AVISO IMPORTANTE:
Esta fanfic é feita em parceria com mais duas autoras: Ivi Canedo e Juliana Yagami (rosenrot), como no ff. net não tem a opção de co-autoria, infelizmente todas as fics são postadas com o meu perfil.
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Saint Seiya (Os cavaleiros do Zodíaco) e todos os seus personagens pertencem a Masami Kurumada e a Toei e tem todos os seus direitos reservados.
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Personagens originais como algumas das Bacantes são de nossa autoria; é proibido o uso delas sem aviso prévio.
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Sinopse:
Quando as trevas regem a vontade do homem, seu único alento é a fé. O que seriam os deuses? Humanos que transformaram o mundo? Pessoas dotadas de poderes especiais? Lendas transfiguradas através dos tempos? Ou apenas fatos além da compreensão comum. Shaka é um vampiro milenar que possui uma missão: encontrar o deus de seu clã, Os Seguidores de Seth, do qual é líder e sumo sacerdote. Impelido por uma fé inabalável, ele passara milênios nessa busca incansável, guiado apenas pelos papiros antigos da civilização egípcia, numa disciplina de fé e persistência. Foi durante um ataque do clã rival, os Espectros das Sombras, que Shaka fizera sua maior descoberta. Porém, antes mesmo de saber que a busca pelo deus de seu povo havia se findado, o sacerdote encontrara algo que lhe era muito mais urgente que fé: Shaka encontrara o amor eterno. Contudo, a sede pelo poder do líder dos Espectros das Sombras pode ameaçar sua existência e com ela essa historia de amor que tivera início há milênios!
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(Rosenrot - Juliana) rosenrotstuff
(Amanda) amandaknabben
********************Cap 1**********************
Vale do rio Nilo, há 2.000 anos A.C.
Quando tudo ainda era apenas terra, céu e mar, eles já habitavam o planeta. Com seus olhos felinos que rutilavam toda a ambição intrínseca de seu ser, tomaram o poder, criaram grandes civilizações, trouxeram vida e morte para um único patamar. Filhos da noite, na noite eles reinam, e ela os abraça como a mãe protetora envolve suas crias.
Uma delas era um rapaz de aparência muito jovem, rosto delgado e angelical, grandes e expressivos olhos verdes, uma pele tão branca quanto o mais puro marfim e longos e exóticos cabelos cor de lavanda, que caiam em madeixas trançadas por suas costas e eram ornadas por minúsculas contas de ouro.
O valioso metal também lhe adornava o corpo forte e esguio, e tilintava conforme ele se movimentava para sentar nas escadarias de pedras do palácio onde morava, à beira do rio mais fértil de todo o nordeste Africano.
Olhava inconformado para toda aquela movimentação ruidosa de sacerdotes que iam e vinham agitados. Não queria dormir, não queria mesmo!
Havia conseguido evitar o sono nos últimos séculos, mas agora que seus pais haviam acordado, quem iria governar os povoados e cidades que englobavam o que se conhece hoje por Antigo Egito, eram eles.
Seu governo estava no fim, fechando mais um ciclo.
— Mas que droga. Justo agora? Eu queria acompanhar a construção do novo canal... — resmungou, vendo os sacerdotes aprontarem suas vestes cerimoniais.
Um homem alto, muito parecido com ele, porém que exibia cabelos em um tom esverdeado, olhos violetas e peculiares pintinhas avermelhadas no centro da testa no lugar das sobrancelhas, sentou-se a seu lado lhe pousando a mão em um dos ombros.
— Ah, Seth, não seja mimado. — disse com um sorriso terno, enquanto abraçava o irmão — O pai e a mãe acabaram de acordar. Sabe que é a vez deles. Depois, você já aprontou demais enquanto eles dormiam. Vamos, não vai ser tão ruim assim. Logo estaremos juntos novamente e, quem sabe, eu até deixe você governar um pouco sozinho.
Os olhos verdes do mais novo brilharam e ele deu um enorme sorriso.
— Promete, Osíris? Promete que quando acordarmos poderei ser novamente o faraó por alguns anos?
