Invocavi Maledictus Ventis (I Invoke Cursed Winds) I

-Se tornou o meu destino...

-Você é mentiroso! Está falando isso apenas por causa dessa ameaça estúpida, que não irá se concretizar!

-Saga, é a minha escolha. Assim se tornou quando Poseidon me deu uma nova chance de quando –

-... Foi preso! Chega! Eu não quero ouvir isso! Você apenas está tentando encobrir, justificando dessa forma!

-Já falei e não estou mentindo. Eu quero estar ao lado de Poseidon. Irei embora... Saga... Eu sinto muito.

Com o olhar perdido, o geminiano ficou a observar os cacos do copo quebrado se dispersarem pelo aposento. Sua reação era como se não estivesse tendo aquele momento, não se importava, nem um pouco, de que tinha um copo quebrado aos seus pés; mas, aos poucos, a consicência e seu olhar retornavam à realidade, e assim, passeava com os olhos pelo quarto, percebendo que aquele lugar se tornava negro, mais uma vez.

-... Kanon... Dessa vez você queria partir por conta própria, não é...? – Murmurava consigo próprio. Agora, fitando os vidros. Cerrou um dos punhos, ferido pelo copo que havia quebrado em sua mão. Estudava, mentalmente, as palavras proferidas pelo gêmeo, buscando o sentido. Sempre lia as entrelinhas dele, mas dessa vez, o real e a suposição eram a mesma coisa. Pareciam a mesma coisa.

O coração estava agitado, podia sentir claramente as pulsações. Seu interior estava intenso, e cogitou momentaneamente destruir o quarto e quem sabe até o próprio Templo. A partir de agora, não havia motivo para ficar.

Mas, sentou-se à beirada da cama e passou a mão não ferida em seu rosto, buscando paciência. Palavras haviam sido trocadas com tanto amor, porque agora, Kanon havia se tornado frio?

Em resposta ao próprio pensamento, sua mão buscou a garrafa de bebida que estava na beirada da mesinha ao lado da cama. Sorveu um longo gole, e ainda a segurou. Sentia-se cada vez mais ressentido em seu interior. Olhou para a bebida, notando que pouco faltava para esvaziar a garrafa, e o fez.

Pouco depois levantou mais uma vez e jogou a garrafa à porta do quarto, com raiva, também a estilhaçando. A tal altura, o machucado em sua mão já não mais lhe importava ou incomodava. Caminhou, pisando no vidro, e o som de sua armadura com os estilhaços provocavam um barulho distinto.

Saiu do quarto, ainda perdido. Não estava de folga ou férias, mas não possuía condições de sequer pensar, a não ser nas palavras do amado gêmeo. Olhou em volta, sentindo uma sutil sensação de que não estava sozinho, algo que sumiu repentinamente, da mesma forma que apareceu.

Buscou controlar o seu cosmo, o máximo que podia, não querendo evidenciar quaisquer reais sensações de como o seu coração estava naquele instante, assim, manteve-se apenas presencial.

Saiu de Gêmeos, e assim que o fez, decidiu que iria até o Monte das Estrelas. E ninguém iria lhe impedir, tanto que naquele instante, para si, nenhum lugar seria proibido.

Guiar-se até o destino não foi dificuldade. Conhecia o caminho melhor que qualquer outro ali no Santuário, e houve um guarda que tentou lhe impedir. E desfazer-se dele, não necessitou levantar o braço.

Em sua cabeça, não era o melhor lugar para meditar. Porém, necessitava de um conforto em seu coração, algo que lhe dissesse que Kanon lhe abandonou apenas por um motivo que pudessem reparar com o que sentiam um pelo outro e não por algo mais grave. No fundo, queria que a ameaça avisada aos Cavaleiros de Ouro fosse um erro de leitura de Shion. Perdoaria a idade do Grande Mestre.

Ou uma preocupação à toa de Aiolos.

Sentou ao trono que dava vista às estrelas. Ergueu a sua cabeça como o seu olhar. Gestos que não diferenciavam de quando era Grande Mestre, e ainda mais, naquele segundo, sentiu-se nostálgico, talvez em seu âmago sentiu falta do posto anterior.

Nessa sensação, riu. Sem que houvesse graça, mas riu de inconformação. Justamente esse sentimento amargo que o fez trazer o Inferno à Terra.

Encostando-se ao trono, sentiu os olhos encherem-se de lágrimas. Respirou fundo, porém, desabou naquele instante. Levou ambas as mãos ao rosto, completamente deixando-se chorar. Deixando-se ser frágil no gesto, talvez até fraco.

Seu sentimento base se tornou desespero. Não foi trocado por outro Cavaleiro, ou por uma mulher, mas Kanon escolheu retornar à vida que possuía, longe de si e por causa de si, o que conseguia ser ainda pior.

Se não tivesse o trancado, ele não seria um Marina. Ele não escolheria outra vida, distinta de sua presença. A repulsa de Kanon, que existiu naquela conversa pela manhã, não teria acontecido.

E Saga não estaria ali... Clamando alento às Estrelas em pranto, mas estaria sim, nos braços de Kanon.