Esta história é uma adaptação do livro Devoção,

da autora Jessica C. Reed.

Capítulo I

Eu estava sentada no bar, bebendo minha segunda margarita. Minha saia lápis na altura do joelho encostou-se ao banco vazio ao meu lado, meus dedos batendo na minha coxa ao ritmo da música que vinha do sistema de som. Este não era o tipo de estabelecimento que eu costumava frequentar, mas meu chefe tinha sido inflexível quanto a me encontrar com Namikaze no seu ambiente preferido. E assim concordei, embora com algum sobressalto pela perspectiva de entrar em um clube de cavalheiros caríssimo, no qual lindas garotas desfilavam pelo ambiente usando elegantes vestidos. E as duas bebidas que pedi já tinham custado mais do que minhas compras semanais no supermercado.

A julgar pelas inúmeras luzes cintilantes e pelos pisos de mármore polido, o lugar destilava estilo e dinheiro. Mesmo que ainda estivesse meio vazio, eu não tinha dúvida de que encheria logo e que seu dono ganharia uma fortuna. Uma menina atrevida, que parecia ter saído da capa de uma revista masculina, escalou um poste e desceu de pernas abertas para "se aquecer", como anunciou o DJ explicando a programação daquela noite para os poucos frequentadores vestindo ternos sob medida. Suspirei com imaciência e me deixei afundar no banco luxuoso do bar, observando os sofás de couro macio e as paredes espelhadas perto da entrada.

Namikaze estava atrasado. De fato, muito atrasado. Eu não gostava de atrasos, e em particular detestava um desse tipo, exatamente quando eu poderia estar em casa, relaxando com uma taça de vinho após um longo dia bajulando os grandes caras do setor imobiliário. Meu emprego deveria ser apenas algo para preencher o espaço e me dar algum dinheiro até que eu conseguisse uma boa posição em uma empresa, como a Delaware & Ray, porém, como acontece sempre com esse tipo de emprego, eles são um beco sem saída. E dois anos mais tarde, eu estava ali, com vinte e três anos, presa, sobrecarregada e sem nenhuma promação à vista…

Talvez fosse a maneira como ele caminhava, cheio de autoconfiança e arrogância, mas no momento em que o vi entrando no bar soube que aquele sujeito era do tipo que só me traria problemas. Então, enterrei o olhar na minha bebida, evitando a curiosidade daquele desconhecido. Os pelinhos na minha nuca se arrepiaram. Virei-me devagar, percebendo que ele estava atrás de mim. Seu hálito quente roçou a pele sensível do meu rosto, quando ele se inclinou sobre o meu ombro e sussurrou no meu ouvido.

— Você é como um peixe fora d'água num lugar como este. Eu não tenho certeza se isso é bom ou ruim…

Sua voz era baixa e rouca. Abrasadora. Era uma voz de quarto… As palavras ecoaram em algum lugar no fundo da minha mente.

Meu coração pulou e quase saiu pela boca, coisa que atribuí ao fato de que não gosto de homens desconhecidos inclinando-se sobre mim. E menos ainda aqueles com a voz profunda e sexy com uma leve sugestão de sotaque sulista. Lutando contra o desejo de saltar do banco do bar e abrir alguma distância — muito necessária — entre nós, endireitei as costas e me virei para encará-lo, pronta para retrucar com alguma observação aguda e malcriada.

Minha nossa! Aquele homem era deslumbrantemente bonito. Esqueça o bonito. Ele era lindo. Era chocantemente lindo. Em uma escala de um a dez, ele era cem!

Por alguns segundos, fiquei só olhando para ele enquanto meu abdome se torcia em quinhentos nós e minha pulsação acelerava. O cara era um tesão e, a julgar por seu sorriso perverso, definitivamente não era o tipo de homem que você pode levar para casa para conhecer seus pais. Ele era alto, pelo menos uma cabeça a mais de altura do que eu. Talvez um metro e oitenta ou noventa. O cabelo loiro e úmido estava um pouco comprido demais e desgrenhado, como se ele ele tivesse transpassado as mãos nele. Seu casaco, agora úmido da chuva que caía em Nova York nos três últimos dias, não fazia nada para esconder os ombros largos e o corpo musculoso, nem a postura insolente. Na penumbra do bar, seus olhos elétricos brilhavam como safiras.

