Resumo completo: Gina Wright sempre fora atormentada por vozes de diversas épocas, sobrepostas, interligadas, vindas de todas as direções, causando-lhe profundo sofrimento. Só havia um lugar onde ela talvez pudesse encontrar a cura para seu mal: a misteriosa fortaleza habitada pelos imortais, em Budapeste. Homens com poderes extraordinários, cada um carregava em si um dos demônios libertados da caixa de Pandora. Porém, somente Harry, o guerreiro castigado com a mais cruel de todas as maldições, seria capaz de livrar Gina de seu desespero. Morrendo todas as noites e renascendo à alvorada, o guardião do demônio Violência agonizava com o desejo de tocar Gina, mas receava perder o controle sobre o espírito maligno e se tornar uma ameaça para ela.

Adaptação do livro de Gena Showalter.

Nota: Essa é uma história bem complexa e tem continuações com casais diferentes o 1º casal escolhido por mim foi Harry e Gina. Como eles são imortais não terão parentescos sanguíneos, Harry, Sirius, Tiago e outros são da mesma idade pode se dizer, só pra lerem e gostarem por favor comentem, quando pensei em adaptar essa história me senti um tanto insegura, e eu realmente não quero abandonar essa fic, odeio fazer esse tipo e coisa, então me deixem mais tranquila e me digam o que pensam.


Capítulo 1

Cada noite a morte chegava, lenta e dolorosa, e a cada manhã, Harry despertava em sua cama, sabendo que teria que morrer de novo mais tarde. Aquela era sua maior maldição, e seu castigo eterno.

Passou a língua pelos dentes, desejando que fossem uma navalha sobre a garganta de seu inimigo. Já tinha transcorrido a maior parte do dia. O tic tac do relógio era um som venenoso, porque cada segundo era um aviso zombador de dor e mortalidade.

Faltava pouco menos de uma hora para que o primeiro aguilhão atravessasse seu estômago, e nada que pudesse fazer ou dizer podia mudar isso. A morte viria por ele.

— Malditos deuses — murmurou. Incrementou o ritmo dos levantamentos de pesos que estava fazendo.

— Canalhas todos eles — disse uma voz familiar às suas costas.

Os movimentos de Harry não diminuíram pela indesejada intromissão de Sirius. Vamos, abaixo. Vamos, abaixo. Levava duas horas desafogando sua frustração e sua ira com o saco de boxe, na fita e no banco de musculação. As gotas de suor lhe caíam pelo peito e pelos braços. Deveria estar tão exausto de ânimo como o estava fisicamente, mas suas emoções só se fizeram mais escuras, mais poderosas.

—Não deveria estar aqui —disse.

Sirius suspirou.

—Olhe, não queria interromper, mas aconteceu algo.

—Pois se ocupe disso.

—Não posso.

—Seja o que for, tente. Eu não me encontro em boa forma para ajudar.

Durante aquelas últimas semanas, faltava muito pouco para que ele se perdesse em sua personalidade assassina, e ninguém estava a salvo a seu redor. Nem sequer seus amigos. Sobretudo, seus amigos. Não queria fazer isso, mas algumas vezes, não tinha poder para dominar seus impulsos de bater e mutilar.

—Harry...

—Estou no limite, Sirius —disse— Faria mais mal que bem.

Harry conhecia suas limitações. As conhecia há milhares de anos. Desde aquele desgraçado dia em que os deuses tinham escolhido a uma mulher para levar a cabo uma tarefa que deveriam ter encomendado a ele.

Pandora era forte, sim, a soldado mais forte de seu tempo. Mas ele era mais forte, e mais capaz. Entretanto, o tinham considerado muito fraco para custodiar, o dimOuniak, a caixa sagrada que continha demônios tão vis e destrutivos que nem sequer podiam ser confinados no Inferno.

Harry nunca teria permitido que a destruíssem.

Ante tal afronta, a frustração se apropriou dele. Se apropriou de todos eles, de todos os guerreiros que viviam ali. Tinham se entregado a luta pelo rei dos deuses, tinham matado com maestria e o tinham protegido. Deveriam tê-los escolhido como guardiães. Que não o tivessem feito tinha ocasionado aos guerreiros uma vergonha que não podiam tolerar.

