Pra quê ir pra casa mesmo? Enfrentar cobranças sem fim, pressões, broncas, retaliações e escassez de amor? Passar o bendito feriado encrustado em um lar frio e medonho, contornado de seres medíocres e a lúgubre infelicidade do recinto? Não, obrigado... Eram esses os pensamentos que assombravam as mentes de Harry e de seu grande rival, Draco Malfoy. Ambos desdenhavam seus lares, se é que podiam ser denominados assim, porque a concepção de 'lar' havia lhes escapado há anos. Os jovens passavam parte de seu tempo com familiares detestáveis, violentados psicologicamente durante anos, encaminhados à solidão e à escuridão, sem nem tentativa de luta. À época do Natal, Hermione despediu-se dos amigos com entusiasmo, e aconselhou que voltassem para o outro semestre do quinto ano com mais ânimo. Ronald, o grande companheiro de Harry, foi-se para a Toca muito sorridente. Talvez o abraço de Hermione tivesse algo a ver com isso.
Draco sentia entre os dedos a textura veludosa de uma das cortinas verde-musgo da Sala Comunal da Sonserina. Nada de esperanças para ele; cobravam-lhe resultados por onde o rapaz mal saberia começar, treinamento forçado, exposição a rituais escabrosos, juramentos efêmeros... Draco cresceu instruído pelos ideais do pai, o influente Lucius, e desde pequeno defendia as Trevas, e usava a bandeira do Mal como a da sua pátria. Para quê aquilo tudo? Queria ele um futuro tingido de sangue? Queria passar o resto da vida bajulando um mestre a qual não vira mais que meia dúzia de vezes? Pretendia matar por prazer? Ver o sofrimento, a vida escorrer pelo asfalto, como esgoto? O Natal chegava, e nada além de angústia permeava sua alma.
A Torre da Grifinória estava camuflada sob tanta neve. A noite parecia mais intimidante que o usual. Harry limpou os óculos na barra da camisa e os recolocou sobre a ponte do nariz em seguida. O dormitório estava vazio, e o fogo da lareira não amenizava a sensação de solidão que o cômodo trazia. Recostou-se na cabeceira da cama. Ele mal podia esperar para os amigos voltarem. Nem que fosse Neville. Apenas para ter uma companhia, poder conversar com alguém direito, sobre o que gostava, sobre coisas do Mundo Mágico, e não ser forçado a barrar essa parte de sua vida por causa dos tios. Tios que, aliás, detestava. Tratavam-lhe como um trapo sujo, inútil, que alastrava nada além de poeira e feiúra. Quanto mais pensou nos parentes, mais pôde sentir que enraivou-se por causa deles. Tinha mesmo que passar por aquilo? O que o confortava era o fato de não precisar ficar perto daquela gente por alguns dias de feriado e férias. Suspirou fundo e encarou as cortinas do dossel, vermelhas como sangue.
Na tarde seguinte, Harry descia as escadarias em
direção ao térreo. Planejava ver alguém
além dos segundanistas barulhentos; estava vestido de maneira
confortável, como costumava fazer na casa dos Dursley. Ele
sabia que, durante o dia, os alunos que permaneciam no castelo
durante as festividades, ficavam no Salão Principal. Talvez
encontrasse Dean, ou Lee. Adoraria conversar com eles sobre
quadribol. Foi nessa linha de pensamento que o garoto pôde
ouvir alguns passos leves vindos dos degraus. Ao chegar ao sopé
da escada, deu de cara com o detestável herdeiro dos Malfoy:
Draco, que vinha coberto por uma camisa escura e péssima
expressão. Harry nem cuidou de cumprimentá-lo. Foi
quando ouviu a voz arrastada do outro.
- Esqueceu a educação
em casa, foi, Potter? – indagou Draco, com um sorriso no canto da
boca. Se tinha uma coisa que adorava, era provocar Harry. Vê-lo
ferver de raiva e permanecer quieto, junto de sua patética
índole grifinoriana de evitar brigas. – Nem no Natal você
sabe falar direito?
Harry pigarreou, e virou-se para o sonserino.
Nada mais desagradável que encontrar Draco na hora da digestão
do almoço. Provocava mal-estar.
- Com você faço
questão de não usá-la. Aliás, Malfoy,
este ano comprei uma coisa legal: xingamentos. Quer ouvir alguns
deles? Tenho um conjunto comigo muito bem preparados. – Harry não
estava mais apto a baixar a cabeça às malcriações
do sonserino. Talvez fosse a falta de uma multidão em volta
deles, instigando a briga, ou a ausência de Crabble e Goyle, os
cães de guarda de Draco.
O herdeiro dos Malfoy deu dois
passos para frente, e mantinha o sorriso desdenhoso. Chegou a
expressar uma cara de desprezo.
