Essa será uma fic muito densa, difícil de escrever e com diversos gatilhos de traumas às pessoas que já sofreram relações abusivas. A história é a primeira em que faço como uma denúncia e um retrato de relação entre um psicopata e uma co-dependente. Não é uma fic "shippável", ou seja, uma fic na qual você torce pro casal e o acha "bonitinho". Até mesmo Sauron e Melkor, que é um casal sombrio, difícil e complicado, no final acaba se acertando (nas minhas fics, que fique bem claro).

Essa fic será densa, com violência proposital, porém não é de forma alguma recomendável que uma pessoa aja assim em seu relacionamento. Explico: obras como "Cinquenta tons de cinza" parecem fazer aval àquela porcaria toda que chamam de relacionamento; fiz a fic praticamente como um "estudo de caso", assim como há filmes como "Vidas partidas" que relatam abusos mas não os endossam.

Tentarei falar um pouco sobre como é a dinâmica de uma relação abusiva, principalmente quando o co-dependente leva suas atitudes ao extremo e o abusador idem.

Também é uma crítica ao clero antigo e às suas ações - a fic se passa no século dezoito. Nesse tempo o clero era pura escrotidão, embora hoje em dia os católicos estejam mais tranquilos e os fanáticos costumem bandear mais pro lado dos evangélicos.

É uma fanfic de Xica da Silva (novela que passou na Manchete em 1996), porém poderia ser uma história atual. Há pessoas que sofrem com isso atualmente, mas a falta de leis e a religião antigamente faziam com que este comportamento ficasse ainda mais escondido e os agressores impunes.

Vamos então à história.

OoOoOoOoOoOoO

A MULHER DO INQUISIDOR

Capítulo 1

"Eu trocaria o Céu... por um beijo de amor"

Já havia se passado um ano. Um ano desde o fatídico dia no qual ela pensara que enfim realizaria a seus desejos. Os desejos pelos quais lutara tão ardorosamente.

Ela, Violante Cabral, mulher de descendência fidalga, religiosa, prendada. Abandonada por dois noivos. Uma dor imensa no coração por conta disso. Um coração amargo. Tragédias causadas a outrem por causa de sua condição.

Queria ser mulher honesta, porém sem precisar abdicar do amor. Parecia ser impossível! Todas se casando na frente dela. Até as prostitutas. Até as escravas forras. Até... os piores tipos de pecadores.

Até mesmo os sacerdotes tinham amores clandestinos e ela, sem querer perder a honra, não aceitava menos do que um casamento bem feito, com um fidalgo de nobre linhagem.

E de que adiantara? Os homens que amara a odiavam. Os homens que por ventura a desejaram fora apenas para relações ilícitas, as quais ela não desejava manter. Como... aquele frei. Aquele frei que ousadamente a beijara. Seu corpo todo tremera ante o toque de seus lábios, porém ele era sacerdote. Conhecia algumas que se sujeitariam com muito prazer a serem a concubina daquele que era não somente um frei, mas um inquisidor com grandes poderes e influência. Mas ela... nascera para esposa!

Nascera para esposa, e o frei deixara tão claro que não largaria o hábito por ela. Eram todos assim! Não a queriam para casamento, mas a desejavam para a cama.

Ela, mulher direita como poucas!

Quando enfim conseguira, através de inúmeros estratagemas, casar com o contratador João Fernandes, ele simplesmente a abandonara num castelo. Com luxo. Com toda a criadagem necessária. Mas nunca a beijara.

Oh, não! Sequer consumara a noite de núpcias - aquela noite para a qual sua mente se preparava desde o primeiro noivado. E no entanto, fora largada por seu primeiro noivo por uma meretriz!

O segundo noivo, o dito João Fernandes que a largara no castelo sozinha, a largara por uma escrava. E agora... não tinha ninguém!

Estava já há um ano naquele martírio. Era ainda jovem e não falava coisa com coisa. Seus cabelos já não penteava. As olheiras adornavam a seus olhos dantes altivos. As lágrimas já haviam secado, pois nos primeiros meses haviam sido muitas.

Arrependia-se de ter sido honesta! Pois era virgem ainda, e em breve já veria a casa dos trinta anos se aproximar. Queria conhecer o amor, porém o amor legítimo. E não conhecera! Seu marido a prendera naquela torre, obrigando-a a ser casta para o resto da vida. Não podia sair. Não podia ver pessoa alguma. Não podia sequer tentar arranjar outro marido, pois todo o seu dote, e sua herança e seus bens, foram passados a seu marido quando casara. E ele controlava tudo de longe.

Não podia fugir! Não podia se separar! Não podia coisa alguma, senão lamentar.

Até quando viveria aquela vida maldita?

Almejava já morrer, sem sequer rezar mais ou ter esperança.

Até aquele dia.

O criado entrou na sala, observou à fidalga de olhos feros e loucos, e anunciou a visita. Sabia que ela estava descomposta, porém o visitante era de tal monta que não podia esperar.

- Senhora dona Violante, na antesala a espera para lhe falar, o senhor inquisidor, frei Expedito.

O coração dela falhara por um segundo. Céus! Era ele! O que fazia ele em Portugal?

O único homem que dissera amá-la. O único homem que a beijara com paixão, mesmo que por breves instantes. Que fazia ele lá?

"Aproveite meus beijos, senhorinha. Pois um dia poderá sentir muita falta deles", dissera ele cerca de um ano e meio antes, quando ela partira para Portugal a fim de entrar em tal casamento falido e de pura fachada.

Ah, se soubesse na ocasião a falta que de fato fariam!

