13

por Ireth Hollow


O relógio encantado ronronou, à medida que o ponteiro mais pequeno se movia para a décima terceira casa. Ronald dormia, os braços abertos, ocupando quase toda a cama de casal. Os lençóis – brancos com linhas douradas que traçavam motivos abstractos – acentuavam o contraste que o ruivo dos seus cabelos produzia na sua pele clara. Se fosse uma artista, seria este o momento que escolheria para o retratar, no sossego da hora que era só sua. Não descuraria qualquer pormenor, ciente de que aquele tempo não terminaria enquanto a sua obra não estivesse completa. Cabelos espalhados, olhos fechados, sorriso tranquilo, corpo relaxado. Um traço mais fino para as pequenas particularidades do marido: as sardas, a pequena ruga que já se adivinhava na testa, a aliança de casamento, a cicatriz deixada por um feitiço antigo. O ar de quem não tardaria a despertar.

Sorriu com o seu devaneio. O seu talento não era desenhar. Nunca fora. Mesmo assim, dia após dia, empregava a sua arte num esforço de contemplação que usava amor como tela e carinho como tinta. Dia após dia. Até o ponteiro deixar a décima terceira casa e o tempo deixar de estar suspenso do seu olhar.

Esse milésimo de segundo que estava preso entre a magia e a normalidade era o preferido de Hermione, porque encerrava antecipação e saudade, num perfeito equilíbrio. Fechava os olhos rapidamente, numa tentativa infantil de o reter. No entanto, o relógio já não ronronava e Ron já não dormia – sabia que não, mesmo sem o ver. Sentira a mudança no ritmo da sua respiração, previra o movimento preguiçoso nos lençóis, esperava o gemido que a atrairia até à cama. Vem, Hermione.

E ela iria, uma mão rodando nervosamente a aliança gémea que o seu próprio dedo acolhia, num gesto de inconsciente desejo. E ele recebê-la-ia, envolvendo-a nos seus braços – espantosamente frios, quase gelados, sedentos de calor. Só então ele abriria os olhos, disposto a acordar, quase como se só fosse capaz de o fazer assim, apertando o corpo da esposa contra o peito, sentido o seu perfume suave, escutando o bater acelerado do seu coração.

Ele não sabia que ela tinha encantado o relógio para poder acordar sempre antes de si. Tão-pouco estava ciente de que ela brincara com o tempo para poder reservar uma hora para o contemplar assim: indefeso, silencioso, nu de emoções e preocupações. O que ele sabia era que, ao abrir os olhos, distinguiria sempre castanho. Castanho brilhante de amor nos olhos, castanho rebelde de vida nos cabelos, castanho constante de paz na pele. Três tons de castanho, três etapas do acordar, três segundos de sentir sem pensar.

Aquela era a sua décima terceira hora de todos os dias.


N/a: Escrita surpreendentemente para o 57º Challenge Relâmpago do 6V. Eu, que nunca pensei voltar aos challenges, ainda para mais com RHr. Eu, que quase pensei abandonar o fandom. Seja como for, aí está 13. Já sabem, aprecio sempre saber as vossas opiniões (só não levem muito a mal se eu não tiver captado bem o espírito do ship).