Autor: Alis D. Clow
Beta
: Ivi
Ajuda Especial de
: Dany, Tach, Sam e Marck (thx so much aos quatro)
Personagens/ Par: Draco Malfoy e Harry Potter (É pinhão, eô, pinhão, ea!)
Classificação: NC-17
Disclaimer: Não é meu, apesar de eu ter arrancado vários tufos de cabelo escrevendo isso aí, ó.
Nota: Esse desafio começou a ser escrito como resposta ao desafio à moderação proposto pelo Romantic durante a segunda fase do PotterSlashFics Tournament. Eu não terminei, mas mantive o que eu tinha escrito até aquele momento (algo em torno de 5.000 palavras). Depois terminei ele para terceira fase, em resposta do desafio de prompt "Slave!fic", proposto pela Dany. O desafio original do Romantic envolvia apenas Malfoys e Weasleys, a sentença e perda de tudo. Mas como eu sou pinhão!power, eu tive de perverter a coisa pro meu lado.É daí que "brotou" a coisa da adoção - eu não tive saco/vontade/paciência pra modificar). Mas não se preocupem. Isso dificilmente é relevante. ;D
Enjoy!

/Harry/Draco/Harry/Draco/

Draco Malfoy assistiu ligeiramente alheio o juiz que presidia a sessão proferir a sentença. Ele e seus pais, Lucius e Narcissa Malfoy, estavam de pé, acorrentados, no meio da grande sala circular onde se dava a maioria das sentenças pós-Guerra: a sala de julgamentos número dez. O lugar, ao contrário do que Draco achara, estava vazio e os poucos espectadores que ali estavam eram, na sua maioria, da imprensa. Até aí, nenhuma surpresa. Já era esperado que a imprensa cobrisse o julgamento coletivo da um dia tão nobre e poderosa família Malfoy. Hoje, apenas mais um grupo de criminosos a ser destruído.. Assim como outros presos de Guerra, todos os Comensais foram julgados em bloco, agrupados por família, como simples animais. Era engraçado como que, com um simples decreto, todas as poucas leis que protegiam os direitos humanos de bruxos e bruxas podiam ser suspensas em nome da "justiça". Justiça essa que Draco estava ali, enojado, assistindo.

O juiz principal, Tiberius Ogden, ajeitou os óculos e continuou a ler o documento em suas mãos. Velho idiota, pensou Draco. Ele observou com a cabeça erguida e um ar de desgosto os juízes, deixando seu olhar demorar-se infimamente em cada um deles. Era algo que ele tinha aprendido com Lucius: olhe-os nos olhos, mostre quem é que manda. Para Draco, aquilo era apenas mais um circo no qual infelizmente ele era a atração principal. Detestando e desprezando cada um dos presentes, Draco vestiu sua melhor expressão de indiferença e esperou.

O julgamento fora até rápido, o que por si só já era prova da óbvia arbitrariedade que recheava aqueles julgamentos pós-guerra. Com as contas em Gringotts congeladas e a impossibilidade de recorrer a qualquer uma das reservas de dinheiro legais ou ilegais dos Malfoy, a defesa ficara a cargo de um defensor público de quinta. Draco não conseguia deixar de se lembrar da expressão no rosto de sua mãe quando ela soubera que nem mesmo o dinheiro da herança que recebera como uma Black poderia ser acessada e que nem mesmo suas jóias poderiam ser vendidas. O desespero e a desolação não eram óbvios em seu rosto praticamente sem máculas do tempo. Narcissa era uma mulher forte demais para se permitir abalar e Draco sentia-se orgulhoso disso. Mas o modo como ela olhava fixamente para a parede a sua frente enquanto ouvia que não tinha um único centavo, absolutamente nada, falava em alto e bom som da situação em que se encontravam.

Por isso quando o juiz sentenciou todos os três Malfoy à morte por enforcamento dentro de três dias, Draco sequer conseguiu se chocar. Ele nem ao menos reagiu. Ficou ali, parado, encarando as próprias algemas que reluziam à luz das tochas e com a mente completamente desligada.

