! - A voz de Nicole tremia.

- Eu telefonei? Ficou louca? - Emanuele continuou furiosa. - Pode ter certeza de que eu seria a última pessoa a telefonar!

- Emanuele, você é uma sem-vergonha! – Yam acusou com raiva. - Armou tudo de caso pensado!

- Não seja estúpido! - Emanuele retrucou. Então, um ar de desafio petulante substituiu a expressão de desconforto. Ela pousou os olhos maliciosos em Nicole, que mal podia se manter em pé. - Eu avisei para você que Yam era meu, não avisei?

- Não! - a voz de Yam saiu esganiçada e ele enfrentou os olhos azul-gelo de Nicole, a dor estampada no rosto pálido fez com que seus olhos parecessem mais gelados do que nunca. Fez menção de se aproximar, as duas mãos estendidas como se quisesse abraçá-la. - Isso nunca aconteceu antes, Nick. Eu juro!

Ela virou as costas e saiu correndo do apartamento. Desceu a escada de dois em dois degraus e quase caiu no último lance. No percurso, os chamados frenéticos de Yam martelavam-lhe os ouvidos.
Sem lhe dar atenção, encostou-se na parede e tomou fôlego. O ar entrava e saía de seus pulmões aos borbotões. Quando conseguiu firmar o corpo, saiu para a rua.

Emanuele e Yam. Emanuele e Yam. Nicole olhou para a aliança de noivado como se a visse através de uma névoa. Sentiu uma forte náusea, faltavam apenas seis semanas para o casamento... e ela flagrava sua prima e seu noivo na cama!Teve a impressão de que o mundo havia parado de girar e sentiu como se tivesse sido lançada em queda livre de um enorme abismo. O choque foi tão grande que não conseguia raciocinar. Apesar disso, fragmentos de diálogos passados surgiram em sua mente.

-Yam a escolheu como escolhe as camisas que veste nos jantares da empresa. Você é adequada e conservadora - Emanuele dissera em tom mordaz.
Ou então:
- Há três anos, se eu levantasse o dedo mindinho, Yam viria correndo. Era doido por mim.

Quando viu seu reflexo na vitrine de uma loja, Nicole comparou-se à prima. Enxergou uma mulher comum, com os cabelos negros e lisos na cintura, sempre presos em um rabo-de-cavalo ou em um coque, vestindo um conjunto azul-marinho muito comportado e sério. Realmente, não era páreo para a loira alta e esguia, que já saíra na capa de uma famosa revista feminina.
Sentiu-se morta por dentro. Não sabia o que fazer, ou aonde ir.
Um ônibus parou no ponto, alguns metros à frente, e Nicole começou a correr. Seu olhar vago passou por um homem parado na porta da loja ao lado. Ele virou a cabeça abruptamente, e Nicole desconfiou que sua fisionomia revelava o desespero que sentia. Não reparou quando o homem correu atrás dela e entrou no mesmo ônibus.

- Precisamos mesmo ter Emanuele como nossa dama de honra? Minha mãe não a suporta - Yam havia reclamado dias antes. - Ela não é boa gente. Uma mulher decente não tiraria a roupa por dinheiro.

Com a cabeça cheia de lembranças, Nicole desceu no quarteirão onde se situava a filial londrina das Indústrias Black. Nem escutou quando a recepcionista do penúltimo andar chamou seu nome. Cega e surda, movia-se como um robô. Entrou no escritório espaçoso que dividia com Remo Lupin. Estava vazio. A mulher dele entrara em trabalho de parto no meio da manhã, ela se lembrou. Era como lembrar um fato ocorrido há muito tempo.
O telefone de sua mesa estava tocando. Nicole sentou-se para atender.

- Aqui é Marjorie Klain. Quero falar com Sirius. - uma insinuante voz feminina falou.

- Lamento, o sr. Black está em reunião. Quer deixar algum recado?

- Você está mentindo, não está? - a voz da cantora ficou ríspida.

