Introdução
A sala de emergência do hospital não era o único lugar em polvorosa. A recepção, os corredores, a calçada e praticamente toda a rua encontrava-se lotada de gente. Fotógrafos com suas grandes câmeras soltando fumaça, repórteres transmitindo ao vivo e centenas de curiosos cercavam o hospital Santa Ana Brígida. Na sala de emergência, algumas pessoas haviam conseguido se esgueirar pela multidão e acompanhavam apavorados o atendimento que salvaria ou não a vida de uma garota que até poucos dias antes era uma simples anônima, estudante do Colégio Central de Ádvena.
Havia sangue nas roupas de Rafaela. Seus olhos estavam abertos em choque e a mão ainda fechada fortemente sobre sua varinha. Os médicos tentaram retira-la, mas seus músculos retesados não permitiram.
Finalmente, quando as enfermeiras começaram a despi-la se suas roupas empapadas, alguém gritou para que todos que não a estivessem socorrendo se retirassem, e dois seguranças grandalhões se ocuparam de esvaziar a sala.
Do lado de fora, repórteres e curiosos aguardaram por horas. Informações desencontradas informavam tanto que Rafaela estava fora de perigo, quanto que havia falecido. Algumas diziam que ela estava em coma, outras que havia saído andando pela porta dos fundos do hospital. Um grupo de pessoas se uniu para enviar energias positivas e orar por ela.
- Coitadinha da menina...
- Coitadinha? De coitadinha ela não tem nada! Foi muito corajosa, nem um bruxo adulto conseguiu fazer o que ela fez.
- Ela é uma heroína, isso sim!
Rafaela, assim como todas aquelas pessoas, era uma bruxa. Aos dezesseis anos, era estudante do primeiro ano do ensino médio no principal colégio da cidade, Ádvena, em cidade homônima.
Ádvena era a maior cidade bruxa da América Latina. Era localizada em plena cidade de São Paulo, oculta aos olhos de quem não era bruxo. Nos subterrâneos da metrópole barulhenta e poluída, encontrava-se uma cidade um tanto menor, com cerca de duzentos mil habitantes, e tinha ar puro e magia no ar.
Rafaela e a mãe, também bruxa, viviam num apartamento em São Paulo, acima da cidade bruxa, mas passava a maior parte dos seus dias no colégio e nas ruas de Ádvena. A mãe nascera de pais sem magia, e seu pai de uma família tradicional de bruxos. O pai, porém, as deixara quando Rafaela tinha apenas dois anos e nunca mais voltara. Sem explicações. Silvana, sua mãe, viu-se abandonada pelo homem que amava e com uma bebê de dois anos para cuidar. Passou a trabalhar muito e a se engajar em causas. Ocupava sua mente ao máximo possível, constantemente. No fundo, sofria escondida pelo amor de sua vida.
. Rafaela e a mãe moravam no antigo apartamento herdado dos avós, e sentiam-se mais conectadas ao resto da família, que não era bruxa, ao continuar morando lá. Quando Rafaela ainda era criança, Silvana filiara-se a um partido político que pregava a democracia em Ádvena e em todas as outras cidades bruxas do Brasil, pregando a unificação de todas como um só país. Havia pesadas oposições a isso. Os poderosos da cidade não abriram espaço para que a democracia os alcançasse, e tornaram seu regime mais pesado a cada ano.
Ao fim, Ádvena e as outras cidades bruxas viviam em plena ditadura. O Comandante Alcino da Veiga comandava a rédeas curtas toda a sociedade e todas as decisões, fossem as que fossem sem permitir que houvesse qualquer tipo de discordância ou discussão. Aos poucos as coisas tornaram-se mais violentas. Partidos contrários sofriam perseguições e retaliações severas. Pessoas começaram a desaparecer e o medo tomou conta da sociedade. Nem se falava em voz alta nada a respeito do regime, pois qualquer pessoa à volta poderia ser espião, fazer uma denúncia ou sentir-se livre e na razão ao fazer retaliações com as próprias mãos. Magia passou a ser utilizada para punir, ferir e matar quem quer que fosse, na posição que fosse, à idade que tivesse.