Eu nunca tinha visto olhos como os dele. De um azul escuro e intenso. Latente. Pronto para despir uma mulher com um único olhar. Eu já me sentia nua, apesar das várias camadas de roupa. Seu olhar viajou até a frente da minha camisa com satisfação, e se demorou nas minhas pernas por mais tempo do que seria educado. Minha pele se arrepiou com aquele olhar. Prendi uma mecha de meu cabelo atrás da orelha e umedeci os lábios, repentinamente secos. O efeito que aquele homem tinha sobre mim era enervante e excitante ao mesmo tempo. Cruzei os braços sobre meu peito e mordi o lábio inferior com força para recuperar meu discurso. Ele me olhou com as sobrancelhas erguidas e com um ar divertido, como se soubesse o efeito que um olhar desses exerceria sobre mim. Porém, não foi sua arrogância óbvia que me deixou de imediato com raiva. Foi a maneira como seus dedos abertos permaneceram intimamente pousados na parte inferior das minhas costas, como se estivessem acariciando um local pelo qual tivessem passado antes. Como se pertencessem àquele lugar!

— Por que você diz isso? Só porque não estou usando um fio dental e saltos agulha, e meus seios não estão se derramando para fora em um sutiã de oncinha? — perguntei com os dentes cerrados, ignorando o delicioso puxão que sentia em algum lugar de meu estômago.

— Naruto Uzumaki. — Os lábios dele se contraíram. — Namikaze não pode vir, então você vai ter de se contentar comigo. E não se preocupe, você e eu ficaremos bem.

A pele ao redor dos olhos deslumbrantes se enrugou e sua boca se curvou em um sorriso. Por que senti que havia um duplo significado naquelas palavras?

— Hinata Hyuuga. — respondi. Meu olhar se demorou em sua camisa azul-clara e em seu jeans desbotados com a barra desfiada que cobriam as botas de cowboy, e eu não pude evitar o som de zombaria se formando atrás da minha garganta.

— Vinho? ─ perguntei, pronta para pedir.

— Prefiro Sex on the Beach. ─ disse ele, e piscou para mim com um sorriso diabólico.

Eu imaginei que suas palavras poderiam ser interpretadas de duas maneiras, mas a julgar pelo sorriso galanteador, duvidava que ele estivesse falando sobre o coquetel. Um calor começou a me percorrer com a imagem indesejável de nós dois tendo relações sexuais na areia e na água. Minha pele formigava por causa da atração magnética entre nós. Que diabos!

Tirei meu olhar de cima dele, na esperança de que essa atração instantânea não fosse nada além de uma invenção da minha imaginação.

— Então, Hinata. Fale-me tudo sobre você. — Ele se inclinou para a frente, enviando-me um sorriso lindo de derrubar corações.

Respirei fundo, irritada, de repente. Como ele se atrevia a me chamar pelo meu primeiro nome? E o mais importante, como ele ousa se mostrar tão sexy fazendo isso?

— Gostaria de lembrar que esta é uma reunião de negócios e não um encontro.

Ele ergueu as sobrancelhas.

— Você quer um encontro?

— O quê? — Meu rosto pegou fogo, e meu coração bombeava um pouquinho mais depressa. — Não foi isso que eu quis dizer. Eu...

Seus olhos brilharam com humor.

— Aparentemente, você gostou do que viu, e eu também. Então... — Ele deu de ombros e parou, deixando o resto por conta de minha imaginação.

Eu odiava esses caras gostosos, em especial os que sabiam o quanto eram lindos.

— Pode acreditar, isso não é uma coisa pela qual eu não tenha passado antes.

