O som estridente do telefone desperta a mulher que prontamente coloca-se sentada à cama. Os olhos cinzentos estão afoitos à procura do aparelho que continua a emitir o mesmo som irritante, desesperado para que seja atendido o quanto antes. Será que a pessoa que a procura ainda não se deu conta de que durante a madrugada as pessoas dormem? Não é de seu feitio receber ligações noturnas. Aliás, pode-se dizer que aqueles que a conhecem não são tolos de acordá-la em meio a uma noite escura, sem estrelas, sem lua. Pensando bem, isso não deve ser obra de alguém que habita a sua mesma facção. Burrice não existe dentro da Erudição. Quem a está contatando não a conhece, muito menos as regras que a mesma impõe aos membros eruditos que a veneram.

Silêncio. Será que o inútil que despertara a mulher loira finalmente terminara e dera-se por vencido? Será que ele compreendera que Jeanine Matthews não se daria ao trabalho de atendê-lo tarde da noite? Será que...? Talvez as coisas não sejam tão superficiais quanto parecem. Por um acaso o plano fora descoberto e o imbecil que a está importunando tentou avisá-la de que ela corre perigo? Mas, se algo realmente deu errado, ela já não deveria ter sido avisada antes de ir para a cama? Quer dizer, como alguém que a apóia seria escuso o suficiente para levar à tona esta ideia, tornando-a pública e fácil de dar errado? Não, os líderes da Audácia não trabalham desta maneira. Ao menos, não um deles em especial.

As mãos longas dirigem-se ao rosto cansado. Ela sabia que não conseguiria voltar a dormir. Não agora que tivera seus sonhos suspensos por uma ligação insistente. Além do mais, se o energúmeno que lhe telefonara aceitou tão facilmente seu desdém, ele jamais teria seu número entre seus contatos. Por favor, estamos falando da mulher mais brilhante de toda a Chicago futurista. Estamos falando da líder Erudita, a que possui maior poder dentro da sociedade que está fadada às ruínas, caso não a apóie. Ela jamais se permitiria dar a um completo inútil seu número pessoal. Nem mesmo os membros do governo, os insuportáveis membros da Abnegação têm a honra de possuir uma relação tão estreita junto a ela. Francamente, alguém genial e perspicaz como Jean não se misturaria com subordinados. O barulho estridente retorna. Pelo visto a situação não pode ser chamada de corriqueira. Aliás, quem a procura não deve ser qualquer um como ela imaginara.

Ainda no escuro, os olhos astutos da líder nata procuram pelo telefone que não está próximo. Ela levanta do leito desfeito notando, sobre uma mesa no canto esquerdo do cômodo, uma luz azul picando continuamente. É dali que o som irritante vem. É da mesma mesa, à esquerda do quarto, onde papéis foram deixados espalhados desde a noite anterior. É o mesmo local no qual suas ideias estão detalhadamente especificadas, nos vários documentos que vem sido analisados há mais de 6 meses. Lá é onde seu plano brilhante foi escrito, desenvolvido e tem sido pesquisado atualmente no mundo real.

Cuidadosa, Jeanine contorna a cama queen size, preocupando-se em não se machucar ou até mesmo tropeçar em móveis ou livros que costumam ficar espalhados pelo aposento. Assim que se aproxima da mesa os dedos ansiosos apertam o aparelho com força. O som é ainda mais estridente agora que o telefone encontra-se em suas mãos.

Ajustando um pouco os olhos para acostumar-se com a claridade da tela, Jeanine prende a respiração ao ler as palavras "número desconhecido". Mas é muita petulância a pessoa incomodá-la em meio à madrugada e ainda achar que está no direito de esconder-se atrás de uma sequência numérica misteriosa. Quem é este covarde afinal?

-Identifique-se. – diz em tom furioso.

-Boas notícias. – a voz do outro lado da linha responde prontamente. Não parece a voz de alguém da mesma idade da líder erudita. Pelo contrário, a voz masculina é grossa e jovial, de alguém que mal completara 18 anos. – Os últimos testes acabam de ser concluídos. A próxima e efetiva fase pode ser iniciada a qualquer instante.

A mulher de 45 anos emudece. Não esperava por aquela informação, não tarde da noite. O coração dispara no peito, ansioso por constatar os resultados de algo que mudará por completo a sociedade. Simplesmente inacreditável. Ela não pode acreditar. A erudita não conseguiria suportar esperar até o dia seguinte para verificar com seus próprios olhos o seu projeto de uma vida inteira sendo colocado em prática.

-Espere-me na entrada do quartel general. Estarei aí em 10 minutos.