Estava descomposta, sozinha e sem uma aia para fazer jus à dama de companhia, digna a uma senhora de sua monta e nome. Mas no estado em que se encontravam as coisas, ela mal se preocupava com recato.

- Mande-o entrar.

Ela nunca tinha visitas. Seu marido não as permitia. Mas... como então o frei entrara? Afinal de contas... ele, o frei, era um inquisidor, e a inquisição tinha muitas vezes mais poderes que a própria realeza. Talvez a homens assim nada fosse vedado...

O lacaio mandou chamar o eclesiástico, ao que ele entrou. Era ainda o mesmo homem altivo, sinistro e circunspecto que Violante conhecera no Brasil. Ela o olhou de esguelha e o convidou para se sentar.

- Eu sinto muito, senhor, que não possa oferecer melhor aparência a uma visita como a si. A sala é soberba, os móveis idem. Mas eu... a cada dia decaio mais!

- Muito boas tardes, senhora dona Violante. De fato, está... sem energia alguma. Está muito mal. Porém, não decaída. Jamais uma senhora como a si decai, mesmo quando pega mais idade.

- Tenho sido comida por muitos desgostos, senhor. Desculpe se estou a falar de tonterias de mulher, mas...

- Vim porque soube de sua situação. E não, senhora, não são tonterias de mulher. A uma dama tão nobre, tão... bela... não se fazem dessas cousas. O crime que o senhor dom João Fernandes cometeu para consigo é imperdoável!

- Por falar em meu marido... como... como entrou aqui, se ele não me permite visitas?

O sacerdote sorriu de maneira sombria.

- Tenho meus amigos influentes, senhora. Cá na corte e em muitos outros lugares. Mas me diga... como tem suportado tamanho tormento?

Como nos tempos em que tramavam juntos contra as bruxas e demônios no arraial, o inquisidor estendeu sua mão para tocar o rosto da moça. E ela, dessa vez, não somente não se opôs a seu toque, como antes fazia por pudor; mas deixou-se tocar; e seu sofrimento e solidão eram tão grandes, que ela desatou a chorar imediatamente.

O sacerdote a abraçou contra si, ao que ela se abandonou ao aperto de seus braços. Há tanto tempo ninguém a tocava; não só um homem, mas também qualquer classe de pessoa que fosse. Nem parentes, nem amigos, ninguém. Então ela simplesmente o abraçou e ficou ali, a chorar toda aquela dor que não tivera a quem chorar.

- Minha senhora - declarou ele, após o pranto de Violante ter abrandado um pouco - Caso queira, pode me contar o que ocorre em caráter de confissão. Não temos aqui um confessionário adequado, mas... posso fechar a porta e ficaremos a sós.

Novamente, as convenções. Fechar a porta, mesmo diante de um sacerdote, era dar asas ao falatório dos criados. Mas ela, que por tantos anos dera tanto valor a estes pormenores, dessa vez não teve energia para negar. Apenas fez um gesto de mão, autorizando-o a selar a porta, e ele assim o fez.

Após tomar assento diante dela, Expedito a observou outra vez.

- Pode começar, senhora. Eu lhe sou todo ouvidos.

Ela respirou fundo algumas vezes, e em seguida começou a abrir seu coração - seu tão dolorido coração.

- Meu senhor. Se sabe do que o senhor João Fernandes me fez, sabe que ele mal contraiu matrimônio com a minha pessoa e partiu, me deixando aqui a sós. Ele... não passou a noite de núpcias comigo, não consumou o casamento... e sequer me deixou ir embora! Ele me mantém aqui literalmente em cárcere privado, e se um dia eu pensei amar a esse homem, hoje eu o odeio!

Ao ouvir as últimas palavras, o sacerdote sorriu. Como sonhara com aquele dia...! O dia em que Violante enfim odiaria a seu próprio rival. Aquele homem rico, belo, livre para casar-se e ter filhos caso assim quisesse. Coisa que ele, frei, jamais pudera fazer, pois fora colocado no seminário ainda muito cedo na vida, contra a sua vontade. Mesmo com todo aquele sangue quente e viril de homem a girar em suas veias.

- Finalmente está livre de sua prisão, minha senhora.

- Prisão?

- Sim. Ora, lembrai-vos de que eu vos disse que com a partida do contratador, a senhora se veria livre para amar a outro homem.

Nesta hora, as mãos do inquisidor tomaram as dela, e com tamanha pungência, que Violante sentiu todo o calor delas nas suas.

- Sim, eu não amo mais a João Fernandes. Mas não sou livre...! Veja, estou presa neste castelo! Ao menos segundo as convenções, ele ainda é meu marido. E eu serei condenada à eterna solidão aqui!

- Ele não consumou o casamento consigo.

- Sim, mas-

- O casamento não consumado dá direito à anulação, minha senhora. Tenho muito gosto em lhe dizer que sim, és uma mulher completamente livre dele.

Os olhos dela se arregalaram.

- Anulação?! Mas... como poderia eu abrir mão de um casamento pelo qual lutei por tantos anos?!

- Minha senhora... seu casamento jamais existiu. Não sentiu sequer o mais leve roçagar dos lábios de seu esposo nos seus próprios. Ou em seu colo, branco e macio como uma seda...

Os olhos do inquisidor brilharam de desejo por si, que mesmo uma mulher descomposta, era ainda muito bela. O frei continuou:

- Senhora dona Violante, teve menos carícias do seu marido do que de mim. Naquele dia... em que nos beijamos, não lembra?

