1. Semelhanças

Chuva, frio e medo.

O corpo da menina mais nova estatelado ao chão. A mais velha chorando copiosamente sobre o cadáver da única pessoa que lhe restara.

- Volta - ela implorava desesperadamente - por favor...

- Ela não vai voltar - desdenhou a voz grave às suas costas - agora você só tem a mim.

Virando-se, a menina viu o rosto malicioso do demônio que lhe levara a irmã e último membro de sua família. Sentiu vontade de atacá-lo e fazer vingança, mesmo que lhe custasse a vida, mas careceu de forças.

- Alastair - balbuciou - traga-a de volta.

- Você conhece o preço.

Dito isso, ele se aproximou da garota e a beijou nos lábios. Fez-se névoa, o mundo estava sumindo como fumaça diante de seus olhos.

A garota acordou com a luz do sol batendo diretamente em seu rosto, através da janela do hotel.

- Bom dia, Louise - disse a irmã mais nova enquanto se vestia - achei que não ia acordar mais.

- Samantha! - exclamou a garota desesperada, erguendo-se da cama - Você está bem?

- Por que não estaria? - indagou a menina, parando com a blusa na mão.

- Tive um sonho estranho...

- Que tipo de sonho?

- Sonhei que você morria.

Samantha parou e olhou para a irmã por alguns segundos, depois deu de ombros e riu, vestindo a blusa.

- Prometemos não falar mais em coisas estranhas, Louise.

- Mas esse sonho...

- Esqueça isso, mana - Samantha disse indo até a irmã e beijando-a na bochecha - e vá tomar um banho, que vou te levar a um café ótimo que eu descobri.

- Café?

- Sim, descobri esses dias. Lá tem aquele frapuccino de morango que nós adoramos.

Louise sorriu e se lançou para o banheiro. Gostaria, mais do que tudo, de esquecer o sonho terrível que tivera. Ela não podia sequer pensar em perder a irmã, não depois de já ter presenciado a morte tão de perto, de forma tão horrenda.

----- x -----

As garotas sentaram a uma mesa em um canto confortável e pediram frapuccinos de morango e brownies. Samantha reparou que Louise brincava distraidamente com o chantilly, e parecia não estar exatamente ali.

- Que foi, Lou? - indagou Samantha, preocupada.

- O sonho foi muito estranho, Sammy. Havia outra pessoa...

- Esqueça esse sonho, mana...

- Não, eu preciso falar. Ele me causava arrepios.

- Ele?

- Um homem chamado Alas... Alastair, eu acho. Pelo menos foi isso que eu disse no sonho.

Nesse momento, um dos rapazes da mesa ao lado virou bruscamente para as garotas, não fazendo a mínima questão de disfarçar.

- Fala mais baixo - sussurrou Samantha.

- Ele me causava arrepios - repetiu Louise, agora mais baixo - parecia um demônio...

Então o rapaz não conseguiu mais disfarçar e olhou fixamente para as irmãs, enquanto o outro que o acompanhava pedia, aos murmúrios, que ele disfarçasse. Louise se irritou.

- Pois não? - ela disse com a voz alterada, virando-se de uma vez para o belo rapaz de cabelos claros e curtos.

- Tudo bem, gatinha? - ele indagou com um sorriso brincalhão.

- Quer um gole do meu frapuccino ou está realmente interessado na conversa?

- Estou realmente interessado na conversa.

- Dean... - disse o outro.

- Dá pra ver que você não tem mesmo educação.

- Pára, Louise...

- Eu pensava em ajudá-las, mas você é tão arrogante que nem sei se vale a pena.

- Chega, Dean...

- Ajudar? - indagou Samantha, preocupada - Como ajudar?

- E dá pra não ser arrogante com um sujeitinho como você? - retorquiu Louise.

- Acho melhor ignorá-la - disse Dean voltando-se para Samantha - prefiro conversar com a sua irmã. São irmãs, não são? Parecidíssimas...

- Vamos pra casa, Dean - sugeriu o outro rapaz, que tinha traços infantis e um tanto delicados.

- Não, Sam, elas falaram em Alastair...

- O que você sabe sobre esse Alastair? - indagou Louise ansiosa.

- O suficiente.

- Você não sabe ter precisão, rapaz?

- Para você, não.

- Argh, insuportável!

Louise se retirou da mesa, levando o seu frapuccino. Não demorou para que os outros fizessem o mesmo, e acabaram se encontrando do lado de fora.

- Esse sonho - disse Sam - é freqüente?

- Hoje foi a primeira vez - respondeu Louise.

- Vocês vêem algo? - indagou Dean - Coisas, por assim dizer, estranhas?

- Vamos embora, Louise - disse Samantha, puxando a irmã pelo braço.

- Não! - exclamou Sam, por sua vez, segurando o braço da garota - Agora estou preocupado.

- Nós só queremos ajudar - disse Dean colocando a mão sobre o ombro de Louise.

- Ajudaria bastante se ficasse longe - disse a garota se esquivando.

- Nossa mãe morreu de forma estranha - desabafou Samantha, meneando negativamente a cabeça.

- Que forma? - indagou Sam, preocupado.

- Louise e nosso pai a encontraram presa no teto - o rosto de Samantha se contorceu.

Dean levou as mãos à boca, estupefato. Algo lhe dizia que havia muita coisa em comum entre os quatro. Horrivelmente comum.