Nicole vinha mentindo para as mulheres que tinham caso com Sirius Black desde o ano anterior, quando fora contratada como secretária dele. Sirius raramente estava disponível para suas amantes no horário de expediente. Quando um nome era retirado de sua lista regular de encontros, ele nunca mais se tornava disponível. Apesar de detestar mentir, Nicole sabia que aquela era sua obrigação.

- Ele me mandou uma pulseira de brilhantes enquanto eu estava em uma apresentação na Hungria e sei o que isto significa. É o fim do nosso caso! - Marjorie gritou. - Ele está com outra mulher, acertei?

- Está muito melhor sem ele, - Nicole escutou as próprias palavras como se viessem de muito longe. - É uma cantora maravilhosa. Estava perdendo seu tempo com um homem sem-vergonha e mulherengo como Sirius Black!

Um silêncio incrédulo se abateu no outro lado da linha.

-0... que foi que disse? - finalmente Marjorie gaguejou.

Nicole olhou o aparelho como se estivesse em outro mundo. Tremia sem parar. Meu Deus, como tivera coragem de dizer aquela barbaridade? Desligou o telefone e levantou-se, sentindo um nó no peito. Correu para o banheiro quase sem conseguir controlar a náusea.

Dez minutos mais tarde, um pouco recuperada, voltou para sua sala.
0 telefone tocava novamente.

Ignorando o som irritante, Nicole abriu o último gavetão do arquivo e pegou a garrafa de uísque, que estava lá a muito, muito tempo, serviu uma dose generosa em uma xícara e bebeu devagar, fazendo caretas para o sabor que não lhe era familiar. Talvez o álcool ajudasse a assentar seu estômago.

Yam e Emanuele. Os nomes atormentavam sua mente como um refrão sem fim. Nicole teve vontade de bater com a cabeça na parede, e assim conseguir evitar o pensamento. Achou que fosse enlouquecer.
Não era mais a sensata e controlada Nicole, que sempre mantinha a calma ao enfrentar uma crise. Na verdade, jamais enfrentara uma crise na qual seu mundo desabasse. Ainda tremendo, tomou mais um gole da bebida. Com uma risada amarga, tirou a aliança do dedo e jogou na primeira gaveta, fechando-a com força.

O telefone tocou mais uma vez e ela atendeu. Por infelicidade, era sua tia, querendo uma informação sobre os preparativos do casamento. Nicole congelou ao escutar a voz da mãe de Emanuele. Respirou fundo e interrompeu-a.

- Tia Micaela? Sinto muito, mas o casamento está cancelado. Yam e eu terminamos tudo. - Mesmo para seus ouvidos, as palavras pareciam irreais como uma piada de mau gosto.

- Não seja tola, Nick.– Micaela BonVoin murmurou, ríspida. - De que está falando?

- Do fim do casamento. Eu lamento. Mas chegamos à conclusão de que não podemos nos casar.

- Se teve alguma briga tola com Yam, sugiro que façam as pazes depressa - a tia falou, brava. - Ele almoçou aqui em casa ontem e nada parecia errado! - Micaela bateu o telefone.

Nicole soluçou. Como poderia contar a verdade para a mãe de Emanuele?
Micaela e Daniel BonVoin haviam lhe oferecido um lar quando sua mãe morrera. Não podia contar a verdade a eles. Era mais fácil fingir que havia mudado de idéia quanto ao casamento. Mais lógico e menos embaraçoso para todos. As duas famílias eram vizinhas e amigas.
Um nó pareceu travar a garganta de Nicole. Será que Yam amava Emanuele? Ele dissera que a prima não era boa pessoa, pois posara nua, feliz com a chance de aparecer no famoso calendário Black.

Régulo, o irmão mais novo de Sirius Back, fizera a mesma proposta a Nicole. E se divertira com o embaraço que ela demonstrara.

- Você tem algo que sua prima alta e bonita não tem. É muito sexy. Além disso, tem classe - Régulo dissera, sem se perturbar com a recusa de Nicole.

