O que Petúnia Calou
Ah, eu estava tão orgulhosa do meu Duzinho! Mesmo depois de quase ter morrido por causa daquele anormal que eu fui obrigada a aceitar debaixo de meu teto, ele ainda agradecia! Agradecia, ainda que aquele moleque não tivesse feito mais que sua obrigação! Meu Dudoca estava virando um homem...
Fui retirada dessa agradável corrente de pensamentos quando ouvi a porta bater. Olhei em volta e percebi que meu filhinho havia saído, deixando-me a sós com o fardo que eu finalmente ia largar. Eu estava sozinha com meu sobrinho. Com a cópia quase perfeita do homem que fora a ruína da minha irmã. Era desconfortável estar sozinha na mesma sala que aquele garoto, cujo rosto era o de um vagabundo estranho... mas que tinha olhos verdes extremamente familiares. Os olhos dela. Os malditos olhos de Lílian Evans, os malditos olhos verdes daquela anormal que era minha irmã! Eu não queria me demorar sequer mais um segundo ali, portanto guardei meu lenço e me despedi de uma vez daquela aberração:
-Bem... Adeus
Fui em direção à porta, mas alguma coisa me fez parar e olhar pra trás. Não sei dizer o que foi. Tudo o que sei é que naquele instante me dei conta de que aquela provavelmente seria a última vez que eu veria qualquer vestígio dela. De Lílian. Daquela traidora, mas ainda assim minha irmã. Lembrei-me de quando costumávamos brincar naquele parquinho quando éramos crianças, antes daquele garoto esquisito estragar tudo. Por um segundo, quase falei para os olhos dela o quanto eu sentia sua falta. Que sentia muito pelo que havia acontecido. Mas essa loucura passou depressa. Lílian para mim se fora muito antes de sua morte. Ela se foi quando me abandonou para ser um bicho estranho. E depois ainda se explodiu e deixou aquele filhote de aberração para eu cuidar! Aquele filhote de aberração que era a cara do pai, mas lhe roubara os olhos. Aquele rosto, o cabelo e a cicatriz tiraram de mim qualquer lembrança boa que eu ainda tivesse dela. Por causa dele eu perdi de vez a minha irmã. Por isso, dei as costas àquela parte da minha vida que finalmente deixava para trás e saí em direção ao futuro. Futuro esse que, por ironia do destino e culpa da minha maldita irmã, me ligava ainda mais o mundo do qual, em um momento de loucura, eu tentei fazer parte, mas que sabiamente tenho evitado desde então.