Parte dele sabia que ele devia estar em pânico. Gritando. Implorando perdão. Mas a outra parte, àquela onde o orgulho Malfoy corria, simplesmente se recusava a descer tão baixo. Não depois de tantos meses em Azkaban aguardando o julgamento. Não depois de ter visto sua mãe ser arrancada pelo braço por um auror ao ser detida. Não depois de ver as marcas roxas no pulso do pai, onde as algemas tinham-no machucado. Nunca. Ele jurou a si mesmo que nenhum som escaparia de seus lábios e a julgar pela postura dos seus pais, eles também estavam decididos a terem uma morte digna.

Ou ao menos, uma morte sem humilhações.

Ele estava tão certo do seu destino, envolto num destemor orgulhoso causado pela convicção de que em três dias a linhagem Malfoy teria seu fim que se assustou quando ouviu o pai falar.

Draco estava tão absorto em seus próprios pensamentos que não ouvira quando o juiz perguntara aos condenados se eles tinham algo a acrescentar. Tradicionalmente, 

uma mera formalidade do julgamento, uma das poucas que não foram deturpadas pelas novas leis contra Comensais da Morte.

"Eu tenho um apelo a fazer, Meritíssimo.", disse Lucius com a voz suave, porém perigosa.

Draco reconhecia aquele tom tão bem quanto conhecia o som da própria voz. Lucius tinha algo em mente. O que, era o que preocupava Draco.

Ao olhar para Narcissa, ele notou a expressão estóica da mãe. Nada ali, nenhum tremor, nenhuma reação. E ele sabia que ela o estava vendo olhá-la, mas Narcissa tampouco se dignou a encará-lo.

Agora Draco estava assustado.

"O condenado pode falar.", disse o juiz Odgen em um tom ligeiramente surpreso. Ele certamente não estava acostumado a ver um condenado ter um apelo final. Ou ao menos um apelo final que não se resumisse a gritos histéricos por perdão.

"Conforme me é permitido na posição de patriarca da família Malfoy, na lei 237 de 1657, eu abro mão de todos os meus bens e reclamo meu direito de ser acolhido por uma família bruxa com laços sanguíneos."

Um silêncio tão profundo se instalou na sala de julgamentos que Draco podia jurar que conseguia ouvir as batidas dos corações dos presentes. Ele não sabia ao certo se devia se sentir chocado ou grato pela jogada do seu pai e nem ao menos sabia do que seu pai estava falando. Mas fosse o que fosse, ele tinha a nítida impressão de que fora meticulosamente planejado. E pela expressão dos juízes da Suprema Corte Bruxa, eles também não tinham idéia do que Lucius estava falando. Um orgulho infantil brotou no peito do bruxo mais jovem, enquanto ele ficava de pé mais reto, o queixo erguido num tom de desafio. Ninguém dobra os Malfoy, pensou o rapaz, um sorrisinho de escárnio nos lábios.

"Condenado. Explique-se.", pediu uma bruxa que Draco não conhecia. Ela era um dos novos juízes, aqueles que integraram a Suprema Corte Bruxa para preencher os bancos vazios feitos durante a Guerra. O próprio juiz Odgen estava substituindo Amélia Bones.

"Juíza Hepburn. Eu tenho certa que a senhora conhece a lei 237.", disse Lucius, com uma sobrancelha erguida e um ar de triunfo. A juíza ficou vermelha.

"Essa lei, condenado, tem mais de trezentos anos!", exclamou outro bruxo.

"Trezentos e quarenta e dois anos, Excelência.", rebateu Lucius, completamente no controle da situação, apesar de estar acorrentado. E sentenciado a morte.

O burburinho continuou até que um dos assistentes apareceu com um pesado tomo de couro escuro e gasto nas mãos. Ele o colocou delicadamente sobre a mesa dos juízes, diretamente a frente de Odgen. O homem leu. Ajeitou os óculos. Olhou incrédulo para Lucius.

"Você está atualmente falando sério quando fiz que invoca essa lei, condenado?"

"Assim parece, Meritíssimo."

Odgen tirou os óculos e encarou Lucius nos olhos. Algo que poucos faziam.