Minha mentira parecia ridícula e ele sabia. Eu poderia deduzir isso pelo sorriso irritante, autoconfiante e ainda assim lindo que ele estava exibindo. Meu mau humor emergiu. Esse contato era para ser uma tentativa inicial de descobrir como seria possível uma potencial parceria entre nossas empresas. O fato de que a Namikaze Realties tivesse enviado alguém que não conseguia nem se vestir de acordo com a ocasião era visível. Por que Namikaze ia querer ser representada por alguém que claramente não tinha nenhum conhecimento do que pode ser aceitável quando se lida com um possível parceiro de negócios? Ou talvez Namikaze não valorizasse nossa cooperação, e essa foi a maneira de me dizer para ir para aquele lugar... De qualquer maneira, eu não estava satisfeita e não tinha intenção de fazer segredo sobre meu desagrado. Namikaze era alguém conhecido por ser um verdadeiro filho da puta. E também por não levar desaforo de ninguém, e de não ser tolerante. Se quisesse ser bem-sucedida nesse cruel mundo dos negócios dominado pelos homens, eu tinha de espelhar suas táticas, ou desistir de uma carreira que já não estava indo a lugar nenhum.

— Olha, eu aprecio sua vinda, senhor Uzumaki, mas prefiro conversar com pelo menos um vice-presidente regional. Por favor, diga ao senhor Namikaze para me telefonar assim que estiver disposto a remarcar nossa conversa. Boa noite.

Pegando minha bolsa e meu casaco que estavam sobre o balcão polido do bar, pulei da banqueta e me dirigia para a saída quando dedos fortes se enrolaram em volta do meu braço. Eu congelei.

— Não se esqueça de seu guarda-chuva. Nós não queremos que esse rosto bonito chegue em casa encharcado. — sussurrou Uzumaki em meu ouvido, enviando outro delicioso arrepio pelo meu corpo.

Qual era a desse homem em ficar sussurrando? Qual o problema em falar como pessoas normais? Procurei cegamente em torno de mim e puxei meu guarda-chuva de sua mão. Sem olhar para trás, marchei para fora do bar, mantendo minha cabeça erguida. Só quando cheguei ao estacionamento, que ficava a uns seis metros da entrada do bar, é que parei e, por fim, dei um longo suspiro.

O ar da noite tinha esfriado. Dei de ombros dentro do meu casaco e corri para abrir a porta do meu Volvo. Era uma coisa velha, mas tinha sido um presente de formatura de meu padrasto, então eu o amava. Mesmo que fosse uma droga andar com ele na cidade, preferia isso a ficar presa em um táxi com um motorista do sexo masculino em quem não podia confiar.

Coloquei a primeira marcha e saí do estacionamento. Meu olhar caiu sobre o imponente desconhecido que estava em pé na entrada do bar, olhando enquanto eu passava de carro. Será que ele tinha me seguido? Meu coração acelerou, porém não parei. Na verdade, pisei fundo no acelerador e o carro engasgou ao ir para a frente. O motor soltou um protesto arranhado, mas não me importei. Fosse qual fosse o negócio de Uzumaki, havia decidido que ele era um canalha, e tinha a intenção de nunca vê-lo de novo. Se ele achava que eu era o tipo de mulher que sucumbia a um corpo musculoso e lindos olhos, estava muito enganado.

Cheguei ao meu minúsculo apartamento em Brooklyn Heights em menos de uma hora e estacionei o carro em frente do prédio de cinco andares que vinha sendo minha casa desde minha formatura na faculdade, havia dois anos. A rua estava molhada e deserta. A lâmpada do poste em frente do prédio lançava um brilho dourado na porta de aço que levava a um corredor estreito

com um hall de entrada. Prestando atenção nas grandes poças de água da chuva, pesquei minhas chaves na bolsa e entrei, chamei o elevador e subi até o quinto andar.

Ino, com quem dividia o apartamento e era minha melhor amiga, não estava em casa. Desde que aportara no emprego de seus sonhos, na área financeira, ela quase nunca chegava em casa antes da meia-noite. Eu tinha sido ensinada a colocar 110% em tudo que fizesse, mas Ino levava essa coisa de rabalhar duro a um nível totalmente novo. Ela ia longe, ao ponto de sacrificar seus hobbies, suas amizades e sua saúde, fazendo horas extras pelas quais não ganhava a mais, numa tentativa de ganhar reconhecimento por todo o esforço adicional. Todas as minhas tentativas para fazê-la perceber que o nível de estresse que ela alcançara era pouco saudável tinham sido em vão até agora, mas eu não ia desistir.

Deixei cair o guarda-chuva em um suporte de bronze e minha bolsa e meu casaco sobre a velha mesa de café no corredor, chutei meus sapatos para longe e fui até a cozinha para me servir de uma muito merecida taça de vinho. Eu estava na metade de minha segunda taça quando a chave girou na

fechadura da porta da frente e a cabeça loira de Ino surgiu em meu campo de visão.

