Título: Apostando alto
Autora: Amy Lupin
Beta: Matthew Black Potter Malfoy
Par: Harry/Draco
Classificação: R
Resumo: UNIVERSO ALTERNATIVO. Baseada no enredo do filme Jogo de Amor em Las Vegas (What Happens in Vegas, 2008).
Disclaimer: essa história é baseada nos personagens e situações criadas e pertencentes a J.K. Rowling, várias editoras e Warner Bros. É também baseada no enredo do filme Jogo de Amor em Las Vegas (What Happens in Vegas, 2008). Não há lucro, nem violação de direitos autorais ou marca registrada.
A Causa
(Las Vegas, 9 de agosto de 2008, sábado)
Harry hesitou na porta da boate por um momento. Nunca fora adepto às noitadas. Nem mesmo quando ainda era um adolescente, muito menos agora que já estava perto dos trinta anos. Aquela multidão de pessoas cheirando a álcool e suor se acotovelando enquanto diziam estar dançando, todas aquelas luzes, as palavras sem importância gritadas ao pé do ouvido... Momentos como aquele o faziam se perguntar por que diabos estava em Las Vegas.
Ah, certo. Porque eu não tive muita escolha, disse a si mesmo com resignação. É só um fim de semana, repetiu para si mesmo como um mantra. Afinal, fins de semana costumavam passar voando para a maioria das pessoas, certo?
Certo, respondeu sarcasticamente para si mesmo.
Ao seu lado, seus melhores amigos - e atuais carrascos - Ron e Hermione, não pareciam compartilhar seus pensamentos a julgar pela maneira como olhavam para a mesma cena.
"Parece animado!" exclamou Hermione esticando o pescoço para tentar enxergar por cima da multidão. A mão no braço do marido se movia ao ritmo da batida.
"Nem pense em desistir, cara" Ron gritou próximo ao seu ouvido. Ele não precisava esticar o pescoço, pois era mais alto que a maioria das pessoas da boate, mas sua cabeça também se balançava num movimento aparentemente inconsciente. "Se bem que... eu bem que trocaria a balada por umas apostas" seu olhar se desviou languidamente para a sala adjacente à da boate, onde se podia ouvir o barulho das roletas e o som estridente de campainhas.
"Você se lembra do que nós conversamos sobre os jogos, não é mesmo Ron?" Hermione o cutucou severamente.
Ron revirou os olhos de modo que apenas Harry visse.
"Sim, sim, não gastar mais dinheiro do que o combinado, lembrar que as probabilidades estão a favor do próprio cassino, blá-blá-blá..." Ron baixou o tom de voz para que a esposa não pudesse ouvi-lo. "Ela me deu uma aula sobre porque os jogos de azar são proibidos em muitos países."
"E você prestou atenção em alguma coisa?" Harry perguntou sarcasticamente.
"Claro! O suficiente para poder fazer comentários como o que acabei de fazer. Ela suspeitaria se eu ouvisse menos do que isso. Casamento é assim, cara. Com o tempo a gente vai pegando as manhas" Ron deu tapinhas nas costas do amigo. "Agora siga em frente. O bar fica a uns cinco metros à direita, caso isso sirva de consolo."
"Obrigado."
"Vá com calma, heim?"
Harry fingiu não ter ouvido e se enfiou por entre a multidão sem se preocupar se estava sendo seguido. Na verdade, estava torcendo para que seus amigos fossem para qualquer outra direção. Não estava no melhor dos humores. Se parasse para pensar, não culparia os amigos. Afinal, eles só estavam tentando ajudá-lo. Mas Harry se sentia no direito de culpá-los pela própria frustração, nem que fosse apenas por alguns minutos.
Harry teve a sorte de se aproximar bem no momento em que um casal deixava o bar, o que permitiu que ele conseguisse um dos lugares para se sentar, enquanto o outro foi rapidamente engolido pelo traseiro avantajado de um senhor que se vestira como um elegante executivo numa provável tentativa de arrumar companhia. Um homem que chegara meio segundo depois fuzilou-o com os olhos, mas Harry o ignorou e fez sinal para o barman mais próximo.
"Boa noite. Um Dry Martini, por favor."
Harry percebeu que era atentamente observado pelo rapaz ao seu lado, cuja única característica que sua visão periférica permitia reparar era o cabelo loiro aguado em contraste com a camisa preta. Harry ficaria feliz em ignorá-lo também, não fosse o fato de seu observador ter lhe dirigido a palavra.
"Sempre um cavalheiro, Potter" disse o rapaz de um jeito arrastado que lhe pareceu familiar.
Harry o encarou e franziu os olhos por um breve segundo enquanto sua memória trabalhava no reconhecimento de seu interlocutor. Já fazia muitos anos desde a última vez em que o vira. Harry não se lembrava do nome da maioria das pessoas com quem estudara, mas aquele nome lhe saltou à boca tão rapidamente como se nunca tivesse caído em desuso.
"Malfoy."
Seu tom foi entre desconfiado e desafiador, porém mais por uma questão hábito do que intencionalmente. Seus olhos também se estreitaram pelo mesmo motivo.
"Não comigo, é claro" Draco Malfoy completou, como se já esperasse por aquela reação. Havia um leve sorriso desdenhoso em seu rosto pálido e pontudo quando ele voltou os olhos para frente e tomou um gole de sua bebida. "Certas coisas nunca mudam."