"Conforme estabelecido na lei 237 de 1657, Lucius Malfoy, como patriarca da família, tem o direito de renunciar aos próprios bens, posições e títulos e se colocar numa posição de gratidão a uma família bruxa com a qual compartilhe laços sanguíneos. Nessa posição, Lucius Malfoy, Narcissa Malfoy e Draco Malfoy ficam, doravante, sob a tutela de uma família bruxa a ser nomeada por nós."

Um burburinho enorme se formou. Para tão pouca gente assistindo, era óbvio que a platéia estava chocada, senão indignada, com o revés. Para Draco, ainda era nebuloso. Ele não conseguia entender o que aquilo significava, ainda que a palavra "tutela" lhe desse uma vaga idéia do que estava por vir.



Na verdade, se ao menos sonhasse com o próprio futuro, Draco teria preferido a forca.

Harry/Draco/Harry/Draco/

Logo após o final da Guerra e todos os muitos enterros, ver os Comensais serem presos e aguardarem julgamento e de fazer os N.E.W.T.s, Harry Potter, O Menino que Sobreviveu e Salvador do Mundo Mágico, viu-se diante de uma difícil decisão: ser ou não adotado pelos Weasley.

A adoção bruxa podia dar-se de duas formas: a primeira era a convencional e idêntica a adoção trouxa. A família adotaria uma pessoa, daria a ela seu sobrenome e patrimônio e ela integraria completamente a árvore genealógica da família.

E existia a adoção mágica. Essa consistia em ligar uma família à outra por laços mágicos. No fundo, funcionava um pouco como um casamento: uma pessoa passaria a fazer parte da família e entraria na árvore genealógica, mas os termos dessa entrada eram discutíveis. E a pessoa magicamente adotada manteria seu sobrenome e origens.

Quando Molly Weasley, no meio de um jantar solene, anunciou que desejava adotar magicamente Harry, o garoto viu-se chocado. Primeiro, porque a idéia de ser adotado que Harry tinha em mente era unicamente a idéia trouxa do processo. E, segundo, porque Harry sempre achou que se algum dia fosse entrar no clã Weasley seria casando com Ginny.

Não que ele tivesse muita opção no assunto.

Somente quando Hermione explicou detalhadamente, com diversas menções a lei bruxa, quatro livros e dois dias de falatório que poderiam ser resumidos em quinze minutos do que se tratava a adoção é que Harry se tranqüilizou um pouco.

E agora, uma semana depois do pedido, Harry estava deitado em sua cama no quarto de Rony encarando o teto. Ele conseguira durante toda a semana educadamente evitar o assunto com a senhora Weasley, mas Harry duvidava que fosse conseguir por muito mais tempo.

Não era como se Harry não quisesse. Ele queria. Por muitas vezes Harry desejara fazer parte dos Weasley, tê-los como parentes, sentar-se a mesa todos os dias e ter um lugar no relógio da família.

E, ao mesmo tempo, ele temia que estivesse traindo seus pais, renegando-os a despeito das palavras de Hermione sobre "manter as origens mesmo após a adoção mágica". Harry não sabia como funcionaria na prática. Se ele teria de tratar Molly como sua mãe. Não que isso fosse ruim. Mas ela não era sua mãe. Por mais que ele a estimasse, ela não era e Harry não tinha mais o desejo real de que ela fosse. Família, sim. Mas mãe era uma coisa completamente à parte para Harry. Depois de tudo, da Guerra, de saber o que sua mãe tinha feito por ele e da experiência com a Pedra da Ressurreição era complicado demais aceitar que alguém tomasse esse lugar.

Era impossível, na verdade.

O rapaz suspirou e se levantou. Não havia razão para aquilo tudo. Ele gostava dos Weasley e tinha a Rony como um irmão desde sempre. Qual era o problema de ligar sua magia a deles, tornar-se uma única família? Em pouco tempo ele sabia que Hermione e Rony se casariam e Harry provavelmente terminaria com um anel no dedo, ligado a Ginny. Era uma mera questão de formalizar as coisas mais cedo e fazer alguém que sempre gostara e cuidara dele como um filho feliz.

Com essa resolução, Harry decidiu anunciar que se tornaria um membro do clã Weasley.