Silvana tornou-se uma das mais bravas lutadoras contra o regime do Comandante Alcino. Nos últimos meses, andava o mais afastada da filha quanto era possível, sem se atrever a contar a ela qualquer coisa a respeito da resistência. Mas Rafaela sabia que algo grande estava para acontecer. Os militantes democratas planejaram durante meses a revolta geral, a tomada do poder e a implantação, finalmente, da democracia.
Nada ocorreu conforme o planejado. Espiões denunciaram a revolta e o Comandante organizada a retaliação, deixando que o ataque ocorresse. Houve tumulto nas ruas. A invasão ao Palácio das Almas, quartel-general do Comandante Alcino e de toda a ditadura tornou-se uma guerra. Os militantes que participaram do ataque ao palácio foram recebidos por bruxos preparados para defender o regime. Silvana, uma bruxa talentosa e de muitos valores, participou. A resistência foi massacrada. Corpos dos militantes foram jogados lado a lado na calçada, em frente ao Palácio, como aviso de que nada nem ninguém seria capaz de derrotá-los.
Silvana foi capturada e mantida no Palácio. No porão escuro e úmido, foi interrogada durante horas sem piedade para que entregasse os nomes dos organizadores principais da resistência. Rafaela entrou em desespero. Sempre teve medo da participação da mãe na oposição ao governo, mas jamais imaginara que algo assim pudesse acontecer. Em poucas horas, uniu-se à resistência, mas não teve calma nem paciência para aguardar o planejamento do resgate da mãe.
Sem que ninguém soubesse, Rafaela, acompanhada apenas de um amigo que considerava como um irmão, Daniel, invadiu novamente o castelo, de maneira silenciosa e com muito mais coração, porque dessa vez se tratava de salvar a vida de sua mãe, além dos objetivos políticos.
Quando estavam próximos da entrada do porão, foram descobertos. Daniel foi desarmado imediatamente e ficou desacordado no chão, os olhos abertos e imóveis em terror. Rafaela lutou. Estava decidida a resgatar sua mãe, salvar o amigo, e provar para aqueles bruxos que eles não podiam fazer aquilo tudo, e que o povo podia ser mais forte que eles.
Aos dezesseis anos, lutou bravamente, movida por uma força que até então não conhecia, vinda do fundo de seu coração. Raiva e amor, revolta e paixão a levaram em frente, duelando sozinha com dezenas de bruxos adultos. Durante a batalha, o Comandante Alcino em pessoa cansou-se do que ele chamou de palhaçada e colocou-se em pessoa em frente á garota. Rafaela não sentiu medo. Sabia que se não resistisse sua mãe acabaria morta depois de muito sofrer, seu amigo seria jogado junto com os corpos na calçada e ela mesma teria um destino terrível. Naquele momento, nada mais importou.
A garota, com a pele morena respingada se suor o sangue, entrou naquele momento para a história da forma mais terrível que poderia entrar. O corpo sem vida do Comandante jazia em frente à garota, que ao perceber a realidade do que havia acabado de acontecer, começou a tremer dos pés à cabeça. Soldados do lado dele ficaram paralisados e nenhum deles a atacou novamente. A grande maioria deles fugiu, entendendo em segundos as implicações que a morte do comandante traria.
Apenas um deles não correu. Começou a rir, quase loucamente, sem tirar os olhos de Rafaela, e anunciou que tanto esforço e tanta coragem não serviram para nada. Silvana havia sido morta horas atrás, ao se negar a denunciar os companheiros mesmo depois de muita tortura.
O ódio e a loucura subiram á cabeça de Rafaela. Com apenas um aceno brusco da varinha, fez com que este bruxo, também, caísse morto ao lado de seu comandante. Em seguida, o corpo em choque da garota também foi ao chão.
Em poucas horas, toda a comunidade bruxa do país sabia do que havia acontecido. Para a grande maioria da população, Rafaela tornara-se uma verdadeira heroína. Para alguns, uma coitada que agora havia se perdido por ter se tornado uma assassina.
Rafaela acordou quase uma semana depois. Seus olhos demoraram a se acostumar com a claridade e a cabeça doía. Levou minutos parada ali, sem se mover, para se lembrar do que havia acontecido. Com uma onda de frio na boca do estomago, Rafaela se recordou de cada detalhe do que havia passado e da terrível notícia de que tudo havia sido em vão.