Harry achou ter detectado um leve toque de amargura no tom do outro e imaginou se ele já estava bebendo havia muito tempo. Seu próximo pensamento foi se devia apertar a mão do ex-colega de colegial. Antes que chegasse a uma conclusão, o barman deslizou seu copo pelo balcão e Harry imediatamente agarrou a oportunidade para ocupar a mão direita. Se Malfoy fizesse questão de cumprimenta-lo, que tomasse a iniciativa, assim como havia lhe dirigido à palavra.
"Como se você fosse um exemplo de conduta comigo, Malfoy."
"Qual é, Potter. Já fazem - o quê? - dez anos? Imagino que nós dois tenhamos amadurecido desde então."
Harry encolheu os ombros.
"Certas coisas nunca mudam, como você mesmo disse."
Malfoy lhe lançou um olhar de esguelha junto com um de seus sorrisos atravessados característicos e levantou o copo como se brindasse antes de tomar outro gole. Harry encarou a rodela de limão do copo dele rodopiando entre os cubos de gelo antes de balançar a cabeça diante da irrealidade daquilo e tomar sua própria bebida. Quais eram as chances de se encontrar um conhecido num bar em Las Vegas? E por que Malfoy, de todas as pessoas?
Porém, àquela altura Harry já estava se sentindo levemente culpado, tanto pela maneira como vinha tratando os amigos quanto pelo modo como acabara de falar com o ex-colega. Realmente, já fazia muito tempo. Talvez ele devesse dar uma chance ao outro.
"Então? O que o trás a Vegas?" disse, se inclinando ligeiramente em direção ao outro como se estivesse realmente disposto a ouvir sua resposta.
"Levei um pé na bunda. E você?"
Malfoy falou aquilo com tanta naturalidade que Harry pensou por um momento se devia acreditar naquilo. Então pensou: 'Bem, por que ele mentiria a respeito disso?'.
"Meus amigos me arrastaram para cá."
"Hmm" Malfoy lhe lançou um olhar superior, como se menosprezasse seu motivo. Então, como que para confirmar os pensamentos do outro, completou: "Já mencionei que fui trocado por uma garota?"
"Como?" Harry franziu as sobrancelhas. "Ela virou lésbica?"
Malfoy rolou os olhos.
"Não. Ele decidiu voltar a ser hétero."
As sobrancelhas de Harry se elevaram e ele tomou mais um gole de sua bebida para ganhar algum tempo antes de ter que responder. Havia ouvido rumores no colégio, mas nunca chegara de fato a acreditar. Afinal, Malfoy não era do tipo que fazia muitas amizades e as pessoas viviam inventando histórias sobre ele. Além disso, sempre achou Malfoy esnobe demais até para ser gay.
Sem saber o que comentar sobre aquilo, Harry optou por jogar o jogo de Malfoy.
"Já mencionei que meus amigos me arrastaram para cá para me manter longe do trabalho depois de descobrirem que eu estive trabalhando durante as minhas férias inteiras?"
"Eu vi aquela doninha que você chama de amigo por aí" Malfoy fez uma careta. "Junto com aquela garota sabe-tudo. Me diga, eles já começaram a própria prole ou estão esperando o preço da fralda baixar?"
Harry o encarou entre incrédulo e enojado.
"Você está falando sério, Malfoy? Depois de todo aquele discurso sobre amadurecimento?"
Malfoy suspirou e revirou os olhos.
"Tanto faz. Suponho que devamos voltar para nossa despretensiosa competição. Já mencionei que meu namorado me chutou no dia do nosso aniversário de quatro anos, depois de eu já ter comprado duas passagens para cá?"
"E o que fez com a outra passagem?" Harry perguntou depois de algum tempo se esforçando para não deixa-lo falando sozinho e voltar para o seu quarto de hotel.
Malfoy deu de ombros e encarou o próprio copo, como se falasse diretamente para ele.
"Vendi na internet" ele terminou sua bebida com um último gole e chamou o barman com um aceno, apontando para o próprio copo vazio. O barman pareceu entender o recado, pois o preencheu com outra dose do que quer que Malfoy estivesse bebendo antes.
Aquilo de alguma forma irritou Harry profundamente e antes que pudesse se conter, viu-se comentando em tom irônico.
"E seus pais deixaram você vir sozinho? Ou eles estão por aí, cuidando para que não falte nada para seu precioso filhinho?"
Malfoy o encarou com ferocidade, os olhos estreitos e as faces enrubescendo de raiva. Ou talvez elas já estivessem enrubescidas antes por causa do álcool, Harry não saberia dizer.
"E você, Potter? Onde estão papai e mamãe? Ah!" ele pôs a mão no peito com fingida surpresa. "Acabei de me lembrar, ele estão mortos!"
Harry já se considerava grandinho o suficiente para não se deixar abalar por comentários maldosos sobre seus pais, mas havia algo naquele rapaz que fazia com que ele se esquecesse disso e quisesse partir para a briga como um garoto procurando encrenca.
"Pelo menos eu não preciso que eles limpem as minhas cagadas por mim."
Harry não pretendia que aquela sentença saísse no presente, mas também não estava disposto a retirar o que dissera. Malfoy sempre fora um garoto arrogante, mimado e prepotente e não parecia ter mudado tanto desde os tempos do colégio. Porém sua certeza se abalou um pouco ao ver a maneira como ele parecia ter se perturbado com o comentário.
Malfoy aproximou o rosto do de Harry e chiou por entre os dentes em tom baixo e ligeiramente trêmulo de emoção contida.