O convite, feito no meio de uma festa da empresa, foi presenciado por muitos funcionários. Durante meses, Nicole tornou-se alvo de piadas. Quando viu que ela corou, Régulo se deliciou. A partir daquela data, todas as vezes que a encontrava, aumentava a oferta para que fotografasse nua. Sem dúvida, Régulo enxergava nela o que ninguém mais via.

Nicole não entendia por que ele a atormentava. Era uma mulher calada, previsível, pudica.
Nos tempos de colégio, Emanuele apelidara a prima de "miss puritana". Depois de criar a imagem, espalhara a história de que Nicole era filha ilegítima, contando que a mãe dela se apaixonara por um garçom grego, por quem fora abandonada.
No começo, algumas garotas não acharam graça, mas logo se submeteram ao controle de Emanuele e riram e zombaram da amiga. Afinal, Emanuele era a líder do grupo. Nicole fora duramente perseguida; nenhuma garota se atrevia a contrariar sua prima. Para escapar, deixou o colégio aos dezesseis anos e foi fazer um curso de secretariado, ainda que não fosse seu sonho.

Yam sempre fora seu verdadeiro sonho. Subitamente, odiou tudo o que possuía. O corpo, a personalidade, as inibições, as roupas. Sentia-se sem graça e boba no meio de mulheres da sua idade. Antiquada, inocente em matéria de sexo, louca para deixar o trabalho, ser esposa e mãe com apenas vinte três anos. Deveria ter nascido cem anos antes.

Com o canto do olho, finalmente reparou que a porta da sala fora aberta. Ergueu a cabeça devagar e foi dominada pelo pânico. Arregalou os olhos azul-gelo ao dar com Sirius Black parado à sua frente, como um animal predador pronto para dar o bote. Os dois telefones tocavam sem parar. Ele deveria estar em Roma naquela tarde, não de volta a Londres.

- Intervalo para o café? - Sirius perguntou curioso, em vez de ficar bravo como ela esperava.

Os telefones pararam de tocar como se alguém tivesse cortado a linha.
Ainda chocada, Nicole encarou o patrão. Sirius era um homem com um metro e noventa de pura virilidade, os cabelos escuros acentuavam o perfil romano, herdado de seus antepassados italianos. Tinha uma presença física imponente e sensual.
Nicole detestava ficar perto dele. Detestava o modo como a encarava. Detestava o modo como falava com ela.
Se montar uma casa não fosse tão caro, há tempos teria sacrificado seu salário, excelente, só para não ter de se expor ao sardônico Sirius a fazia sentir-se incômoda e ridícula. Como se fosse uma espécie rara, exposta atrás de um vidro de museu.

- Termine seu café.
Ele estendeu a mão longa e empurrou a xícara, ainda com a metade do uísque, na direção de Nicole.

'Será que ele não sentiu o cheiro da bebida? Com certeza não, pois confundiu com café. '

Sem graça, ela aceitou a xícara, focalizando o olhar nos sapatos elegantes e bem engraxados. Virou a bebida de uma só vez. Isso trouxe lágrimas a seus olhos, e ela piscou para disfarçar.

- Onde está Remo?

- Ainda está no hospital, com a esposa. - Nicole tentou falar com voz normal, curiosa por não ter ouvido nenhum comentário sarcástico do patrão.

Ela apoiou as duas mãos na escrivaninha e se levantou. Sem querer, seu olhar cruzou com o brilho tempestuoso dos olhos de Sirius. Para Nicole, a sensação foi a de ter tocado uma cerca eletrificada. Ondas de excitação passaram por seu corpo. Deliberadamente, virou o rosto.
'Não! Não sou suscetível. Já provei a mim mesma inúmeras vezes.' - pensou ela.

- Então, acho que vai ter de assumir o lugar dele.

- Como?

