Havia uma meia marrom sobre sua cama.

Não realmente marrom, marrom era uma palavra demasiadamente simples para definir a cor daquela peça de roupa; era uma espécie de bege escuro acinzentado, como aqueles barbantes estranhos que sua avó compra para fazer tapetes de crochê que jamais serão usados, e tinha alguns detalhes em tons diferentes da mesma cor desagradável.

Ah, por detalhes, entenda-se estampa argyle. Quem diabos tem meias com estampa argyle? Além de professores substitutos de romances vintage, claro.

Quanto mais Alfred encarava a meia, mais inconcebível ela se tornava. Era apenas um pé, estirado sobre sua cama em meio a toda a roupa limpa, parecendo terrivelmente fora de lugar em meio à profusão de azul e branco. Até havia uma jaqueta marrom em algum lugar, mas era um marrom bonito, cor de chocolate, e portanto não combinava em nada com aquela meia estúpida.

Suspirando, pegou a meia com todo o cuidado de alguém designado a segurar um pote contendo amostras de sangue infectado por um vírus que devora a carne, e desceu as escadas de seu prédio até a área da lavanderia. Entre os oitenta apartamentos existentes no prédio, as chances de que o dono daquela aberração decidisse dar as caras antes que todo o seu guarda-roupa fosse infectado pela estampa argyle cor de crochê de vó parecia muito pequena.

Seus chinelos estalavam contra os degraus, o que era uma coisa boa, pois o silêncio do prédio em horário comercial era quase sufocante. Morava no décimo sétimo de vinte andares, e o elevador havia sido desligado por questões de racionamento de energia – o que o fez diminuir drasticamente o número de vezes em que saía do apartamento em geral. Bocejou, esfregando um dos olhos preguiçosamente por baixo dos óculos, e abriu a porta da lavanderia com o ombro, quase derrubando a pessoa que tentava abrir a porta do outro lado.

"Oi, olha por onde anda!"

O cérebro de Alfred decidiu ignorar a mensagem e se focar em coisas mais importantes, como o sotaque legal que a proferira. Uma sinapse preguiçosa mandou-o abrir os olhos, e ele a obedeceu pela metade.

"Mm?"

Olhos muito verdes olhavam para ele com reprovação. Uma boca fina torcida para o lado completava a expressão, que outra sinapse igualmente preguiçosa notou que combinava com os traços do rapaz à sua frente.

"Acho que seria muito pouco proveitoso tentar expor o fato de você quase ter me der—porque está com minha meia?"

Meia? Olhou para sua mão e lembrou-se do motivo de estar ali. Ah, sim. Olhou de novo para o rapaz, vestindo um colete por cima de uma camiseta e sapatos estilo Oxford, e dele de volta para a meia. De fato, as imagens se complementavam. Voltou-se novamente para ele e sorriu.

"Você tem roupas estranhas."

A boca fina torceu-se ainda mais para a esquerda, e um pouco de cor subiu ao rosto pálido. A sinapse preguiçosa de antes decidiu que essa expressão combinava ainda mais com o rosto daquele estranho mal-vestido.

"Seja como for, gostaria de estar em posse de todos os meus estranhos artigos de roupa, então se não se importa..."

Alfred riu um pouco, estendo a meia ainda segura apenas pela ponta de seus dedos indicador e polegar.

"Você fala de um jeito estranho também."

O rapaz suspirou e fechou os olhos muito verdes, tomando bruscamente a meia para si enquanto a raiva começava a tingir seu rosto de vermelho. Francamente, havia um máximo de estupidez que ele poderia tolerar às dez da manhã de um sábado, sem uma xícara sequer de chá em seu organismo.

"Bom, se me dá licença, eu e minhas estranhezas temos mais o que fazer do que falar com estranhos rudes. Passar bem."

Fez para sair, uma pilha de roupas limpas balançando em seus braços enquanto tentava se espremer entre o portal estreito e o americano obtusamente largo.

"Alfred."

Olhou por cima do ombro, franzindo o cenho levemente. Ajustou o peso da pilha de roupas e endireitou a coluna, virando-se mais propriamente para o outro.

"Acho que está me confundindo com alguém. Meu nome é Arthur."

"Bom saber!" Sorriu e ajeitou os óculos que escorregavam pelo nariz. "O meu é Alfred, e agora não sou mais um estranho rude, certo? No máximo, um conhecido rude. Você e suas estranhezas teriam tempo para um desses?"

"Você sempre será estranho, não se engane." Disse Arthur rindo e balançando a cabeça. "Infelizmente, eu e minhas estranhezas ainda temos que calcular uma forma de levar tudo isso" e apontou com o queixo para as roupas em seus braços "dezesseis lances de escada acima."

"Dezesseis? Foi você que se mudou semana passada para o 174?" Arthur acenou lentamente em concordância, se perguntando se realmente deveria dar detalhes de sua localização àquela pessoa. Por fim, definiu que ele eventualmente descobriria de um jeito ou de outro, limpou a garganta e disse um 'sim' sem muita convicção.

Se Alfred notou a desconfiança e inquietude que gritavam nos olhos verdes do outro, as ignorou com maestria e sorriu de uma orelha a outra. Em sua defesa, ele provavelmente não as notou.

"Que demais! Eu moro logo em frente, no 171. Sorte, huh?"

Sorte nunca pareceu a Arthur um conceito tão relativo quanto naquele instante.

"Quer dizer, eu posso te ajudar e tals. Depois de raptar sua... meia... é tipo o mínimo que eu posso fazer." Disse limpando os óculos, pois havia acabado de notar uma impressão digital na lente que o estava distraindo com vigor dos olhos muito verdes previamente mencionados, e aquilo não estava certo.

E quando ele colocou os óculos de volta no rosto, a armação pendendo levemente para baixo do lado esquerdo, e sorriu meio sem graça com uma das mãos na nuca, Arthur decidiu que sorte era sim uma palavra perfeitamente cabível para definir aquela situação.