"O que você saberia a respeito disso, Potter?" ele jogou uma nota no balcão e se levantou abruptamente, parecendo decido a abandonar a bebida intocada para colocar alguma distância entre ambos.
Porém, antes que ele se afastasse, Harry ouviu uma voz conhecida que fez ambos olharem para trás.
"Três minutos e meio! Ganhei! Eu disse que eles não aguentariam mais de cinco minutos" Ron tinha um sorriso satisfeito no rosto e estendia a mão com a palma voltada para cima bem abaixo do nariz da esposa, como se esperasse, que algo fosse colocado nela.
Hermione, visivelmente contrariada, entregou o cartão de crédito para o marido.
"Não sei porque fui concordar com isso" Mione se repreendeu em voz alta. "Olá, Malfoy."
Malfoy ignorou completamente o cumprimento e se dirigiu a Ron.
"O que nós não aguentaríamos, Weasel?" o desdém estava de volta às feições de Malfoy, cuja descompostura parecia agora uma lembrança distante. Tão distante que Harry sequer conseguia lembrar-se de seu próprio arrependimento por ter cedido à provocação do outro e baixado o nível da conversa.
"Ora, ficar mais do que cinco minutos próximos um do outro" Ron falou como se fosse óbvio. "Conversando. Essa foi boa..."
"Não acredito que você apostou sobre isso, Ron" Harry meneou a cabeça.
"Não acredito que você apostou com a própria esposa, Weasel! Deve estar mesmo desesperado por causa de dinheiro."
"Mione não queria me deixar começar a jogar ainda hoje" Ron explicou ao amigo ignorando completamente o ex-colega de colégio.
"Eu conheço você muito bem, Ron" Hermione cruzou os braços, finalmente desviando o olhar reprovador que estava lançando a Malfoy desde que fora ignorada. "Você vai acabar gastando toda a quantia que nós combinamos em uma só noite e vai passar o resto do tempo me implorando para liberar mais dinheiro."
"Ou eu posso ganhar o triplo do que gastar e então você vai se arrepender de não te me deixado apostar mais alto."
Hermione estava prestes a fazer algum comentário sobre a atitude infantil do esposo quando Malfoy a interrompeu.
"Quanto você apostaria por uma noite inteira?"
Os três se voltaram para Malfoy, que parecia pensativo.
"O quê?" Ron perguntou ao perceber que a pergunta fora dirigida a ele.
Malfoy umedeceu os lábios lentamente antes de responder.
"Quanto você apostaria se eu dissesse que posso aturar Potter pelo resto da noite?"
"O quê?" Harry perguntou indignado. Então olhou para Ron. "Não se atreva a considerar essa aposta, Ron."
"Ah, qual é, Harry... Não é como se você estivesse se divertindo" o ruivo deu de ombros.
"Ron!" Mione exclamou incredulamente.
"Mione, ele nem queria vir, pra começo de conversa!" Ron voltou-se para Malfoy, já vasculhando os bolsos. "Cinquenta pratas, Malfoy."
Malfoy soltou um bufo desdenhoso.
"Eu esperava mais, mesmo de você, Weasel. Estava falando de aposta de gente grande" Malfoy tirou um par de notas de cem dólares do bolso e jogou no balcão fazendo os olhos do barman brilharem. "Duzentas pratas ou nada."
Ron enfiou novamente as mãos nos bolsos, mas Hermione lhe deu um puxão.
"Ron, não seja ridículo!"
Harry alcançou o braço de Ron e o puxou para perto, falando ameaçadoramente.
"Você ficou maluco? Eu não vou aturar Malfoy na minha cola pelo resto da noite nem por mil libras, entendeu?"
"Harry, você não entende?" Ron choramingou. "Não é sempre que aparece uma oportunidade de ganhar duzentos dólares do Malfoy. Tudo que você tem que fazer é insultá-lo até ele cair fora. E, bem, eu poderia usar o dinheiro, você sabe..."
"Ron!" o aperto de Harry se tornou ainda mais forte.
"Harry, eu prometo que divido com você tudo o que ganhar com esse dinheiro. Bem, não vou prometer meio a meio, porque tem a Mione também. Então, um terço de... digamos... cinco milhões são... uma puta grana, pode ter certeza. Pergunte à Mione e ela vai dizer até os centavos. Anda, por favor, Harry. Por favorzinho..."
Harry soltou o braço do amigo e meneou a cabeça, passando as mãos pelos cabelos pretos bagunçados. Ron aparentemente tomou o gesto como consentimento e deu tapinhas nas costas do amigo.
"Você não vai se arrepender, amigão" garantiu.
"É bom você ganhar mesmo alguma coisa, porque você me paga por me meter nessa."
"É assim que se fala, cara. Vamos lá, vai ser como tirar doce de criança" Ron tirou duzentos dólares do bolso e mostrou para Malfoy, fingindo não reparar no olhar fulminante da esposa.
Malfoy e Ron começaram a negociar os termos da aposta, como quantos metros de afastamento eram permitidos entre ambos os envolvidos e o horário que seria considerado oficialmente como o término daquela noite, sincronizaram os relógios e trocam um curto aceno de cabeça antes de Ron se afastar com Mione depois de fazer um gesto assegurando que estaria de olho.
Harry virou as costas para os amigos, finalizando sua bebida enquanto se perguntava no que diabos havia se metido.
