Leviatã
Depois da derrota de Voldemort, Severus Snape é o bruxo mais poderoso do mundo. Hermione descobre que ele é o único capaz de ajudá-la, mas ele o fará? E o que ela terá de fazer para obter sua ajuda? Tradução da história Leviathan, escrita por pewterlocket. Translation of Leviathan, by pewterlocket.
Disclaimer: É tudo da JK Rowling. História por pewterlocket. Eu só traduzo mesmo.
Capítulo Um: Uma rosa por qualquer outro nome
Curandeiro Pye estudou os luminosos dados diagnósticos que flutuavam diante de seus olhos e então observou seu paciente cuidadosamente.
- Não mais do que um ano, é o que me parece.
- Arthur Weasley foi curado. Como você o curou?
- Eu não sei dizer precisamente. – Pye começou, mas então hesitou. – Essa é só uma teoria, mas eu acho que há uma conexão entre o apoio da família e a recuperação dele. Não sei se você alguma vez discutiu com... uh... Dumbledore... sobre as teorias dele acerca do poder mágico do amor? – O olhar no rosto do seu paciente pareceu indicar que ele não havia dado muita consideração a essas discussões. – Ele fez uma boa pesquisa no assunto, antigamente, lá no Departamento de Mistérios. Talvez você queira dar uma olhada por conta própria. Tenho certeza de que o Ministro lhe daria acesso a esses arquivos. Eles pertenceram a Dumbledore, o que significa, pelo que sei, que eles agora pertencem a você. Eu gostaria de ver esses registros também, se você puder, em algum dia desses.
- Antes tarde do que nunca, suponho? – O sarcasmo do homem era lendário.
- Quanto mais cedo, melhor, obviamente. Embora eu não tenha nenhuma prova conclusiva sobre o que curou o Sr. Weasley, suspeito que exista uma forte correlação entre sua melhora e o amor que a família dele nutria por ele.
- Esse definitivamente é um tratamento não disponível a mim, curandeiro. – disse Severus Snape. A austeridade do homem era também lendária. – E disponho de pouco e precioso tempo para a pesquisa que já tenho que completar. Como você sabe, o tempo está correndo para as outras duas vítimas daquela maldição.
- É verdade, mas seus esforços nisso fizeram os últimos dias de Horace Slughorn bem mais suportáveis. – respondeu Pye. Seu paciente, em um gesto cansado, beliscou a ponte de seu considerável nariz. E levantou-se.
- Continuarei procurando por uma solução para eles enquanto eu for capaz. – afirmou, então se virou e desapareceu da sala. Curandeiro Pye o assistiu partir em um floreio de vestes negras.
Hermione Granger apertou sua capa contra o frio do final de novembro e passou, nervosamente, pelo boticário* pela quinta vez. Apesar de ser dia claro, ela se sentia inquieta naquela parte mágica de Londres. Era ruim o suficiente o fato de que a loja estava localizada na parte mais perigosa da Travessa do Tranco, mas pior era o homem que ela teria de encarar lá dentro. O homem a quem ela vinha implorar um favor.
Não havia nenhuma razão para ele atender a seu pedido, nenhuma mesmo. Ele não devia nada a ela depois da vida que o destino havia lhe entregue, ela duvidava que ele tivesse a presença de espírito de sequer considerar o pedido. Mas estava desesperada. Com a morte de Dumbledore, Severus Snape era agora o bruxo mais bem informado e poderoso do mundo mágico. Ele era sua última chance. Ela respirou fundo, tomou coragem... e passou pela porta pela sexta vez.
Estava começando a atrair olhares. O bruxo grisalho em vestes esfarrapadas vagando perto da entrada da travessa, a muitas lojas de distância, estava começando a observá-la um pouco demais e um par de olhos de dentro da loja de roupas de segunda mão do outro lado da rua não mais desviava o olhar quando ela olhava naquela direção. Finalmente, decidindo que provavelmente estaria mais segura dentro do boticário que fora, lançou-se para a porta, girou a maçaneta e, tentando ao menos fingir confiança, caminhou a passos largos para dentro da loja.