Só pensavam em dar uma lição aos deuses aquela noite em que roubaram dimOuniak de Pandora e liberaram a horda de demônios no mundo despreparado. Que estúpidos tinham sido. O plano para mostrar seu poder tinha fracassado, porque a caixa se perdeu na batalha, e os guerreiros tinham sido incapazes de capturar a um só dos espíritos malignos.

Logo tinha reinado a destruição e o mundo tinha ficado envolto em sombras, até que o rei dos deuses tinha intervindo: tinha amaldiçoado a todos e cada um dos guerreiros e os tinha condenado a levar um daqueles demônios dentro de si.

Um castigo adequado. Os guerreiros tinham desatado o mal para vingar seu orgulho ferido; assim, a partir de então deviam contê-lo.

E desse modo tinham nascido os Senhores do Submundo.

Harry devia encerrar a Violência. Aquele demônio se converteu em uma parte de si mesmo, como os pulmões ou o coração. O guerreiro já não podia viver sem seu demônio, e o demônio não podia funcionar sem o guerreiro. Eram duas metades de um todo.

Desde o começo, a criatura que o habitava o tinha tentado para que fizesse coisas más, odiosas, e ele tinha se sentido obrigado a obedecer, inclusive quando o tinha forçado a matar a uma mulher. Tinha assassinado a Pandora.

Apertou a barra dos pesos com tanta força que quase lhe deslocaram os nódulos. Durante todos aqueles anos, tinha aprendido a controlar algumas das coações vis do demônio, mas a luta era constante, e Harry sabia que podia se fazer pedacinhos a qualquer momento.

Teria dado tudo por ter um dia de paz. Por não sentir aquele desejo entristecedor de machucar aos outros. Por não albergar batalhas em seu interior, nem preocupações, nem morte. Só... paz.

— Estar aqui não é seguro para você —disse a seu amigo, que ainda estava na porta. — Tem que partir.

Deixou a barra chapeada nos ganchos e se sentou.

—Só Rony e Lupin podem estar perto de mim em minha morte.

E só porque tomavam parte nela, embora não quisessem. Estavam tão indefesos ante seus respectivos demônios como Harry ante o seu.

—Falta uma hora para que aconteça, assim... —Sirius lhe lançou uma toalha. — Me arriscarei.

Harry girou, apanhou a toalha e secou o rosto.

—Água.

Uma garrafa gelada estava atravessando o ar antes que terminasse de pronunciar a palavra. A apanhou também e a bebeu. Depois observou a seu amigo.

Como de costume, Sirius estava vestido de negro e usava luvas. Tinha o cabelo preto e ondulado, até os ombros, e traços que as mulheres mortais considerariam uma festa sensual. Não sabiam que aquele homem era na realidade um diabo na pele de um anjo. Entretanto, deveriam sabê-lo. Tinha um brilho irreverente e pecaminoso nos olhos, que proclamava que seria capaz de rir na cara de alguém enquanto lhe tirava o coração. Ou que riria enquanto tiravam o coração dele.

Para sobreviver, procuravam encontrar motivos para rir, de si mesmos ou de outros. Todos o faziam, embora às vezes se tratasse de um humor negro.

Como todos os residentes daquela fortaleza de Budapest, Sirius estava maldito. Possivelmente não morresse cada noite, como Harry, mas não podia tocar a nenhum ser vivo sem infectá-lo.

Sirius estava possuído pelo espírito da Enfermidade.

Não tinha sentido a carícia de uma mulher em quatrocentos anos. Tinha aprendido bem a lição quando se rendeu ao desejo e tinha acariciado o rosto de uma jovem que queria converter em sua amante. Ao fazê-lo, tinha ocasionado uma praga que tinha dizimado família atrás de família, povo atrás de povo.

—Só te peço cinco minutos —disse Sirius com determinação.

—Acha que seremos castigados por insultar aos deuses hoje? —respondeu Harry, fazendo caso omisso da petição. Se não permitia que lhe pedissem um favor, não teria que se sentir culpado por não fazê-lo.

Seu amigo voltou a suspirar.

—Se supõe que cada uma de nossas respirações é um castigo.

Certo. Harry sorriu olhando ao céu. "Canalhas. Me castiguem mais, eu os desafio". Possivelmente então, se desfizesse em um nada, por fim.