"Então" Malfoy se acomodou ao seu lado novamente, guardou seus dólares no bolso da calça e se apossou de sua bebida como se nada de extraordinário tivesse acontecido. "O que você tem feito desde... o colegial, Potter?"
Harry fez sinal para o barman, que chegou todo solícito, lançando olhares de esguelha para seu acompanhante.
"Mais uma dose, por favor" pediu.
-oOo-
(10 de agosto, domingo)
Harry acordou com uma sensação estranha ao mudar de posição na cama. Estava tudo errado: a textura dos lençóis, a macies desconfortável do colchão, a claridade por trás de suas pálpebras, a queimação no estômago... Mas a claridade era a mais incômoda de todas.
Grunhindo, fazendo careta e se amaldiçoando por ter colocado uma gota sequer de álcool no organismo, Harry se sentou desajeitadamente - seu estômago parecia ter virado do avesso - e tateou em direção à claridade até encontrar a cortina e fechá-la com um puxão. Após lidar com a mais urgente das fontes de seu desconforto, Harry se viu livre para concentrar-se nas demais. Havia a dor de cabeça incômoda, a boca seca, o hálito desagradável, a nudez e... ah, sim, o fato de que não se lembrava de onde estava.
Assim que parou para pensar no assunto, Harry suspeitou que aquele não era o quarto que havia se hospedado na noite anterior. Localizou os óculos ao lado da cama e vestiu-os. Os lençóis de seda preta e o ambiente requintado apenas confirmaram sua suspeita e a compreensão fez com que se cobrisse apressadamente antes que tivesse qualquer outra surpresa desagradável. Ao se enrolar no lençol, porém, algo chamou sua atenção. Um brilho dourado em sua mão esquerda e a sensação estranha e pesada em seu anelar.
Um flash súbito de lembrança fez com que Harry se apoiasse no parapeito da janela e olhasse mais atentamente para as dobras e contornos sobre a cama. Não havia mais ninguém lá, apenas os travesseiros e os lençóis revirados, mas a visão fez com que as lembranças voltassem com maior nitidez...
... a pele pálida e suave contrastando gritantemente com o negrume dos lençóis, as mãos longas de aparência delicada segurando com surpreendente força, os cabelos sedosos escurecidos pelo suor, os lábios finos e rosados entreabertos...
"Puta merda, o que foi que eu fiz?" Harry agarrou os próprios cabelos com força e se deixou escorregar para o chão.
-oOo-
Levou algum tempo para conseguir se acalmar o suficiente para pensar com coerência. Quando isso finalmente aconteceu, ele se vestiu num piscar de olhos e se certificou de que não estava esquecendo nada ao sair. Decidido a tomar um banho no próprio quarto, Harry ficou aliviado ao encontrar a chave com o número de seu apartamento e descobrir que felizmente ainda estava no mesmo hotel.
Tomou um banho demorado se esfregando mais que o necessário e só depois de vestir roupas limpas é que se deu ao trabalho de checar o próprio celular. Já passava das duas horas da tarde e havia dezenas de chamadas perdidas tanto de Ron quanto de Hermione, algumas mensagens de voz e outras mensagens de texto.
Além das de praxe 'Onde diabos você se meteu, cara?' e 'Cadê aquele cara de fuinha com as minhas duzentas pratas?', havia outras que indicavam que o dia havia começado cedo para seus dois amigos.
'Café da manhã, você não vem?'
'A noite deve ter sido mesmo um porre pra você não ter acordado ainda.'
'Harry, está tudo bem? O Ron quase derrubou sua porta de tanto bater e você não acordou! Sério, estou começando a ficar preocupada!'
'Ei, cara, a Mione já está achando que você voltou para Londres! Ela não sossegou enquanto não confirmaram que você ainda não fez o check-out. Bem, pra falar a verdade ela ainda não sossegou...'
'Almoço no cassino... Cara, se você não aparecer logo, não sei o que vou fazer para a Mione não chamar a polícia, sabe.'
A última mensagem havia sido enviada enquanto ele ainda estava no banho, o que fez com que Harry se sentisse menos culpado. Ele digitou uma resposta rápida e começou a pensar no que diria aos amigos enquanto chamava o elevador. Devia haver alguma saída. Preferia morrer a ter que contar a verdade a Ron. Mas talvez aquilo não fosse a verdade, talvez Harry estivesse realmente bêbado demais para se lembrar o que realmente havia acontecido.
'Você bem que gostaria' seu subconsciente rebateu sarcasticamente.
Harry só não bateu com a cabeça no espelho ao entrar no elevador porque estava acompanhado por um senhor de aparência respeitável.
Não havia como negar o que havia acontecido. A cada minuto que passava, Harry tinha mais certeza do que tinha feito, apesar de não conseguir entender o porquê. A única coisa que lhe ocorria no momento era que talvez pudesse desfazer aquilo tudo antes que seus amigos sequer desconfiassem. Estava decidido a procurar Malfoy logo depois de assegurar os amigos de que estava tudo bem e... consertar as coisas. Malfoy com certeza ficaria feliz em colocar a culpa no álcool e ambos concordariam em esquecer tudo.
"Harry! Aqui!" Mione e Ron o avistaram assim que saiu do elevador e Harry sentiu outra pontada de culpa ao pensar quantas vezes eles haviam olhado naquela direção.
Harry deu um sorriso sem graça e evitou encará-los enquanto se acomodava ao lado de Mione - o lugar que julgou mais seguro - e tentava se preparar para o que viria em seguida.
"Harry, o que aconteceu? Onde é que você esteve?" Hermione perguntou, preocupada.