Estava vazia. Sentindo-se aliviada e desapontada ao mesmo tempo, olhou em volta. Estava marginalmente quente lá dentro. O interior não era diferente de seu escritório nas masmorras de Hogwarts com frascos de coisas apertadas em conserva revestindo as paredes em prateleiras do teto ao chão. A única luz natural vinha de duas janelas largas na frente do prédio, situadas em ambos os lados da porta de entrada de vidro. A iluminação fraca das arandelas nos fundos mal alcançava o ponto em que as luzes das janelas deixavam de cobrir, tornando o lugar excessivamente escuro. Um balcão enorme, que aparentemente se passava por bancada de trabalho já que existia um caldeirão em uma ponta soltando mechas delicadas de vapor, atravessava praticamente toda a extensão da loja. Entre a entrada e o balcão havia estantes velhas e já frágeis, que ficavam à altura dos ombros para que o proprietário pudesse ver qualquer cliente entrando, abarrotadas de frascos, jarros e cestas de ingredientes de poções. Ela se aproximou do balcão, notou a existência de mais prateleiras embaixo deste e pegou um dos vários frascos dispostos ali, o nome dos ingredientes rabiscados no rótulo na letra estreita do professor Snape.
- Senhorita Granger – uma voz suave falou, quase em sua orelha. Ela chiou, girou na direção da voz e derrubou o frasco. Com um rápido aceno de sua mão, professor Snape levitou o pote em queda e o colocou sobre o balcão.
- Veio para roubar dos meus estoques novamente? – perguntou, espreitando o rótulo e então novamente Hermione. – É até o mesmo ingrediente da última vez. Pele de ararambóia.
- Você sabia disso? – Ela tentou não gaguejar, mas o condicionamento de cinco anos de vida na sala de poções com aquele homem tornava difícil responder de qualquer outra forma.
- Foi bastante óbvio depois que você apareceu na Ala Hospitalar na forma de um gato. – O sorriso afetado no rosto do homem indicava que ele sentia profundo prazer de ter aquela informação. – Quem você acha que Madame Pomfrey chamou quando aquilo aconteceu? – É claro que o mestre de poções da escola seria a primeira pessoa a ser convocada para um caso de poção polissuco que deu errado.
- Você nunca mencionou isso antes.
- Essa memória é uma daquelas que tenho zelado por estes últimos cinco anos e meio e tem me produzido diversão suficiente para impedir que eu exija que você reponha um ingrediente bastante caro, então estamos quites. – ele afirmou. – Agora, o que você quer?
A coragem de Hermione estava enfraquecendo. – Isto é um boticário. – Bem, dã, aquilo era óbvio. Os nervos estavam empurrando palavras para fora de sua boca. – Eu vim por, hm, suco de tolete**.
- Realmente. – Ele aparentava total descrença. – Você veio até a parte mais perigosa da Travessa do Tranco por suco de tolete?
Ela concordou com a cabeça, inquieta, sem ousar olhar nos olhos dele. O que diabos a havia possuído para tentar mentir para um legilimente?
- Que poção você está preparando? – Ele exigiu.
Em pânico, ela soltou a primeira coisa que veio à sua mente. – Herbicida. – Herbicida, sua idiota? Ela pensou. Isso não iria funcionar.
- Senhorita Granger, você vive em um apartamento na Londres trouxa. Por que você precisaria de herbicida? – ele perguntou, suavemente, seu sorriso afetado uma clara indicação de que ele sabia que ela estava mentindo e estava saboreando a oportunidade de brincar com ela.
- Eu... Eu queria fazer um pouco para... para a Sra. Weasley. Sim. Ela acabou de ficar sem e eu lhe disse que faria um lote novo imediatamente.
- E isso seria para todas as ervas daninhas que surgem durante o inverno, certo? – Ele não estava exatamente zombando, mas era algo próximo disso. Ela não disse nada, tomando um súbito interesse por um grande arranhado no balcão gasto. Ele se inclinou e escolheu uma garrafa de uma prateleira. – Aqui está. É por conta da casa. Bom dia, Senhorita Granger. – E em um redemoinho de preto, andou para trás do balcão e passou a observar o caldeirão borbulhante.
Agora que ele estava de frente para a loja, a luz fraca das janelas dava um pouco mais de iluminação ao semblante do professor Snape. Embora não houvesse como confundi-lo, Hermione estava verdadeiramente chocada com sua aparência. Seu rosto estava torcido e seus olhos pareciam quase vazios por dentro. Ele sempre fora um homem magro, mas agora estava raquítico. Seu colarinho alto e sua usual gravata lhe impediram de espiar as cicatrizes que devem ter sido deixadas após o ataque daquela cobra terrível. Enquanto sua voz era suave e hipnotizante como sempre fora, sua respiração parecia mais difícil de alguma forma.