Entretanto, duvidava que os deuses se preocupassem. Depois de tê-lo amaldiçoado, o tinham ignorado. Tinham fingido que não ouviam suas súplicas de perdão e absolvição. Tinham fingido que não ouviam suas promessas e suas ofertas desesperadas.

Que mais podiam lhe fazer, de todos os modos?

Não tinha nada pior que morrer uma e outra vez, que ser despojado de tudo o que era bom, que albergar o espírito da Violência no corpo e na mente.

Harry ficou em pé e caminhou até o outro extremo da sala, onde olhou para o céu noturno através da janela de cristais escuros, pelo único vidro transparente.

Viu o Paraíso.

Viu o Inferno.

Viu a liberdade, a prisão, tudo e nada.

Viu... seu lar.

Situada sobre uma colina, como a fortaleza, estava a cidade. As luzes de cores rosa, azul e arroxeado iluminavam o céu escuro e tingiam o Danubio. Soprava um vento gelado que formava redemoinhos com os flocos de neve.

Ali, todos tinham certa privacidade do resto do mundo. Ali podiam ir de um lugar a outro sem ter que suportar centenas de perguntas. "Por que não envelhece? Por que o eco de seus gritos atravessa o bosque a cada noite? Por que, algumas vezes, parece um monstro?".

Os habitantes daquela parte da cidade se mantinham a distancia, cheios de reverência e respeito. "Anjos" tinha ouvido uma vez, quando tinha se encontrado com um mortal.

Se eles soubessem...

A unhas de Harry se alargaram ligeiramente e se cravaram na pedra. Budapest tinha uma beleza majestosa. Tinha o encanto do antigo e os prazeres modernos, mas ele sempre tinha se sentido alheio à cidade, alheio ao bairro do castelo e aos bares e discotecas. Alheio as barracas de verdura e fruta e alheio às pessoas.

Possivelmente aquela sensação de afastamento se desvaneceria se percorresse a cidade, mas ao contrário dos outros, que podiam passear por prazer, ele estava preso na fortaleza, como certamente tinha estado Violência na caixa de Pandora tantos séculos atrás.

As unhas lhe cresceram mais, se transformaram quase em garras. O fato de pensar naquela caixa sempre o deixava de mau humor. "Soca uma parede", Violência propôs. "Destrói alguma coisa. Fere, mata". Harry teria gostado de destruir aos deuses. Um por um. Possivelmente, os decapitando. Arrancar o coração negro deles, putrefato.

O demônio ronronou de gozo.

"Claro que está ronronando", pensou Harry. Qualquer coisa que fosse sanguinária tinha a aprovação da criatura. Com o cenho franzido, olhou de novo para os céus. O demônio e ele estavam a muito tempo unidos, mas recordava o dia com claridade. Os gritos dos inocentes, os humanos que sangravam ao seu redor, sofrendo e morrendo depois que os espíritos tivessem devorado sua carne com êxtase.

Harry tinha perdido a conexão com a realidade depois que empurraram Violência ao interior de seu corpo. Não ouvia sons nem podia ver. Só escuridão. Não tinha voltado a recuperar a consciencia até que o sangue de Pandora lhe salpicou o peito e escutou seu último fôlego.

Ela não tinha sido sua primeira vítima, nem a última, mas sim tinha sido a primeira mulher que perecia sob sua espada. O horror de ter visto aquela vibrante mulher rasgada e de saber que ele era o responsável...

Nunca tinha conseguido se desfazer do sentimento de culpa, da dor e da vergonha.

Após isso,tinha feito todo o possível para dominar o espírito que levava dentro, mas já era tarde. Cheio de fúria, Zeus o tinha amaldiçoado uma segunda vez: cada noite morreria exatamente como Pandora tinha morrido, com o abdômen atravessado seis vezes por uma espada. A diferença era que a tortura daquela tinha terminado em uns minutos.

A tortura de Harry duraria toda a eternidade.

Entretanto, ele não era o único que sofria. Os outros guerreiros também conviviam com seus demônios. Sirius era o guardião da Enfermidade; Rony, o da Morte; Lupin, da Dor, Tiago da Ira e Draco da Promiscuidade.

Por que ele não tinha podido receber aquele último? Teria podido ir à cidade sempre que tivesse desejado, tomar a qualquer mulher, saborear todos os sons e as carícias.

