Correu os dedos por aquelas bochechas pálidas de pele macia, o olhar era duro, como se fitasse seus piores demônios querendo engolir-lhe a alma. Mas era só o frio do espelho contra seus olhos certos, os dedos finos ainda traçavam linhas imaginárias por suas bochechas, até tocar seu, rubro, lábio.
Era tão doce e tão frio ao mesmo tempo. Era o toque de dedos longos tentando secar as lágrimas. E enquanto tentava secá-las, dançava sobre a sua pele e acariciava as cicatrizes eternizadas que só seus olhos eram capazes de ver, ele sabia. Cicatrizes prateadas de um passado inóspito que foram deixadas pelas mais duras lágrimas passadas e todas elas escorreram e pingaram, solitárias, sem nada ou ninguém para secá-las. Sem ninguém para ampará-lo.
Abaixou os olhos, não querendo mais se ver no espelho redondo, era dor demais, era agonia demais, e as mãos enluvadas jamais pararam de secar-lhe as lágrimas. Cerrou os punhos, arranhando com força o mármore branco, sem nem deixar uma só marca. Porque ele já tinha as dele, e não se deixava marcar por outras, facilmente. Então fechou os olhos com tamanha força porque esperava não mais ter que abrí-los e em desespero constante, espalmou a mão que, carinhosamente, um carinho hipócrita, lhe afagava as maçãs do rosto.
–Boochan...
Ciel abriu os olhos, imersos em tamanha tristeza, e fitou o espelho novamente, não se prendendo a sua própria imagem, mas a do homem de negro atrás de si. E chorando, sem se envergonhar, naquele momento, perdeu-se no vermelho do olhar do demônio.
–Só fique calado e ao meu lado, Sebastian.
–Tudo o que desejar, boochan. Esse é o acordo.
Diante do espelho, Ciel pode notar as mais novas cicatrizes, incuráveis, que lhe desciam pelo rosto. Amava um demônio que amava sua alma.
–Sebastian. – Ele permaneceu quieto, esperando as mesmas ordens que sempre vinham. Afinal, seu boochan ainda era uma criança, uma ingênua criança de treze anos sem família e aos acalentos de um demônio. – Essa noite, eu espero que me ame, como você nunca amou alguém. – Parou e novamente fitou o demônio, seu sorriso perfeito, seus cabelos negros. – Como eu nunca senti de ninguém.
–Devo considerar isso uma ordem, my lord? – Murmurou ele, diante das paredes silenciosas. Ciel era a mais bela e mais amável aquisição que já tivera e, passando os braços ao redor da criança, afagando-a enquanto a puxava para seu colo, sorriu diante das trêmulas palavras.
–É uma ordem, Sebastian.
Em um abraço calmo e consolador, o garoto pode chorar todas suas lágrimas dolorosas escondido do mundo, escondido nos braços de um demônio que comeria sua alma.
E ele nunca saberia se aquele amor era real ou não. Ele nunca saberia se Sebastian Michaelis algum dia havia pensado em não mata-lo, em passar a eternidade ao seu lado.
Ele nunca saberia o quanto um demônio perfeito, como ele, amou uma criança solitária.
–Yes, my lord.