— Prometo. — disse Osíris taxativo — O povo amou você, mas é bem verdade que quase faliu o Egito todo, seu festeiro. — levou a mão à cabeça do irmão bagunçando seus cabelos — Por isso, eu lhe prometo que permito, mas por pouco tempo. Caso contrário a bagunça que terei que arrumar vai ser faraônica! — riu, se levantando e puxando o outro consigo, que não cabia em si de felicidade — Agora vamos. Os ritos de mumificação irão começar e precisamos nos preparar para o sono.
— Está bem, Shion, digo , Osíris... Ah, esses títulos que nos dão me confundem. — disse esfregando as mãos uma na outra — Venha, vamos logo! Quanto mais cedo dormirmos, mais cedo iremos acordar!
— Eu sabia que ficaria animado, meu pequeno Mu. No entanto, deve sempre se lembrar de seu título. Eles nos são muito importantes, Seth! — disse Shion, beijando a testa do mais novo, como numa despedida singela e carinhosa — Vamos. Bastet, Rá, Hórus e Aset nos esperam.
Os irmãos seguiram juntos e calmamente para o interior do palácio, onde os altos sacerdotes já preparavam o mais puro linho para os rituais de mumificação. Assim, os quatro filhos do clã Nut, Bastet, Hórus, Osíris e Seth foram enfaixados e colocados em sono profundo, até que Rá e Aset governassem em seu tempo e os despertassem.
Mas assim como as areias do deserto e as águas do Nilo nunca são as mesmas, o tempo também tratou de modificar o destino de Seth e dos filhos da noite.
**** Quatro mil anos depois****
Quando ainda era vivo, a única certeza que tinha era de que todas as respostas aos mistérios do mundo estavam nos livros.
Ainda era muito jovem quando se descobriu fascinado pelos amontoados de letras impressas nos papeis e todo o peso de seus significados.
Fora justamente esse fascínio que o impeliu a ingressar na carreira de bibliotecário, apenas para poder ficar perto de seu objeto de desejo e predileção.
Na noite em que fora abraçado, tinha um papiro nas mãos. Um dentre os tantos que compunham cerca dos 700 mil rolos que existiam na Biblioteca de Alexandria.
Esse e mais alguns outros pergaminhos foram um dos poucos tesouros que conseguira salvar do incendeio que destruiu séculos de história, e com os quais passou quase toda sua pós-vida, se dedicando a decifrar os anagramas que acreditava ser a chave do mapa que o levaria até seu deus maior, Seth, um dos vampiros originais, um verdadeiro deus que caminhou sobre a Terra, o criador do caos, senhor dos raios e das tempestades!
Foram anos de estudos, buscas inúteis e perguntas sem respostas. Viu o mundo se transformar diante de seus olhos sempre analíticos. Tornou-se um sacerdote respeitado por seu clã, muito sábio e influente, porém todas as suas buscas foram em vão.
Os pergaminhos agora não eram mais necessários. Foram substituídos por papel, depois por irritantes telas digitais que só agrediam suas íris sensíveis à luz.
Arqueólogo autodidata, caminhou por toda a Terra, desde sua pátria natal, a Índia, onde costumava sempre voltar quando se sentia muito distante de si mesmo e de suas crenças, já que Seth parecia não passar mesmo de uma lenda, até as pátrias mais novas, onde o sangue jovem e pueril lhe exercia verdadeiro fascínio!
Foi numa dessas viagens que fazia como sumo sacerdote do clã Setita, onde visitava outros membros que moravam em países diferentes para lhes inteirar de suas buscas acerca do paradeiro de Seth, que algo muito grave aconteceu.
Enquanto estava reunido no Irã com os membros do conselho que seguiriam ao Egito, sede principal do clã, e onde estavam concentradas suas maiores riquezas e influências, fora atacado covardemente por um bando feroz de Espectros das Sombras, um clã rival e cria do mundo novo.