Harry/Draco/Harry/Draco/

Oito meses depois, já no treinamento de auror e oficialmente um membro dos Weasley, Harry foi chamado ao escritório do Ministro da Magia, Kingsley Shacklebolt para resolver um assunto de maior importância.

"Harry. Por favor, sente-se.", disse o Ministro, com uma voz grave e imponente. Harry aquiesceu e se sentou.

"Em que posso ajudá-lo, Ministro?", perguntou Harry, enquanto achatava o cabelo contra a testa com a mão. Um hábito nascido do nervosismo.

"Harry, eu não vou perder tempo com preâmbulos. Semana passada foi proferida a sentença da família Malfoy. Como você bem sabe, as acusações deles eram suficientes para sentença de morte e foi exatamente o que aconteceu. Eles foram condenados ao enforcamento."

Harry abriu a boca num perfeito "o" mudo. Não havia muito que dizer. Harry havia deposto no processo dos Malfoy, assim como no de vários outros Comensais, relatando detalhadamente tudo o que sabia. Somente as palavras de Harry já eram capazes de lançá-los em Azkaban por toda a vida. Com outras provas e depoimentos, a recém renascida pena de morte era certa como o sol raiando dia após dia.

"Entendo.", ele disse depois de vários segundos. "E quando será a execução?"

"Não será."

Harry franziu o cenho.

"Como assim?"

"Lucius Malfoy apelou para uma antiga lei, mais de trezentos anos, que permite que o patriarca da família abra mão de todas suas posses e coloque a família sob a proteção de outra família bruxa com laços sanguíneos. Na antiguidade, era comum que famílias falidas se colocassem na posição de servidão para escapar de uma punição e da penúria que era a vida como um nada. Como protegidos, eles não gozam do status de membro da família, mas tornam-se responsabilidade dela. Por outro lado, a família que aceita a responsabilidade, fica comprometida a olhar e responder pela ação de seus tutelados e se tornam donos de todos os bens da família que protege."

Shacklebolt fez uma pausa, dando a Harry o tempo necessário para absorver as informações. Então Lucius tinha, mais uma vez, escapado de uma sentença usando de astúcia. Nenhuma novidade aí. O que surpreendia Harry sem fim era o fato do homem ter tido a coragem de abrir mão dos próprios bens e se colocar numa posição de quase servidão.

Pensando bem, não era coragem. Era puro desespero. Entre a morte e a pobreza, levando em conta a postura deles na Guerra, certamente a pobreza era mais atrativa.

"Então, eles escaparam.", não era uma pergunta. Era apenas uma simples constatação de Harry. Não que ele desejasse que os Malfoy morressem, mas ele certamente não suportava ver Lucius mais uma vez dar uma volta em todos.

"Da execução, sim."

"Qual família vai tutelá-los?"

"Eu esperava que você me perguntasse isso, Harry. Sendo rápido: a Suprema Corte decidiu que os Weasley ficarão com a tutela dos Malfoy. Por ser uma família íntegra até onde se sabe e ligada ao Ministério, julgou-se que eles farão um bom papel na recuperação dos condenados."

Harry arregalou os olhos. E encarou Shacklebolt. E continuou assim, olhos arregalados e boca aberta, na mais perfeita expressão estúpida até que Kingsley pigarreou.

"Você só pode estar brincado!", Harry soltou sem pensar.

Kingsley ergueu uma sobrancelha.



"Eu certamente não perderia o meu tempo brincado sobre isso, Harry."

"Merlin amado!", exclamou Harry. "Como eles podem decidir isso sem nos consultar?"

"Não podem. Por isso você está aqui."

"O quê?"

"Cabe a você, como membro legítimo dos Weasley decidir, Harry."

Harry encarou Shacklebolt como se o homem estivesse decididamente louco.

"Mas eu não posso falar em nome deles!"

Kingsley inspirou bem fundo e soltou o ar devagar.

"Harry. Quando você finalizou com a adoção, você se tornou um membro do clã Weasley."

"Eu sei disso e o que isso tem a ver com-"

"Deixe-me terminar. Parte da lei institui que a família, como voto de confiança e gratidão, deve entregar o primogênito da família como um servo."