-Sim, Sra. Matthews. – o homem agora soava tão ansioso quanto a mulher loira.

Ainda conectados pela linha telefônica, Jeanine emitiu um suspiro e disse inesperadamente:

-Eric?

-Pois não, Jeanine?

-Se o que você me diz é verdade, teremos muito o que comemorar esta noite.

-Providenciarei algo especial só para você.

-Não, meu querido. – disse a líder da Erudição enquanto abria um sorriso malicioso nos lábios carnudos – Providencie algo para nós dois.

Ambos encerraram a ligação ao mesmo tempo. Havia muita ansiedade, muita vontade de provar ao outro que a união os fortaleceria, principalmente durante a última e extraordinária fase.

O veículo preto pouco se preocupa com a alta velocidade. O motorista facilmente ultrapassa os 320 km. A passageira tem pressa. Anseia por respostas, por verificações reais a respeito de seu projeto. Os prédios completamente escuros dão um ar sombrio ao cenário. Não é possível ver as ruínas e as más conservações. Vêem-se somente fachadas obsoletas, de uma época que fora incapaz de seguir adiante, ao decorrer do tempo.

O banco de couro confortável incomoda a passageira que tem pressa em chegar ao seu destino. O terno azul marinho confunde-se com o estofado da mesma cor. Os olhos cinzentos olham de relance para o relógio de pulso que marca 2h15 da manhã. Não há mais sono, muito menos preocupação. Há somente ansiedade, vontade de ver anos de pesquisa sendo postos em prática.

Quando Jeanine Mathews propôs aliança entre as facções da Erudição e Audácia, a mesma jamais imaginou algo tão grandioso e extraordinário quanto aquilo que está prestes a ocorrer. É verdade que os eruditos são repletos de inteligência, conhecimento vasto e vontade gigantesca de ir atrás do novo, do diferente, do impossível. Mas, o que todo erudito sabe é que não há triunfo sem esforço e para consegui-lo é preciso o uso de ferramentas, armamentos que vão além de analises em laboratórios. É preciso ir a campo e, nesse caso, nada melhor do que utilizar da melhor equipe acostumada a batalhas: os membros da facção da Audácia.

Quando as cinco facções foram criadas ficou determinado que os membros da Abnegação fossem os únicos capazes de governar a sociedade. São seres incorruptíveis, completamente doadores de si, sempre dispostos a estender a mão, ao mais necessitados, quando necessário. Todavia, é simplesmente inadmissível as outras quatro facções não possuírem voz em meio às tomadas de decisão. Isso pode soar presunçoso e pouco educado. Sim, se você pensar a respeito isso é realmente desagradável de pensar e ainda mais de dizer em voz alta. Entretanto, como pessoas que sempre se preocupam tanto com os menos afortunados podem compreender o que facções melhor estruturadas precisam para sobreviver? Por favor, o mundo não é feito apenas por grupos pobres, ignorantes por terem feito a decisão errada e ter caído em uma facção que nada tinha a ver com seus perfis. Quer dizer, um adolescente de 16 anos espera exatamente o quê? Uma vida fácil, sem compreensão de mundo e de si mesmo? Muita coisa precisa ser mudada. A sociedade atual precisa de uma repaginaçã Erudição quem precisa apresentar ao mundo a era do conhecimento e da libertação.

O veiculo estaciona após o percurso de 10 minutos. O motorista sai de seu acento e educadamente abre a porta da passageira para que a mesma possa sair com elegância. Os saltos agulha tocam o solo com leveza. As pernas bem torneadas exibem uma perfeição que vai muito além da esperada para uma mulher de 45 anos. A saia azul marinha é simples, porém elegante. Não é comprida, muito menos curta. Ideal, como tudo na Erudição. A blusa de seda, azul mais clara, possui um decote um tanto quanto provocante, permitindo que qualquer homem crie expectativas que vão além dos rudimentares pensamentos ferinos, excitando-o com uma simples observação. O casaco leve, em tom azul marinho escuro, cria a graciosidade que compões a aparência magistral da líder erudita. A pasta entre os dedos é apenas um acessório que poderia ser dispensado a qualquer momento.

Um homem de vestes pretas a aguarda. Os braços musculosos, outrora defensivos, relaxam ao analisar a dama que se dirige a ele. O sorriso malicioso estende-se, enquanto os olhos escuros cintilam um brilho nunca antes emitido. Será que ela vestira-se daquela forma convidativa especialmente para ele? Será que ela o conhece tão bem que é capaz de enlouquecê-lo apenas com aquelas vestes?