- Sim, mas vossa mercê é um sacerdote. Eu não devo-

- Ter certeza de que ainda deseja se ater a este tipo de convenção, minha senhora?

- Convenção? Ora, trata-se de minha honra!

- Honra? Na sua idade?

- Também não sou nenhuma velha!

- Não sois velha, porém também não tão nova. A maioria dos homens buscam meninas com idade entre quinze e dezoito anos, no máximo, para contrair matrimônio. Com quantos anos conta, minha bela senhora?

Violante mirou o chão, tentando escapar do olhar intenso e, porque não, penetrante do sacerdote. Mas não retirou as suas mãos do meio das dele.

- Vinte e oito, senhor.

- Vinte e oito anos... e nunca conheceu homem? O único beijo de amor que provou foi de... um sacerdote? Nunca de um noivo? De um marido?

- Cheguei a beijar a João Fernandes quando éramos noivos, porém-

- Contra a vontade dele.

Ela corou, vexada. Como o senhor inquisidor sabia tanto sobre si? Quem contara estas coisas a ele?

O frei continuou:

- Minha senhora, eu admiro muito a vossa virtude. É bonito ser moça-donzela, principalmente na sua idade. É fácil ser pura aos quinze ou dezesseis anos, mas depois dos vinte... apenas as mais honestas das mulheres se conservam assim.

Violante apertou as mãos do sacerdote nas suas. Ousou olhar em seus olhos, e eles brilhavam por si.

- Porém, senhora... vossa mercê não tem vocação para o celibato. Em seu íntimo, desde muito jovem vossa mercê desejou ser tocada por um homem... não é?

- Isto não são modos de falar com uma mulher casada!

- Uma mulher casada e virgem. Sei. Senhora, eu tenho também algo a lhe confessar. Eu também não tenho vocação ao celibato. Fui enviado ao seminário contra a minha vontade. Sempre desejei mulher. E no começo dos tempos de estudo até que tive as minhas... "aventuras"... entende? Cousa de homem. Mas depois da ordenação, tive tamanho medo do inferno, que passei a apenas olhar. Apenas olhar...! E nunca mais conheci mulher. Em suma, estou há quase doze anos sem tocar a uma.

A moça corou. Por que ele estava lhe falando daqueles assuntos?

- Minha senhora, eu também sei, assim como vossa mercê, o que é o celibato forçado. O celibato desejando ter alguém. É terrível...! Por isso que eu tinha um gosto enorme em fazer mal a outrem... ainda o tenho, minha senhora. Reprimi de tal forma a meus sentimentos, que os transbordei em crueldade. Foi assim que me tornei inquisidor.

- Eu também passei pelo mesmo. Mas por outras razões... sempre fui mulher livre, por que nunca fui amada por um homem?

- Vossa mercê foi, e ainda o é. Eu não deixei de a amar, senhora dona Violante.

- Mas...

- Sabe como foi difícil deixá-la sair do Brasil para vir acá se casar com aquele biltre, a quem eu sempre odiei?

- Senhor, eu...

- Sabe o que eu sentia quando ia me deitar, solitário, e pensava em si nos braços dele?

Ela permaneceu calada, mas em seu íntimo sabia bem como era aquilo. Quando, no passado, tinha de se deitar - também solitária - a imaginar João Fernandes se deitando com Xica e com todas as demais mulheres das quais ele nunca abriu mão - e ela ainda sozinha, ainda virgem.

- Não sabia que me amava tanto assim.

- Eu a amei de tal forma, que quando tomei ciência do que seu marido fizera a si, não deixei de sentir um laivo de esperança. Não sabe como fiquei feliz quando soube que estava ainda moça... ainda intocada...

As mãos do eclesiástico apertaram as de Violante com tanto ardor, que ela fechou os olhos. Mas voltou a abri-los, pois ele continuou a falar:

- Minha senhora, eu não pude mais deixar as cousas como estavam. Eu tive de agir.

- Q-que quer dizer?

O sacerdote sorriu misteriosamente outra vez.

- Quando soube como estava, escrevi a seu marido.

- Escreveu?!

- Sim. Disse a ele que esse tipo de comportamento não se toma com uma senhora como a si. Que desse a si a anulação do casamento. Ele negou, senhora. Negou, pois temia que vossa mercê saísse do castelo, livre após a mesma, e pudesse voltar a atormentá-lo. Ele disse que não queria vê-la de forma alguma!

Violante abaixou as pestanas, ferida por dentro. Teve de fazer força para conter as lágrimas.

- Apenas consegui a anulação de seu matrimônio ao prometer algo em troca a João Fernandes...

- Já... deliberaram tanto sobre a minha pessoa, sem sequer me consultar?

- Vossa mercê é nobre, é bela, é altiva, voluntariosa, mas é mulher. Deixe que os homens decidam por si, senhora. Pois bem. Eu prometi a ele que cuidaria de si e a deixaria ocupada.

- N-não entendo.

O frei a observou, como que penetrando-a com os olhos.

- Sei que vossa mercê nunca foi tocada por um homem, mas não é inocente. Eu a tomarei por conta, minha senhora.

- Tomar-me por conta?! Meu senhor, eu sou uma fidalga!

- Fidalga ou não fidalga, seu marido aceitou que eu entrasse com o processo da anulação, desde que garantisse que vossa mercê nunca mais falasse com ele, ou sequer escrevesse a ele por carta. Portanto, a partir de amanhã, não mais terá direito a viver neste castelo. João Fernandes será como se nunca houvesse sido seu marido.

- Por isso... disse que eu estou livre? Já sabia de tudo?

