Capítulo I
Derbyshire, Meados do século XIX, Era Vitoriana.
-Acredito que esta cor combine mais com você Bella! – Disse a garota enquanto mostrava um delicado recorte de seda verde para a amiga – Ressaltará a cor de sua pele...
-Pois eu duvido muito que algo fique bem neste cabalo de fogo! – Responde uma terceira garota de belos olhos azuis e que penteava de forma delicada seus sedosos cachos loiros – Mamãe e eu até hoje tentamos entender por que Bella nascera assim!
-Não seja tão rude Rosalie! Bella é sua irmã mais nova e você deveria ser mais gentil com ela!
-Tudo bem Alice... Já nem ouço mais os disparates de Rose! – Afirmou Bella tentando apaziguar a discussão.
Mesmo tendo apenas doze anos, ela sabia que jamais seria uma beldade como sua irmã, que tivera a sorte de herdar a beleza da mãe, Lady René Swan. Quem dera que ela tivesse cabelos loiros como os de Rose ou ate mesmo negros como os de Alice. Mas não! Ao invés disto, ela nascera com as enfadonhas madeixas castanhas que teimavam a ficar avermelhadas no sol, deixando claro sua ascensão escocesa.
-Eu jamais falo disparates! – disse Rose enquanto se levantava da penteadeira e parava de fitar seu próprio reflexo no espelho para encarar a irmã mais nova – Todos sabem que Bella não é lá essas coisas. Mamãe sempre diz isso, mas ela tem esperança de que o tempo faça milagres! – Ótimo, aquilo era demais para qualquer dama por mais preparada que fosse! Bella não suportaria ouvir se quer mais um absurdo de Rose.
-Que seja... – Disse ela levantando-se da cadeira e caminhando em direção a porta – Tomarei a liberdade de pegar um livro na biblioteca. Tudo bem pra você Alice?
-Claro, fique a vontade. Já lhe disse que pode ficar a vontade enquanto estiver em minha casa! – Com um terno sorriso, Bella saiu do quarto e agradeceu aos deuses por ter conseguido ficar um pouco sozinha.
Ela adorava a casa de Alice, pois a mansão Cullen era uma das mais antigas construções de Masen Park, além de ter os jardins mais esplendorosos da região. Em toda sua curta vida, gostaria de morar em uma casa como aquela, em algum lugar remoto e longe de toda a corrupção Londrina! Afinal, assim como seu pai, Bella admirava a tranquilidade dos campos de Darbyshire, diferente de mãe e de Rosalie, que viviam se queixando por não irem mais vezes a corte.
Ela teve de cruzar toda a ala leste ate finalmente chegar à biblioteca que era uma das mais completas da região, pois o Conde Carlisle Cullen, pai de Alice, era certamente um dos homens mais instruídos que ela já conhecera.
Bella sabia que deveria ler um dos romances que ficavam na prateleira reservada as damas, mas ela não estava com paciência para mais uma historia tórrida cheia de água com açúcar. Então, sorrateiramente, ela se dirigiu as estantes repletas de exemplares mais concisos e maduros que certamente falavam sobre filosofia e história da Grécia antiga. Adorava aquelas temáticas!
-Esta perdida senhorita Swan? – Indagou uma voz austera e firme atrás dela. Com o susto, Bella se virou repentinamente e deixou cair o exemplar de "O príncipe" que tinha em mãos. – Até onde eu saiba, a estante de livros para moças faca próxima a janela!
-Desculpe-me senhor. – Ela fez uma delicada reverencia ao notar que falava com o irmão mais velho de Alice, lorde Edward Cullen – Se soubesse que estava aqui, não teria vindo incomodar...
-Não se preocupe, não me incomoda em nada. Mas não respondeu a minha pergunta. – Ela sabia que podia mentir e dizer que se confundira de estante, mas não queria parecer tola.
-Estava procurando algo mais concreto para passar o tempo milorde. A mim não agradam os romances tórridos. – Ele estreitou os belos olhos verdes em sinal de admiração, e aquele singelo ato fez seu coração disparar.
Bella sempre achou o irmão de Alice um dos homens mais lindos que já vira, se bem que não foram muitos. Mesmo tendo pouco mais que vinte anos, seus ombros eram largos e imponentes, e os cabelos cor de bronze que lhe emolduravam o rosto lhe davam um ar mais serio, que era quebrado pela postura que assumia enquanto se reclinava na cadeira em que estava sentado.
-Não me pareça que Maquiavel seja leitura adequada para uma dama!
-Sei disto milorde, mas não posso evitar. Alem do mais, garanto-lhe que tenho permissão de meu pai para ler este tipo de livro.
-Lorde Charles me parece um homem bastante instruído, mas me surpreende que ele deixe sua filha mais nova dispor de padrões literários reservados à cavalheiros!
-Pois acho que tais restrições são em demasiado sexistas! – Disse ela indignada por ele estar menosprezando sua capacidade cognitiva.
