Hey-ho. Outro projeto com capítulos, baseado em uma história real... Não, mentira. Era só eu ouvindo um desses programas nonsense quando me bateu a ideia. Realmente, é um monte de besteira, mas as pessoas LIGAM! Nos dois sentidos, anyway. Espero que vocês gostem.
PS: Qualquer semelhança com o filme com Tom Hanks e Meg Ryan é mera coincidência, really. Só depois eu me lembrei que ele existia.
Hetalia não me pertence.
O contraste entre as inúmeras luzes – propagandas de bares, restaurantes, hotéis, os próprios faróis de outros automóveis – despertava uma leve e confortável letargia em Alfred. Adorável, se ele não estivesse dirigindo. Não que ele fosse exatamente o tipo de pessoa que sentisse sono sempre que entrasse em um carro, mas aquele dia em particular havia sido exaustivo e a perspectiva de dirigir durante uma hora até chegar em casa não ajudava. Olhava para um lado e via carros, olhava para outro e mais carros. Alfred simplesmente amava carros, junto com hambúrgueres eles eram a sua obsessão. Mas não exatamente quando o trânsito o separava de sua cama macia e confortável.
Alfred até tentou pensar nos problemas – normalmente super efetivos para expulsar a insônia – lembrando-se do relatório que Kiku pedira, do encontro que teria com aquela irmã obsessiva de seu chefe, Natasha, no dia seguinte, de como a máquina de café do trabalho havia quebrado logo pela manhã e outros pormenores. Mas continuava a falhar miseravelmente. O reflexo da luz vermelha do semáforo e o doce som do jazz convidavam seu subconsciente a propiciar-lhe uma viagem ao mundo dos sonhos.
Então, é, ele estava quase dormindo ao volante.
A buzina do carro detrás o assustou e Alfred estapeou a própria bochecha, murmurando palavras de encorajamento para se manter alerta. A estação do rádio também não contribuía. Jazz era ok, mas não depois de um dia exaustivo de trabalho, não quando você precisa realmente esquecer que a cama lhe aguarda.
Alfred começou a zapear pelas emissoras, quase nunca passando mais de cinco segundos sintonizado na mesma. Ouviu um pouco de cada coisa: rock, pop, punk, metal, música latina, alternativa, hip hop, o noticiário e até seu querido rap, sem sequer prestar atenção. Era como se nada daquelas opções pudesse realmente tirá-lo de seu topor e suas pálpebras continuavam a parecer pesar uma tonelada. Ele estava lá pela segunda passagem pelas mesmas emissoras quando percebeu que o carro da frente freara e teve uns dois segundos para fazer o mesmo se envolver possivelmente em um acidente por falta de atenção.
Oh, ótimo, pelo menos aquele susto resolvera parcialmente o problema do sono.
O americano respirou fundo, encostando-se no banco e esperando que o ritmo das batidas de seu coração voltasse ao normal, mantendo os olhos fixos na traseira do carro à frente.
"Cara... Meu reino por uma xícara de café." Falou para si mesmo.
Foi basicamente o momento em que a música – que Alfred sequer notara que estava tocando – terminou, e uma mulher com uma voz forte e esquisita, séria e ao mesmo tempo tentando ser maternal, falou:
"Nada como uma relaxante música para começar a sua madrugada insone, ouvinte. Aqui é sua sempre amiga e conselheira Daisy, pronta a ouvir o que você tem a me dizer, pronta a aconselhar e esclarecer os problemas da sua vida amorosa, aguardando sua ligação aflita."
Alfred fez uma careta, ponderando se alguém realmente telefonava para programas daquele tipo. Era nojento. E qual era o ponto, afinal? As pessoas devem ter o mínimo de orgulho para não expor seus problemas e aflições para meio mundo que elas sequer conhecem, não? Tudo bem, Alfred era o tipo de pessoa que contava sua vida inteira para um estranho no meio da rua, se tivesse vontade, mas não era como se ele fosse sair confessando todas as suas frustrações e desejos para o sujeito... Ou para um país inteiro.
Mas mesmo com isso em mente, ele nem se preocupou em mudar de rádio.
"Temos uma ligação." Disse a marcante voz da mulher.
A ligação era de uma estudante universitária chamada Suzie, de Omaha. Ela estava arrasada porque o namorado havia desfeito a relação e lamentava-se, ponderando o que havia feito de errado. Meia hora depois, as pálpebras de Alfred voltaram a pesar e ele estava achando aquele papo todo realmente entediante. Que diabos ele iria querer ouvir uma estudante cabeça oca se lamentando pelo fim do namoro? Aquilo não acontecia todo dia, afinal?
Ele secretamente comemorou quando a garota desligou, um pouco mais animada pelos conselhos totalmete nonsense e triviais que a mulher havia dado.