— Uau! Que bela surpresa! — Sentei-me e apontei para minha taça. — Quer um pouco?

— É melhor pegar uma garrafa...

Ela caiu no sofá ao meu lado e colocou suas longas pernas para cima. Eu fiz a varredura desde sua saia listrada que ficava um pouco acima do joelho até seu rosto e o cabelo loiro molhado. Alguma coisa estava diferente. Seu rímel estava borrado. A pele sob seus olhos azuis estava inchada e vermelha como se estivesse chorando, o que era impossível porque Ino não era o tipo de mulher acostumada a chorar. Em todos os anos em que tínhamos sido as melhores amigas, eu nunca a vira derramar uma lágrima sequer. Era uma garota que sempre fora nada menos do que perfeita e feliz. Endireitei-me de imediato, sentindo que algo estava errado.

— O que aconteceu?

— Tomei um pé na bunda.

— O quê?

Ela pegou a taça de minha mão e a esvaziou em um grande gole.

— Eles me mandaram embora. Disseram que não precisavam de outra trainee. Blá, blá, blá. — Ela revirou os olhos. — Que seja...

— Ah, merda. — balancei a cabeça em descrença. — Mas você trabalhou tão duro!

— Eu sei disso, certo? E sabe de uma coisa? Estou bem. C'est la vie. Hora de seguir em frente. — Ino deu um pulo, e um sorriso surgiu em seus lábios:

— Vamos encher a cara.

Apertei os olhos. Havia algo na maneira como ela evitava olhar para mim que levantou minha suspeita.

— Espere! — Agarrei seu braço e puxei-a de volta para o sofá. —Você não está me contando a história toda.

Ela revirou os olhos de novo.

— Vai falando. — ordenei.

Ela fechou os lábios em uma linha apertada.

— Ino... — insisti.

— Tudo bem. Eu dormi com o chefe.

Meu queixo caiu.

— Você não fez isso...

Ela assentiu com a cabeça.

— Fiz. O assistente pessoal dele, que é o melhor amigo da mulher do cara, começou a suspeitar. Então o filho da puta ficou nervosinho e decidiu se livrar de mim.

— Isso está dentro da lei?

Está? Ino deu de ombros.

— É provável que não, mas é um mundo pequeno, e eu preciso dessa referência, se pretendo arrumar outro emprego na área de bancos.

— O filho da puta... — Eu espelhei as suas palavras. Ino era a pessoa mais brilhante que eu conhecia. Formara-se como uma das primeiras da classe, e qualquer empresa ficaria feliz em tê-la em seus quadros. — Você vai encontrar outra coisa em pouco tempo. — Eu não tinha dúvida sobre isso.

Ela sorriu.

— Sim, só que na próxima vez trate de me lembrar de não transar com o chefe, e não interessa se ele é gostoso. Você é tão sortuda por ter o Kiba... Pelo menos ele não é casado e não mente sobre não ter dormido na mesma cama com a esposa pelos últimos dois anos. Vai ser clichê assim lá na…

Passei os braços ao redor de Ino, e ela apoiou a cabeça contra meu ombro do mesmo jeito que sempre fazia quando um relacionamento azedava. Eles sempre azedavam, quer a gente quisesse, quer não.

— Kiba não é perfeito, você sabe disso. E eu não quero nenhum compromisso. — respondi.

— Pelo menos ele é honesto. Isso é mais do que você pode dizer sobre a maioria dos caras lá fora.

Sei lá, você pode me chamar de romântica, mas não concordo com Ino sobre seu último comentário. Evidentemente, nem todos os homens eram mentirosos ou tinham fobia de engatar um relacionamento sério. Revirei os olhos enquanto pensava no cara que todo mundo considerava um achado: Kiba, o namoradinho que não se sentia pronto para assumir um compromisso sério, assim como eu, por minhas próprias razões. Ele era bonito, bem-sucedido e com quem vinha saindo por quase um ano, embora soubesse que aquela era uma relação que daria num beco sem saída e que poderia acabar de uma hora para outra. Se você chamasse aquilo de um relacionamento no estilo "vamos nos ver de vez em quando", então tudo bem, isso era tudo o que nós tínhamos: uma

espécie de amigos com alguns benefícios extras.