Ninguém poderia assumir o lugar de Remo, o secretário particular mais devotado. Nada havia entre Remo e sua dedicação. Ele já admitira para Nicole que seu primeiro casamento acabara porque quase nunca ia para casa. Naquele exato momento, se Sirius ligasse para o celular dele, Remo viria correndo.

- Não é tão difícil. Relaxe. Só quero que anote algumas cartas.

Nicole pegou caneta e um bloco. Sirius falava devagar, não com a impaciência habitual. Nem reclamou dos telefones tocando sem parar. Com um gesto elegante, afastou-se para lhe dar passagem. Na ânsia de manter a maior distância possível entre os dois, Nicole desviou o corpo e perdeu o equilíbrio.
Foi segura por mãos fortes e protetoras. Sentiu a cabeça rodar e seu coração disparou.

- Tudo bem? - Sirius murmurou, mantendo as mãos nos braços dela.

- Sim, obrigada e desculpe.

Para Nicole, o perfume másculo e íntimo foi devastador. O que estaria acontecendo? Respirou fundo e arrumou o corpo. Só então Sirius soltou-lhe os braços.
A bebida já fizera efeito. Sua visão estava embaralhada, forçando-a a caminhar devagar através do corredor. Mesmo assim, não se sentia envergonhada. Ao contrário, sentia-se anestesiada contra a enorme dor que iria dominá-la. Uma dor que não se preparara para enfrentar. Enquanto não pensasse, estaria protegida.

- Sente-se, Nicole.

Com cuidado, ela se acomodou na cadeira mais próxima, apavorada ante a possibilidade de o patrão perceber-lhe o estado. De repente, a embriaguez tornou-se um incômodo, principalmente por acontecer na presença dele.
Desorientada, percebeu que Sirius estava em pé à sua frente. Com as mãos trêmulas, preparou o bloco e a caneta. O chefe não sentou. Caminhando com elegância até a janela, perguntou:
- Podemos começar?

Não fazia parte da personalidade dele pedir qualquer coisa. Sem graça, Nicole concordou. Embora Sirius falasse devagar, ela perdeu muitas coisas, porque sua mente divagava. O choque estava cedendo espaço para a realidade.

Há quanto tempo Yam manteria aquele caso com Emanuele? Lembrou a garrafa de vinho vazia na sala e os copos pela metade, no chão, ao lado da cama. Não fora um impulso. Eles haviam levado os copos até o quarto. Um encontro combinado no horário em que Nicole estaria trabalhando.

- Anotou tudo?

A página em seu colo estava em branco. Ela simplesmente fechou os olhos, respirando fundo para se controlar.

- Não há problema, Nicole. A carta não é importante. - a suavidade na voz dele assombrou-a e Nicole viu sinceridade naquele olhar. Sirius se aproximou e retirou o bloco das mãos trêmulas. - Alguma coisa perturbou você?

- Não foi nada.

- Notei que não está usando a aliança.
Nicole ficou pálida e deixou a caneta cair.

- Você está muito perturbada - Sirius murmurou gentil, de um modo que ela nunca ouvira antes. - Soube que foi chamada inesperadamente por alguém da família. - O que aconteceu?

Apesar de querer contar tudo e se livrar do veneno que a queimava por dentro, Nicole permaneceu em silêncio.

- Acho que o melhor a fazer é ir para sua casa, descansar um pouco.

- Não - ela respondeu, horrorizada. Emanuele a estaria esperando para o confronto final.

- Por que não? - Sirius perguntou sério.

- Porque encontrei meu noivo na cama com minha prima.
Assim que falou, Nicole surpreendeu-se, sem acreditar que contara o fato para o chefe. Um rubor tomou conta de seu rosto.

- Que bom que você escapou.

- Escapei? - ela perguntou desorientada.

- Sim. Pense em como seria muito pior se você descobrisse essa ligação sórdida depois do casamento. Escapou de um constrangimento maior.