Ela olhou para a garrafa que ele havia pressionado em suas mãos e quase chorou. Estava certa que aquilo somente tornaria as coisas piores. Era hora de falar a verdade e arriscar dizer a ele o real motivo de sua visita. O pior que ele poderia fazer era expulsá-la. Com a decisão tomada, e relembrando seus pais, uma sensação de calma tomou conta dela.
- Eu estava mentindo para você, Professor. – ela confessou, esfregando o rótulo da garrafa.
- Sim, Senhorita Granger, você estava. – ele respondeu bem calmamente. – Clientes apenas desejando adquirir suco de tolete não andam de um lado para outro na frente da minha loja por meia hora antes de entrar. – Os olhos dele estreitaram enquanto a estudava. – Desembuche. Não existe mais qualquer necessidade de mentiras entre nós.
- Você é minha última chance, Professor. Preciso de sua ajuda. – Ela colocou a garrafa em cima do balcão, enfatizando seu ponto. Ele levantou uma sobrancelha questionadora.
- Com?
- Ano passado, antes de nós – Rony, Harry e eu – sairmos em busca das horcruxes de Voldemort, eu modifiquei as memórias dos meus pais. Apaguei as lembranças deles sobre mim, dei a eles novos nomes e uma ambição de vida de mudar para a Austrália. Tudo para protegê-los, inclusive se algo acontecesse comigo. Agora quero restabelecer a memória deles e descobri que... – ela hesitou, sua garganta apertando, mas forçou-se a continuar. – Que eu não consigo reverter os efeitos.
- E você quer que eu conserte o seu erro?
Ele tinha de colocar daquela maneira. Ela estava lidando com Severus Snape afinal.
- Sim, senhor. Eu tentei tudo e todo mundo. Ninguém pode me ajudar. Desde... – desde que você matou Dumbledore, ela pensou. Não, isso não seria apropriado. – Desde a morte de Dumbledore, você é o bruxo mais bem informado e poderoso ainda vivo. Você é o único que teria alguma chance de corrigir meu... erro.
- E o que você me daria em troca, Senhorita Granger?
Ela suspeitara que isso seria perguntado. Professor Snape nunca parecera a ela como um homem particularmente generoso. Era lamentável que tivesse bem pouco a oferecer.
- Não tenho muito, senhor. Mas tenho 2.000 galeões em meu cofre no Gringotes e eles são seus se me ajudar.
- Não estou interessado em dinheiro. – ele respondeu, seu olhar negro fazendo-a nervosa novamente.
Ele cruzou os braços, encarando-a. Trazendo seu polegar para cima, roçou-o por seu lábio inferior. – Eu poderia aproveitar alguma ajuda nesse lugar. – ele comentou finalmente.
- Bem, eu não tenho um emprego ainda. Venho estudando para compensar o que teria sido meu sétimo ano, para que eu possa prestar os NIEMs e... – ela pausou. – ...tentar recuperar meus pais. Eu certamente poderia passar aqui e dar uma ajuda. – Hermione tinha uma sensação desconfortável na boca do estômago. Ele não poderia possivelmente achar que isso seria suficiente se havia rejeitado seus galeões. Ela mudou de posição nervosamente.
- Passar aqui? – ele ergueu as duas sobrancelhas dessa vez. – Não, Senhorita Granger. Acredito que isso exige mais esforço do que "passar aqui", como você colocou.
Era só a luz ou a distância? As linhas de seu rosto pareciam mais suaves e as cavidades sob seus olhos não tão escuras, sua respiração menos forçada. Estranho. Mas então ele continuou a falar.
- Na verdade, acho que sei exatamente o que faremos. – Ele agitou sua varinha na direção da porta dos fundos da loja. Ela abriu parcialmente e, um momento depois, um livro voou pela abertura, diretamente para sua mão. Ele deitou o volume velho e aparentemente frágil em cima do balcão. Hermione não conseguiu resistir à tentação. Enquanto ele reverentemente, ao que pareceu a ela, folheava as páginas, o suave odor de pergaminho velho flutuou pelo ambiente e ela se inclinou ligeiramente para frente, inalando profundamente. Era quase intoxicante.
Ele correu seu dedo por uma página, virou-a e continuou na seguinte. Hermione observou seu rosto enquanto ele se concentrava em sua pesquisa e ela pode dizer por sua expressão o momento em que ele encontrou o que estivera procurando; o vinco entre seus olhos suavizou e o sorriso afetado retornou.