Enfermeiras sorridentes correram ao seu encontro no mesmo momento, festejando que ela tivesse acordado. Muitos não acreditavam que ela se recuperaria. Mas naquele instante, já que tinha a saúde recuperada, tudo o que Rafaela queria era se levantar da cama e correr, fugir de tudo, até o fim do mundo.
Durante semanas só se falou nela, e não havia um único bruxo no Brasil que não conhecesse seu nome. Rafaela Salles entrara para a história como a bruxa que libertou seu povo da repressão e violência. Assim que o Comandante Alcino caiu, os líderes da revolta tomaram o Palácio, restauraram a ordem e o povo clamou por eleições diretas. Era um novo e esperado capítulo na história da comunidade bruxa brasileira.
Rafaela foi liberada de concluir o ano no colégio e passou com honras para o segundo colegial. Enfiou-se em seu apartamento, não autorizando ninguém a subir, e dedicou-se ao seu luto, a chorar a morte da mãe. Sentia orgulho dela. Sabia que ela havia morrido sendo fiel aos seus princípios e aos seus companheiros. Sentia-se também satisfeita de saber que tudo pelo que ela lutou agora finalmente aconteceria. Porém seria capaz de trocar tudo aquilo pela simples consciência de que sua mãe estava viva.
Quando começaram novamente as aulas, no ano seguinte, Rafaela ainda não falara com quase ninguém. Negara entrevistas, e nas poucas vezes que falou com alguém que não era da família ou amigos, dizia apenas o discurso feito – estava feliz por ter ajudado a conquistar a democracia no país e esperava que isso valesse a pena, que o povo não desperdiçasse a morte de sua mãe e a sua própria luta para colocar depois no poder algum corrupto. Mais nada.
Na escola, tentou ser sempre receptiva e simpática, mas não tinha certeza se queria ter aquilo constantemente em sua vida. Focou-se em estudar, enfiava-se nos livros e se afastou o máximo que pode dos olhares admirados e curiosos.
Sendo menor de idade, não poderia simplesmente seguir sua vida. Uma tia se responsabilizou por ela. Tia Solange não tinha as mesmas capacidades mágicas que Silvana e Rafaela compartilhavam, mas compreendia que para ela as coisas eram diferentes e era um bom apoio para suportar a falta da mãe. Tia Solange sempre fora muito próxima das duas, e sabia que Rafaela não era uma menina comum de dezesseis anos. Sabia que ela era madura e responsável, e não quis obriga-la a se mudar do apartamento. Tia Solange passou a se dividir entre sua própria casa e os filhos adolescentes e Rafaela. Porém, Rafaela ainda preferia continuar sozinha. Não queria o olhar de piedade dos tios e primos e não queria a fama e a admiração de todos.
Daniel, o amigo que a apoiara na invasão ao Palácio, recebeu alta e voltou ao colégio semanas depois. Foi recebido com honras e, ao contrario de Rafaela, não achou nada de ruim nisso. Gostava de saber que as pessoas tinham orgulho da atitude e o admiravam pela coragem e companheirismo, apesar de ter sido derrubado antes do final da batalha. Com o tempo, Rafaela acabou de afastando dele. Não tinham mais o mesmo foco.
O primeiro semestre se passou e as férias chegaram. As notas de Rafaela foram as maiores da escola, resultado da concentração que aplicou nos estudos. Seu animo melhorara, apesar de ainda fugir de falar sobre o assunto e de não dar nenhuma entrevista. No final do semestre voltara a frequentar as aulas extras, como as de Defesa Contra a Magia Negra Avançada, Transfiguração Pessoal, Poções Funcionais e Potentes e também aulas mais leves de alguns instrumentos de música clássica, e a participar do coral da cidade. Tudo o que pudesse fazer para manter seus pensamentos distantes de sua própria experiência.
Era uma das primeiras noites geladas do ano em São Paulo. Rafaela estava sozinha em casa, depois de a Tia Solange ter ido embora depois de lhe preparar uma sopa. Sentada no sofá, debaixo do edredom, com o prato de sopa já vazio na mesa de centro, havia apagado a luz e estava assistindo televisão. Sentia-se bem e recuperada. A saudade da mãe seria constante e para sempre, ela sabia, mas estava aprendendo a lidar com isso.