Não, era menos que um amigo, ele era mais um parceiro para fazer sexo. Nós nos conhecemos quando Ino deixou sua bolsa em um bar, em uma noite de bebedeira. Kiba encontrou e, quando ele apareceu na nossa porta, ela deveria ter sido a pessoa a agradecê-lo por não roubar o dinheiro dela e atirar sua cédula de identidade na lixeira mais próxima. No entanto, Ino estava vomitando no banheiro por quase uma hora... Então, Kiba me conheceu em seu lugar. Nós nos demos bem de imediato, e eu realmente achei que ele pudesse ser um projeto para longo prazo. Contudo, como se viu mais tarde, até mesmo planejar um fim de semana era muito compromisso para ele. Na verdade, nem conseguia me lembrar da última vez que tínhamos saído para namorar. Falando sério, nem conseguia me lembrar de alguma vez termos planejado qualquer coisa que não envolvesse uma noite de bebedeira com nossos amigos.

Desde o início, Kiba havia deixado bem claro que não seríamos exclusivos, e isso foi uma coisa com a qual concordei, porque ele me deixava confortável. Junto dele, era como se pudesse ser eu mesma. Quando a gente conversava, o tempo parecia voar, e nós acabávamos falando a noite toda. Tudo bem, não estava naquela de um amor de causar arrepios, de aquecer a barriga, de sentir um nervoso de excitação, mas... Mais uma vez, isso existe em algum lugar fora dos romances da Barbara Cartland?

— Bem, e aí? — continuou Ino, me empurrando para fora dos meus pensamentos. — Como foi seu encontro com esse cara?

— Namikaze. — disse eu, para refrescar sua memória.

— Namikaze. — ela repetiu.

— Nem me fale. — acenei com minha mão, preferindo evitar essa

conversa. — Ele não apareceu.

— Parece que nós duas precisamos de uma bebida. — Ino ficou em pé e me puxou para cima com ela. Eu hesitei.

Ela podia estar desempregada agora, entretanto eu ainda tinha um emprego. Embora pudesse ser divertido passear pelos bares de Nova York, saboreando margaritas à meia-noite, eu não tinha o cartão de crédito Platinum igual ao de Ino, cortesia de seu pai, para pagar minhas contas. Tinha de me levantar cedo de manhã e ir trabalhar.

— Vamos lá, pequena! — Sabendo que iria me fazer rir, ela imitou o falso sotaque britânico que aprendeu em uma de suas férias em família. — Vamos esquecer esse dia horrível... — Meus lábios se curvaram para cima. — Estaremos de volta em um instante. — Isso, no dicionário pessoal de Ino, era o equivalente a uma farra que duraria toda a noite. Contudo, ela era minha melhor amiga, e precisava de mim. E teria feito o mesmo por mim. Naturalmente, minha determinação não teve chance.

Revirando os olhos, balancei a cabeça e a segui porta afora. O ar frio da noite chicoteou meu cabelo contra a pele de meu rosto. Felizmente, nosso bar favorito de bebedeiras ficava ao virar da esquina, então não tivemos de enfrentar o frio por muito tempo antes de nos acomodarmos em nossa mesa de costume, rodeadas por inúmeros admiradores de Ino e algumas doses de tequila com limão.

….

Um zumbido penetrante me acordou muito cedo. Eu gemi e cobri meus ouvidos com meu travesseiro, implorando em silêncio para que quem estivesse produzindo tal ruído horroroso parasse de fazê-lo. Demorei alguns instantes para perceber que era meu despertador. Rolei de lado sobre meu corpo e o desliguei. Uma voz masculina soltou um grunhido divertido. Sentei-me no colchão, instantaneamente acordada. Meu olhar pousou sobre o cara deitado do lado esquerdo da minha cama, e senti o calor revelador de um grande rubor correndo para meu rosto. Ele estava apoiado em um cotovelo, um braço dobrado sob a cabeça, seu peito esculpido com pelos escuros que desciam pelo abdome liso em plena exibição. O lençol que cobria sua... Er... decência não deixou nada para a imaginação. Na verdade, ele só conseguia me lembrar de uma indesejável distensão entre minhas pernas. Ele não apenas tinha uma boa aparência, mas também era bem-dotado. Uma inebriante e perigosa combinação em um homem. Minha língua passou sobre meus lábios repentinamente secos

quando afastei meu olhar para longe do volume que se mostrava evidente debaixo do lençol fino.