- Cuidei de todo o processo; tendo posto importante no clero como tenho, a anulação saiu bastante depressa.

- Então eu vou depender da caridade de... vossa mercê?

- Não. Será a governanta de minha casa. Eu sou um homem muito ocupado; fico fora por muitas horas e não tenho como cuidar dos criados como se deve. A senhora certamente desempenhará bem esse papel.

- Ora, pensando assim até que não é tão mal. Serei livre novamente - livre para encontrar outro marido. Sim, outro, pois não desejo nunca mais olhar para João Fernandes. Ainda tenho a um vultuoso dote que meu pai me deixou, embora já esteja passada da idade de casar. Nem que seja com um viúvo mais velho. Por falar nisso, quando ele me devolverá meu dote?

O inquisidor sorriu outra vez. Seu sorriso tinha garras, nas quais Violante leu o que ele queria dizer antes que ele proferisse palavra.

- Minha bela senhora, acha mesmo que eu deixaria a vossa mercê casar com outro homem, amando-a como a amo?

- Mas... não pode se casar comigo! É um eclesiástico, e uma vez me disse que jamais largaria o hábito por mim! Ou será que mudou de ideia?

- Não. Não largaria a meu ofício por nada neste mundo.

- Então...

- Não entendeu o que eu disse, quando proferi que a tomaria por conta?

O coração de Violante bateu depressa. Céus, não seria possível que ele-

- Minha senhora, eu estou cansado de meu celibato. Vossa mercê certamente também está exausta do seu...

As mãos brancas, fortes e bem tratadas do inquisidor passaram pelo rosto da fidalga, a qual estremeceu com o seu toque.

- Meu senhor, eu não posso ser uma concubina!

- Não será uma concubina e sim minha governanta...

- Mas eu não posso... não posso perder a minha honra consigo!

- Senhora, eu declarei na carta, em termos bastante claros ao senhor João Fernandes, que desejava obter para mim a sua noite de núpcias... a qual ele rejeitara.

A moça teve um sobressalto tão grande, que retirou as suas mãos do meio das do sacerdote.

- Como ousa?! Sou uma mulher direita!

- Por isso mesmo. As mulheres por aí, ou estão muito sujas ou são muito novas. Até as casadas, de quem se diz honestidade, traem a seus esposos com tudo que usa calças - e com alguns que usam sotainas também, que eu que ando sempre nesse meio sei bem como é. As únicas assim, castas, são as meninas muito novas... ainda solteiras, as quais não se pode deflorar ou tomar por conta sem grande alarde. A senhora é a única mulher mais velha que conheço... uma mulher já adulta, formada, mas ainda não sendo velha... que é casta, bela, limpa... e representa tudo que eu sempre quis numa mulher.

Os olhos dele soltaram fagulhas tão intensas, que Violante teve ganas de sair correndo. Mas antes que o fizesse, ele a tomou nos braços e a beijou tão longamente, que ela de pronto desistiu da ideia de fugir.

Gemeu dentro do beijo, as faces ficando afogueadas de prazer. Há quanto tempo esperava um beijo assim. Nunca o tivera de seus noivos; somente o tivera dele próprio, o frei, pouco antes de embarcar para casar... porém, fora apenas naquela ocasião.

Neste ano e meio, quanto mudara. A solidão, a loucura, afrouxaram as amarras de sua rigidez moral dantes tão arraigadas em si. Agora, se abandonava ao beijo sem remorsos. Poderia ser a sua última esperança de ser beijada daquela forma...!

Após o beijo, com os lábios avermelhados e a respiração ofegante, ambos se entreolharam cheios de desejo. Sim, ela também desejava ardentemente ao sacerdote, o qual era ainda um homem na força dos anos, com cerca de trinta e três anos de idade, uma aparência altiva e intensa, da qual ela se agradava imenso.

Mas ainda havia aquele medo de se perder após tantos anos se guardando...!

- Meu senhor, não me disse o que foi feito de meu dote.

- O senhor João Fernandes o passou para minha pessoa, já que agora vossa mercê é responsabilidade minha.

- Mas...! Eu sou maior de idade! Deveria ter sido passado a mim!

- Não, minha senhora. Ele somente aceitou anular o casamento se eu a impedisse de vê-lo ou contatá-lo. E para isso seria necessário retirar todo o poder de vossa mercê e passá-lo a alguém que se encarregasse de mantê-la afastada dele.

- Como... como ele fez isso?

- Através de letras de câmbio.

Os olhos dela ainda traíam medo.

- Que vai fazer então?

- Ora, o que. O senhor João Fernandes recentemente enviou mensagens aos criados encarregados de si e deixou bem claro que eu a possuiria aqui dentro. Que não era para incomodar, por mais que vossa mercê gritasse, chamasse ou implorasse. E quando eu entrei aqui dentro, tranquei a porta e retirei a chave da fechadura sem que vossa mercê percebesse. Está em meu poder, senhora dona Violante.

O desejo e o sadismo nos olhos do inquisidor eram tão fortes, que Violante virou o rosto para o outro lado.

- Vai me forçar?!

- Não.

- C-como não, se os criados inclusive estão avisados para-

- Eu poderia fazê-lo. Mas não quero.

- Por que?

- Porque a amo em demasia para tal. Por mais que minha carne implore por si, por mais que meu corpo queira ter ao seu debaixo do meu a qualquer custo, o amor não me permite fazer isso consigo. Eu tive mulheres antes de me ordenar, e nunca precisei forçar a nenhuma. Já fiz muitas coisas duras e cruéis nos autos de fé, é verdade, mas ali é trabalho. Fora dali, as cousas são diferentes. Minha senhora, nos interrogatórios eu gosto de ouvir os acusados implorando por clemência; para que eu pare. E na cama, quero que a mulher que estiver comigo me implore para que eu não pare... para que eu a possua cada vez mais... para que ela não deseje que eu saia de dentro de si nunca mais!

