Aquele seu sorriso psicótico me assustava, trazia de volta lembranças que a todo custo eu tentava apagar de minha mente, fazia-me estremecer, dava-me esperanças falsas e sujas. Por breves instantes eu imaginei que você pudesse querer-me, pudesse retribuir tudo que senti, pudesse dar-me tudo que sempre quis. Mil e um pensamentos dançavam em minha mente quando tocas-te minha face – aquela altura, empalidecida - com tuas mãos enluvadas. Aproximaste-me de ti, nossos rostos, tão unidos. Eu sentia tua respiração tocar meus lábios, o que me fazia desejar os teus.
Finalmente imaginei que fosse possível tê-lo ao meu lado, ter seu amor, sua presença, seu calor. E aquele teu sorriso, tão sádico, tão convidativo, fez acender a chama que estava a muito apagada dentro de mim. Fez-me pensar que, talvez, as coisas pudessem mudar. Talvez eu pudesse ser plenamente feliz, coisa que eu havia desistido de acreditar. Mas com você... Com você seria diferente. Com você eu seria capaz de sorrir, seria capaz de acreditar em mim mesmo. Eu poderia esquecer tudo que um dia me fez mal, eu poderia deixá-lo fazer-me esquecer. Em meus sonhos você o faria. Em meus sonhos, amar-me-ias independente de tudo, em meus sonhos, poderíamos cruzar a noite trocando carícias e promessas de amor eterno.
E por breves instantes, acreditei em meus sonhos tolos. Acreditei em tudo aquilo que eu sempre imaginei antes de dormir, acreditei no impossível, acreditei no seu amor.
Talvez tenha sido tudo um equívoco meu. Aliás, haveria erro mais fatal do que apaixonar-se por um demônio? E o pior de tudo foi esperar que um dia eu fosse correspondido.
E com aquelas mãos, aquelas mãos que me serviram por anos, aquelas mãos que sempre me fizeram estremecer ao sentir o toque, aquelas mãos, as mãos de meu amado. Foram com aquelas mãos que minha vida foi rompida, como num piscar. Minha consciência se apagou, não houve tempo de dizer nada, não houvera tempo para choros ou despedidas, e a única coisa que vi antes de meus olhos se fecharam para a eternidade, fora meu sangue jorrando aos montes, escorrendo e pintando a grama verde com um vermelho mórbido. O vermelho da morte súbita de um coração apaixonado.
E por mais irônico que isso possa soar, a verdade é que em nenhum momento eu me arrependi. Em nenhum momento eu me arrependi de ter te amado tanto assim, pois o que senti por você, fora o que me manteve vivo, fora o que me dera esperanças, fora o que me fez pensar duas vezes antes de desistir de tudo. Porque, bem... Se eu houvesse de fato desistido, se eu tivesse acabado com minha vida... Quem garante que eu teria tantas lembranças assim de você? Lembranças que ainda fazem-me brotar um sorriso nublado pela decepção, e escondido pelas lágrimas mortas que escorrem de meus olhos azuis.
E por mais que me doa ver o quanto aparentas estar feliz sem mim, e por mais que doa ver que outro o faz sorrir da maneira que eu nunca o fiz, e por mais que me doa estar longe de ti, por mais que me doa ser substituído... Ainda consigo sorrir. Afinal, comigo ou não, você finalmente sorriu, Claude.