-De forma alguma era minha intenção subestimar seu gênero minha cara. Só me surpreende que uma dama tão jovem como a senhorita tenha entendimento suficiente para compreender ideias tão revolucionarias.
-Pois pode ter certeza de que sou altamente capaz de compreender qualquer tipo de texto estando ele em latim ou francês! Na verdade, posso afirmar sem falsa modéstia de que consigo compreender determinadas ideias melhor do que certos cavalheiros!
-Não duvido disto milady! – Disse ele achando graça do ar ofensivo que aqueles grandes olhos castanhos tomavam. – Só acho que não deveria menosprezar tanto assim as atividades e leituras incumbidas a seu sexo.
-Não as menosprezo, apenas as acho enfadonhas. Jamais gostei de poesia ou de versos líricos. Papai sempre disse que eu teria dado um excelente varão, mas... – Quando se deu conta do absurdo que falou, sentiu suas bochechas corarem, o que pareceu deixar Lorde Edward maravilhado.
-Sim, provavelmente se a senhorita tivesse nascido homem teria sido um ótimo herdeiro. Mas seria lastimável privar nossa sociedade da dama formosa que um dia a senhorita virar a ser. – Ela ficou boquiaberta com o elogio.
-Não sou tola milorde. Sei perfeitamente bem que minha beleza não se encaixa aos padrões atuais...
-E quem lhe disse tamanho absurdo?
-Minha irmã Rosalie, minha mãe e todas as minhas amigas. Mas não preciso que ninguém me diga isto. Posso comprová-lo eu mesma ao olhar-me no espelho. Todavia a questão não é esta, estávamos falando sobre minha aptidão a ser um cavalheiro. – Replicou ela vendo que aquele assunto era menos constrangedor – Como lhe dizia, seria muito bem sucedida, e até posso arriscar que seria muito bonito.
-Algo me diz que existem mais motivos para milady achar que teria sido melhor se tivesse nascido homem.
-Bem... De fato não é exatamente devido a isto! Creio que o que mais me agrada nesta ideia é a liberdade. Qualquer um vê que os homens tem menos limitações que as mulheres.
-Verdade, realmente a temos! – Ela se alegrou ao ver que ele demonstrava verdadeiro interesse em sua opinião.
Era difícil encontrar alguém com que conversar sobre suas opiniões revolucionarias. Sua mãe se importava apenas em ensinar a Rosalie e a ela a serem mais delicadas e sociáveis, mas ela jamais se dera bem nestas matérias, pois não via utilidade para aquilo na vida no campo.
O único em sua casa que a ouvia era seu pai. Quando Lady René engravidara pela segunda vez, Lorde Charles tinha certeza de que desta gestação nasceria um varão, mas ao invés disto, veio ela, Isabella. Todavia, seu pai não a rejeitara como se era esperado devido sua decepção em relação ao sexo do bebe. Ao contrario, ele a fez sua favorita e a ensinara tudo o que sabia, enquanto que sua esposa se ocupava apenas em exibir a formosa filha mais velha que sempre fora sua preferida devido à eminente beleza que a precedia.
Mas na verdade, o verdadeiro motivo que fazia lady René menosprezar sua filha mais moça, era o fato desta parecer com o seu odioso marido! Não era segredo algum que o casal jamais se amou, pois o casamento havia sido de conveniência, e com o passar dos anos, lady René começou a desprezar o marido e tudo que a lembrava dele.
Com o tempo, Bella foi se acostumando aquele cenário. Mas as coisas estavam ficando cada vez mais difíceis nos últimos meses, desde que Lorde Charles adquiriu uma moléstia crônica que o impedia de passar mais de que uma hora por dia na companhia de sua adorável filha.
Devido a isto, Bella estava sentindo-se isolada e extremamente solitária. A mãe não conseguia trocar mais que dez palavras com ela sem que uma fosse ofensiva. E enquanto a Rosalie, não se davam muito bem devido suas diferenças de interesses, pois enquanto Bella se ocupava com leituras e montarias, Rose apenas pensava em fitas e vestidos. Bella era apenas um ano mais nova, mas mesmo assim, a diferença de personalidade entre ambas era maior do que as evidentes diferenças físicas. Apesar de tudo, ela gostava da irmã mais velha, pois Rose nem sempre era irritante como naquela manhã em que acordara de mau humor ao ver que suas regras haviam chegado.
Sendo assim, a Bella cabia passar os dias dando singelos passeios pelos arredores e ler até que a luz do dia se extinguisse. Isto claro, quando não iam para a casa de Alice, que ficava apenas a quinze minutos de carruagem da propriedade da família Swan.
Alice Cullen sempre fora uma boa amiga e seus familiares jamais a fizeram sentir-se deslocada. Mas sempre que se via na presença do estonteante herdeiro Cullen, Isabela sentia-se como um gatinho encurralado, pois jamais aprendera a ser coquete como sua mãe tentara ensiná-la.