Ei ... O que ele estava fazendo na minha cama? E por que estava nu?

O que você acha, sua estúpida? Não é preciso ser um gênio para descobrir isso. É só olhar para o sorriso maroto.

Olhei para o rosto dele. Na luz brilhante da manhã que vinha se derramando através da janela, ele parecia mais jovem do que na noite passada, porém tão arrogante como sempre. Seus lábios lindos

se curvaram no sorriso mais deslumbrante que eu já tinha visto. Um sorriso de abaixar calcinha, como Ino o teria chamado. Eu empalideci com a constatação. E se eu tivesse deixado abaixar minha calcinha por ele?

Ele me olhou com uma expressão divertida em seus olhos ardentes. A maneira como ele olhou para mim... Senti como se esse homem visse através de meu corpo e diretamente até minha alma.

Ninguém nunca tinha me feito sentir desse jeito. Então, de novo, eu também nunca tinha visto alguém tão eletricamente bem-apessoado, contudo há uma primeira vez para tudo.

— Você está pronta para a segunda rodada? — Sua voz destilava insinuação. Eu tinha ouvido aquela voz rouca antes, mas onde? Meu cérebro lutava para fazer uma conexão por meio daquela

neblina provocada pelo álcool, nublando meu sistema de recuperação de memória. E então, me dei

conta.

— Você estava no Black Rose. Era para eu me encontrar com Namikaze, mas ele mandou você em seu lugar.

O sorriso dele se alargou, revelando duas sequências de dentes simétricos, de um branco perolado. Dentes fortes e bonitos que morderam meu pescoço e desceram, roçando a pele sensível de minhas coxas. Ei, calma lá, de onde veio isso? Balancei a cabeça de leve e tentei me apegar à memória diante dos meus olhos, mas já tinha ido embora.

— Nós... — Fiz um gesto para seu peito nu.

Meu coração parou de bater por um momento, enquanto esperava por sua garantia de que fora tudo um mal-entendido, que eu não transara com um desconhecido, porque essa coisa de ficar por uma noite não era minha praia. Além disso, eu estava em um relacionamento, embora fosse daqueles abertos, mas trair também não era coisa minha. Eu não estava me transformando em Ino, estava? E eu provavelmente não seria tão idiota a ponto de transar com aquele sujeito.

O tal senhor Estranho abriu a boca para dizer alguma coisa, fechou-a de novo, e naquele instante eu soube. Eu era uma ordinária, até porque não conseguia sequer lembrar-me de seu nome.

— Ah, Deus. — pulei da cama, percebendo de maneira vaga que não estava usando nada, nem mesmo minha calcinha, provavelmente cortesia de seu sorriso de fazer abaixar calcinhas.

Mortificada, puxei o lençol dele e cobri meu corpo nu, em seguida, peguei aquilo que assumi ser a calça jeans dele em uma pilha de roupas espalhadas no chão e atirei-a para o senhor Estranho. Ele a pegou no ar, mas não se apressou em vesti-la. Bem, ele obviamente estava confortável com suas partes íntimas em plena exibição. Bom para ele. Eu me encolhi e sussurrei:

—Fora.

Ele piscou e franziu a testa, como se não estivesse acostumado com esse tom de voz de ninguém. Isso foi um toque de decepção em seus olhos? Eu balancei a cabeça para organizar meus pensamentos confusos. Por que ele se sentiria assim quando nem sequer me conhecia? E, então, aquilo se foi, e seu olhar ardente se transformou em gelo.

Meu coração afundou em meu peito. Virei as costas para ele e falei por cima do ombro:

— Você encontrou seu caminho aqui para dentro, então tenho certeza de que pode encontrar seu caminho para fora. — e corri porta do quarto afora, me dirigindo para a segurança da cozinha, correndo direto para Ino que preparava nosso café da manhã.

— Alguém está fazendo a caminhada da vergonha? — Ino apontou para minhas bochechas ruborizadas.