"Servo.", repetiu Harry. "Defina servo."

Shacklebolt encarou Harry muito profundamente. Tão fundo que Harry tinha certeza que ele podia ver o fundo do seu crânio.

"Draco Malfoy é um escravo. Destituído dos direitos da pessoa humana. Basicamente um objeto."

Harry riu. Na verdade, gargalhou.

"Isso é ridículo, não existem escravos."

"Não existem. Exceto no caso de tutela. Como eu disse, essa lei é antiga. Arcaica, de uma época onde a escravidão era permitida."

"Mas ela foi abolida!", insistiu Harry.

Shacklebolt ficou em silêncio e deixou Harry absorver sozinho o fato de que sim, a escravidão havia sido abolida e que não, ela não tinha sido abolida naquele caso específico. Era aceitar isso e seguir em frente.

"Eu ainda não entendendo onde eu entro nessa conversa.", pergunto Harry depois de aproximadamente três minutos inteiros em silêncio. Um milagre que Kingsley não o tivesse chutado de lá para fora.

"Você é o membro mais forte do clã. E reconhecido como líder para efeitos legais."

Harry apenas murmurou um "oh, entendo". Ele não estava entendendo e isso era óbvio. Mas pelo menos ele estava ouvindo.

"Como líder, cabe a você decidir."

"Mas a casa é dos Weasley..."

"Potter.", disse Shacklebolt com sua voz imponente. Harry se encolheu. Oh, tinha demorado, mas finalmente a paciência dele tinha se esgotado. Ótimo. "Você tem vinte e quatro horas para me dizer a sua decisão. Consulte os Weasley, Merlin, uma adivinha, quem você quiser, mas eu quero uma resposta na minha mesa amanhã. Tenha um bom dia."

Harry/Draco/Harry/Draco/

"DE JEITO NENHUM!", berrou Rony, dando um soco na mesa de centro, fazendo um copo entornar e sujar tudo.

Toda a grande família Weasley estava reunida na pequena sala de estar d'A Toca. Hermione também estava lá, quase membro da família, ao lado de um Rony vermelho e furioso. Harry fora rápido em convocar os Weasley e mais rápido ainda em contar os fatos. Verdade fosse dita, ele estava tão apavorado que a filosofia "quanto mais rápido, menos dói pareceu acertada".



Não era.

Molly quase desmaiou, Arthur ficou branco, Bill soltou um palavrão, Charlie acompanhou o irmão e soltou mais três. George caiu na gargalhada e Rony explodiu em berros. Ginny se agarrou a manga da camisa de Harry, enquanto Hermione parecia levemente intrigada, como se de toda a conversa, a única parte que a interessasse fossem os detalhes legais. E Fleur reclamava, ultrajada, do volume da conversa.

"ISSO É ABSURDO!", continuou Rony, alto o suficiente para doer os tímpanos. "Eles conosco? Aqueles miseráveis merecem morrer!"

"Rony!", exclamou Hermione, horrorizada.

"Hermione, aquela doninha desgraçada arruinou metade das nossas vidas! Aquela família não presta, eles merecem morrer!"

"Ronald Billius Weasley, não repita isso novamente!", exclamou Arthur, recuperado do choque, enquanto abanava a esposa.

Rony se calou imediatamente. De fato, toda a família silenciou, coisa pela qual Harry ficou grato.

"Pai, Rony pode ter sido um pouco radical.", começou Bill com um tom calmo. "Mas ele tem razão, aceitarmos eles aqui é ultrajante."

"Eles morrem se não o fizermos.", ponderou Charlie. "Droga, não que eu goste de tê-los aqui, mas eu não quero me sentir responsável pela morte de ninguém."

"Eles foram responsáveis! Eu não obriguei ninguém a aceitar a Marca Negra! Se eles estão nessa situação, é porque mereceram.", berrou Rony.

"Mas isso não muda o fato de que tínhamos a chance de salvá-los e viramos às costas.", contrapôs Charlie.

"Ninguém irá nos culpar quando o fizermos.", rebateu Rony.

"Se o fizermos, irmãozinho.", murmurou George, agora completamente sério.