Violante nunca havia escutado linguagem tão vulgar, nem tão direta em relação ao sexo, principalmente vinda de um sacerdote. Mas antes que ficasse ainda mais surpresa, o inquisidor a tomou para mais um longo beijo, no qual ela se sentiu ficar úmida no meio das pernas. Ela não sabia o que era aquilo, mas entendia que aparecia quando tinha desejo por um homem. E era exatamente o que ela estava sentindo naquele momento.

As mãos do eclesiástico foram para a sua cintura e depois... para a abertura central de seu vestido, a qual tinha alguns colchetes que ele rapidamente desfez. Antes que Violante pudesse protestar, ele parou de beijá-la e sussurrou em seu ouvido:

- É meu direito saber se vossa mercê ainda é mesmo moça-donzela.

- Como ousa duvidar de mim?!

- O tolo de seu marido nunca se importou mesmo se seria violada ou não neste castelo. Tanto foi assim, que a deixou aqui com todos estes criados homens! Pois bem... preciso saber se ainda o é.

- Não acredita em minhas palavras?

- Não quero só ouvir tal fato de sua boca... mas senti-lo com meu corpo.

Sendo assim, ele colocou a mão na abertura que fizera pouco antes no vestido dela e em seguida a desceu... desceu, desceu, até chegar ao meio das pernas de Violante.

A fidalga fechou os olhos e gemeu. Sabia que não adiantaria dizer "não"; mas algo dentro de si a impedia de lutar, ou mesmo de negar, mesmo que assim pudesse fazê-lo. Embora ainda temesse a perda da honra, queria e até mesmo ansiava ser possuída por ele. Se até mesmo João Fernandes consentira com aquilo!

Enquanto lutava contra seus próprios pensamentos, a mão do inquisidor abaixou o elástico da roupa de baixo dela e enfim chegou a seus pelos pubianos... para logo depois tocar-lhe todo o órgão sexual.

O frei fechou os olhos, suspirando de desejo e prazer.

- Ah, é como eu imaginava...! É tão úmida, nunca pensei que uma mulher pudesse ficar assim tão úmida por um homem...!

A moça fechou os olhos, as faces coradas. Ele a beijou nos lábios outra vez e em seguida sussurrou a si:

- Vossa mercê também me deseja, não é verdade?

Numa voz estrangulada, ela respondeu:

- Sim...

Após ouvir tal monossílabo tão curto porém tão cheio de sentimento, introduziu seu dedo indicador dentro dela. O dedo deslizou fácil, tão lubrificada ela estava.

- Oh, é moça, sim...! É moça, meu dedo mal entra... tenho certeza de que se não me desejasse desta forma e não estivesse tão escorregadia, talvez nem conseguisse entrar!

Violante suspirou de êxtase, pois logo em seguida o dedo polegar da mesma mão do sacerdote a massageou no clitóris, arrancando dela alguns gemidos quase involuntários.

- Ah... senhor... ah!

Maravilhado, o eclesiástico beijou-a e chupou-a no pescoço, finalmente aproveitando aquela pele de seda que ele sempre quisera possuir e do que sempre se refreara tanto. Ela não gritou, não disse "não", não tentou retirar sua mão ou mesmo lutar. Apenas o apertou com força em seus braços, de repente querendo que ele - como o frei mesmo dissera momentos antes - não parasse nunca, não saísse de dentro de si jamais.

Sabia que aquilo era mais do que o simples exame para saber se ela era ainda moça ou não; pois dava tanto prazer, que ela sabia que era já um ato lúbrico, um ato que precedia ao sexo de fato e servia para despertar os sentidos... pois era esse o efeito que fazia em si.

Com medo de pecar, Violante antes não se masturbara nunca; apenas se deixava levar pelos sonhos lúbricos, os quais pensava serem pecado por si só, Mas após aquele período sozinha, pensou que o beijo de amor o qual tanto pedira enfim chegara. Ela devia enfim aproveitar.

Do pescoço e do colo, a boca do inquisidor foi novamente para os lábios entreabertos de Violante. Ela gemeu várias vezes dentro do beijo, enquanto sentia aquele prazer crescer dentro de si, irradiando-se para todo seu corpo.

Quando ele a parou de beijar e o prazer chegava a um patamar já adiantado e mais intenso, retirou também o dedo de dentro de si e parou de estimulá-la. Os olhos de Violante traíram a vontade que ela tinha de que ele continuasse... até o final.

O inquisidor não lhe deu tempo de pensar ou de querer qualquer outra coisa: rapidamente, com ambas as mãos, a virou de bruços sobre a mesa e levantou a sua saia até a altura de seus quadris. Logo a seguir, abaixou as suas calçolas e mirou com volúpia seu traseiro nu.

- Assim que eu gosto...! Este é outro motivo de eu apreciar mais a mulheres já passadas dos vinte anos... pois as mais novas não tem ainda tão desenvolvida e protuberante essa anca de animal do campo!

Sem mais resistir, o sacerdote aplicou um tapa na nádega dela e a ouviu gritar de surpresa.

Estava ainda envergonhada, pois tudo acontecera tão rapidamente e ela não tivera sequer tempo de processar em sua mente o que ocorria. Mas logo sentiu o arfar intenso da respiração cheia de desejo dele, logo em seu pescoço. Ele se dobrava sobre si, preparando-se para cobri-la como se fosse um touro a possuir uma vaca no cio.

