Passou as costas das mãos sujas de graxa na testa de forma cansada, pouco antes de entrar em casa. Precisava de um banho.
Era uma noite qualquer da semana e ia ver Lisa outra vez.
Olhou à volta, encontrando a TV ligada para ninguém, enquanto um barulho de plástico e louça denunciava alguém na cozinha.
– Em casa de novo... – berrou da porta mesmo, indo para o lavabo lavar as mãos.
– Hey Dean! Pensei que fosse na Lisa. – ouviu seu irmãozinho falar e deu um meio sorriso safado para o nada.
– Pensando em trazer alguém pra casa garanhão? Sabe que o pai acha, não sabe? – falou alto e riu consigo enquanto secava as mãos na toalha meio úmida já. Hora de ir pra lavar, pensou consigo, tirando-a do lado da pia e jogando-a em cima da descarga. Acabou terminando de secar as mãos nas calças mesmo, aproveitando que não estavam tão sujas de graxa.
– Claro que não, idiota. Mas vou sair também, ou acha que só você tem vida própria? – chegou na cozinha a tempo de ver o mais novo balançar a cabeça negativamente e fechar o lanche que preparava.
– Opa, tô morto de fome, como adivinhou? – adiantou-se, roubando o sanduíche das mãos do outro, que só o xingou e empurrou, tentando não rir.
– Qual é Dean! Deu trabalho pra fazer! – reclamou entre risos ao ver o mais velho dar uma enorme mordida e sorrir daquele jeito cretino de boca cheia e tudo.
– Você faz outro DamDam. Faz bem pro seu cérebro, assim deixa de ser tão loiro. – respondeu sem engolir, já mordendo de novo o lanche. – Hmm... Tá ótimo, valeu hein?
– Hah, ok porque você é moreno por acaso... – o garoto cruzou os braços e riu alto, enquanto o mais velho engolia a bocada que tinha dado.
– Loiro escuro. – apontou para os próprios cabelos e depois para os do irmão. – Posso não ser tão esperto, mas pelo menos sou mais que você.
– As garotas adoram os loiros... Isso me dá vantagem.
– As 'garotas' adoram uma boa pegada de braços fortes que nem os do papai aqui. Vai ter que malhar muito pra chegar perto, meu filho...
– Blablablá, eu sou o melhor do mundo, blablá... não cansa não? E não me chama de DamDam. Parece que tá falando com uma garota.
– E não tô? – teve que desviar de um pano de prato manchado e caiu na gargalhada, jogando-o de volta no garoto que o tirou da cara com nojo. – Ninguém lava os panos dessa casa não?
– Tô com cara de empregada? Deixa aí num canto que depois o papai recolhe...
– Aaaah, muito bonito da sua parte Adam Winchester... Como se o cara não tivesse mais o que fazer além de lavar roupa! Caralho, a gente tem máquina aqui, é só por dentro com sabão! – sentiu o irmão se encolher um pouco ao tom mais duro de sua voz, talvez arrependido, e respirou fundo, passando a mão pelo cabelo loiro do outro. – Ok... Mas já sabe. Quanto menos deixar acumular pro pai...
–... melhor. É eu sei... – suspirou e encarou o irmão, que lhe sorriu ladino. – Vai logo tomar a droga do banho que daqui a pouco a Lisa tá por aqui derrubando a porta.
– Vai sair? – ouviu a voz do seu pai assim que voou escada abaixo, olhando o relógio de pulso. Era de se esperar que ela já tivesse ligado.
– Lisa. – respondeu simplesmente, enquanto procurava as chaves em algum lugar do móvel da TV.
– Filho, desmarca. – o pai falou, surpreendendo-o.
– Desmarcar? Pra quê?
– Dean, preciso dos meus filhos em casa hoje. Temos que dar um jeito nisso aqui. – o homem falou, mostrando a casa com as mãos. Ele tinha um ponto, a casa estava uma zona. Mas era de se esperar, se tratando de uma casa só de homens, certo?