Ele era o sacerdote mais antigo e o mais sábio de todo seu clã, e também o alvo principal do ataque. Suas vestes egípcias, os adornos em ouro, as joias ritualísticas que sempre usava, o cabelo loiro muito longo e a testa pintada em azul turquesa o tornavam fácil de ser reconhecido, já que ele se destacava entre os demais.
Assim como é comum nos jovens a gana de viver sem limites e a pressa em experimentar o novo, o clã dos Espectros das Sombras atacaram o conselho dos Setitas com uma violência ímpar e uma euforia desmedida. O que eles procuravam no sumo sacerdote? Ora, o que se procura em um acervo com mais de dois mil anos de histórias? Conhecimento!
A sabedoria que lhes faltava para o domínio completo e absoluto da raça. E ninguém mais indicado para lhes dar o que queriam do que o sangue ancestral dos Seguidores de Seth, principalmente de seu representante maior, o qual era carregado de preciosas informações sobre o mundo antigo e a sociedade vampírica.
O embate foi ferrenho e muitos sucumbiram. O templo dos Setitas ficou em ruínas e o sumo sacerdote, mesmo muito poderoso se viu em um dilema de vida e morte. Sentiu que um poderoso membro dos Espectros estava presente no ataque, talvez fosse seu líder em pessoa e o sacerdote, sendo muito sábio, logo percebeu que não poderia enfrenta-lo ali, ou correria o risco de ser derrotado e seu sangue rico em informações sigilosas selar o destino de toda sua espécie. Mesmo a contra gosto, sua razão falou mais alto e ele fugiu.
Muito ferido devido à batalha, o sacerdote correu entre as cordilheiras iranianas acidentadas até chegar às planícies da costa do Mar Cáspio. Finalmente havia conseguido despistar seu perseguidor ao mesclar o odor de seu sangue com a lama barrenta da orla marítima, por onde se arrastou até chegar à uma rocha muito grande. Contudo, o sacerdote agora tinha outro problema, tão grave quanto ser capturado e morto pelo possível líder dos Espectros, o amanhecer.
Quando seus olhos âmbares circundados por um anel carmim ergueram-se para o céu e viram a movimentação dos pássaros que anunciavam a alvorada, uma nova jornada se iniciava. Agora ele teria que sobreviver aos primeiros raios da manhã.
Em desespero, o sacerdote se pôs a correr em busca de algo que lhe servisse de abrigo, mas tudo era orla marítima e planícies. Já muito fraco, pensou em desistir quando olhou para o horizonte e viu o astro rei despontar ameaçador entre as montanhas. Seus olhos queimavam e quando tudo parecia perdido foi impelido por uma força maior que o fizera juntar o pouco que lhe restava de ânimo e correr até um grupo de rochas na parte setentrional da praia.
Quando chegou às pedras notou uma pequena abertura. Nem pensou duas vezes para se enfiar lá dentro e se proteger dos letais raios do astro rei.
O calor daquela estrela terrível era tamanho que ele de tudo fez para se embrenhar ainda mais para dentro daquela gruta, e quando achou que tinha atingido o limite, que não tinha mais para onde ir, o chão cedeu e ele caiu uns quatro metros para baixo, no que parecia ser uma catacumba, ou cripta... ou até mesmo um covil!
Muito assustado, se levantou rapidamente do chão. O lugar era muito escuro e úmido, cheirava mal e se não fosse por sua visão aguçada não veria um palmo diante dos olhos. Estava machucado, cansado, assustado e muito fraco, mas sua alma de explorador e sua curiosidade falaram mais alto e imediatamente passou a dedilhar todo aquele lugar, como um cego lendo em braile!
Depois de longos minutos tateando rochas, seus olhos já se acostumaram com a escuridão do local. Agora conseguia ver que as paredes internas da gruta eram esculpidas com desenhadas de hieróglifos tão antigos que nem mesmo ele conhecia. A única certeza que tinha era de que estariam ali há milênios!
No entanto o que hieróglifos faziam em solo iraquiano? Estranhou.