"Dormindo" Harry respondeu apenas a segunda pergunta, tentando ganhar mais tempo.
"Você devia comer alguma coisa" Hermione acenou para um garçom antes que Harry pudesse dizer que não estava com um pingo de fome.
"Dormindo até agora?" Ron se espantou. "Cara, eu imaginei mesmo que você fosse ficar de ressaca depois de ter que aturar Malfoy por meia hora, que fosse. Mas se você dormiu até uma hora dessas, ele deve ter dado um trabalho e tanto pra sair da sua cola. Olha, cara, sinto muito por ter metido você nessa..."
"Ah, agora você está com remorso?" Harry se viu projetando sua frustração no amigo, como se aquilo encobrisse a raiva que sentia de si mesmo. Ron pareceu envergonhado, porém aquilo não fez com que Harry se sentisse melhor. Muito pelo contrário.
"Ei, vamos deixar essa conversa para depois?" Hermione interrompeu, apontando para o garçom que aguardava pacientemente ao seu lado. "Harry, você precisa comer alguma coisa."
"Hmm... um café, por favor" Harry pediu e continuou antes que a amiga protestasse. "Mione, não acho que meu estômago conseguiria processar comida agora. Mais tarde eu como, prometo."
Hermione bufou, contrariada, porém cedeu.
"Bem..." Ron recomeçou, evitando encarar o amigo nos olhos. "Agora essa história me parece uma bobagem, para falar a verdade. Obrigar você a aturar Malfoy por causa de tão pouco... OUCH!" o ruivo encolheu a perna de repente e Harry teve a impressão que não foi apenas por causa do olhar fulminante da esposa. "Por qualquer quantia que fosse, quero dizer. Sinto muito, cara. Mas" ele esfregou as mãos, subitamente animado. "Por falar nisso, aonde é que Malfoy se meteu? Eu bem que poderia usar minhas duzentas pratas agora. Mas pense nisso como um investimento. Não sei porque, mas tenho certeza que vou ganhar alguma coisa com essa aposta."
'Talvez uma dor de cabeça como a minha' Harry pensou, amargurado, e se sentiu aliviado quando o garçom escolheu aquele preciso momento para voltar com seu café.
"Obrigado" ele falou. Talvez tenha soado agradecido demais por uma simples xícara de café que ele provavelmente ainda teria que pagar uma fortuna.
"Aliás" Ron continuou, parecendo não notar a aflição do amigo. "Quanto tempo você realmente aguentou? Hermione e eu voltamos para o bar algum tempo depois e vocês já não estavam. Então, por volta das duas horas da manhã, quando nós voltamos para o nosso quarto, batemos na sua porta e não tivemos resposta. Imaginei que você já estivesse dormindo. Mas se você só acordou agora..."
"Bem..." Harry limpou a garganta após terminar sua xícara de café torcendo para que ela parasse em seu estômago. "Na verdade, tenho quase certeza de que já era de manhã quando Malfoy e eu nos... separamos."
Harry tentou esconder o rubor enquanto Ron ficava pálido. Harry não soube dizer como Hermione reagiu, pois estava decidido a não deixar que ela visse seu rosto. De algum modo achava que a amiga conseguiria ver exatamente a lembrança que lhe veio em mente, caso seus olhos se encontrassem.
"O-o quê?" Ron gaguejou. "Como assim? Você está de brincadeira, certo?"
Harry balançou a cabeça negativamente, evitando olhar para o amigo.
"Mas... mas você não tem certeza, não é mesmo? Talvez tenha bebido um pouco além da conta. Nós três sabemos como você não consegue processar muito álcool..."
"Sinto muito, Ron..."
"Espera" Ron praticamente gritou, fazendo com que o coração de Harry disparasse. Será que ele desconfiava? Será que Harry tinha deixado escapar alguma coisa? "Já sei! É isso! Alguma hora vocês devem ter ficado mais de dois metros longe um do outro?"
"Não, acho que não..." Harry meneou a cabeça novamente, mantendo o olhar abaixado para as próprias mãos.
"Qual é, Harry! É claro que vocês devem ter se afastado em algum momento! Tente se lembrar... Será que nenhum dos dois teve que ir ao banheiro ou coisa parecida?"
Harry sentiu outra onda de calor nas faces quando as palavras do amigo fizeram com que se lembrasse de mais detalhes sobre a noite anterior. Sim, eles tinham ido ao banheiro da boate mais de uma vez durante a noite, mas definitivamente haviam ficado menos de dois metros longe um do outro.
"Ron, eu..." Harry começou a querer se desculpar novamente, porém um grito de Hermione o interrompeu.
"Harry! O que é isso?" ela apontou para suas mãos, tampando a própria boca num gesto de assombro.
Harry olhou - realmente olhou daquela vez - para as próprias mãos ao mesmo tempo em que Ron se levantava para espiar por cima da mesa. Lá estava a aliança. E Harry a estivera girando nervosamente no próprio dedo apenas momentos atrás sem nem mesmo se dar conta do que fazia. Sequer conseguia pensar no motivo pelo qual não a havia tirado.
'Merdamerdamerdamerda...'
"Você se casou?" Hermione o encarou de olhos arregalados.
"O quê? Como...? Com quem?"
"Acho que esse seria eu."