Entretanto, tal e como eram as coisas, Harry não podia se afastar da fortaleza. Tampouco podia permanecer muito tempo junto à mesma mulher. Se o demônio o dominava, ou não podia voltar para casa antes da meia-noite, e alguém encontrava seu corpo morto, ensangüentado, e o enterrava ou o queimava...

Desejava que algo assim terminasse com sua triste existência. Teria partido muito tempo antes e teria permitido que o assassem. Ou teria se jogado da janela mais alta do castelo. Entretanto, fizesse o que fizesse, no dia seguinte despertaria outra vez, queimado ou dolorido. Quebrado e esfaqueado.

—Está a um bom tempo olhando pela janela — disse Sirius. — Nem sequer tem curiosidade de saber o que ocorreu?

Harry piscou quando Sirius o tirou de seus pensamentos.

—Ainda está aí?

Seu amigo arqueou uma sobrancelha negra —Acredito que a resposta a minha pergunta é não. Está mais calmo, ao menos?

Estaria tranqüilo alguma vez?

—Muito calmo.

—Deixa de se queixar. Tenho que te mostrar uma coisa, e não pode se negar. Se quiser, pelo caminho falaremos de meus motivos para o incomodar.

Sem uma palavra mais, Sirius saiu da sala.

Harry ficou imóvel durante uns segundos. A curiosidade e uma diversão irônica, entretanto, superaram seu mau humor, e decidiu segui-lo. Harry saiu do ginásio e percorreu o corredor. Viu Sirius uns metros mais a frente e o alcançou.

—O que acontece?

—Por fim demonstra interesse.

—Se for um de seus truquezinhos...

Como aquela vez em que Sirius tinha encomendado centenas de bonecas infláveis e as tinha colocado por toda a fortaleza, porque Draco se queixou, estupidamente, da falta de companhia feminina na cidade. Coisas como aquela aconteciam quando Sirius estava aborrecido.

—Não vou perder tempo tentando gastar uma brincadeira com você —respondeu Sirius — Você, meu amigo, não tem senso de humor. Certo?

—Onde estão os outros? —perguntou Harry, ao se dar conta de que não encontravam a ninguém mais pelo caminho.

—Poderia pensar que Draco foi comprar comida, já que a despensa está vazia e esse é seu único dever, mas não. Foi procurar uma nova amante.

Afortunado bastardo. Draco estava possuído pela Promiscuidade, e não podia se deitar duas vezes com a mesma mulher, e devia seduzir a uma nova, ou duas ou três, cada dia. Aquilo provocava a inveja de Harry.

— Tiago está... se prepare —o acautelou Sirius— porque essa é a razão pela qual o avisei.

—Ocorreu algo a ele? —perguntou Harry, e a escuridão se apropriou de seus pensamentos enquanto a ira o dominava. "Destrói, arrasa", pediu Violência, se cravando nos limites de sua mente —Ele está bem?

Tiago podia ser imortal, mas de todo o modo podia acabar ferido. Inclusive morto, algo que tinham descoberto da pior forma possível.

—Nada disso —lhe assegurou Sirius.

Lentamente, Harry relaxou e Violência se retirou.

—Então o que? Estava limpando e teve uma briga com alguém?

Cada um dos guerreiros tinha atribuídas determinadas responsabilidades. Era sua forma de manter certa ordem no caos de suas próprias almas. Tiago fazia as vezes de faxineira, algo do que se queixava diariamente. Harry se ocupava da manutenção doméstica. Sirius se encarregava das operações financeiras e os investimentos, e mantinha todos em um bom nível econômico. Rony resolvia as papeladas e Lupin lhes proporcionava as armas.

—Os deuses... o chamaram.

Harry cambaleou, cegado momentaneamente pelo choque.

─Como?

—Os deuses o chamaram —repetiu Sirius pacientemente.

Os gregos não tinham voltado a falar com eles desde a morte de Pandora.

—O que queriam? E por que estou me inteirando agora?

— Ninguém sabe o que querem. Estávamos vendo um filme quando, de repente, se ergueu no assento com uma expressão vazia, como se estivesse sozinho. Poucos segundos depois nos disse que o chamaram. Nenhum de nós teve tempo de reagir. Em um momento Tiago estava conosco e, no segundo seguinte, se foi. Quanto a sua segunda pergunta, tentei lhe dizer isso mas me respondeu que não se importava, recorda?