Em uma bancada mais ao fundo, haviam algumas joias, bem como objetos de ouro e peças que remetiam à civilização egípcia da antiguidade. Aproximou-se das peças e notou que atrás dessa bancada havia outra abertura, por onde ele teve que se agachar para conseguir passar.
Nessa nova saleta, havia uma catacumba rodeada de alguns esqueletos que ainda estavam revestidos por vestes carcomidas pelo tempo, e pelas túnicas longas pareciam ser membros de alguma seita, ou irmandade.
A essa altura, era óbvio que ali dentro daquele túmulo havia algo, ou alguém, importante e que precisava muito ser escondido do mundo. O sacerdote se arrastou entre as ossadas ao pé do mausoléu, mas quando foi tentar puxar a enorme pedra de rocha maciça para destampar a tumba, sentiu suas forças o abandonarem de vez.
Com toda aquela descoberta, ele não se dera conta de que estava muito ferido e precisava descansar para se recuperar. Sendo assim, se encostou aos pés da catacumba e se deixou entregar ao sono reparador.
Só quando o sol se punha no horizonte, é que dentro da caverna o sacerdote começava a despertar. Senti-a se ainda muito cansado, débil e fraco. Precisava se alimentar. Podia sair daquela gruta imediatamente e beber até se sentir forte o suficiente para voltar à sua casa, mas algo o impelia a abrir aquela cripta. E foi exatamente o que fez.
Juntando o pouco de forças que lhe restava, o loiro segurou a rocha muito pesada com ambas as mãos para tentar levantá-la do encaixe com a tumba. Mesmo fazendo uma força imensa, conseguiu mover poucos centímetros apenas, mas o suficiente para enfiar os dedos na fenda e arrastar a rocha, agora sentido horizontal, escorando os pés na base da cripta como apoio para lhe dar mais força.
O que não contava era que toda a borda que envolvia a rocha era feita de algum tipo de material cortante. Sentiu seus dedos sendo rasgados, enquanto puxava a peça pesadíssima, mas não desistiu de movê-la o suficiente para ver o que havia no interior da tumba. Quando terminou, suas mãos estavam ensanguentadas e algumas gotas caíram sobre o rosto daquele que dormia ali dentro.
Dentro da catacumba havia um túmulo de bronze e ouro, o qual abrigava o que aparentemente parecia uma múmia, já que o corpo estava totalmente envolto em tiras de linho que um dia fora branco, mas que agora tinham um tom ocre envelhecido. O rosto estava intacto, apesar de seco e mumificado. As grossas tiras de tecido encobriam a cabeça e o cabelo. Duas pequenas manchas acima dos olhos, onde deveriam ser as sobrancelhas, denunciavam se tratar talvez de algum membro de uma tribo antiga, cujos costumes eram exóticos ou estabeleciam ritos funerários.
No entanto, o sacerdote não tinha tempo de decifrar os mistérios daquele indivíduo mumificado. Precisava correr atrás de sua própria sobrevivência, ou ficaria tão fraco que não conseguiria mais sair daquela caverna.
Juntando todas as forças que lhe restava, ele deixou a caverna e saiu em busca do alimento que encontrasse por ali mesmo. Torcia para não ter de entrar na cidade, pois estava vestido para os ritos cerimonias, todo adornado em ouro, com braceletes suntuosos, um colar egípcio enorme todo cravado em pedras de jade e lápis lazúli, além de anéis. Havia perdido o adorno que usava na cabeça durante a luta e a fuga, mas seu semblante não era menos chamativo sem ele, pois tinha toda a parte de cima do rosto, o que compreendia os olhos e toda a testa, desde as têmporas, pintadas com uma tinta azul turquesa. Os olhos azuis, quando não estava em sua forma vampírica, eram contornados em preto, e preto também eram os desenhos que se espalhavam por todo seu corpo seminu, principalmente nos ombros, costas e coxas. Além do cabelo loiro muito longo que cobria todas suas costas, a única coisa que lhe encobria a intimidade era um saiote longo de linho branco, que estava todo manchado de barro e sangue e que tinha duas fendas frontais que saiam da virilha e desciam até o chão, preso por um cinturão de ouro.