- Agora não vai mais haver casamento.
Quando dissera as mesmas palavras, para a tia, sentia-se no meio de um pesadelo. No momento, a realidade era ainda mais dolorida.

- É lógico que não. Nenhuma mulher perdoaria uma traição dessas, não é?

Os dois ficaram se olhando em silêncio.
Perdão. Compreensão. Yam suplicara por ambos.

- Depois disso, - Sirius continuou persistente - como conseguiria confiar nele outra vez? Ou nela? Está pensando em desculpar seu noivo?

- Não - Nicole murmurou, sabendo que nunca mais confiaria nos dois.

No entanto, mal podia acreditar que estava tendo aquele tipo de conversa com Sirius Black. Ele era conhecido por não ter interesse nem benevolência com os problemas pessoais de seus funcionários. O jargão da empresa era que os melhores funcionários deixavam sua vida particular do lado de fora das Indústrias Black e nunca, jamais, permitiam que ela interferisse no trabalho.

- Por que está falando assim comigo? - ela murmurou.

- Você tem outra pessoa em quem possa confiar?

Nicole não acreditou. Era como se Sirius soubesse. Mas como ele poderia imaginar o grau de solidão em que se encontrava? Não poderia se consolar com os pais de Emanuele e não tinha outros parentes, ou amigos íntimos.

- Não, mas...

- Nada do que me contou sairá daqui - Sirius assegurou. Seu olhar, habitualmente mordaz e frio, mostrava uma ternura inusitada.

- Está sendo muito bondoso - ela agradeceu, ainda surpresa com aquela faceta desconhecida do caráter do chefe.

- Você sofreu um trauma. É natural que eu fique preocupado.

- Obrigada, mas não preciso de sua piedade.

- A última coisa que você inspira é pena. Deveria estar celebrando sua liberdade. A vida é muito curta para perder tempo com lamentações. Você já perdeu dois anos com aquele advogadozinho. O futuro pode lhe oferecer oportunidades mais interessantes.

- Como sabe que Yam é advogado?

- E não é? Pois tem toda a aparência de um de quinta categoria. Você mora com sua prima, não é?

Mais uma vez, Nicole ficou desconcertada com o conhecimento que ele demonstrou ter sobre sua vida. Sirius deu a explicação:
- Régulo me disse isso há alguns dias.

- Moro com minha prima, sim.

Nicole corou, lembrando o curto relacionamento que Emanuele tivera com o irmão de Sirius. A prima a mantivera informada de todos os detalhes do romance. A ligação havia embaraçado Nicole.

- Com certeza, não vai querer voltar para sua casa neste momento - Sirius falou, tirando um molho de chaves do bolso. - Pode usar o apartamento da empresa até conseguir se mudar.

Nicole assustou-se com a oferta. O apartamento ficava na cobertura do prédio, um andar acima, era usado apenas pela família Black e, ocasionalmente, por amigos pessoais.

- Eu não acho...

- Aonde mais poderia ir?

A idéia de enfrentar Emanuele, no estado em que se encontrava, era absurda. Ela encarou Sirius e aceitou as chaves.

- Não imagina como estou agradecida.

- Será um bom começo para uma nova vida. Vou oferecer uma festa esta noite. Não gostaria de ir? Acho que não deve ficar sozinha.

'Uma festa? Ele imagina que estou com disposição para ir a alguma festa? Será que enlouqueceu ou simplesmente não é capaz de compreender a gravidade do que acabou de acontecer em minha vida?'

- Estarei bem, obrigada.

Normalmente, quando Sirius dava festas, Remo comparecia para supervisionar os garçons e o serviço de bufê. Também ajudava a organizar os grupos e assegurava-se que tudo funcionasse a pagava pelo serviço extra.

- Ligo para você mais tarde. Vou mandar um carro buscá-la às sete horas - Sirius falou, como se ela não houvesse respondido.

Nicole tentou encontrar uma desculpa para não ir.

- Eu não tenho um...

- Não se preocupe, cara mia. Vou comprar um vestido para você.