Três pares de olhos se voltaram para cima ao mesmo tempo e o estômago de Harry deu dois nós cegos. Malfoy estava em pé entre Ron e Hermione, com o mesmo esgar de escárnio de sempre, exibindo uma aliança idêntica no próprio anelar esquerdo. Por algum motivo, o fato de suas roupas e seus cabelos parecerem impecáveis irritaram Harry mais do que qualquer outra coisa. Como ele podia parecer tão composto depois de tudo o que acontecera? E por que ele estava falando aquilo para os seus amigos quando Harry preferia esfolar a própria língua a admitir o que acontecera?
Quando ninguém demonstrou nenhuma intenção ou capacidade de responder, Malfoy continuou.
"Acredito que você me deva alguma coisa, Weasel. Antes que você comece a chorar dizendo que não tem o dinheiro agora, adianto que já estou fazendo check-out no hotel. Mesmo que não estivesse, você teria que mandar entregar no meu quarto, o que custaria uma gorjeta da sua parte e eu duvido que você tenha alguma coisa sobrando" ele estendeu a mão na frente de Ron, que parecia abobalhado demais sequer para retrucar, quanto mais para reagir. "Vamos, Weasley. Não tenho o dia todo!"
Foi Hermione quem pareceu se recuperar primeiro do choque, vasculhando a própria bolsa atrapalhadamente e entregando duas notas de cem dólares para Malfoy, que as enfiou no bolso sem nunca perder a expressão de nojo. Hermione, ofegante, evitou olhar diretamente para qualquer dos companheiros. Draco tornou a se pronunciar antes que qualquer outra pessoa reagisse.
"Harry" ele pronunciou o nome com tanta afetação quanto costumava cuspir seu sobrenome. "Acredito que nós temos muito que conversar. Estarei nos caça-níqueis."
Sem esperar por qualquer resposta, Malfoy deu as costas e se afastou pomposamente. Só então Harry percebeu que estava com os punhos fechados com tanta força que as unhas começavam a machucar as palmas das mãos. Talvez se ele simplesmente matasse Malfoy, pouparia muito trabalho. Ficaria viúvo, mas feliz.
A raiva morreu subitamente quando Harry baixou os olhos para os amigos, que agora o encaravam com o mesmo assombro com que haviam encarado Malfoy momentos atrás.
"Harry...?" Hermione foi a primeira a quebrar o silêncio e fez com que os ombros de Harry desmoronassem.
"Sim, eu fiz uma bela cagada, está bem?" Harry admitiu, sentindo-se desanimado demais para se importar. "Eu não devia ter bebido tanto, pra começo de conversa. Vocês sabem como eu fico deplorável quando bebo demais. Mas como vocês esperam que eu explique isso? Eu nem sabia que era possível... quero dizer, nós somos dois caras!"
Ron ficou em pé de repente, fumegando de raiva.
"Eu devia ter desconfiado que aquele maricas fosse apelar para alguma coisa do tipo. Está na cara que ele colocou alguma coisa na sua bebida e fez você ter umas alucinações. Ou melhor, pesadelos! Mas eu vou ensinar uma bela lição a ele, ah se vou..."
"Ron!" Hermione tentou impedir o marido, mas Ron passou por ela como se nem a notasse.
Num piscar de olhos, Harry havia se colocado na frente do amigo.
"Ron, espera..."
"Sai da minha frente, Harry. Eu vou fazer ele confessar, você vai ver..."
"Ron, me escuta!" Harry empurrou-o, fazendo com que ele quase caísse de volta na própria cadeira.
"Posso ajuda-los, senhores?" um segurança praticamente se materializou ao lado dos dois, fazendo com que Hermione sufocasse um grito.
"Não é necessário" Harry assegurou sem nunca deixar de olhar o amigo nos olhos. "Nós só estamos conversando, não é nada de mais."
"Se precisarem de mim, estarei por perto" o segurança lançou um último olhar demorado para ambos e sumiu com a mesma rapidez com que havia aparecido.
"Ron, presta atenção" Harry recomeçou, dessa vez num tom mais brando. "Ninguém colocou nada na minha bebida. Eu estava apenas bêbado. Aliás, nós dois estávamos..."
"Mas, Harry..." Ron interrompeu com a voz mais aguda que o normal. "É do Malfoy que nós estamos falando!Como você possivelmente poderia ter se casado com aquele... Quero dizer, você precisaria estar mais do que bêbado pra fazer isso..."
Harry tentou ignorar a parte de si mesmo que concordava plenamente com o amigo.
"Eu dei uma mancada, já admiti isso. Ainda não sei como isso foi acontecer, acredite, mas não sou idiota a ponto de colocar a culpa em outra pessoa. Foi erro meu, portanto sou eu quem vai consertar. Entendeu?"
"Porra, Harry" Ron passou a mão pelos cabelos, inconformado. "Como você conseguiu estragar tudo desse jeito? Era uma aposta ganha e você..."
"ESQUECE a aposta, Ron" Harry respirou fundo e voltou a abaixar o tom de voz. "Tenho coisas muito mais importantes que dinheiro para me preocupar no momento, se você ainda não percebeu. Vou falar com o Malfoy. Posso contar com vocês dois para ficarem fora disso?"
"Como quiser, cara" Ron espalmou as mãos em sinal de rendição.
Hermione abriu a boca para falar alguma coisa, porém tornou a fechar e se limitou a acenar com a cabeça.
