Fëanor resmungou. Os raios do sol que entravam pelas frestas da janela o fez mudar de posição no sofá na tentativa de ignorar o fato de que fora roubado de sua doce inconsciência. Simplesmente detestava as manhãs de domingo.

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Agora vivia sozinho e se dava o luxo de permanecer nesse estado, ignorando as vontades de seu corpo enquanto sucumbia aos apelos de sua mente. Sua tenacidade sempre fora elogiada e criticada ao mesmo nível, no entanto, era de consenso geral que determinação era sua mais importante qualidade. Fëanor tinha necessidade de controlar a si mesmo com a mesma determinação com que antes fazia dele o maior dos Noldor.

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Sentia essa necessidade especialmente depois do Acordo.

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Não se lembrava dos detalhes e nem das novas leis com que concordara á um ano atrás, porém, começara a ter sonhos de sua vida anterior. Esses sonhos lhe infligiam a dor da separação e do arrependimento e, ainda assim, ansiava por eles. Não se importava em ter seu orgulho ferido em troca de algumas noites de paz.

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" _ Eu te amo.

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Ela sorriu. Sabia que esse era o modo mais passional que ele encontrara de expressar a felicidade que sentia diante da notícia ela lhe trouxe.

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_ Eu te amo. – ele repetiu, agora com a voz mais firme, passado o choque inicial. Fëanáro não conseguia encontrar palavras melhores do que aquelas.

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Nerdanel continuava a lhe sorrir docemente, sua expressão demonstrava tudo o que sentia. Simplesmente não era capaz de esconder seus sentimentos assim como não hesitava em dar sua opinião sobre um assunto quando achava necessário. Era o oposto de seu marido.

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_Existem outras palavras que queira me dizer? Sendo o gênio que és, esperava um pouco mais de eloqüência. – ela provocou.

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_Nerdanel...- tinha plena consciência de que estava fazendo o tolo de si mesmo, no entanto, seu cérebro processava os sentimentos tão rapidamente que sua língua só conseguia debilmente transmitir o que sentia.

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A tomou nos braços e rezou para que esse gesto pudesse lhe mostrar a felicidade que lhe tomava todo o ser. Achava que jamais seria capaz de sentir aquilo novamente. O êxtase em que se encontrava seu fëa era inexplicável e absoluto.

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Mal sabia que ainda passaria pela mesma experiência mais seis vezes."

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Esse era um sonho em particular que sempre o deixava irritado pelo resto do dia. Era capaz de reviver aquela sensação só para no momento em que acordava ter a sensação de vazio que o invadia por perceber que tudo era só lembrança.

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Queria que os acontecimentos mundanos o afetassem de uma maneira ou de outra, queria que o impactasse. Qualquer coisa desde que pudesse ter um estímulo que o fizesse se lembrar de que um dia fora uma tempestade.

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Incapaz de voltar a seu sonho se levantou do sofá. Não saiu do lugar, permanecendo em pé ao lado de sua cama improvisada, mas seus olhos permaneciam fechados.

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Fëanor sempre adiava esse momento.

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Era como se ainda pudesse se agarrar ao último fio da tapeçaria de Vairë que contava sua história e que, no instante em que abrisse os olhos, a mesma se desfaria, desmanchando o bordado e a transformando em nada mais do que fios soltos.

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Com um suspiro resignado lentamente abriu os olhos impondo aos mesmos a visão de seu apartamento sóbrio e vazio.

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Exatamente como seu morador.

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Nota: Sim, eu vou colocar os descendentes de Finwë na Londres moderna sob circunstâncias misteriosas. Cada capítulo mostra um apartamento que pode ser habitado por um ou mais personagens. O primeiro apartamento não poderia deixar de ser dele: Fëanor.