—Deveria ter me dito isso de todo o modo.

—Enquanto tinha os pesos a seu alcance? Por favor. Sou a Enfermidade, não a Estupidez.

Aquilo era... Harry não queria pensar o que era, mas não pôde conter os pensamentos. Algumas vezes, Tiago, o guardião da Ira, perdia o controle de seu espírito e embarcava em uma vingança contra os mortais, para castigá-los por seus pecados. Acaso os deuses iriam impor a ele uma segunda maldição por suas ações, como tinha ocorrido com ele séculos atrás?

—Se não voltar tal e como partiu, encontrarei uma maneira de irromper no céu e acabar com todos os deuses que encontre.

—Tem os olhos injetados de sangue —disse Sirius. — Olhe, todos estamos confusos, mas Tiago voltará logo e nos explicará o que está ocorrendo.─ Bem. Se obrigou a relaxar. De novo.

—Chamaram a alguém mais?

─Não. Rony saiu para compilar almas. E Deus sabe onde estará Lupin; provavelmente, cortando a si mesmo.

Deveria tê-lo sabido. Embora Harry sofresse o inexprimível todas as noites, se compadecia de Lupin, que não podia passar uma hora sem se torturar.

—E que mais tinha que me dizer? —perguntou.

—Acredito que será melhor que o veja por si mesmo.

Seria algo pior que a notícia sobre Tiago? Se perguntou Harry enquanto passavam pela sala de jogos. Seu santuário. A sala que tinham dotado de todas as comodidades que podia desejar um guerreiro. Tinha um refrigerador cheio de vinhos e cervejas especiais. Uma mesa de bilhar. Um aro de basquete. Uma enorme tela plana de televisão, que naquele momento mostrava a imagem de três mulheres nuas na metade de uma orgia.

—Vejo que Draco esteve aqui —comentou.

Sirius não respondeu, mas acelerou o passo sem olhar uma só vez a tela.

—Não importa —murmurou Harry. Dirigir a atenção de Sirius para algo carnal era uma crueldade desnecessária. Aquele homem celibatário tinha que estar morrendo por ter relações sexuais, por acariciar, mas nunca poderia fazê-lo.

Inclusive Harry desfrutava com alguma mulher de vez em quando.

Suas amantes eram, normalmente, as mulheres que Draco tinha deixado, mulheres tão tolas para segui-lo a casa com a esperança de compartilhar sua cama de novo, sem saber que aquilo era impossível. Sempre estavam embriagadas de desejo sexual, uma conseqüência de aceitar a Promiscuidade, assim não lhes importava quem se metesse finalmente entre suas pernas. A maioria das vezes estavam encantadas de aceitar Harry como substituto. Aqueles encontros eram impessoais, emocionalmente vazios, embora fisicamente satisfatórios.

As coisas tinham que ser assim para proteger seus segredos. Os guerreiros não permitiam a entrada de humanos no castelo. Harry tomava às mulheres no bosque próximo, sem se quer olhar para elas, em uma relação rápida que não excitasse a Violência nem o obrigasse a fazer coisas que o horrorizariam durante toda a eternidade. Depois, enviava as mulheres para casa com uma advertência: não deviam voltar nunca, ou morreriam. Era simples assim. Não podia manter uma relação duradoura; possivelmente terminasse por sentir algo por uma das mulheres e, ao final, lhe faria mal. Isso só poderia lhe trazer mais culpa e mais vergonha.

Por fim, quando chegou ao quarto de Sirius, afastou aqueles pensamentos de sua mente. Olhou ao seu redor. Tinha estado mais vezes ali, mas não recordava o sistema de computadores que cobria uma das paredes, os numerosos monitores, os telefones e todo o equipamento. Ao contrário de Sirius, Harry evitava a tecnologia, porque nunca se acostumou ao quanto as coisas mudavam rapidamente, e o muito que cada novo avanço o afastava do guerreiro despreocupado que tinha sido. Embora estivesse mentindo se dissesse que não desfrutava das vantagens que proporcionava a eletrônica.

Se voltou para seu amigo.

—Buscando o controle do mundo?

—Não. Só o estava vigiando. É a melhor maneira de nos proteger, e também de ganhar dinheiro.