Só quando Harry relaxou foi que percebeu o quanto estivera tenso. Decidido a acabar com aquilo o mais rápido possível, deu as costas aos amigos e fez o mesmo caminho que Malfoy havia feito. Demorou algum tempo para encontrá-lo em meio à tantas variedades de caça-níqueis. Malfoy estava colocando moedas em aparentemente todas as máquinas livres e puxando a alavanca com determinação... para que nada de extraordinário acontecesse. A julgar pela familiaridade que Malfoy mostrava em sua pequena rotina, ele já devia estar fazendo aquilo havia algum tempo.
Harry limpou a garganta.
"Malfoy."
Malfoy olhou por cima do ombro para Harry brevemente antes de puxar mais uma alavanca.
"Você ronca" ele disse voltando a encarar as figuras que rodavam na máquina à sua frente.
Harry fechou as mãos em punhos e meneou a cabeça para si mesmo por sequer achar que seu maior problema durante aquela conversa seria ficar relembrando o que se passara entre ambos apenas algumas horas atrás. Era praticamente impossível casar suas memórias com aquele bastardo parado à sua frente.
"Aonde você estava esse tempo todo?" Harry se viu perguntando antes que pudesse se conter. Se aquela conversa tivesse acontecido antes que Harry encontrasse seus amigos, talvez eles nem tivessem ficado sabendo.
"Eu ia dizer que não é da sua conta, mas suponho que seja. Não é mesmo, querido?"
"Corta essa, Malfoy" Harry falou entredentes enquanto olhava ao redor para se certificar de que ninguém estava ouvindo. Mesmo que fosse provável nunca mais voltar a ver aquelas pessoas na vida.
"Como eu ia dizendo" Malfoy pegou outra moeda do bolso da calça de alfaiataria e depositou na próxima máquina assim que ficou claro que o jogo anterior não daria em nada. "Você ronca. Eu não consegui dormir muito. E como parecia que você não estava com pressa de ir embora, fui dar uma volta. Também imaginei que você não iria me querer por perto quando acordasse" ele virou o rosto apenas o suficiente para que Harry visse seu sorriso enviesado. "Você estava bêbado como um gambá ontem à noite."
"E imagino que você não estivesse também" Harry retorquiu.
Malfoy soltou uma risada de escárnio.
"É óbvio que eu estava bêbado ou nada daquilo teria acontecido" ele teve que pular a próxima máquina, onde havia uma pessoa jogando, e Harry se viu obrigado a dar mais alguns passos para perto. Era típico de Malfoy querer demonstrar que estava no controle da situação fazendo com que Harry o seguisse.
"Que bom que nós dois concordamos em alguma coisa" Harry falou sarcástico. "E o que é que vamos fazer a respeito?"
"Imagino que me mudar para o seu apartamento esteja fora de questão" Malfoy se virou novamente para o outro com um sorriso enviesado enquanto acionava a manivela. Harry se limitou a deixar bem claro que não estava achando graça. Malfoy tornou a lhe dar as costas e manteve os olhos fixos na máquina enquanto as figuras giravam novamente num borrão de cores. "Vou dar entrada com a papelada para a anulação na segunda-feira, Potter. Não se preocupe, não deve levar muito mais do que algumas assinaturas. Vamos, vamos, vamos!" Malfoy ficou atento quando a primeira figura a aparecer no caça-níquel foi uma moeda, porém meneou a cabeça quando algo parecido com um limão apareceu em seguida. Ele vasculhou os bolsos com certa dificuldade daquela vez e pegou mais uma moeda. Estava prestes a colocá-la na máquina quando se interrompeu, beijou-a e só então a depositou.
Harry ficou parado por algum tempo imaginando se ele já havia dado o assunto por encerrado. Estava prestes a se virar para ir embora quando Malfoy praguejou e bateu na lateral da máquina.
"Eu realmente não devia ter esperado muito desse dinheiro. Qualquer coisa que viesse daquele pé-rapado do Weasley não daria sorte nem a um pé de coelho" Malfoy girou nos calcanhares para encará-lo. Antes que Harry tivesse qualquer chance de defender o amigo, porém, ele continuou. "E por falar em custar" Malfoy levantou as mãos e tirou a própria aliança, oferecendo-a a Harry. "Acredito que isso seja seu."
Harry abriu a boca para dar alguma resposta espertinha, porém tornou a fechá-la e sentiu o rosto enrubescer. Lembrava-se vagamente de ter insistido para pagar pelas alianças, como se aquilo fizesse algum sentido já que Malfoy provavelmente tinha muito mais dinheiro no Banco do que Harry conseguiria economizar a vida toda.
Sem nenhuma palavra, Harry aceitou o anel. Era mais pesado do que aparentava. Harry levantou os olhos para o homem à sua frente. Malfoy empinou o nariz e enfiou as mãos nos bolsos, como se o desafiasse a dizer alguma coisa. Daquela vez, Harry se esforçou para encontrar alguma semelhança entre ele e as lembranças, que não paravam de voltar, cada vez mais ricas em detalhes ou mais confusas.
Malfoy sorriu e Harry não se lembrava de jamais tê-lo visto tão descontraído. Ele devia sorrir mais...
..."Então, Harry, o que me diz de irmos logo para a pista de dança? Ou você ainda não bebeu o suficiente?" Malfoy ofereceu-lhe a mão com uma seriedade típica dos bêbados, mas tudo o que Harry conseguiu pensar, em sua própria embriaguez, era em como nunca havia ouvido seu nome daquela mesma boca sem o característico tom de desdém...
...Draco jogou a cabeça para trás enquanto ria de algo que Harry havia dito. Uma risada melódica que Harry jamais julgara possível sair daqueles lábios...