Olhei para o rosto maquiado e os cabelos perfeitos. Sério, como ela conseguia parecer que tinha acabado de passar por um tratamento de beleza em um spa depois de uma longa noite de bebedeiras, e de vomitar no pequeno gramado do lado de fora de nosso prédio? Ino estendeu a caneca de café.

—Tome, pegue. Você precisa disso mais do que eu.

— Obrigada. — Tomei um gole e queimei a língua.

Aquela forte pontada de dor ofereceu uma distração bem-vinda para a questão em pauta. Por que eu tinha trazido um cara para casa?

— Ele ainda está aqui? — sussurrou Ino em um tom conspiratório.

Quase cuspi meu próximo gole.

— Você sabe do... ?

Ela assentiu com a cabeça.

— Bem, não foi exatamente um segredo o que você fez, querendo ir para a cama com o cara...

O que diabos eu fiz? Tirei a roupa e dancei no colo dele? Do jeito que Ino falou, parece que agi como se estivesse sedenta de sexo. Não admira que o cara estivesse desapontado por não dar uma rapidinha de manhã.

— Você é minha melhor amiga! Devia ter me detido! — Fiquei brava com ela, comigo mesma, com aquele Gostosão Arrogante Descamisado por aceitar os avanços de alguém que estava obviamente embriagada. Contudo, por mais que eu estivesse fervendo por dentro, sabia que ele era o último que poderia ser culpado de alguma coisa. Afinal, que homem diria "não" a uma mulher disposta a transar e com a moral frouxa?

— Eu estava bêbada. — sussurrou Ino, como se isso explicasse tudo.

Passos pesados ecoaram do outro lado do corredor estreito e pararam na porta da cozinha. Segurando minha respiração, enterrei meu olhar no café e desejei que a xícara me engolisse para que não precisasse enfrentar a vergonha de minhas ações.

— Bom dia, senhoras. — disse o senhor Estranho.

— Quer café? — Ino se aproximou e lhe serviu um pouco de café, ignorando meu olhar venenoso lançado sobre ela.

Uau, que diabos? Quer dizer que ó cara agora ia ficar para uma xícara de café? Será que ele não recebeu meu memorando?

— Saúde.

Ele tomou um gole e suspirou de leve. Droga! Por que ele parecia tão sexy fazendo coisas normais, como beber café? Minhas bochechas começaram a queimar de novo quando meu olhar deslizou pelo peito largo daquele homem, minha mente evocando imagens dele em cima de mim. Seria uma tentativa de meu cérebro para me fazer lembrar do que fizéramos, ou era apenas uma fantasia?

— Você vai me contar como conseguiu esse gostoso? Estou com inveja, e ao mesmo tempo orgulhosa de você! — sussurrou Ino, nem um pouco incomodada com o fato de que minha conquista podia mais do que certamente ouvir cada palavra que ela estava dizendo. Seu olhar avaliou o homem apreciando-o, os olhos de raios-X muito provavelmente estavam despindo-o nesse mesmo instante. Embora eu em geral não me importasse de ela ficar olhando de soslaio meus homens, por alguma razão inexplicável aquilo me incomodava agora. Seus lábios se curvaram em um sorriso lascivo, e ela começou a brincar com um fio dourado de seu cabelo. Eu não teria ficado surpresa se a visse colada à sua perna, babando em cima dele.

— Pare com isso! — Dei um cutucão em minha amiga, para o caso de ela não estar mais me ouvindo naquele seu estupor induzido pela luxúria.

Ela encolheu os ombros e deu um passo para trás, mas isso não a impediu de lançar mais um olhar malicioso.

— E aí, tem planos para o dia de hoje? — perguntou o senhor Estranho.

A cozinha ficou em silêncio até que percebi que ele estava se dirigindo a mim. Ergui os olhos, que estavam fixos no chão, para o rosto dele e na mesma hora desejei não ter feito isso. Ninguém tinha olhos como os desse cara, olhos azuis como o pecado, mas nunca antes o pecado pareceu tão tentador. Engoli em seco e implorei para meu coração desacelerar antes de estourar no meu peito. Aquilo tinha sido um convite para passar o dia com ele? Certamente, não poderia ser isso. O cara teve a sua ficada. Sexo sem compromisso não era o sonho de todo homem? Então, por que ele estaria interessado em ver mais da minha calcinha... A menos que essa calcinha tivesse se mostrado de um modo que valia a pena uma segunda tentativa…

Meu sangue começou a ferver com a maneira como ele sorriu para mim: autoconfiante. Então ele tinha gostado do jantar e tinha ficado para a sobremesa. Talvez quisesse ver o que mais a minha lojinha teria para oferecer hoje. Bem, uma boa notícia: o estabelecimento estava fechado. Ele não ia conseguir mais nada, mesmo que meu corpo todo estivesse gritando para ver até onde essa trilha deliciosa poderia me levar.