Sirius se sentou na cadeira giratória que tinha em frente à maior das telas e começou a digitar em um teclado. Um dos monitores negros se acendeu, e a tela negra se povoou de linhas cinzas e brancas.

─Bem, isto era o que eu queria que visse.

Então, as linhas se fizeram mais grosas e opacas. Eram árvores.

—Bonito, mas não era algo que precisasse ver.

—Paciência.

—Depressa.

Sirius o olhou com ironia.

—Como me pediu isso tão amavelmente, instalei sensores de calor e câmaras por todo o imóvel, de modo que sempre sei quando entrou alguém.

Alguns segundos depois a imagem da tela virou para a direita. Então surgiu um borrão vermelho que desapareceu imediatamente.

—Volta —disse Harry com tensão. Não era um perito em vigilância. Sua maior habilidade era matar. Entretanto, sabia que aquela cor vermelha era o calor de um corpo.

A forma voltou a aparecer na tela.

—Humano? —perguntou. A silhueta era pequena, quase delicada.

─Sim.

—Homem ou mulher?

—Certamente, mulher. É muito grande para ser uma criança, e muito pequeno para ser um homem.

—Será uma das amantes de Draco?

—Possivelmente. Ou...

─Ou?

—Um Caçador —disse Sirius— Uma isca, mais especificamente.

Harry franziu os lábios.

—Agora sei que está me tirando o sarro.

—Pense nisso. Os entregadores vêm com caixas, e as garotas de Draco sempre correm diretamente para a porta principal. Esta não leva nada nas mãos e se move em círculos. Se detém a cada poucos minutos e faz algo contra as árvores. Possivelmente está colocando cartuchos de dinamite para nos causar mal. Ou câmeras para nos vigiar.

—Se leva as mãos vazias...

—A dinamite e as câmaras são o suficientemente pequenas para que as possa esconder.

—Os Caçadores não tinham voltado a nos espreitar desde a Grécia.

—Possivelmente seus descendentes estiveram nos procurando todo este tempo, e possivelmente nos tenham encontrado por fim.

De repente, o medo apertou o estômago de Harry. Primeiro, a chamada de Tiago, e depois, aquele visitante. Mera coincidência? Recordou os dias escuros da Grécia, dias de guerra e selvageria, gritos e morte. Dias em que os guerreiros tinham sido mais demônios que homens, dias nos quais a fome de destruição tinha guiado todas as suas ações, e os corpos humanos tinham enchido as ruas.

Logo, os Caçadores se elevaram de entre as massas torturadas. Eram uma liga de mortais decididos a destruir a quem tinha desatado tanto mal. Tinha estalado uma luta sem quartel. Ele tinha visto a si mesmo lutando batalhas de espadas, fogo, carne queimada... A paz se transformou em algo legendário.

A melhor arma dos Caçadores tinha sido o engenho. Tinham adestrado iscas femininas para que os seduzisse e os distraísse enquanto os homens se aproximavam para matar. Assim tinham conseguido matar a Sulco, o guardião da Desconfiança. Entretanto, não tinham podido matar ao demônio, que tinha escapado do corpo esmigalhado, em meio da loucura pela perda de seu anfitrião.

Harry já não sabia onde residia aquele demônio.

—Está claro que os deuses nos odeiam —disse Sirius. — Que melhor maneira de nos causar mal que enviar Caçadores quando acabamos de conseguir uma existência pacífica?

O medo de Harry se intensificou. —Mas não quererão que os demônios, enlouquecidos se percam de nós, que os que albergamos e os contemos, andem soltos por aí.

—Quem sabe qual é o propósito que guia seus atos? —respondeu Sirius. Nenhum deles entendia aos deuses, nem sequer depois de tantos séculos. — Temos que fazer algo, Harry.

Ele olhou o relógio de parede e ficou tenso.

—Chama Draco.

—Já fiz isso, e não atende ao celular.

—Chama...

—Acha que o teria incomodado tão perto da meia noite se houvesse alguém mais? —espetou Sirius. — Tem que ser você.

Harry negou com a cabeça.

—Vou morrer muito em breve. Não posso sair de dentro destes muros.