"George!", exclamou Rony. "Você não pode... Você não acha que eles devem ficar aqui, não?"

"O que eu acho, Rony, é que já houve mortes o bastante.", disse George, baixo o suficiente para que alguns deixassem de ouvir, mas todos escutaram. A dor velada por trás das palavras era palpável. E contagiante.

Rony desviou o olhar e encarou as próprias mãos. Hermione apertou o ombro dele, num ato de solidariedade.

"Harry?"

O auror em treinamento estava completamente absorto em pensamentos, encarando nada em particular. A voz de Molly, porém o chamou de volta.

"Sim?"

"O que você acha, querido?"

Harry quis de verdade se esconder embaixo da mesa. Ou sumir. Ou qualquer coisa que tirasse todos aqueles pares de olhos de cima de si.

Não era uma questão de achar. Era uma decisão tomada antes dele próprio, dentro da sala de Shacklebolt. Não havia opções, escolhas a serem feitas. Havia três vidas postas numa bandeja de prata e entregues a ele. E era simples demais a decisão a ser tomada.

"Narcissa Malfoy salvou minha vida no fim da batalha. Pode ter sido um ato egoísta e nem ter sido a intenção dela, mas ela salvou mesmo assim. Eu-", a voz de Harry se quebrou. Ele nem sabia bem por que, mas sentia-se ridiculamente entalado com emoções que ele sequer sabia nomear. "Eu simplesmente não posso virar as costas.", completou a voz pequena.

E foi assim que o destino dos Malfoy foi selado.

Harry/Draco/Harry/Draco/

Quando a porta da cela se abriu, Draco ainda não sabia ao certo o que seria feito dele. Preso numa solitária de Azkaban, vigiado por mais aurores do que podia contar, despojado de magia, esperança e dignidade, tudo o que ele não podia se permitir era criar expectativas. Pelo bem da própria sanidade, ele precisava manter-se fixo aos fatos.

Draco sabia muito pouco do ato do seu pai. Tudo se resumiu às palavras do juiz Odgen e a rotina de vendar o prisioneiro, transportá-lo para cela, suprimir sua magia e trancá-lo num cubículo fétido. Dali em diante, não existia mais nada, apenas o tempo a correr por ele sem se importar se ele existia. Dois dias poderiam ser duas horas. Ou dois anos.

Voltar à sala de julgamentos deixou Draco nauseado de alívio. Parte dele estava convicta, nesse ponto, de que se fosse para ser executado, seria em outra sala e não ali. E isso só podia significar que os Weasley haviam aceitado.

Depois de ser acorrentado magicamente ao chão, Draco aguardou. Dessa vez, sem ninguém dentro do aposento, a sala parecia maior e ao mesmo tempo, mais claustrofóbica. Draco respirou fundo várias vezes, tentando controlar as batidas descompassadas em seu peito.

Draco estava acostumado com o medo. Durante toda sua vida, esse sentimento o seguiu, um companheiro indesejado, mas necessário e impossível de suprimir. Era quase normal para Draco sentir e encarar esse sentimento, vencê-lo, sobrepujá-lo. Medo de perder, de falhar, da dor, de desagradar, de sofrer. Muito mais tarde, veio o medo da ausência e da morte. Hoje, porém, era o medo do desconhecido que o assolava, fazendo sua boca ficar seca e as mãos suarem.

Quando o juiz Odgen finalmente adentrou ao aposento, quinze minutos depois, acompanhado por uma bruxa que Draco nunca vira na vida, a ansiedade preencheu Draco. O bruxo mais velho se acomodou em uma cadeira, ajeitando as vestes cor de ameixa, enquanto a bruxa desceu até onde estava Draco.

"Meu nome é Mellinda Tiberkins. Sou Executora de Feitiços de Ligação e estou aqui para explicar os procedimentos que tomaremos hoje, bem como presenciar e auxiliar a execução dos mencionados procedimentos."

Draco não assentiu ou disse qualquer coisa. Sua aquiescência não era necessária e ele sabia disso.