Ou seja, em pormenores, se aguem o visse nesses trajes teria sérios problemas!
Por isso, o sacerdote saciou sua fome ali mesmo, numa aldeia próxima de onde estava. Como era muito silencioso e estratégico, abateu dois homens que montavam guarda em um barracão de sementes. Enquanto se alimentava de um, mantinha o outro paralisado por seu poder, até que esvaiu toda a vida dos dois homens sem desperdiçar quase nenhuma gota.
Enquanto isso, na gruta à beira da praia, um fenômeno acontecia.
O sacerdote não percebera ou apenas não dera importância, mas seu sangue derramado na hora em que abrira a lápide escorreu pela tampa de rocha e pequenas gotas pingaram entre os lábios da múmia.
Em instantes, como comportas que se abrem após anos represando um rio, o sangue começou a percorrer o interior do corpo ressequido, se espalhando rapidamente como em uma trilha de pólvora acessa.
Por cada célula que passava reativava suas funções, indo imediatamente para a próxima. Era um processo rápido, incomum e fenomenal. Apenas aquela quantidade ínfima de sangue fora o suficiente para cumprir seu papel, e quase uma hora depois que o processo se iniciara, a múmia tremelicava as pálpebras enrijecidas e despertava de seu sono milenar.
Mu estava confuso e letárgico. Sentia uma dificuldade descomunal para se mexer. Era como se tivesse areia entre os ossos e além disso, uma fome avassaladora o tomava por completo, o impedindo de raciocinar a tal ponto que não conseguia entender o que acontecia consigo.
Por isso que, reunindo forças se pôs sentado e com alguma dificuldade retirou aqueles trapos que o revestia. Estava lento, fraco e tão dolorido como jamais se recordara. No entanto, tudo era fome.
Ainda que fosse extremamente difícil caminhar, se arrastou para fora do túmulo observando tudo à sua volta. Não entendia o que estava fazendo ali, o que ou de quem eram aqueles esqueletos, só se via dentro de uma tumba no que parecia ser uma gruta, pois era escuro e cheirava a mofo.
Avistou alguns morcegos no teto... A fome agora era incontrolável.
Sequer pensou duas vezes, agiu por puro instinto, pois precisava recobrar suas forças e num salto agarrou dois deles e os devorou por inteiro. Assim fez com outro e mais outro, rasgando a carne, triturando os ossos, mastigando de forma animalesca.
Não era bom, tampouco saboroso, mas pelo menos agora conseguia ficar em pé e ter forças para caçar algo mais consistente, mesmo que ainda estivesse com os membros rijos e a pele seca, completamente enrugada.
Saiu daquela caverna à duras penas. Sentia o cheiro do gado, porém num raio muito distante de onde estava. Movimentou-se com certa agilidade, os morcegos foram ruins ao paladar, mas lhe asseguraram energia suficiente para chegar até uma vila, onde farejara quatro pastores que cuidavam de um rebanho de cabras.
O ataque fora feroz e fulminante. Em poucos minutos ele estava de cócoras sobre restos de vísceras, sangue, ossos e matéria orgânica disforme. Pouca, aliás, já que devorava a caça num todo.
Assustadas as cabras se dispersaram e agora completamente revigorado Mu analisava, mas consciente, como esconder o estrago da carnificina que acabara de fazer.
— Droga... Shion não vai gostar nada disso. Muito menos a Yuzuriha, ou o pai... Tenho que enterrar logo esses restos. Algo está errado... — dizia a si mesmo o jovem Nut, em sua língua mãe, que era o sânscrito, uma língua morta há milênios.
Sem demora, achando que iria levar uma bronca do irmão mais velho, Mu cavou um buraco no chão usando as garras e enterrou os restos de sua refeição. Ao término estava completamente sujo de uma mistura medonha de terra, vísceras e sangue.