Estava rindo do seriado na televisão quando aconteceu. Um estalo alto que não pertencia ao local, e Rafaela reconheceu o que estava acontecendo. Um segundo depois, ela já estava em pé, no meio da sala, apontando sua varinha bem entre os olhos de um homem que aparecera do nada.
- Quem é você?
Na sala escura, Rafaela vira o rosto pouco iluminado do homem. Cabelos negros e pesados caiam como cortinas dos lados de seu rosto marcado, intenso e inexpressivo. Sem deixar de olhar pra ele com a varinha em punho, Rafaela tateou a parede às suas costas e acendeu a luz. O homem estava imóvel. Fechada firme ao pescoço, uma capa preta caía até o chão, deixando á mostra apenas suas mãos, a varinha segura na direita.
- O que você quer?
A voz grave do homem soou ameaçadora quando ele finalmente falou.
- Abaixe sua varinha.
Ele falou em Inglês. Sua voz era grave e lenta.
- Não. Quem é você?
- Eu sei que você sabe falar ingles. Por favor, abaixe sua varinha.
- Não até você me dizer o que está fazendo na minha sala! – ela gritou, agora no idioma dele, dando largos passos até ficar mais próxima
- Meu nome é Severus Snape. Estou aqui para conversar com você.
- Por que desaparatou na minha casa? Não podia ter me procurado de outro jeito? O que você quer?
- Eu vou eplicar. Apenas me ouça.
- Estou ouvindo. Se explique ou saia.
- Está tudo bem, acalme-se.
- Fala logo! – ela gritou
- Estou aqui par ate ajudar. Não para te fazer ma. Você está em perigo.
- O que você está falando?
Sem que Rafaela pudesse prever, o bruxo fez um leve movimento com a varinha quase completamente abaixada.
- Expelliarmus. - a varinha de Rafaela voou por cima de suas cabeças e caiu do outro lado da sala, fora de alcance. – Silentio.
Desarmada e sentindo a garganta seca, sabia que não conseguiria mais falar. Ficou sem ação.
- Sente-se. – disse Severus Snape apontando a varinha pra ela. Rafaela obedeceu, andando lentamente e sem dar as costas para o bruxo que a acompanhou e ficou em pé diante dela. – Eu disse que não vim fazer mal. Peço que apenas ouça tudo o que eu tenho a dizer. Vou colocar minha varinha no bolso e me sentar.
Dizendo isso, fez um aceno com a varinha e fez a cadeira mais próxima deslizar até ele, guardou a varinha em um bolso interno da capa e sentou-se lentamente, sem tirar os olhos dela, profundos, de maneira quase teatral. Rafaela tremia, mas não demonstrava. Continuava com a expressão demonstrando apenas raiva.
- Como eu disse, meu nome é Severus Snape. Sou professor na Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts.
Rafaela conhecia esse nome. Ádvena sempre fora o segundo maior colégio mágico do mundo, vencido apenas por Hogwarts. Sabia que ficava no norte da Inglaterra e formava centenas de jovens bruxos todos os anos.
- Ensino Poções, mas mantenho muitas outras responsabilidades além dessa, e muito maiores. Sou parte fundamental em uma guerra que vem acontecendo há muitos anos.
Lentamente, Severus Snape contou a Rafaela sobre o colégio, os bruxos mais poderosos, o diretor Albus Dumbledore e o bruxo que tentava tomar o poder e pregava a purificação do sangue bruxo. Rafaela reconheceu a história e os nomes. Sabia que alguns anos antes, esse bruxo maligno havia tentado a mesma coisa, porém fora derrotado por um bebê. Não acreditava que ele pudesse ser tão terrível assim. Como se tivesse ouvido seu pensamento, Snape começou a explicar como fora essa derrota, quem era o bebê, sobre a proteção que recebera pelo sacrifício da mãe para salvar sua vida e que, mesmo tendo sido praticamente derrotado, o bruxo das trevas continuava vivo, tornando-se cada vez mais forte e desejoso de vingança. O bebê agora era um adolescente e frequentava Hogwarts, e vinha lutando do lado da Ordem da Fênix, algo muito semelhante à resistência da qual a mãe de Rafaela, Silvana participava. Albus Dumbledore era o líder da Ordem, e Snape era um de seus fieis aliados. Tão fiel que se tornara espião há vários anos, fazendo jogo duplo. Era também o mais fiel seguidor de Lord Voldemort.