- Mas eu...

Sem lhe dar chance de continuar, Sirius empurrou-a com gentileza na direção da porta.

- Agora, quero que suba para o apartamento e descanse um pouco. Pode praticar pensando em coisas otimistas, felizes e positivas. Sorria!

Com gentileza, Sirius virou-a de frente e passou o dedo sobre o lábio inferior de Nicole. Desconcertada, ela encarou os olhos acinzentados. Mais uma vez sentiu-se perturbada. Um arrepio percorreu seu corpo.

- Sr. Black...

- Sirius! - ele protestou em voz alta.

Ainda confusa, Nicole percebeu que Sirius foi até o telefone que ela nem ouvira tocar. Antes de atender, ele a instruiu mais uma vez a subir e descansar.
Nicole foi pegar a bolsa na escrivaninha. Sentia pontadas na cabeça. Tirou o elástico que lhe prendia os cabelos e passou as mãos pelas mechas brilhantes. O telefone sobre sua mesa tocava. Ela hesitou um momento antes de atender.

- Nick? - Remo falou com impaciência. - Onde estava?

- Eu fui...

- Por favor, preciso de sua ajuda - ele interrompeu. - Sirius me pediu para conseguir a assinatura de Régulo em alguns documentos e eu esqueci. Estão na primeira gaveta da minha mesa. Pegue um táxi até o estúdio de Régulo e consiga a assinatura antes que Sirius peça os papéis, está bem?

- Tudo bem.

- Você é um anjo. Aposto que sua substituta não chegará a seus pés.

Nicole lembrou que estava cumprindo aviso-prévio. Sua sucessora já havia sido escolhida e entraria em treinamento na semana seguinte. Yam não queria que a esposa trabalhasse fora.

Além de desempregada, ficaria com um rombo no orçamento. Colocara todo o seu dinheiro na casa, em estilo vitoriano, que Yam havia comprado. Durante vários fins de semana e várias noites, trabalhara lá. Pintara, colocara papel de parede e costurara cortinas. Pusera seu coração na reforma e na decoração. Ao perceber que nunca iria morar lá, não evitou um soluço.
Uma raiva antiga começou a crescer dentro dela.

Há três anos, observara de longe Yam perseguir Emanuele, sem sucesso. Mas a prima fizera charme a ele só por prazer. Durante os anos em que viveu na casa dos BonVoin, Nicole viu aquele filme inúmeras vezes. Tudo de que gostava, ou que lhe fosse caro, um dia era tomado por Emanuele. Só que daquela vez não foi um brinquedo ou uma roupa, mas o homem que amava.

Nicole foi tirada de seu devaneio pelo motorista do táxi.
Nunca havia estado no estúdio fotográfico de Régulo Black. A área da recepção era barulhenta e cheia de gente. Sentindo-se mal, forçou a passagem na direção indicada pela recepcionista.

Régulo se reclinava no encosto de uma cadeira colocada, no meio de um estúdio vazio, sob holofotes acesos. Parecia adormecido, mas, assim que Nicole entrou, abriu os olhos e sorriu.

- Quanta honra. Vai me dizer que finalmente aceitou minha oferta? Miss Dezembro, usando botas vermelhas e uma coroa de frutas natalinas? O que acha?

Nicole cerrou os dentes com força e corou. Não estava disposta a escutar as baboseiras de Régulo. Evitando o olhar malicioso, estendeu os papéis e pediu que ele os assinasse.
Régulo deu uma gargalhada.

- Qual é a graça? - ela perguntou um pouco agressiva.

- E uma piada particular.

- Se diz respeito a mim, não é particular.

- Para ouvi-Ia, você deve pagar um preço... - ele disse, divertido.

- Um preço?

- Quero saber uma coisa antes. Diga-me a verdade. Nunca sentiu atração por meu irmão? Nunca foi para cama com ele?

Nicole olhou-o, boquiaberta.
- Como?