E o pior foram as ligações posteriores dos ouvintes. Sim, porque se já não era ridículo o suficiente expor sua vida em público, aqueles que ouviam ainda tinham o privilégio de opinar e perguntar a respeito.
É isso, Alfred pensou. Não dá pra ouvir um programa desses.
Suas mãos fizeram menção de mudar de estação justamente no momento em que ouviu uma voz masculina, ligeiramente embriagada, saudar a mulher.
"Com quem eu falo?" Perguntou Daisy, com aquele tom neutro de sempre. Deus, como ela era irritante.
"Eu não sei se quero" soluço "Dizer meu nome". O cara estava visivelmente bêbado, até Alfred notou. E ele tinha um sotaque inglês ridiculamente forte. Nem que ele quisesse, ele esconderia suas origens. "Mas você pode me chamar de Inglaterra."
Alfred bufou e depois gargalhou, meio que forçado. Ok, aquilo podia ficar engraçado de tão ridículo que era.
"Hmm, ok. Então conte-nos, Inglaterra, você parece um pouco embriagado..." Um pouco? Alfred pensou. "De onde você é, Inglaterra?"
"Atualmente vivo em Nova York."
Alfred fez um 'o' surpreso. Quais eram as chances de ele já haver topado com esse cara na rua mesmo? Ele fez uma nota mental para prestar atenção em todo sujeito com sotaque britânico que lhe aparecesse, só para garantir.
"O que lhe leva a nos telefonar nesta noite?"
Houve um pequeno período de silêncio do outro lado, como se o homem estivesse repensando a ideia de telefonar para o programa e cogitando ou não falar.
"Eu estou com esse peso nos ombros..." Ele começou a falar, cautelosamente. "Eu não aguento mais."
O silêncio da mulher foi um sinal para que ele continuasse a falar.
"Eu vivo com a minha namorada que conheci durante a universidade. Vivemos juntos por cinco anos e dividimos o mesmo apartamento."
"Fale sobre sua mulher."
"Oh, ela é adorável. Inteligente, engraçada, um pouco assustadora quando irritada... Costumamos conversar sobre tudo, desde o trabalho ao clima e nunca falta assunto. Nunca tivemos uma briga grande. Nossos amigos dizem que somos um casal perfeito. Eu acho que nunca encontrarei alguém tão boa como ela, sabe."
Ele pausou mais uma vez, respirando fundo. Ao mesmo tempo, Alfred sequer percebeu que havia prendido a própria respiração, como se algo dentro dele soubesse o que viria a seguir.
"Então... Vocês são felizes juntos?" Perguntou – retoricamente, Alfred precisou acrescentar – a mulher.
"Muito." Ele pareceu engolir seco. "Como já disse, nós nos damos excepcionalmente bem, mas..."
"Vocês estão sofrendo com falta de comunicação?" Interrompeu novamente.
"Deixa ele falar em paz, ô bruxa!" Alfred esticou a mão aberta na direção do rádio, como se brigasse com ele.
Como se percebesse o incentivo de Alfred e se sentisse tão irritado quanto pelas interrupções, o sujeito suspirou mais uma vez. "Não, estamos bem. O problema não é realmente com ela, é comigo." E Alfred se viu prendendo a respiração mais uma vez, seu coração acelerando. "Veja bem, eu acho que sou tipo... Hm... Gay, sabe."
Houve um silêncio meio desconfortável do lado do cara, da mulher e um silêncio ansioso do lado de Alfred. Ele nem mais se importava em prestar atenção na estrada mesmo.
"Oh. Eu entendo."
Não entende não. Alfred fez bico. De repente, ele desejou estar onde quer que o sujeito estivesse para lhe dar aquele ombro amigo.
"Algum de seus amigos sabe?"
Houve uma hesitação do outro lado da linha antes do homem responder um não resignado. "Eu sequer sei como contar pra ela. Eu não quero, você sabe, partir o coração dela ou deixá-la arrasada. Tenho tanto medo de feri-la."
Alfred mordeu a ponta do dedão, olhando meio nervoso e de relance para o celular. Mas em compensação, você está se ferindo, colega. Pensou.
"Você já dormiu com algum outro homem?" Ela perguntou e Alfred sentiu todo o ar de seus pulmões ficar preso lá mesmo.
"Não enquanto estamos juntos, mas quando era mais jovem – sim, eu dormi."
"Hm, então não é de agora essa dúvida."
"Eu estava bastante certo quanto a ela quando nos conhecemos."
"Mas agora não está mais."
Alfred apertou o celular com raiva. "Pare com isso, bruxa, você vai deixá-lo ainda mais triste!" Gritou com o rádio.