Envergonhado, olhava para si mesmo inconformado, tanto por estar imundo, quanto por estar sozinho. Onde estavam seus irmãos? Por que não havia sacerdotes e sacrifícios em seu despertar? Havia acordado sozinho, num lugar fedido e estranho, e as poucas lembranças que o sangue de seu despertor lhe dera não foram o suficiente para deixa-lo à par do que acontecia.
Procurando por respostas, Mu regressou ao lugar do qual era seu único ponto de referencia no mundo todo. A gruta à beira da praia, onde despertara.
Antes de entrar na fenda, porém, caminhou até o mar e entrou na água. Queria se livrar de toda aquela imundice grudada em sua pele, mas por mais que se esfregasse não tinha perícia nenhuma, já que eram sua mãe e seu irmão que sempre o ajudava a se limpar depois que se alimentava, portanto conseguiu se livrar apenas da sujeira mais grossa.
Foi exatamente nessa hora, quando estava acocorado na beira da praia esfregando as unhas umas contra as outras, tentando tirar a terra que tinha por baixo, que o sumo sacerdote Setita regressara.
Após recobrar as forças, o sacerdote poderia ter partido de volta à sua casa usando seus poderes em auxílio, era o mais sensato a fazer, já que estava sendo perseguido. Mas a curiosidade profissional e a euforia de ter feito uma descoberta arqueológica misteriosa o fez voltar àquela mesma gruta onde encontrara a múmia.
Contudo, quando se aproximava da fenda viu a figura agachada sobre a orla. Ainda de longe, ficou a observá-lo sem saber de quem se tratava. Pelos cabelos muito longos e de tom peculiar, que à luz do luar parecia de um pérola rosado, julgou não ser um Espectro das Sombras, já que quase todos os membros ostentavam cabelos curtos e de tons escuros.
Outro fator também o levou a crer que não era um inimigo. O fato de estar nu e sua presença, que era absurdamente poderosa. Seu odor também era único. Não se recordava de algo parecido ao consultar seu acervo mental.
Quando deu mais três passos na direção da criatura fora notado e ela então virou o rosto para trás encarando seus olhos. Já havia sentido o cheiro do sacerdote e o reconhecera como seu despertor por causa das poucas lembranças do sangue. O analisou rapidamente e pela maneira como estava vestido julgou ser um de seus sacerdotes, já que possuía vestes egípcias, porém não parecia. Era bonito demais e sua presença era envolvente, como nunca sentira.
A princípio o sacerdote também ficou estupefato pela beleza ímpar dos traços da criatura, mas não fora isso que lhe chamara a atenção e sim as duas pequenas manchas que tinha sobre os olhos, no centro da testa.
— Não é possível! — exclamou em voz baixa, pois reconhecera aquele sinal na mesma hora. O tinha visto na múmia que descobrira logo mais – Você... – não sabia o que dizer, pois ela o olhava como um bicho acuado, concentrada e atenta a seus mínimos gestos, totalmente em alerta – Olá... Eu... Puxa! Você deve ser um dos antigos! — disse emocionado, com os olhos vidrados nela – Eu... meu nome é Shaka... posso me aproximar? Você... você me entende? – perguntou.
Mu se levantou devagar o olhando nos olhos em silêncio, sem se importar com sua nudez, enquanto a brisa da maresia balançava seus cabelos molhados. Não entendeu o que ele falou de pronto, mas ao beber seu sangue havia absorvido algumas informações, entre elas a habilidade de falar em egípcio antigo, já que só falava originalmente em sânscrito.
— Não entendo o que você fala...
Porém, Shaka entendeu. Como arqueólogo conhecia muitas línguas e como líder do clã Setita o egípcio antigo era uma das línguas que falava fluentemente.
— Eu imaginei. — disse o sacerdote — Agora entende? Entende o que falo?
— S-Sim... — respondeu Mu com autoridade, pois se ele era um dos sacerdotes que deveriam despertá-lo iria puni-lo pela maneira como o despertara, o obrigando a sair para caçar — Seu despertar foi falho. Por que não me concedeu o sacrifício de sangue? Há algo errado... onde estão os outros sacerdotes? Você é meu responsável? Se for, é bem incompetente. Banhe-me! Por culpa do seu erro despertei faminto e fraco, e... Estou sujo! – disse olhando para as mãos ainda muito sujas. Só pensava na bronca que levaria de Shion.