— Eu tenho planos. Muito importantes. — Endireitei minhas costas e firmei meu olhar no dele, pronta para continuar encarando até que ele não pudesse mais.

Entretanto, ele ergueu as sobrancelhas e os olhos brilhavam com desafio e determinação.

— Então, cancele. — disse, naquele tom rouco de sua voz.

Eu suprimi um suspiro e cruzei os braços sobre o peito. Sério, quem ele pensava que era? Talvez a maioria das mulheres tropeçasse nos próprios pés para passar o dia com ele, mas eu não era uma delas.

— Isso não vai acontecer.

— Jogando duro, é? — Ele mostrou um sorriso sexy. — Você com certeza não jogou assim ontem à noite...

Minhas bochechas estavam em chamas. Eu queria poder ficar invisível e desaparecer da face da Terra. Só desse jeito eu poderia lidar com toda a vergonha e humilhação que estavam me queimando. Quer dizer, talvez eu pudesse.

— Pegue suas coisas e pode dar o fora.

Eu apontei para a porta. Ele não fez o menor movimento, então segurei seu braço e empurrei. Seu bíceps abaulado ficou rijo sob o tecido fino de sua camisa, mas ele não se mexeu do lugar. Respirei profundamente e devagar reuni minhas palavras.

— Olha, o que aconteceu ontem à noite não vai acontecer de novo.

— Por que não? — Ele riu. — Eu pensei que você quisesse... Mais.

Uma pontada aguda de mortificação escaldante queimou através de mim. Será que lá no quarto, enquanto nós estávamos nos divertindo, eu dissera a ele que queria mais?

Ah, Deus.

Meu coração começou a bater mais forte no meu peito enquanto ele me observava, os olhos varrendo meu corpo dos pés à cabeça, aproveitando cada momento daquilo que eu chamaria de a maior humilhação da minha vida.

— Por que não de novo? — insistiu ele.

Fechei as mãos em punhos e me encolhi sob a centelha divertida que enxerguei em seu olhar.

— Porque isso foi um erro. Nós deveríamos ter uma reunião de negócios, não, ficar nos agarrando. — sibilei, enfiando meu dedo em seu peito forte. Sua falta de qualquer tipo de reação fez meu temperamento chamejar. — Você foi um erro causado pela embriaguez, que eu nunca repetiria em meu estado sóbrio, então, trate de ir embora agora.

Por alguma razão inexplicável, eu me arrependi de minhas palavras no momento em que as pronunciei, contudo não havia como voltar atrás. Ele era um cara diabolicamente sexy com um belo rosto e o corpo de um deus, mas eu não podia ignorar o fato de que esses caras gostosos agiam sempre do mesmo modo, e que convencer urna mulher a ir para a cama não é nada além de um jogo para eles. Um jogo para confirmar seu nível de gostosura. A julgar pelo sorriso preguiçoso nos lábios, eu aposto que ele concordaria totalmente comigo. Por isso, não tinha importância se eu me sentisse atraída por ele, esse cara não devia fazer parte de nada em minha vida, para meu próprio bem.

Isso se chama amor próprio. Coisa que não demonstrei muito na noite passada.

O cara era um jogador que me traria nada além de problemas. Eu soube disso no momento em que ele entrou no Black Rose, e minha intuição estava no lugar, como é habitual. Engolindo meu orgulho, cruzei na frente dele e fui para o quarto batendo os pés, furiosa, e não fui capaz de ignorar o brilho de interesse divertido em seus olhos.

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E então, mina-san, gostaram de ler até aqui?

Deixar um comentário vai me deixar mais motivado a escrever/adaptar o resto da história, façam um esforcinho aí!