—Eu tampouco —replicou Sirius. Em seus olhos cinzas brilhou algo perigoso e amargo, que transformou sua cor em um cinza venenoso. — Ao menos, você não apagará a toda a raça humana da face da Terra se se aventurar aí fora.

—Sirius...

—Não vai ganhar a discussão, Harry, assim deixa de perder tempo.

Harry passou a mão pelo cabelo, cada vez mais frustrado. "Deveríamos deixá-lo lá para que morresse", afirmou Violência. Se referia ao humano.

—Tanto se for Caçador —disse Sirius— como se for uma isca destes, não podemos permitir que viva. Devemos destrui-lo.

—E se for inocente e me domina a maldição da morte? —inquiriu Harry, contendo o demônio o melhor que pôde.

A expressão de Sirius se encheu de culpa, como se as vidas que tinham acabado por sua culpa clamassem em sua consciência e lhe rogassem que resgatasse a todos os que pudesse.

—Temos que correr esse risco. Não somos os monstros que os demônios querem.

Harry apertou os dentes. Ele não era um homem cruel, não era um monstro. Odiava as quebras de onda de imoralidade que queriam dominá-lo constantemente. Odiava o que fazia, o que era, e aquilo no que poderia se transformar se alguma vez deixasse de lutar contra esses impulsos perversos.

—Onde está o humano agora? —perguntou. Estava disposto a entrar na escuridão, embora tivesse que pagar um preço muito alto.

—Na borda do Danubio.

Uma carreira de quinze minutos. Tinha tempo suficiente para pegar as armas, encontrar ao humano, levá-lo a um lugar seguro se fosse inocente ou, do contrário, matá-lo, e voltar para o castelo. Se tinha algo que o retivesse, podia morrer no exterior da casa. Qualquer que fosse o suficientemente estúpido para se aventurar na colina estaria em perigo, porque uma vez que a primeira dor o atravessasse, Violência o dominaria, e uma ansia negra o consumiria.

Não teria outro propósito que a destruição.

─Se eu não voltar antes de meia-noite, envia a alguém para procurar meu cadáver, o do Rony e o de Lupin.

Tanto Morte como Dor iam procurar Harry a cada meia-noite, estivesse onde estivesse. Dor atirava os golpes e Morte escoltava sua alma ao inferno, onde permanecia sob a tortura do fogo e dos demônios, como Violência, até a manhã seguinte.

Por desgraça, Harry não podia garantir a segurança de seus amigos no exterior da casa. Podia feri-los antes que terminassem sua tarefa. E se os machucasse a angústia que ia sentir seria tão grande como a agonia daquela sentença de morte que devia se cumprir todas as noites.

—Me prometa isso.

Sirius assentiu com um olhar sombrio.

—Tome cuidado, meu amigo.

Harry saiu da sala apressadamente. Entretanto antes que pudesse chegar ao corredor, Sirius voltou a chamá-lo.

—Harry, é melhor que veja isto.

Ele experimentou outra pontada de medo e voltou junto a seu amigo.

—Parece que há quatro mais. Todos são homens ou amazonas. Não estavam aqui antes.

—Maldita seja.

Harry estudou atentamente as quatro novas manchas vermelhas do monitor. Cada uma delas era maior que a anterior. Se aproximavam da menor, sim, as coisas sempre podiam piorar.

─Me ocuparei deles – disse. ─ De todos eles.

Uma vez mais se pôs a caminho. Quando chegou a seu quarto abriu o armário, que era o único móvel que ficava. Tinha destroçado o espelho e as cadeiras em um ataque de violência ou outro. O único motivo pelo que ainda tinha a cama, feita de metal, era que Lupin necessitava de algo ao que algemá-lo cada vez que se aproximava a meia-noite. Tinham vários colchões, lençóis, algemas e cabeceiras de metal em um dos dormitórios que não estavam ocupados, a modo de reposição. No caso de destroçarem tudo.

Harry colocou uma camiseta negra e um par de botas. Depois atou adagas aos pulsos, a cintura e os tornozelos. Não levava pistolas. Violência e ele estavam de acordo em uma coisa: os inimigos deviam morrer de uma maneira pessoal, próxima.

Se algum dos humanos que estavam no bosque naquele momento fosse um Caçador, ou uma isca, não tinha salvação possível.


Bom esse foi o 1º capítulo espero que gostem!

E não esqueçam de comentar.