"Seguindo a decisão da Suprema Corte Bruxa em acatar o pedido de ser tutelado proposto por Lucius Malfoy. De acordo com a decisão, os Malfoy ficarão sob a tutela dos Weasley durante um período mínimo de um ano, extensível sem limitações. Ainda de acordo com a decisão, todos os bens pertencentes a família Malfoy ficarão congelados e passarão para a posse da família Weasley dentro de duas semanas, após retirados a porcentagem referente as indenizações decididas unanimemente na Comissão de Restituição de Danos de Guerra. Draco Malfoy, você entende o que foi dito até agora?", perguntou a bruxa, no melhor tom de profissional entediado que está cansado de seguir a mesma rotina.

"Sim.", respondeu Draco.

A bruxa continuou a explicar a situação da família Malfoy e em que consistia a tutela. Basicamente, era o que Draco havia imaginado: os Malfoy, até que a Suprema Corte Bruxa decidisse em contrário, ficariam sob a "guarda" dos Weasley. Toda a responsabilidade de atos cometidos por eles, seriam de responsabilidade dos ruivos pobretões, que não seriam mais tão pobretões quando todos os bens dos Malfoy passassem para a posse dos Weasley. Ao menos, nominalmente, eles ainda seriam proprietários de cada coisa, mas os Weasley poderiam dispor dos bens como bem entendessem. A vida era de uma justiça poética, pensou Draco. Anos chamando o pobretão ruivo de, bem, pobretão ruivo e agora o infeliz teria todo o sua fortuna.



Draco odiava profundamente a vida.

Mas não o suficiente para abrir mão dela.

Ela continuou com sua longa narração de como funcionaria a tutela e todos os detalhes possíveis e imagináveis. Draco deixou de prestar atenção quando percebeu que tudo o que ela dizia girava em torno da afirmação "estão todos fodidos". Era simples assim. Estavam todos fodidos. E pobres.

"Draco Malfoy, nascido em cinco de junho de 1980, filhos de Narcissa e Lucius Malfoy, primogênito e único herdeiro da linhagem Malfoy, puro-sangue.", anunciou a bruxa em um tom monótono. O loiro franziu o cenho diante do anúncio.

"Como um símbolo de gratidão será entregue aos Weasley como um servo, como meio de fechar o contrato de tutela..."

A bruxa continuou falando, mas Draco parou. Parou mesmo, inclusive de respirar. Ele encarou Tiberkins bem firmemente.

"O que você disse?", ele perguntou, sem se importar que tinha interrompido o discurso obviamente ensaiado da bruxa.

"Que parte?", perguntou Tiberkins, ligeiramente irritada.

"A parte onde você diz que serei entregue como servo."

"Sim?"

"Como assim servo?"

A bruxa olhou o juiz Odgen. Odgen olhou para Tiberkins. E Draco não gostou da cara deles.

"Você não sabe como funciona a tutela?"

"Não."

"Oh."

E ficaram em silêncio.

"Alguém pretende me explicar o que significa eu ser um servo?", perguntou Draco em tom frio.

"Bem.", começou a bruxa. "Como meio de ligar as família além do laço sangüíneo, o patriarca deve entregar seu filho primogênito, ou seja, seu herdeiro legal, como um servo, um escravo, à família que o está acolhendo."

Draco assentiu. E começou a gritar.

"Não tem a menor chance que vou me tornar um escravo! Esqueçam toda essa loucura e me joguem de volta em Azkaban!"

Draco já se sentira afrontado muitas vezes na vida. Muitas mesmo. Mas nada se comparava a onda de ódio que ele sentia naquele instante. Ele ia matar Lucius. Não, ele ia primeiro torturá-lo e depois matá-lo. Escravo? Primeiro tudo pelo o que ele teve de passar por causa das escolhas políticas de Lucius e agora isso? Para o inferno com ele!

"Vocês não voltarão a Azkaban se você se recusar.", disse Odgen, de sua cadeira.

Draco parou de tentar arrancar as correntes presas no chão à força, uma atividade bem infrutífera.

"Não?"

"Não, você e seus pais serão enforcados."

Draco quase xingou. Quase mesmo. Ele pensou em cinco maneiras diferentes de mandar o velho bruxo enfiar as palavras dele num lugar bem sujo, mas descartou todas. Ele tinha certeza que se os desacatasse podia ser preso. E ele já estava preso. A coisa podia piorar.