– Ok, quer que eu fure com a uma garota pra ficar de doméstica aqui? – inquiriu ironicamente, esperando ver seu pai sorrir e dizer que era brincadeira, que podia ir e que só voltasse no dia seguinte. Mas ele não fez isso. Só cruzou os braços em ar grave, com aquele olhar de estou mandando, me obedeça.
– Seu irmão está vindo. – respondeu mais secamente, ainda de braços cruzados.
– Ótimo, chamou o Dam pra ajudar pelo menos... – amenizou o tom de voz e passou a mão na testa, desconfortável com a cara fechada do pai.
– Sim, chamei ele também, mas não é disso que estou falando Dean. – disse em tom ainda mais grave e olhou preocupado para o seu primogênito quando este voltou a encará-lo, agora de forma estranha.
– Espero que não seja mesmo o que eu acho que é. – respondeu prontamente, de forma violenta.
– Dean!
– Não está falando que aquele lá está vindo, está pai? – alterou o tom de voz e fechou os punhos, irritado. – Pai!
– Aquele lá é seu irmão, meu filho! Ele trancou a faculdade e está voltando pra casa, onde é o lugar dele Dean! – respondeu firmemente, mas não conseguia evitar o peso que tomava seu peito toda vez que via seu filho agir assim em relação ao próprio irmão.
– Ele NÃO é meu irmão! E o lugar dele não é aqui! Ele fez questão de jogar isso na cara de todo mundo quando quis dar uma de o bom e se mudou daqui pra fazer aquela merda de faculdade!
– Não fala assim do seu irmão Dean! Era o que ele queria pro futuro dele! Qual o problema disso? Você não quis estudar, queria ser mecânico não é? Ele não tem o mesmo direito, filho?
– Eu não vou largar a Lisa pra dar uma de comitê de boas-vindas pra alguém que eu não quero ver, pai. Vou indo. – baixou o tom de voz e pegou a chave com firmeza, contornando John rumo à porta, mas a mão firme no seu ombro o impediu de sair como queria.
– É uma ordem Dean. – prendeu o ar ao tom autoritário de seu pai, fechando os olhos frustradamente
–... Sim senhor. – respondeu a contragosto, afastando-se da mão do pai e voltando escada acima enquanto ligava irritado pra ela pra desmarcar o encontro.
Não podia acreditar que ele ia voltar. Não agora. Pra quê?
Sentiu seu estômago revirar à ideia de ter que ver outra vez seu outro irmão.
– Ele não é meu irmão... – repetiu baixinho para si, passando as mãos no rosto.
Por que só ele sentia vontade de vomitar com aquele climinha de família feliz na limpeza da casa? Até mesmo Lisa, que ia sair com ele pra um lugar bacana, estava lá agora, animada com a notícia, dando um toque feminino na arrumação da casa.
Bufou e revirou os olhos enquanto terminava de por as roupas sujas na máquina de lavar.
Olhou à volta, pensando na possibilidade de roubar uma cerveja da geladeira e se refugiar no seu Impala, mas desistiu logo que viu John voltar da garagem com umas caixas velhas, provavelmente fotos de família ou outra ridiculice sentimental. Ele sempre ficava desse jeito quando o Winchester do meio aparecia. Ou quando ficava tempo demais sem aparecer, como tinha sido no ultimo fim ano que passaram...
Somente ele tinha gostado da ideia de passar o Natal e Ano Novo somente com Adam e John? Sem ele pra ficar andando de um lado pro outro com a cara enfiada num livro, ou reclamando do tando de junk food que eles consumiam? Enfiando legumes na geladeira, ocupando o espaço das cervejas e obrigando-os a comer? Tendo de dividir os quartos? Afinal a casa só tinha 3...
E era sua vez de dividir o quarto.
Xingou em alto e bom som ao lembrar disso. Adam não abriria mão da sua privacidade com os pornôs do computador, que ele escondia a sete chaves, como se ninguém jamais fosse descobrir. Sabia bem...
Respirou fundo e foi mesmo até a cozinha pegar uma cerveja. Necessitava de uma com toda a sua alma.
Talvez fosse uma boa ideia pegar uma das armas que tinham em casa e atirar numas garrafas vazias nos fundos da casa. Pelo menos assim descontava sua frustração em algo.