- Ah. Isso deve servir. – Ele disse, conjurando um pedaço de pergaminho. Bateu de leve na página que encontrara no velho livro e transferiu o texto para o pergaminho conforme o desenrolava na frente dela. – Eu acredito que a duração normal de um contrato desse tipo é... – ele consultou o volume antigo novamente. – ...sim, de sete anos.
- Sete anos?
- Acho que isso adequadamente cobre o seu pedido. – ele retrucou, conjurando uma pena e tinteiro. Ele os colocou ao lado do contrato. Ela olhou para aquilo, paralisada. Sete anos. Seus sonhos de terminar os NIEMs e encontrar uma carreira na qual poderia fazer realmente alguma diferença para o mundo bruxo seriam destruídos. E encontrar o amor da sua vida e ter alguns filhos? Tudo isso teria de ser colocado em espera até que conseguisse cumprir tal obrigação. Ela sentiu sua garganta apertar.
Mas então pensou em seus pais: o sorriso de sua mãe e como ela era capaz de entender o que Hermione estava sentido com apenas um olhar; os abraços de seu pai e o modo como os dois passavam horas na biblioteca lendo juntos. O sacrifício valeria a pena. Ela pegou a pena.
- Você talvez prefira ler o contrato inteiro antes de assinar, Senhorita Granger. – Ele respondeu quietamente. Ela sacudiu a cabeça.
- Eu não tenho escolha. Daria qualquer coisa para ter meus pais de volta e você é minha última chance. – Ela desenhou sua assinatura no final do pergaminho e entregou a pena a ele. Ele fez o mesmo, em sua familiar, apertada escrita. E, assim que concluiu, o pergaminho se enrolou novamente e desapareceu, sem dúvida para se autoregistrar junto ao Ministério da Magia.
- Então, qual será meu horário? – ela perguntou, esperando que seria tão pesado quanto as tarefas que ele lhe designaria. Ela não tinha dúvidas de que ele a trataria pouco melhor do que a um elfo doméstico. – Que horas você quer que eu apareça pelas manhãs?
- Pelas manhãs? Ah, não, Senhorita Granger, você viverá aqui na loja. – ele respondeu astutamente. – Permitirei que você prepare sua mudança e dê aviso prévio a seu locador até às 17h. Venha. Eu vou lhe mostrar seus aposentos.
Sete anos. Disso. Ela suspirou e seguiu o professor Snape pela porta dos fundos da loja.
A porta abriu para um longo hall e Hermione imediatamente suspeitou que um feitiço de extensão particularmente complicado havia sido usado para fazer o prédio parecer muito maior. Eles passaram por diversas portas em cada lado até que chegaram à última da esquerda. O quarto não era nada mais do que um armário de vassouras. Era largo o suficiente para que pudesse tocar ambas as paredes sem estender seus braços e tinha menos do que o dobro de profundidade. No final, do outro lado, no chão, se estendia um minúsculo e gasto colchão. Certo. Ela seria tratada exatamente como um elfo doméstico.
- Você tem algum travesseiro sobrando? – ela murmurou.
- O que disse?
- Nada, Professor.
- Eu não sou mais seu professor, Senhorita Granger. Tecnicamente, de acordo com o nosso contrato, você deve agora se dirigir a mim pelo...
- Apesar de... – Hermione interrompeu, prevendo o que ele estivera prestes a dizer. - ... que eu teria assinado o contrato independentemente de suas estipulações, eu acho que talvez devesse dar uma olhada nele agora.
- Certamente. – ele respondeu, observando-a, imperturbável. – Assim que você atender às minhas primeiras ordens, iremos discutir as questões sobre o seu horário livre, que não será significativo, eu lhe asseguro. Você pode ler o que você quiser quando tiver completado suas tarefas do dia.
Hermione se virou rapidamente nos calcanhares e se dirigiu para a porta. De jeito nenhum eu vou alguma vez na vida chamar esse homem de "mestre", pensou furiosamente.
Contudo, enquanto ela saia da loja e se dirigia ao ponto de aparatação mais próximo, havia uma única pergunta em sua mente: como o Professor Snape sabia onde ela morava?
* Boticário ou apotecário, do inglês apothecary, é uma farmácia. No mundo bruxo, um lugar em que se adquirem ingredientes de poções e poções propriamente ditas.
** Suco de tolete, do inglês horklump juice. Ingrediente de poções utilizado na fabricação de herbicidas e da poção Wiggenweld, que é uma poção curativa.