Por alguns instantes, Violante sentiu que ele suspendia a batina, a fim de... deixar a seu membro enfim livre para possui-la afinal.

Teve medo. Pois foram tantos anos evitando que aquilo acontecesse, que por mais que tivesse vontade, ainda tinha receio. Era o hábito.

O frei respirou fundo e disse afinal:

- Senhora dona Violante, eu disse que jamais forcei a uma mulher e não será desta vez que virei a forçar. Ainda está em tempo, portanto, de desistir. Pode ir ainda moça para minha casa e lá, depois, verei se a tomarei ou não. O que me diz?

A fidalga fechou os olhos. Ele lhe dava, então, a liberdade de rejeitar? Porém, ela estava esperando há tanto tempo, e seu desejo fora despertado de tal forma quando ele a tocara daquela forma há pouco, que ela decidiu ir adiante.

- Não. Eu quero agora.

O sacerdote sorriu de surpresa e de prazer.

- Quer mesmo?

- Quero. De nada serviu me guardar a um casamento fidalgo, se fui tratada pior que a uma mulher reles. Se o céu me nega o amor, que o inferno o dê a mim!

De súbito, ele tomou da trança que Violante usava no cabelo, e com tamanha firmeza, que Violante gemeu ante a dor inesperada.

- Não fale de inferno diante de um homem santo como eu!

- Está bem, que seja. Que não seja o inferno, porém... algum outro caminho mais tortuoso e inesperado, que me dê o amor.

O bafejo tépido da respiração dele roçou na nuca da senhora, ao passo em que ele continuava a empunhar a sua trança nas mãos.

- Fez muito bem, minha senhora. É bom que vá por bem. Pois eu não sei se me seguraria por muito tempo ao tê-la em minha casa sem tocá-la. De qualquer forma... depois não poderá dizer que a forcei.

E após dizer isto, de uma só vez, arrancou a trança dela de sua cabeça, fazendo com que os grampos se soltassem imediatamente, e de uma única vez a penetrou até o fim, rompendo assim os véus de sua pureza.

O ato fora tão repentino e brusco, que Violante gritou. Aquilo a atravessava como uma faca; ela nunca sentira tamanha dor física em sua vida, embora das emocionais já estivesse bastante familiarizada.

Já o inquisidor fechou os olhos de deleite, se segurando para não atingir o ápice muito depressa ante aquela cavidade tão apertada e úmida.

- Ah, senhora Violante...! Como isso é bom! É realmente necessário ser um homem de muito autocontrole para não terminar tudo muito rápido! Vossa mercê não merece isso, e sim um homem que lhe faça as devidas honras do leito em sua primeira vez.

Esperando mais um pouco a fim de não se exceder, o frei sentiu a moça inquieta debaixo de si. Ela estava sentindo dor, e pensando que de fato não perdera muito ao ficar virgem por tanto tempo, se era ruim daquele jeito. Mas o que não entendia era que antes ela sentira prazer com as carícias dele. E de repente se deu conta de que nenhum criado viera em sua defesa, mesmo ante seu grito de dor. Se ela estivesse sendo de fato forçada, ninguém a defenderia.

- Resigne-se à dor, minha senhora... ela purifica! - disse ele, sussurrando em seu ouvido.

Antes de conseguir compreender a tudo que a incomodava, sentiu o inquisidor sair de dentro de si e voltar a entrar, primeiro uma, depois duas e enfim várias vezes. Ouviu-o gemer de prazer e suas mãos, que não largavam de suas tranças, as agarraram com tanta força que com o tempo as desfizeram completamente, deixando a seus longos cabelos castanho-claros totalmente livres e desgrenhados, caindo desordenados por suas costas enquanto ele a empurrava cada vez com mais força contra a mesa que lhes servia de apoio ante tal ato.

Ainda não satisfeito com este ímpeto, não resistiu e parecia disposto a destruir ainda mais. Sem parar de penetrá-la, segurou firme a parte superior do vestido da fidalga e, fazendo com que vários colchetes se abrissem e saltassem já quebrados, expôs os seios dela enfim.

Suas mãos não tardaram em empolgá-los, segurando-os enquanto beijava e mordia os ombros e o pescoço de Violante. A penetração causava dor a ela, porém o peso do corpo dele, a sua respiração entrecortada de gemidos, o desejo que ele demonstrava ao tomar a seus seios... tudo isso a excitava grandemente. Percebendo isso, o frei aproveitou que os colchetes que ele abrira para ter contato com a genitália dela ainda estavam abertos, e portanto deslizou sua mão por lá outra vez, entrando em contato com ela e voltando a masturbá-la, arrancando assim um gemido de prazer dela.

De repente, Violante voltou a sentir prazer e associou tal sensação a como ele o tocava. Tal sensação crescia, e ela quase por reflexo passou a se mover contra os dedos dele que a estimulavam tão habilmente.

O peso do corpo dele sobre o seu lhe esquentou, fazendo com que ambos suassem dentro de suas roupas. A moça segurou com força a mão dele que ainda estava sobre seu seio, e ele o apertou ainda mais firmemente.

- Ah...!

- Implore por mim...! Nada me dá mais prazer, senhora...!

Ela se contraiu de excitação em torno dele, uma ânsia de sentir ainda mais deleite a tomando por completo. A penetração àquele momento estava mais fácil, pois ela estava excitada e lubrificada, bem como talvez houvesse algum sangue que saíra de sua defloração... mas isto fazia com que o membro do inquisidor deslizasse agora facilmente para dentro e para fora de si.

