Só Por Um Segundo
por Ireth Hollow
Draco Malfoy não contava encontrar alguém naquela zona tão vazia e fria do castelo, quando todos os alunos já estavam no conforto das respectivas Salas Comuns. E, contudo, não havia dúvida alguma de que os suaves gemidos de dor que ouvia eram humanos, nem que provinham da esquina mais próxima.
Imediatamente, foi percorrido por sentimentos diametralmente opostos: curiosidade e prudência. A sua mente aconselhava-o a continuar o seu caminho, assegurando-se de que o seu segredo permaneceria seguro; o seu corpo impelia-o na direcção do som que inexplicavelmente o cativara, qual canto de sereia.
Após alguns momentos de indecisão, decidiu investigar. Demoraria, apenas, o tempo necessário para satisfazer a curiosidade ansiosa que, agora, o dominava, mas não seria o suficiente para revelar a sua presença – e, consequentemente, aquilo que tinha de permanecer secreto. Moveu-se, pois, tão silenciosa e rapidamente como uma sombra, atento a qualquer ruído que ousasse misturar-se com aquele pranto sedutor.
Embora estando ainda a alguns metros da fonte do som, já podia afirmar com segurança de que se tratava do choro de uma rapariga. E, no entanto, não era um choro comum: era o lamento de um coração despedaçado, era o gemido de uma alma agonizante. E era, também e por contraste, o som mais belo que já ouvira. Quase podia imaginar as lágrimas a escorrer por uma face devastada pela mágoa, os ombros assaltados por implacáveis estremecimentos, as mãos violentamente contorcidas uma contra a outra…
Estacou a um passo de descobrir a identidade da desconhecida. Fechou os olhos por uns momentos, numa tentativa de acalmar o seu coração alvoroçado e evitar que a sua respiração se tornasse demasiado audível. Contudo, mais uma vez, a curiosidade sobrepôs-se à cautela, com o auxílio de uma impaciência recém-nascida, e ele ousou espreitar, só por um segundo. E, só por um segundo, viu os indomáveis cabelos castanhos a cobrir uma face molhada pelas lágrimas, a esconder uns olhos, também castanhos, que ele adivinhava vermelhos e infinitamente sofredores. E os ombros, tal como ele imaginara, violentamente sacudidos por soluços, e as mãos torcidas e trémulas, e aquele choro que ameaçava perigosamente destruir a sua resistência.
No entanto, o segundo terminou e Draco Malfoy virou as costas a Hermione Granger, afastando-se tão silenciosamente como se aproximara. Fugia daquela dor, que o cativava e dilacerava ao mesmo tempo; fugia da sua vontade, que o tentava arrastar para junto dela; fugia dos seus próprios sentimentos, que insistiam em também humedecer os seus olhos, em sintonia com os dela. E fugia de tudo isso, amaldiçoando a sua fraqueza, desejando nunca ter posto a vista naquele cenário.
O gemido estava cada vez mais distante, mas continuava vivo no seu espírito. A visão daquele corpo prostrado pela dor, daquele rosto molhado e, ainda assim, dotado de um misterioso encanto, durara apenas um segundo, mas acompanhá-lo-ia durante muito mais tempo, talvez para sempre. Porque, durante aquele segundo, quis segurá-la nos seus braços, quis recolher as suas lágrimas, quis beijar a sua boca e fazê-la curvar-se num sorriso. Porque, durante aquele mísero segundo, repudiou a tatuagem no seu braço, arrependeu-se de actos futuros e amou apaixonadamente Hermione Granger. E, mesmo tendo terminado já esse precioso segundo, tudo isso permanecia dentro de si, eternamente condenado à reclusão.
Fora só por um segundo, mas fora o suficiente.
N/a: Para a Fran, que leu primeiro, comentou e, sabe-se lá porquê, gostou. (L)