- Mas veja só! O Cicatriz
aprendeu a ser mal-criado! Com quem aprendeu tudo isso? – o moreno
não estava com paciência para aquela frivolidade.
Encarou o rival e começou a respirar a largas passadas, como
que tentando reter sua raiva. – Com a nojenta da sangue-ruim? Hum,
ela não teria frases tão prontas, isso não se
aprende nos livros... – e fingiu coçar o queixo, como que
organizando os pensamentos. – O pobretão Weasley? Ah não,
já sei! – apontou para Harry, fingindo ter tido uma
epifania. – Foi aquele macaco peludo do Hagrid! – e fitou o chão.
– Bom, com os seus pais não foi...
Harry mal podia
acreditar. Era dia de Natal e lá estava ele ouvindo uma
coleção de bobeiras vindo do rapaz que tinha menos
crédito com ele! Tratou de revidar à altura.
- Acho
que foi observando a sua família desclassificada. –
respondeu Harry, com uma das sobrancelhas arquedas. – Ou melhor, só
você mesmo já dá um belo exemplo de como não
se deve ser.
Draco aproximou-se do outro. Parecia ter acatado às
provocações.
- Você tem metade do sangue
sujo. Aliás, quem é seu pai mesmo? Será que era
bruxo de verdade?
- James Potter, homem que jamais lambeu os pés
de Você-Sabe-Quem, e nunca ofereceu para ele seu... – Harry
não pôde completar. O loiro foi tomado de tal fúria
que Harry apenas sentiu uma ombrada no estômago. Caiu de costas
no chão e ergueu o tronco para poder respirar, mas quando deu
por si, Malfoy havia pulado em cima dele e levantava o punho para
esmurrar-lhe a cara. Harry foi mais rápido e acertou-lhe um
soco de direita na face pálida do rival.
- Seu imbecil!
Filho de uma... – começou Draco, enquanto esfregava o lugar
onde fora desferido o golpe. Levantou-se de imediato, mas mal pôde
prever que Harry viria em seu encontro, para espancar-lhe. Malfoy deu
passos para trás e tateou rapidamente a parede. Por sorte,
havia uma maçaneta. Girou-a, mesmo estando de costas, e sentiu
um empurrão forte, vindo do grifinório. Os dois caíram
no chão e continuaram atracados. Mal podia-se divisar os
braços e pernas que tentavam de qualquer maneira nocautear o
adversário.
A confusão continuou, até que
Harry se viu debruçado sobre o rosto de Draco, segurando as
mãos dele sobre a cabeça alourada. Havia vencido. Para
terminar de uma vez com aquilo, aproximou a boca da de Malfoy e
murmurou.
- Sangue não garante nada, Malfoy. Quem aqui
venceu?
A resposta ficou para sempre em aberto, porque Draco
levantou a cabeça de leve e teve tempo para beijar os lábios
macios do moreno. Nada fora planejado ou pré-determinado.
Harry soltou os pulsos do loiro e tratou de apoiar-se sobre as mãos,
mas ainda sim correspondendo à atitude inesperada. Draco
envolveu o pescoço de Harry com uma das mãos e com a
outra, passou a apertar aquelas costas magras, e os ombros redondos.
Sem perceber, Potter começou a ficar excitado. A loucura que
cometia era eterna para o momento. Continuou concentrado em explorar
a boca de Draco com a língua e os lábios, e sentir as
mãos do outro alisando suas carnes avidamente, como numa
emergência. Apoiou-se nos cotovelos, e fez com que o loiro se
deitasse em meio aos seus braços. O moreno pôde detectar
algo novo: a ereção de Draco pressionada contra as suas
coxas. Harry se assustou, mas prosseguiu. Malfoy afastou o rapaz e
com a varinha apenas recostou a porta do cômodo; em seguida,
tirou a camisa. Apesar daquilo parecer um pesadelo terrivelmente
real, Harry ficou ainda mais interessado.
Observou o tronco magro
e mediano do sonserino: tinha raros pêlos loiros e peitoral
menor que o seu. Draco levantou o queixo numa atitude passiva, e
Harry mergulhou naquela palidez macia. Chupou a orelha dele,
deixou-lhe algumas marcas de tesão e lambeu toda a extensão
branca de pele. Malfoy gemia pouco, mas quando o fazia, o grifinório
podia sentir pontadas em sua própria ereção. Foi
quando ele se deu conta do que estava fazendo.
Levantou-se de
súbito, arfando, e com a boca avermelhada. Afastou-se a passos
errantes e saiu, batendo a porta com força. Draco continuou
deitado, e sorriu, de olhos fechados.
O episódio terminou ali. Draco não respondeu quem vencera a briga, Harry abraçou os amigos com imensa felicidade ao rever Ron e Hermione, e os dois nunca mais mencionaram o ocorrido. A vida seguiu com extraordinária repetição, até que Draco teve de cumprir, no fim do ano seguinte, a mais difícil de suas ordens...