"Que situação complicada." Disse ela. "Agora é com vocês, ouvintes. Façam suas ligações e aconselhem nosso querido Inglaterra. Lembrem de nosso número: **89-9898. Esperamos a sua ligação."
Ótimo. Uma porção de idiotas falando sobre o que não sabe. Bufou o loiro. O som de um telefone tocando anunciou a primeira ligação.
Era uma garota. Adolescente, pela voz. "Você não pode fazer isso com a sua namorada, Inglaterra. Vai partir o coração dela."
Uma mulher, madura provavelmente, foi a seguinte. "Tente conversar com algum amigo a respeito. Procure uma terapia, talvez isso ajude a sustentar o relacionamento de vocês."
Outra mulher disse "Conte a verdade a ela, melhor ela saber da verdade do que você continuar enganando-a."
Um homem se seguiu. "Se você algum dia precisar de um consolo, meu nome é Hernando Gonzales."
As ligações subsequentes não foram muito melhores. Era como se as pessoas não soubessem exatamente o que dizer para confortar o sujeito, porque qualquer escolha que ele fizesse resultaria em uma dose de sofrimento. Como se sabe, as pessoas quase nunca sabem lidar com o sofrimento alheio.
"Aparentemente tivemos uma série de ligações com conselhos distintos a seguir... Infelizmente estamos caminhando para o final de nosso programa, então somente atenderemos a mais um ouvinte." O som do telefone anunciou a última ligação. "Com quem falo e o que você tem a dizer ao nosso querido Inglaterra?" Disse a mulher.
"Alfr... Você pode me chamar de América." Disse com uma timidez inicial, posteriormente amaldiçoando por quase dar seu nome verdadeiro. "Hm, tudo bem. Outro país. Prossiga, América." Comentou a mulher com o tom enfadado. Alfred simplesmente ignorou. "Eu... É... Olha, quem quer que você seja, você não tem ideia de como eu entendo a sua angústia. Não, sério. Não é que eu seja gay que nem você, nem nada, nah-ah. Tenho muita certeza sobre minha sexualidade, a propósito. Mas eu sei como é uma merda você guardar algo que fatalmente irá destruir a pessoa que você ama. Eu sei como é querer contar e ter medo de vê-la desabar na sua frente, da perspectiva de jamais ser como antes. É um saco, sério." Alfred foi ganhando confiança à medida que avançava. "Esses conselhos que você recebeu? Pfff, inúteis. É muito fácil dizer faça isso ou faça aquilo ou não faça quando não é conosco. Essas pessoas sequer sabem o que dizer, elas estão tão perplexas, desorientadas ou comovidas como eu ou a dona locutora aí. Olha, você pode pensar até que é falsa simpatia essa história toda do eu te entendo, mas é verdade. Eu nem gosto desses programas idiotas e nem sei porque ouvi esse até o final, mas eu ouvi mesmo assim e digo que essas opiniões dos outros não importam! É, você me ouviu! Sabe por que? Porque eles nunca vão ser felizes por você. Eles só serão felizes por eles e olhe lá. Um coração partido? O tempo cura de qualquer jeito. Uma escolha muito errada? Você vai se arrepender pro resto da vida, guarde as minhas palavras. Não são os outros que vão sorrir por você, só pela alegria de estar tudo certo, são? O que quer que você resolva fazer – porque nem eu sei dizer o que é melhor mesmo, essa situação é uma merda e eu sinceramente estaria surtando no sofá de casa e lamentando tudo com um grande pote de sorvete na mão – mas o que quer que você decida, lembre-se disso." E Alfred finalmente respirou.
Houve um silêncio do outro lado da linha e Alfred imaginou se o rapaz estaria com um pequeno sorriso no rosto ou abismado demais para falar.
"Er... Obrigada, América." Disse a mulher, um pouco ofendida. Alfred sorriu trinfante para o rádio. "Inglaterra, foi um prazer ouvi-lo. Espero que os conselhos de nossos ouvintes lhes tenham sido úteis e eu desejo, de todo o meu coração, que você consiga sair dessa. Aqui foi sua conselheira Daisy, direto de Manhattan. Que a fraqueza em seus corações se transforme em coragem para enfrentar os seus medos!"
Alfred passou bons minutos com o olhar meio perdido, meio sonhador. Ele nem havia percebido que estacionara o carro na porta de casa antes mesmo de telefonar para aquele programa.
Era loucura, loucura completa. De repente, ele se viu obsessivo por uma cara que sequer sabia o nome, mas que estava bêbado o suficiente para assumir que era gay para o país inteiro.
Ok, explicando o porquê de eu haver colocado asteriscos no lugar do número: a doida da minha beta pensou em telefonar pra ele. E podem existir mais loucas como ela no mundo. E vai que depois sobra pra mim. Vocês me entenderam.
Reviews são bem-vindas.