Mas sabia que não podia. Seu pai era ex-militar, ok... Mas isso não dava exatamente o direito de ter quase um arsenal escondido no porão. Ou de ensinar os filhos a atirar (o que ele fez mesmo assim).
Seu pai era extremamente zeloso com os filhos. E um tanto supersticioso também. Não se conformava com aquela correntinha que ele obrigava-os a usar. Ou com os sacos e sacos de sal grosso que tinham na dispensa, que ocupavam mais espaço lá que os próprios alimentos que guardavam. E aquelas preces em latim? Não se conformava por ter sido obrigado a aprender aquilo. Não era como se fosse usar, certo? Então pra quê?
Suspirou enquanto abria a garrafa e tomou um gole irritado ao lembrar que o seu irmãozinho gostava bastante dessas aulas estúpidas. Devia saber recitar aqueles exorcismos idiotas de trás pra frente e ainda vivia falando que podia não ter utilidade prática, mas que conhecimento nunca é demais. Era um idiota metido a nerd era isso que era.
– Sam! – deu um salto no mesmo lugar ao ouvir aquele nome, quase derrubando a cerveja no chão e xingou baixinho, vendo que derrubou mesmo um pouco dela na própria camiseta. – Como você está meu filho?... Hum. Chega quando?...
Blablablá... Apostava que era bem capaz dele chegar agora à noite só pra complicar ainda mais a vida deles. Porque daí seu pai ficaria todo preocupado com ele na estrada.
– Sammy, você não dirigiu 14 horas seguidas, certo? – percebeu o tom de ameaça na voz do pai e revirou os olhos. Sabia que lá vinha preocupação pro seu velho. – Motel 6 Grand Junction... Claro que sei que ele existe. ...Não acha que está se explicando demais se não quer que eu desconfie? ...Quantas paradas até agora? Só pra comer? Sammy, não se dirige mais de 2 horas seguidas! Ok, ok... Mais 13 horas coisa nenhuma, você me demore mais um dia se necessário, mas não fique mais de 3 horas no volante Samuel. ...Eu também... Certo, boa noite meu filho. Tchau... – viu-o desligar o aparelho sem fio enquanto vinha para a cozinha balançando a cabeça, inconformado.
– Chega amanhã é? – perguntou por perguntar, dando mais um gole de sua garrafa, mas sentiu um desconforto quando seu pai lhe sorriu discretamente, suspirando logo depois.
– Ele não estava com uma boa voz... – John suspirou novamente, imitando o filho e também pegando uma cerveja para si. – Espero que seja só cansaço, mas não creio.
– Tá falando de quem pai? – perguntou o caçula, entrando com uns panos de prato limpos que estavam mofando na lavanderiazinha.
– Sammy.
– O que tem ele? – tornou preocupado também, fazendo Dean prender a respiração pra não bufar.
Decidiu que era melhor arrumar seu quarto para receber seu irmãozinho e saiu sem ser notado por seu pai e irmão, que falavam preocupados algo sobre como Sam não pareceu bem no telefone e como isso talvez tivesse a ver com o fato de estar trancando a faculdade.
Não queria participar daquela conversa de jeito nenhum e não conseguia entender exatamente porque aquilo o incomodava tanto assim. Se ele estava bem ou mal, o problema era dele, certo? Mas não conseguiu evitar aquela sombra de pesar sobre si, numa quase preocupação que daria muito orgulho ao seu pai, mas que para si só parecia ridícula e inconveniente.
Filhadaputamente inconveniente.
NOTAS DO CAPÍTILO:
Primeira vez que me meto a escrever com qualquer coisa que não seja animada e tenha olhos anormalmente grandes... Também o meu projeto mais sério e ao qual mais estou me dedicando.
Espero sinceramente que gostem viu? Sou novata na área, então qualquer toque ou sugestão será mais do que bem-vindo!
Ah, imagens do Motel 6 Grand Junction, Rota de viagem de Sam Winchester CA/KS e Casa-modelo pro Sobrado dos Winchester, disponíveis no meu blog:
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beijos!