- Foi Lord Voldemort quem me mandou aqui.
Alguns segundos de silencio depois, Severus recomeçou. Explicou que Voldemort enraivecera-se da morte de Comandante Alcino, com quem vinha planejando parcerias para que seu poder não ficasse apenas na Grã-Bretanha, mas também nas Américas, apenas para começar. Futuramente seus poderes combinados alcançariam ainda mais território. Mas a derrota do Comandante havia atrapalhado seus planos. Sem saber, Rafaela entrara na lista negra de Lord Voldemort.
A expressão de Rafaela mudara. De raiva e susto pela presença daquele homem, baixou o olhar com certo medo e desolação. Não imaginava que poderia haver ainda mais consequências ao que havia feito. Se aquele homem havia dito que era fiel a Albus Dumbledore e fazia parte da Ordem da Fênix, porque fora até o Brasil, até Rafaela, por ordens de Lord Voldemort?
- Eu vim obedecendo às ordens do Lord das Trevas, mas Albus Dumbledore também sabe que estou aqui. Eu vim para levar você para Hogwarts. – Rafaela se assustou e voltou seu olhar a ele – Não há escolha. Você virá comigo. – ela fez que não com a cabeça, meio desesperadamente – Acalme-se. Não há escolha, mas você não estará sozinha. O Lord das Trevas me deu ordens para vir e sentenciar-te de maneira que não possa desobedecer; enfeitiçá-la e fazê-la ir para Londres e embarcar para Hogwarts com os outros alunos.
Rafaela fez que ia se levantar, porém não conseguiu. Queria gritar que jamais cumpriria as ordens dele e que não permitiria que ele a enfeitiçasse, mas não via maneiras de fazer aquilo no momento.
- Você irá. Não pode escaper. Ele a estará observando, e observando a mim para certificar-se de que você cumprirá as ordens. Ele quer que você se aproxime de Harry Potter e dos amigos dele e, quando chegar a hora, você servirá de isca para que Harry Potter vá até ele e seja morto.
Rafaela arregalou os olhos, sentindo vontade de gritar.
- Acalme-se. – o homem disse grave e lentamente – Há dois lados nessa história. Assim que recebi as ordens de Lord Voldemort, fui até Albus Dumbledore e pedi auxílio. Ele concordou que não havia nada que eu pudesse fazer. Se eu não viesse até aqui nesta noite e não te enfeitiçasse, seria desobedi~encia ao Lord das Trevas e ele saberia que eu sou um agende duplo. Praticamente todas as operações da Ordem da Fênix estariam arruinadas. – ele fez uma pausa – Você entende que isso é sobre algo imensamente maior do que apenas você? Você se envolvou até o pescoço quando impressionantemente liquidou o Comandante. Foi um ato incrível, visto o poder que ele tinha. Agora, porém, você arcará com as consequências e não tem como escapar.
Por alguns instantes ficou em silencio observando-a antes de voltar a falar.
- Vou explicar tudo o que deverá acontecer antes de permitir que fale novamente. Eu quero que entenda que, mesmo que pareça estranho, eu estou do seu lado. Se Voldemort houvesse mandado qualquer outro Comensal da Morte até você, não estaria segura. Você seria atacada e enfeitiçada sem conversa alguma, e tudo seria muito pior. Pode entender isso?
Rafaela, muito exasperada, conseguiu fazer um sinal afirmativo com a cabeça.