"Mas eu não posso ser um escravo! Isso é ridículo!"

A bruxa parecia estar com pena de Draco. E isso só o irritou mais.

"Bem, não é tão ruim quanto parece..."

"Não? Então você se torna o escravo.", respondeu Draco, pingando veneno. Ele não queria ouvir nenhum tipo de baboseira setimentalóide sobre como não é tão ruim 

se tornar um elfo-doméstico para um monte de pobretões imbecis. O que ele queria ouvir era que tudo era uma brincadeira de mau gosto, que ele podia voltar para sua cama e seus travesseiros de penas de ganso e ter uma noite de sono tranqüila. Talvez aquilo só podia ser um pesadelo. Algum tipo cruel e bizarro de pesadelo. Ou talvez ele estivesse morto e aquilo fosse o inferno.

Mas a quem ele estava tentando enganar? Ele estava vivo, pobre, preso, acorrentado ao chão e com duas opções: tornar-se escravo ou morrer.

Alguém lá em cima devia odiá-lo demais. Ou alguém lá embaixo estava se divertindo muito com a cara dele.

"Eu vou ter de servi-los para o resto da minha vida?", perguntou Draco. Se tinha que escolher entre morrer e se humilhar, ao menos era melhor saber ao certo quanto tempo durava a humilhação.

"Bem, a princípio sim. Mas tudo depende do tempo da tutela e da decisão do seu dono."

Dono. Só aquela palavra sozinha era capaz de fazer os finos pêlos da nuca de Draco se arrepiarem.

"E quanto tempo isso deve durar, em princípio?"

"Até a Suprema Corte decidir que os Malfoy estão aptos a viverem em sociedade como cidadãos comuns."

"E depois disso estou livre?"

"Depois disso seu dono deve libertá-lo, se assim ele desejar."

Draco pensou. Bom, era muito simples. Ele tornaria a vida do seu pseudo-dono em um inferno e ele seria obrigado a libertá-lo.

"Mas saiba que seu dono não pode libertá-lo antes ou isso invalidará o contrato."

"E nós seremos enforcados.", completou Draco, num tom seco.

"Exato."

Com sorte, muita sorte, a Suprema Corte os libertaria em menos de seis meses. Bem ou mal, Lucius ainda tinha influência e cartas na manga. Vivo, ele ainda podia jogar. E ele iria fazê-lo e bem rápido ou Draco acabaria com ele. Lentamente.

"Eu tenho qualquer outra chance de escapar desse destino infeliz?", perguntou Draco.

"Não.", disse a bruxa, num tom piedoso que o fez querer enforcá-la com as correntes que o prendiam ao chão.

"Há mais alguma coisa que eu deva saber antes de aceitar essa loucura?"

"Também não."

Ele coçou os olhos com as mãos. Que chance tinha? Entre morrer sufocado por um feitiço de enforcamento e ao menos ter seus pulmões funcionando, era melhor a segunda. Se o contrato não era permanente, então tudo bem. Ele ainda tinha uma chance. Morto, era fim de jogo para ele.

"Então vamos terminar logo com isso."

A bruxa assentiu e pigarreou.

"Draco Malfoy, você aceita tornar-se servo da família Weasley?"

"Sim."

"O juiz aceita que os procedimentos tomados até aqui estão de acordo com o especificado na lei?"

"Sim.", disse Odgen.

A bruxa recitou algumas palavras em latim e as algemas dos braços e pés de Draco brilharam até se tornarem um tom de dourado. Eles se tornaram mais finas e mais refinadas, como se função delas não fosse prender, mas apenas relembrá-lo de sua posição.

Como se ele precisasse de lembretes.



"E agora, só temos de finalizar o ritual.", disse a bruxa. Ela acenou com a varinha e a porta por onde ela e Odgen tinham entrado se abriu.

E do outro lado esperava Harry Potter.


To Be Continued

(Reviews são amor, eu sou uma autora carente necessitada de atenção e precisando de carinho. Review me! Botãozinho roxo ali embaixo ó. Beijosmereviewa)

Alis