- Sirius é charmoso e bonitão. As mulheres ficam loucas por ele. Se não fosse meu irmão, eu o detestaria. Vamos lá, pode me contar. Ele lhe fez alguma proposta? Como naquele filme em que Robert Redford propõe pagar um milhão de dólares por uma noite com Demi Moore? Você também poderia fazer seu pé-de-meia!

- Não estou entendendo - Nicole respondeu, sem acreditar na insinuação de Régulo.

Ele a fitou incrédulo.

- Vai me dizer que ainda não notou? Ou Sirius não tentou se aproximar de você?

- Se está querendo insinuar que seu irmão sente atração por mim, está completamente enganado.

- Você não iria para a cama com ele nem por um milhão de dólares? Ele pagaria sem piscar. Não, a soma mencionada foi de dois milhões.

A cabeça de Nicole começou a girar. O calor dos holofotes atrapalhava sua concentração.

- Que conversa mais desagradável, Régulo.

- Sirius a deseja. Desde quando isso é crime? É a luxúria que faz o mundo girar - ele falou impaciente.

'Será que Sirius Black quer mesmo me levar para a cama?' - Nicole não conseguia acreditar naquela história.

- Você não fazia a menor idéia, não é? Puxa, o amor é cego. - Régulo sacudiu a cabeça. - Escute aqui, não amoleça seu coração para meu irmão. Tenha sempre em mente que não gosta dele. Case com seu advogadozinho e viva feliz para sempre - aconselhou sem emoção, enquanto assinava os documentos.

Nicole achou que Régulo só podia estar inventando coisas. Já tivera outras demonstrações do humor negro que lhe era peculiar. Régulo notara que ela não gostava de Sirius.

'Será que fui tão óbvia?' - Lembrou-se da bondade e da tolerância que o chefe revelara momentos atrás e sentiu uma pontada de culpa. - 'Não. Eu realmente não gosto de Sirius Black. Detesto sua arrogância, sua impaciência, sua língua ferina e seu egoísmo. Também não gosto do modo como ele costumava tratar as mulheres. Como se fossem coisas, que pudesse comprar e descartar quando não o interessassem mais. Enjoava delas com rapidez.'

A vida de Sirius era uma seqüência de mulheres diferentes, carros velozes, boates, festas, verões no sul da França, invernos nos Alpes. Sempre que uma mulher deixava de interessá-lo, ele a presenteava com duas dúzias de rosas vermelhas e uma pulseira de brilhantes.
Naquele ponto, não era muito criativo. Nem precisava ser. As mulheres corriam atrás dele como abelhas atrás do mel, não precisava se esforçar para conquistá-las. Não precisava mentir ou trapacear. Também não se obrigava a fazer promessas, quando não tinha intenção de mantê-las.

'Oh, Yam, como pode fazer isto comigo?'- Nicole pensou, angustiada.

O calor no estúdio era sufocante. Ela sentiu a blusa grudar no corpo. Num movimento brusco, tirou o blazer e inspirou fundo. Dois milhões de dólares! Queria rir. Aquilo era absolutamente ridículo.

- Você sabe que um casamento custa muito caro - Régulo falou pensativo, observando Nicole com fascinação, enquanto o blazer lhe escorregava das mãos e caía no chão.

-Por que não reconsidera minha proposta? Ninguém precisa saber. Prometo que não publico as fotos. Seria um segredo... entre nós dois.

Magoada, Nicole olhou para Régulo e ouviu um barulho confuso atrás de si. Uma torrente de palavras em italiano feriu seus ouvidos. Um punho atingiu o ombro de Régulo e ele caiu para trás. Subitamente, Sirius apareceu, gritando com o irmão, puxando-o pela camisa, pronto para bater outra vez.

Pálido e assustado, Régulo se escondeu atrás de Nicole.
- Dio... alguém desligue este homem antes que ele me mate!

N/A: Eis o 1°cáp. Espero que tenham gostado.
Reviews, please. Para próximo prometo mais emoções.