Por falar no irmão, já havia se dado conta de que ele não estava por ali e de que deveria ter despertado no tempo errado, porém quanto? Nem esperou o sacerdote lhe responder às perguntas que fizera antes e já lhe questionara novamente:
— Me responda: Em que ano estamos? Suas memórias de sangue não foram suficientes para me situar no tempo, sacerdote. — fixou o olhar naqueles olhos incrivelmente azuis aguardando ansioso pela resposta, que veio como uma maldição.
— Eu não sou seu despertor, por isso está confuso. Eu o encontrei por acaso e... não sou seu servo, nem seu sacerdote. Estes, creio estarem mortos há muito já. Acho que está sozinho. E estamos no ano 7.098 depois de Caim. — disse Shaka, com certo pesar na voz. Olhava para ele completamente fascinado. Deveria ser mais antigo até que si.
O Nut escutava atentamente, discordando do que ele dizia, pois era obvio que ele era seu despertor, sentia seu sangue correndo dentro de si, mas quando o ouviu dizer em que ano estavam Mu arregalou os olhos em completo pavor.
— 7.000... 7.098?... N-não... Não... Não pode ser! Não é possível!
Suas pernas fraquejaram e ele caiu de joelhos sobre a areia molhada. Em desespero, levou as mãos à cabeça, apertando os dedos contra o cabelo e depois as escorregando para o rosto, que começava a ser banhado por lágrimas rubras de dor, medo, aflição e agonia. Agora que o sacerdote lhe dissera o ano em que estavam, ativou seu poder para tentar rastrear seus irmãos, era para isso que os pontos na testa lhe serviam, não podia localiza-los, mas podia senti-los, e sua dor e desespero só aumentaram quando percebera que não havia mais nenhum membro do clã Nut a caminhar sobre a Terra. Tentou mais algumas vezes, em vão. Nenhum Nut entrava em sua frequência mental. Era como se sua existência tivesse sido apagada completamente. Tudo que obtivera fora silêncio.
O belo vampiro do rosto azul estava certo, ele era o único Nut em toda a superfície terrestre.
— Nããããããããããoooooooooooooooo! — o grito gutural de dor e agonia do jovem Nut ecoou pelos rochedos iranianos, ressoou com as ondas do mar e tocou o coração frio de Shaka, que de inicio apenas ficou o observando impassível. Não sabia quem ele era, nem a que clã pertencia, se era amigo, inimigo...
Pelo pouco que pode entender, e como era muito inteligente, juntou as peças do quebra cabeças e percebeu que aquele vampiro despertou muito depois do que imaginara, ou do que fora programado para ele e isso era realmente traumático!
Compadecido de sua dor, Shaka se ajoelhou na areia a seu lado e tocou em seu ombro com suavidade.
— Se acalme. Eu acho que posso ajudá-lo. — disse.
— Não... você não pode fazer nada... todos... todos eles...
— Na caverna há vários escritos em hieróglifos. Sou estudioso de línguas extintas, mas não consegui decifrá-los. Talvez eles possam te indicar algo... E, depois, não podemos ficar aqui fora. Esse lugar não é seguro. Há muitos de nossa espécie perseguindo meu clã. Eu não sou seu servo, mas se despertei você irei protegê-lo e ajuda-lo... Mas, precisa ver se consegue ler os escritos da caverna, pois podem ser mensagens deixadas para você quando despertasse. Mas antes me diga, quem é você? Como devo chama-lo?
O Nut enxugou as lágrimas de sangue e olhou nos olhos do sacerdote. Como ele poderia entender a dor que sentia? Havia perdido tudo, todo seu mundo havia ruído. Osíris, Bastet, Hórus, Rá, Aset... Todos mortos em definitivo. Estava sozinho. Desejou que jamais tivesse despertado.