- Muito bem. Eis o que vai acontecer: antes que eu saia de sua casa nessa noite, eu vou atacá-la com um feitiço muito forte e negro. Você ficara quase cega e, ao mesmo tempo, surda. Você será capaz de ver e ouvir apenas quando estiver usando um certo par de... óculos. Lord Voldemort verá e ouvirá através das lentes deles, tudo o que você vir e ouvir. Você entende por que não há maneira possível de não te enfeitiçar? Isso precisa ser feito, isso precisa acontecer para que possamos protegê-la. Assim que o feitiço for lançado, tudo precisará parecer, à sua frente, ou seja, à frente dele, que está acontecendo conforme suas ordens. Dumbledore, eu, e todos os outros membros da Ordem da Fênix estaremos trabalhando para livrá-la e para usar essa situação em nosso favor, como mais uma tentativa de acabar com ele.
Rafaela respirava depressa agora sem tirar os olhos de Snape. Ele podia ver lágrimas começando a brotar, mas ela se mantinha firme.
- Vou tirar o feitiço agora e deixar que você volte a falar.
Tirou a varinha da capa e fez um aceno leve. Rafaela sentiu a pressão na garganta se dissolver, porém permaneceu em silêncio por mais alguns instantes, enquanto Snape apenas a observava. Quando falou, quase não reconheceu sua voz rouca.
- Ele me... Me escolheu por causa do que aconteceu meses atrás... Com o Comandante?
- Sim, porém não foi a única razão. Sua atuação memorável ficou no caminho dos planos dele a longo prazo, e ninguém pode ficar no caminho dele sem ser severamente punido. Ele desejou puni-la pelo que fez, mas também quer usar você para alcanãr o objetivo principal antes de realmente tomar o poder: matar Harry Potter. Além disso, há outras razões. Já faz alguns meses que ele mandou alguém para observá-la. Ele sabe praticamente tudo a seu respeito.
Rafaela se impressionou – Venho sendo observada?
- Sim. Um dos escravos do Lorde das Trevas está por perto a algum tempo.
- Mas quem...
Parou antes de terminar a frase. Como se parecesse óbvio lembrou-se de cenas aleatórias em que sempre vira o mesmo homenzinho em plano de fundo, e não entendeu como não percebera que algo estranho estava acontecendo.
- Peter Petigrew. – Snape respondeu brevemente
Houve mais alguns segundos de silencio.
- E o que foi que ele homem viu para fazer Voldemort querer me usar..?
- Você é um talent natural e todos no seu colégio parecem saber disso. Isso será muito útil para chamar atenção em Hogwarts e para se aproximar de Harry Potter e dos amigos, que tiram vantagens de ser assim também. – disse com os lábios um tanto contorcidos, e Rafaela entendeu que Snape tinha algum tipo de problema com eles – Além de ser capaz de, você mesma, executar parte do trabalho que Voldemort quer feito: finalizar os amigos dele e torná-lo fraco.
- Ele vai me fazer matar alguém, não vai? – Rafaela perguntou sem precisar pensar muito, amargurada.
- Sim, ele vai..
Houve silencio mais uma vez. Rafaela começou a chorar, demonstrando fraqueza pela primeira vez.
- Tem alguma coisa que eu possa fazer pra evitar isso?
- Infelizmente não. Dumbledore e eu tentamos criar uma solução, mas qualquer atitude que tomássemos arriscaria anos de organização e luta da Ordem. Senhorita Salles, nós tentamos evitar, mas realmente precisaremos de você. Isso não pode ser feito se eu não te enfeitiçar com o encantamento que fará com que o Lorde das Trevas veja tudo através de você, de dentro para fora.
Rafaela respirou fundo em com dificuldade algumas vezes, seus pensamentos voando depressa. Secou as lagrimas.
- Você vai estar do meu lado, mesmo que não possa demonstrar isso?
- Constantemente.
- E você vai me ajudar a me livrar disso sem ser forçada a matar ninguém ou a colocar esse Harry em perigo?
- Sim. Nós estaremos nos preparando. Você entende que, a partir do momento em que eu enfetiçá-la, eu precisarei ser ameaçador, violento e fazer parecer que eu realmente sou um fiel e devoto seguidor de Voldemort?
- Eu entendo… Ele estará vendo tudo e se em algum momento você tentar me ajudar ou for amigável de qualquer forma, ele saberá que você é fiel a Dumbledore, e não a ele.
- Exato. Estou satisfeito que tenha compreendido. Dumbledore não poderá ter muito contato com você, e quando tiver, ele não poderá demonstrar nada do que sabe que estará acontecendo, ou que está tentando libertá-la.