...Harry encarou o rosto de Draco abaixo de si, emoldurado pelos cabelos brilhantes, pálido contra os lençóis, corado de excitação e vulnerável, tão vulnerável. "Não se mexa" lembrava-se de ter dito em meio ao seu torpor. "Você fica lindo desse jeito."
Harry desviou os olhos, corando novamente. Pela primeira vez, sentiu um aperto no peito. Havia algo ali que não conseguia dar nome e que o fez se sentir envergonhado por ter tentado ignorar tudo a princípio. Aquilo tudo era para ter significado alguma coisa, não era? Ainda que estivesse bêbado demais para pensar coerentemente, alguma coisa devia ter feito com que ele se casasse com Malfoy naquela noite.
Felizmente Malfoy escolheu aquele momento para soltar uma exclamação e tirar uma moeda do bolso, aparentemente absorto demais em seus próprios assuntos para reparar no que se passava diante de seu nariz.
"Veja só, ainda sobrou uma moeda" ele olhou da moeda para o outro e a estendeu. Harry aceitou por puro reflexo. "Toma. Para você não dizer que eu nunca lhe dei nada. Além de uma surra no colegial, é claro. Tenha um bom dia, Potter."
E com aquilo, Malfoy passou por ele como se já o houvesse esquecido.
"Ei!" Harry exclamou indignado quando finalmente conseguiu articular alguma palavra, porém já era tarde. Lembrava-se muito bem de qual briga Malfoy se referia e tinha certeza de que havia saído menos machucado do que o outro na ocasião.
Ainda incrédulo, Harry olhou para a moeda em sua mão e deu de ombros. Aproximou-se da máquina que Malfoy acabara de abandonar e depositou a moeda, acionando a alavanca em seguida. Enquanto as figuras se misturavam num borrão de cores, Harry se perdeu em pensamentos.
Como é que Malfoy ousava tratá-lo daquela forma? Harry certamente não estava se sentindo desapontado, afinal não devia ter esperado que o loiro agisse de outra forma, certo? Conhecia Malfoy, sabia que ele seria capaz de qualquer coisa para ganhar um argumento - quanto mais uma aposta!
Mas o Malfoy que Harry conhecia era apenas um garoto. Aquele Malfoy já devia ter aprendido algumas lições com a vida àquela altura.
'Certas coisas nunca mudam' Harry se lembrou.
De alguma fora, Harry achou tudo muito deprimente. Talvez fosse aquilo que o estivesse incomodando tanto: o fato de que alguém pudesse chegar ao ponto de fingir ser outra pessoa completamente diferente apenas como subterfúgio para ganhar uma aposta. E permitir que as coisas chegassem ao ponto em que haviam chegado...!
Harry teve seus pensamentos interrompidos ao perceber que havia algo errado. Alguma coisa diferente estava acontecendo. O barulho do cassino havia mudado, se tornado de alguma forma mais direcionado. Levantou os olhos para descobrir que várias pessoas haviam se aglomerado ao seu redor e outras ainda estavam chegando, olhando para ele com cara de espanto e apontando. Em seguida, Harry reparou numa música irritante e deu um passo para trás ao perceber que havia luzes piscando ao redor do caça-níquel à sua frente e...
"Três moedas! Ele ganhou!" alguém gritou e o burburinho de repente se transformou numa cacofonia.
"Você ganhou, cara" um homem apontou para o letreiro acima da máquina que mostrava um número com muitos zeros.
Harry foi sacudido, várias pessoas deram tapinhas em suas costas, seguraram seus braços e por um momento ele amaldiçoou os americanos por serem tão invasivos. Por que ninguém respeitava seu espaço? Onde estavam Ron e Hermione quanto ele mais precisava? Eles sabiam o quanto Harry odiava ser o centro das atenções...
"Ei, essa era a minha moeda!" uma voz arrancou-o de seu estupor.
Lá estava Malfoy, se espremendo nada delicadamente entre algumas pessoas para chegar até ele. Aquilo fez com que a raiva borbulhasse instantaneamente nas veias do de Harry.
"Sua moeda? Você acabou de dar ela para mim!"
Um sorriso torto se espalhou lentamente pelo rosto de Malfoy.
"Como você preferir... querido."
-oOo-
Notas e avisos: Nem acredito que escrevi alguma coisa depois de tanto tempo! Ah, a saudade estava me matando...
A fic já está finalizada e tem 10 capítulos no total. Os capítulos foram divididos por conveniência, por isso já aviso que os tamanhos podem variar bastante. Será narrada inteiramente sob o ponto de vista de Harry.
Apesar de começar em Las Vegas, a fic é ambientada em sua quase totalidade em Londres, no ano de 2008. Tentei ser o mais fiel possível aos lugares e costumes Londrinos, embora nunca tenha morado - nem mesmo passeado - no exterior. Por isso, peço que me desculpem se algo fugiu à realidade do país.
Optei por não usar nenhum personagem desconhecido e tentei me ater apenas àqueles que teriam sobrevivido até o ano de 2008, seguindo a cronologia dos livros, embora pelo menos dois deles tenham escapado a esse critério. Procurei também utilizar o maior número possível de elementos dos livros, situações, características dos personagens, etc., apesar de que em algum ponto possa tê-los distorcido um pouco para adaptá-los à situação, pelo que peço também a compreensão de vocês...
Enfim... reviews são sempre bem-vindas! Até o próximo capítulo!