Em profunda melancolia, não achou motivos para dizer nem seu nome, tampouco seu título de poder, que não lhe valeria de nada naquele momento. Provavelmente seu título e significado nem mais eram reconhecidos nesse mundo novo, e sem sua família de que lhe adiantava ser Seth?
Por isso, tocou a mão do sacerdote e disse com voz baixa, triste e suplicante.
— Não quero ler nada. Qualquer coisa escrita naquelas paredes perderam completamente o sentido há muitos anos... Eu dormi por mais de 4.000 anos... Não me restou nada. Sou o último Nut do meu clã. Com mais de 6.100 anos, nada do que estiver escrito lá poderá aplacar a dor e o vazio que estou sentindo. — limpou as lágrimas do rosto com as palmas sujas das mãos.
— Um... Nut! – disse Shaka em espanto e agora sim podia entender a dor e o desespero dele, já que conhecia a história do clã dos Nuts, vampiros muito antigos, primordiais e que com o passar dos anos foram todos exterminados. Jamais vira um e agora estava diante de um deles. Um Nut de mais de 6.000 anos! Deveria ser um dos primeiros! Ele mesmo tinha pouco mais de 2.500 anos, mas se dos 6.000 anos daquele Nut, 4.000 ele passara dormindo, então não havia vivido tanto assim para ver as mudanças do mundo. Seria assustador para ele! Shaka estava sem palavras.
— Quem eu sou não importa mais. Me chame apenas de Mu... Me ajuda a me banhar? — pediu envergonhado, pois não sabia se lavar corretamente sozinho, já que jamais precisara.
Na mente do Nut era como se tivesse ido dormir na noite anterior. Agora, sentia como se Osíris a qualquer momento pudesse aparecer ali para lhe dar uma bronca por ter abatido o gado e se sujado todo. Aset então viria ajuda-lo a se banhar antes de regressar ao palácio. Com carinho ela lavaria seus cabelos, limparia suas unhas, tirando todo o excesso de sangue, em seguida lhe daria um beijo no rosto e escolheria uma túnica para vestir.
Agora tudo que tinha eram lembranças, tristeza e solidão. Foi a voz de Shaka que o despertara de seu devaneio.
— Eu estou honrado em conhecê-lo, Mu. – disse Shaka, pegando nas mãos dele e segurando entre as suas – Nunca imaginei um dia encontrar um de seu clã, pois todos desapareceram há muitos anos. Eu sinto muito. O mundo mudou muito, Mu. A água do mar, principalmente desse mar, nunca irá limpá-lo. Ela é poluída. A guerra do gado derrama óleo e imundices nela a cada dia. Os humanos precisaram construir dispositivos para limpar os recursos naturais que eles mesmos emporcalham... Se me der a hora de ser o seu guia, eu o levarei para um lugar seguro, pois aqui você não pode ficar.
O vampiro ancestral olhou para o mar meio confuso, então olhou para seu próprio corpo e se cheirou. Sim, tão perdido que estava nem havia notado aquele odor estanho e forte na água.
Mas, se o próprio mar, tão grande e antigo pôde mudar tanto, como estaria o mundo?
Em seus 2.000 mil anos vividos antes do sono, as coisas não mudaram tanto. Como seria esse novo mundo agora? Nem sabia se queria viver nele. Talvez fosse melhor cumprir o destino de seu clã e desaparecer também, como todos. No entanto, algo na maneira como o sacerdote dos cabelos de ouro olhava para si o fez desejar ver como era o mundo novo.
— Está bem. É mesmo o meu único laço com o mundo, sacerdote. Creio que não tenho escolha. Leve-me com você, apenas não me deixe sozinho. — disse, se levantando da areia junto de Shaka e pegando forte em seu braço, como uma criança que procura alento na proteção e no amor dos pais.
Seth, afinal, jamais deixara de ser o que de fato era, o caçula de uma família poderosa e primitiva, aquele a quem os entes queridos tratavam como a mais inocente e doce das criaturas, mas que no mundo novo era conhecido como o terrível deus das tempestades, dos raios, da violência e do caos. Seth era o próprio caos!