-Concluo que os resultados foram alcançados. - diz a mulher loira enquanto segue um dos líderes da Audácia por um corredor estreito.

-Diria que foram ainda melhores. – responde o rapaz abrindo uma porta pesada de metal conforme realiza um gesto para que a acompanhante caminhe à sua frente.

Jeanine pára diante de Eric, extremamente próxima a ele, podendo sentir partes de seu corpo junto ao dela. Aquilo não soa nem um pouco constrangedor. Pelo contrário, seus corpos tão rentes é algo muito provocante, delicioso, quase um êxtase.

-O que você quer dizer com resultados ainda melhores, Eric?

A voz baixa e cativante faz os pêlos do garoto da Audácia eriçar. Aquela mulher sempre soube como estimular pensamentos sujos em sua mente masculina deturpada. Acercando seu corpo ainda mais, ele faz com que a dama toque suas costas à parede gelada. Os olhos cinzentos continuam fixos aos olhos escuros do rapaz. Um dos braços de Eric dirige-se aos tijolos, como se procurasse prender sua presa. Vê-la acossada é excitante demais para um ex-erudito. A mão livre desliza demoradamente pelo decote provocante de Jeanine. O dedo indicador demora-se confortavelmente sobre um dos mamilos já enrijecidos da dama. Aquilo muito o diverte. Os lábios encostam suavemente uma das orelhas de erudita e a voz que na maioria das vezes é alta, grossa e assustadora, agora é baixa, um sussurro provocante.

-A curiosidade ainda vai te colocar em apuros, Jeanine.

Inesperadamente o garoto leva os dentes ao lóbulo da mulher, mordendo-o levemente. Sua pele é suave e emite um odor cítrico. Sua excitação é ainda mais evidente. Como a senhora à sua frente pode causa-lhe tanto prazer? Ele, um garoto que mal completara 18 anos consegue sentir-se atraído por alguém que poderia ser a sua mãe? Mas Jean não é qualquer uma. Aliás, ela nunca o fora. E por Eric conhecê-la tão bem, já que viveu na Erudição por 16 anos, o rapaz sabe que sua ex-líder sempre fora peculiar, única. Os dentes divertem-se. Os ouvidos do garoto deliciam-se enquanto escutam gemidos vindos da dama que o puxa ainda mais para perto de si. Os lábios de Eric deslizam suavemente pelo pescoço de Jeanine e devagar os mesmos retornam aos seus ouvidos, sussurrando palavras provocantes:

-Eu adoro te ver em perigo. Adoro te ver encurralada, como agora. É delicioso vê-la acuada.

Jeanine sorri maliciosamente. Uma de suas mãos puxa o rosto do Eric com violência. O menino assusta-se com o movimento inesperado, sendo agora acuado, no outro lado do corredor. Jean o tem preso, próximo a ela, podendo sentir sua respiração ofegante. Aquilo é tão divertido quanto perigoso. O jogo acabara de iniciar e as coisas já estão tomando proporções inimagináveis. Aproximando os lábios carnudos das orelhas repletas de cicatrizes, a dama sussurra em voz insinuante:

-Eu não sou as menininhas de 14 anos da sua facção patética que adora colocar-se em apuros para chamar a sua atenção. – as unhas compridas afora provocam um certo desconforto no garoto. Ela o está machucando. Ela aperta suas mandíbulas com extrema violência que chega a deixar o intrépido aturdido de prazer. – Sou eu quem lhe provoca perigo. Sou eu quem lhe atormenta os sonhos. Sou eu quem vivo entre os seus pensamentos. Sou eu quem o amedronta e quem sempre deixará perturbado. Acredite, querido, você ainda não viu nada.

Sem esperar por uma resposta, Jeanine aproxima seus lábios aos de Eric e o beija violentamente, chegando a ferir-lhe a carne. O gosto de sangue que agora mistura-se às suas salivas torna tudo ainda mais excitante. As línguas brincam divertidas, uma corrida demorada, um jogo que poderia durar eternamente e que jamais teria um vencedor.

Repentinamente, Jeanine separa-se do rapaz aturdido. Por um instante é como se aquele beijo nada significasse à dama fria e calculista. Eric sente-se como um brinquedinho nas mãos da senhora insana. E, mesmo tudo aquilo soando tão estranho, o jogo o interessa ainda mais.

Dando as costas ao adolescente da Audácia, o mesmo que ainda controla-se para esconder sua excitação visivelmente aparente, Jeanine caminha alguns metros á sua frente enquanto fala em um tom divertido e malicioso:

-Seja obediente e leve-me ao nosso projeto.