- Implore por mim, senhora!

- Ah... me possua...!

- Vamos, continue!

- Me possua! Uhn...! Meta... meta em mim!

Ele chupou seu pescoço com intensidade, deixando nela nódoas roxas.

- Implore de novo!

- Mais...! Mais! Faça mais em mim!

O inquisidor sorriu. Sempre conseguia fazer com que implorassem, fosse para que parasse de torturar, fosse para que continuasse a dar prazer. Pena que nos últimos anos ele se privara das mulheres.

Violante fechou os olhos, maravilhada. Se antes sentira uma grande dor, então sentia um êxtase tão indescritível que jamais sentira antes. Então compreendeu porque só falavam daquilo. Porque só pensavam em fazer aquilo.

Chegou em um patamar em que não conseguia mais sequer verbalizar seu gozo. Somente conseguia gemer, pensando se ia aguentar todo aquele tesão afogueado e onde tudo aquilo ia parar.

Mordeu os lábios e apertou os olhos, socando a mesa. De repente, tudo ficou tão intenso, que parecia que ia explodir. Gritou, apertando a mão do frei que ainda se encontrava em seu seio, e sentiu sua cavidade se contrair várias vezes no membro dele.

O eclesiástico sorriu. Ela atingira o ápice afinal. Ele fizera as honras do leito.

Após isso, um cansaço, uma lassidão tomou conta de Violante e ela tombou sobre a mesa. Mas o frei ainda não terminara. Retirou a mão de sua vagina e depois colocou no outro seio, apertando a ambos com força, deixando neles marcas. Enfim atingiu ao clímax, gozando dentro dela, fazendo com que a moça sentisse pela primeira vez o que era ser preenchida pela semente de um homem.

Respiraram ambos em grandes haustos, tentando se recuperar do esforço despendido no ato. Violante ainda não reagira, inclinada sobre a mesa sem saber direito como se portar ou mesmo pensar. Já o frei, de espírito mais frio e prático, após acalmar os batimentos cardíacos e a respiração, retirou-se enfim de dentro dela, abaixou a sua sotaina e também a saia dela. Em seguida, foi até uma jarra e uma bacia com água e sabão que havia no quarto, lavou as mãos, secou-as com a toalha que havia também, voltou a ficar junto de Violante - que continuava prostrada sobre a mesa, ainda sem saber como agir - retirou de um dos bolsos de seu hábito um anel de ouro cravejado de brilhantes e jogou-o sobre a mesa, ao lado da moça.

Finalmente ela reagiu.

- O que... o que é isso?

- É um regalo, minha senhora.

- R-regalo? Mas por que?

- Já deve ter ouvido dizer, minha senhora - dizia ele num tom de voz calmo, como se nada houvesse acontecido entre eles há pouco - que nos tempos antigos os homens presenteavam às mulheres as quais houvessem por ventura perdido a virgindade para eles. Como uma compensação. Este é o meu para si.

- Um... presente? Mas... nestes casos o presente era simples! Uma touca para os cabelos, um cinto, até mesmo um vaso de plantas! Um anel desta monta...?

O homem sorriu.

- Isto é para que a senhora veja o quanto eu dou valor à sua pureza agora perdida.

- Perdida...

Finalmente aquela palavra despertara em si o sangue, que parecia amortecido até então desde o orgasmo.

- Perdida! Sim, é o que sou - uma perdida! Oh, senhor inquisidor, eu o odeio!

De uma vez, Violante se levantou de sua prostração e passou a socar o sacerdote - nos ombros, nos braços, no peito. Só não o fez no rosto porque ele segurou seus punhos a tempo.

- Acalme-se - disse ele, sem uma nota de emoção na voz.

- Acalmar-me?! Acalmar-me?! A única coisa que me sobrava era a honra, senhor! E agora não tenho mais nada!

Então desatou a chorar. Sentou na cadeira, de frente para ele, os cabelos revoltos, metade do vestido destruído pelo ímpeto do inquisidor.

Ele pacientemente a esperou chorar mais baixo para enfim replicar:

- Não, minha senhora. Pode ter me entregado a sua pureza - que de mais a mais não foi entregue forçada, como bem fiz questão de fazer - mas a sua honra permanecerá intacta. Eu pessoalmente cuidarei de que tenha a melhor reputação possível.

- Mas eu... eu me entreguei a um homem que não é meu marido!

O frei foi até ela e a acariciou suavemente no rosto.

- Senhora dona Violante... a partir de agora tenho um vínculo mais forte consigo que um marido tem com sua esposa. A partir de amanhã, vossa mercê será minha propriedade! Só minha! E eu a ensinarei, através da disciplina e da ordem, a me amar. Um dia me agradecerá por eu tê-la tirado de um casamento falido e tê-la colocado numa situação muito mais digna.

- Eu serei... sua concubina!

- Jamais. Sois muito mais do que uma concubina, e eu deixarei claro a si que nossa convivência de concubinato não será. Minha senhora, serás mais ainda do que uma esposa. Acredite nisto. Um dia aprenderá que a virtude não se perde nos braços de um sacerdote do Senhor.

Tendo dito isto, Expedito tomou o rosto de Violante com as mãos e a beijou ternamente - já que o desejo havia sido aplacado, o beijo rescendera mais a ternura que a outra coisa.

- Agora vá se banhar e se compor. Amanhã volto para buscá-la em definitivo.

- Vai... me deixar?

- Sim, por hoje sim.

- Oh, não... não!