- Certo… E Harry Potter e os outros saberão sobre isso?
- Não inicialmente. Eles tem uma inclinação deprimente para tentar resolver todos os problemas sozinhos, e eles poderiam tornar tudo ainda pior. Dumbledore e a Ordem vão tentar encontrar a melhor solução, e só então eles saberão. No começo, tudo o que você precisa fazer é realmente seguir as ordens impostas. Você deverá se aproximar deles, o máximo que puder. Se na sua rotina ele observar que você não está se esforçando para fazer isso acontecer, nós perderemos tudo e você será punida.
Silencio novamente. Rafaela entendia. Conseguiu compreender que não tinha saída e que seria parte importante para acabar com os planos desse Lord... Não iria deixar que ele conseguisse seus objetivos. Conquistar o poder faria com que o sacrifício da mãe e a morte do Comandante tivessem sido em vão, e isso não poderia acontecer. Ao mesmo tempo, queria simplesmente fugir, desaparecer, e fazer com que aquilo tudo não acontecesse. Só queria que as coisas voltassem a ser como eram antes.
Snape voltou a falar – A documentação já está pronta. Precisamos que convença ás pessoas à sua volta que você irá por decisão própria, e que consiga uma assinatura da sua guardiã legal. Fora isso, está tudo feito. Você irá para londres por Undertrains, e deverá embarcar no trem que parte de lá para Hogsmeade em 1o. de Setembro.
- Isso não sera um problema. Todos entenderão que eu queira ficar longe daqui por um tempo, me afastar das pessoas me seguindo, reporteres e memórias... Vou começar o sexto ano novamente?
- Sim. Você precisar ser colega de Harry Potter, Ronald Weasley e Hermione Granger. Esperamos que seja escolhida para a mesma casa que eles, de acordo com a sua história.
- Casa?
Snape explicou para Rafaela tudo sobre as quatro casas de Hogwarts: Gryffindor, Slytherin, Ravenclaw e Huflepuff. Cada novo aluno da escola era selecionado por um chapéu pensante que, em segundos colocado na cabeça do aluno, analisava sua personalidade e escolhia em qual casa melhor se encaixaria. Harry e os dois amigos eram na Gryffindor, e Voldemort esperava que ela também ficasse nessa casa, depois das informações passadas por Pettigrew, e isso tornaria ainda mais fácil a aproximação.
- E se eu ficar em outra casa? E se esse Chapéu vir a parte do Voldemort que estará na minha cabeça e me mandar pra outra... Que casa seria?
- Slytherin. É improvavel que isso acontece, porém se acontecer, você terá apenas mais uma dificuldade em se aproximar deles, mas não será libertada do trabalho.
- Certo... – ela fez uma pausa – Mais uma coisa... Eu vou porque devo ir, porque sei que é a coisa certa a ser feita, porque eu quero ser parte disso para que a morte da minha mãe não seja em vão. Eu sei que essas são as razões, e você sabe também, mas Voldemort não pode saber que eu vou na intenção de ajudar na luta contra ele, certo?
- Exato. Ele não deverá saber, em hipótese alguma, que você está do nosso lado.
- Então eu estou indo por qual motivo? O que me faria ir se eu não quisesse ir? Eu lutei contra o bruxo mais poderoso do meu país, eu não deveria sentir medo de me defender de você. Talvez eu não tivesse chance, mas ele deve imaginar que eu não iria simplesmente aceitar tudo isso. O que foi, então, que me "convenceu" a não resistir?
- O que te "convenceu" a ir é a sua lealdade áqueles que ama. Voldemort garante que, a cada erro que você cometer, alguém será ferido. Podem ser membros de sua família ou amigos.
Ela engoliu em seco. Entendeu que aquilo realmente aconteceria, e não seria mentira que esse era um grande motivo para que ela fosse sem resistência para Hogwarts.
Rafaela e Snape passaram mais algum tempo conversando sobre como tudo aconteceria e, ao final, ela já estava convencida de que faria aquilo sem hesitação. Queria se unir á luta contra o Lord das Trevas e não deixar ir adiante seus planos, que fariam com que a morte de sua mãe tivesse sido em vão.