-Menina Swan... – Disse uma criada que acabara de adentrar na biblioteca a trazendo de volta de seus devaneios – Lamento atrapalhar, mas a carruagem de seu pai já chegou e a senhorita vossa irmã já está aposta lhe esperando. – Bella apenas concordou com a cabeça enquanto via a criada sair novamente pela porta.
-Bem, creio que já é dada a hora de partir. – Ela disse com todo o decoro – Foi um prazer imenso conversar com o senhor! – E fez uma educada reverencia.
-O prazer foi todo meu, menina Swan. E por favor, sinta-se a vontade para sempre dispor de nossa biblioteca. Temos mais livros do que poderíamos ler em duas vidas, por isto creio que não haverá mal algum em dividi-los com a senhorita.
-Obrigada novamente milorde! – Ela já se preparava para sair quando ele a chamou novamente. Tentando não demonstrar a impaciência que sentia, Bella virou-se e o encarou. Edward havia se levantado para ir ate a estante onde pegou o velho exemplar de "o príncipe". O examinou com certa curiosidade e por fim, cruzou o salão indo até onde Bella estava parada.
-Pode levar este emprestado! E desfrute dele por quanto tempo quiser. – Ela pegou o livro e ao fazê-lo tocou de forma deliberada nas grandes mãos de Edward. Agora que ele estava de pé frente a frente com ela, deixava bastante evidente sua imponência e virilidade, mesmo ainda sendo muito jovem.
-É muito gentil comigo senhor! – Disse ela recolhendo o livro e o segurando contra o peito.
-Veja isto como um investimento! – Ele disse com um sorriso sedutor – Passo muitos meses retido nas aulas de Oxford, e quando volto para casa, desejo ter alguém instruído para poder trocar uma ou duas palavras que não se tratem de futilidades da corte ou de terríveis combinações de fitas das quais Alice insiste em me pedir opiniões.
-Não fale assim de sua irmã! Ela não é tão desagradável quanto o senhor faz parecer! – Ele não pode evitar dar uma gargalhada descontraída diante da lealdade da garota.
-Fala isso só por ela não ser sua irmã!
-Pois adoraria que ela o fosse e não me importaria em ter outra irmã bonita mesmo já sendo o suficiente ter uma irmã deslumbrante! – Ao perceber que falara demais, Bella acabou corando novamente e levando a mão aos lábios.
-Temo que devo discordar disso! Aos meus olhos, a senhorita parece bem mais interessante do que a senhorita Rosalie! – Ele achou graça na forma como ela balançou a cabeça demonstrando incredulidade e ao mesmo tempo fazendo os sedosos cabelos castanhos dançarem com leveza.
-O senhor é bastante cruel milorde. Agora devo ir, ou do contrário Rose irá me matar por tê-la feito esperar.
-Sim de acordo. – Ela se virou para partir mais ele a reteve novamente – E Bella, lembre-se "Todos veem o que pareces, mas poucos percebem o que és!" – Ela sorriu graciosamente e ergueu o livro que tinha em mãos.
-Nicolau Maquiavel! É uma de minhas citações favoritas... Bem, até mais milorde! – E ao dizer isto, Bella o deixou.
Ela tinha que admitir que aquela não fora uma conversa normal, mas a adorou em demasiado. Infelizmente não sabia quando poderia voltar a falar com ele, pois agora que as aulas em Oxford começaram, seria quase impossível se deleitar novamente com a companhia do galanteador Lorde Edward Cullen!
Quando finalmente chegou à carruagem, Rose já estava com uma das piores expressões de tédio em seu rosto.
-Por que demorou tanto? Você sabe que hoje desceram minhas regras e que fico estupidamente indisposta! – Grunhiu a loira.
-Indisposta e mal humorada! – Respondeu Bella enquanto recebia ajuda do cocheiro para subir e despedia-se de Alice que estava as observando da sacada de seu quarto – Se estava tão indisposta assim, não deveria ter vindo. Sabe muito bem que não é obrigada a sair de casa quando as regras descem!
-Você só fala assim porque jamais passou por isto! – Alfineta Rosalie que sabia o quanto irritava a irmã o fato de ainda não ter tido sua menarca – E alem disto, ficar presa em meu quarto em um dia tão lindo quanto este deve ser considerado um dos piores sacrilégios!
-Que seja! – Disse Bela enquanto abria o livro que lorde Edward a havia emprestado, para demonstrar a Rose que aquela conversa finalmente chegara ao fim.
Mas antes de começar a ler, ela olhou em direção a janela da biblioteca, onde certo rapaz podia ser viso redigindo algum documento ou carta. Automaticamente, Bela relembrou das últimas palavras dele, antes de deixá-la partir:
"Todos veem o que pareces, mas poucos percebem o que és!"