Desesperada, Violante se jogou ao chão, primeiro agarrando as mãos do homem e depois a barra da batina. A loucura despontava em sua mente outra vez. Fora abandonada tantas vezes, que pensava ser aquela separação temporária uma definitiva, como todas as outras que sofrera.

- Minha senhora, acalme os nervos. Já disse que a buscarei amanhã.

- Vai me abandonar, como todos fizeram!

- O que a faz crer que assim será?

- Foi só o que aconteceu em toda a minha vida!

As lágrimas brotavam dos olhos da fidalga, mas o inquisidor não se comoveu nem um pouco.

- Senhora - proferiu ele, na voz mais calma que um ser humano poderia proferir - Se pensa que vou abandoná-la em definitivo, raciocine: eu jamais contataria a seu marido e faria a toda uma anulação de casamento somente para ter um único... dia... consigo. Assim como também há as cartas que o senhor dom João Fernandes ainda tem em seu poder, bem como as provas de que seu dote foi enviado à minha pessoa. Tais provas seriam o suficiente para que ele acabasse com minha carreira eclesiástica; seria suficiente somente a senhora escrever a ele e dizer que eu não cumpri com minha palavra. Estou, senhora, em vossas mãos portanto.

Violante respirou fundo. Nunca pensara que um homem arriscaria mesmo sua vida e suas atividades dessa forma somente para tê-la. Aquilo a comoveu de tal forma, que seu coração acelerou.

- De qualquer forma - concluiu o sacerdote- acima de meu sacerdócio ou mesmo da responsabilidade que me foi delegada, sou um homem de palavra. Quando prometo algo, eu cumpro. Pode ficar sossegada.

Ainda descomposta, a moça levantou do chão e olhou nos olhos do inquisidor.

- Posso... acompanhá-lo até a porta ao menos?

- Infelizmente não. Veja como a parte de cima de seu vestido está totalmente destruída...

- Ah, é verdade - e por instinto ela cobriu os seios com as mãos, mesmo que já houvesse feito com ele muito mais do que simplesmente mostrá-los.

- Amanhã, às duas da tarde, me espere, perfeitamente composta e com toda a sua bagagem à mão. Eu trarei diligência suficiente para levar a si e a seus pertences.

Tendo dito isto, o frei se inclinou sobre Violante e a beijou demoradamente, uma última vez antes de partir. Tal carícia comoveu e acalmou a moça, a qual pôde assistir com um pouco mais de tranquilidade o sacerdote destrancar a porta, deixar novamente a chave na fechadura, sair e encostá-la para ninguém ver a fidalga semi-desnuda.

To be continued

OoOoOoOoOoOoO

Nota da autora: foi quase um parto, emocionalmente falando, pra sair esse primeiro capítulo. E olha que o "balacobaco" ainda nem começou.

Parece bonitinho, né? Ele chega para salvá-la do casamento falido, vai lá e dá pra ela EXATAMENTE o que ela estava esperando: elogios (embora haja muitas críticas veladas, reparem bem, do tipo: falando que ela já passou da idade de casar), carinho, ouve seus problemas (psicopatas e narcisistas em geral ouvem muito às pessoas; primeiro para saber melhor do que as vítimas precisam, e depois para fingir que se importam. Muitos pegam as informações confidenciadas e jogam contra a vítima algum tempo depois) e enfim, sexo gostoso e de qualidade.

Reparem que assim como em "Vidas partidas" (para quem assistiu - para quem não assistiu é um filme muito bom) o cara é bonitão, é bom de cama, mas também é só isso. O resto da relação é lixo.

Reparem também que ele faz um pseudo-terror psicológico dizendo que poderia estuprá-la se quisesse, então ela se sente acuada. Seu consentimento também é dúbio: ela está nas mãos dele, ela não pode fugir e ao mesmo tempo está tão carente, por ter tido a um marido relapso, que acaba cedendo quase por uma questão de "sobrevivência psíquica". Ela gosta do sexo, mas não se surpreendam: psicopatas usualmente utilizam o sexo e o carinho como uma "droga", para a pessoa se viciar e quando o "rojão" vier - e nessa fic ele vai vir - a pessoa lembrar dos bons momentos e não ir embora.

Pra quem assistiu a novela: Violante era a antagonista, megera clássica, mas na verdade ela apresenta traços de co-dependente total. Não larga o osso de forma alguma e o cara que ela pensa amar na verdade a despreza. Some-se isso ao fato de que ela vinha de uma família cujo pai era abusivo com a madrasta - foi isso que ela aprendeu sobre relacionamentos na vida.

Some-se também que ela era uma mulher "solteirona" no século XVIII, onde não havia muitos outros papéis à mulher além de casar e ter filhos.

Já a Xica e o contratador, acho um casalzinho chatinho, sem profundidade alguma. O amor deles se baseia em obsessão e "amor de pica/xana", mas nada mais profundo.

Já quando chegou aquele inquisidor e sentiu o cheiro de co-dependência da Violante, a despeito de ela querer parecer forte - fodeu. Começou a perseguir a mulher de tudo que era jeito - além de ser tarado pra porra, só pensava nos peitos e nas bundas de todas as mulheres na novela.

Apesar de dizer que a amava, deixou claro que jamais deixaria de ser clérigo para ficar com ela. Típico comportamento de pessoas abusivas.

No próximo capítulo, tentarei explicar um pouco como funciona esse lance dele ser frei e ter casa pra ela morar. Até onde eu saiba, freis vivem em mosteiros, mas ele vai dar um jeito - sempre se dá, né?

Abraços e obrigada por lerem!