Saint Seiya pertence aos fãs e apreciadores, mas os direitos autorais são de Masami Kurumada.


Capítulo 1

Hugo deixou cair o copo d'água, como se não coordenasse mais os seus sentidos. Via mais ao longe, no final da sala de espera, a mãe chorar descompassadamente, como nunca vira antes. E como desejou jamais ver.

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Era comum que ao fim da tarde, Hugo chegasse ao palácio com vários hematomas. Adorava brincar na neve o dia todo, e embora conhecesse o Palácio de Valhala como se tivesse um mapa do mesmo projetado em seu cérebro, sempre havia algo a se descobrir. E ferimentos a mais para se conseguir.

"Brinque com cuidado!" advertia sempre a mãe, impostando rigidez. Ou tentando esforçadamente impostar, pois Freya era tão doce com os filhos que mal conseguia aumentar o tom de voz ou mudar a expressão serena de seu olhar, havendo vezes que ela até ria da situação, sempre repetindo "como consegue esses hematomas vestindo tantos agasalhos?". E era por esta razão que Hugo sempre tentava não se ferir, para que Freya nunca se aborrecesse, e assim não perdesse a doçura que ele tanto cativava na mãe.

Tinha portanto, uma certa inveja de Adelle, sua irmã gêmea, que possuia tanta delicadeza em seu ser que era possível contar com os dedos de uma unica mão todas as vezes de sua vida que ela se machucara brincando. E isso porque ela era na maioria das vezes cumplice de Hugo nas estripulias. E sempre que se feria, chorava como se o arranhão no joelho fosse uma amputação, mais uma razão para que o menino tivesse mais cuidado, pois sempre protegia a irmã.

E este foi um fator preocupante no ultimos dias. Freya observou uma enorme mancha roxa nas costas de Adelle, enquanto a agasalhava, como se tivesse levado um grande tombo e batido o quadril. Mas durante este meio tempo, não houve nenhuma reclamação da menina.

- Onde conseguiu isso?

- Hum... Eu... não sei mamãe. - Respondeu a menina, virando-se no espelho para verificar a marca, tão surpresa quanto Freya.

Desde então, Adelle nunca mais brincou com Hugo, pois sempre se sentia cansada ou com dores. Passava o dia em seu quarto, lendo e desenhando paisagens. Apesar de estar se alimentado normalmente, estava cada dia mais magra e indisposta.

E eis que ao levar Adelle ao hospital, e tendo recebido o triste resultado dos exames da menina. Freya concluiu o quanto necessitaria de forças a partir de então, e o quanto ainda era fraca.

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Hugo andou um pouco mais depressa, e logo sentou-se ao lado da mãe, que tentou retardar o choro assim que o viu. Enxugou as lágrimas e brincou com os curtos cabelos do menino, e após beijou-lhe o topo da cabeça.

- O que faz aqui, hein? - Perguntou, com um singelo sorriso, tentando esconder seu tormento. Em vão, pois o garoto só se sentia mais angustiado vendo-a desta forma, esperando que a qualquer momento ela explodisse de tanta dor.

- Pedi a tia Hilda que me mandasse para cá. Vocês estavam demorando demais para voltar.

Ele pousou a cabeça sobre o colo dela, enquanto ela continuava afagando seus cabelos louros.

- Mamãe... eu vi você chorar. - Dizia com pausas, como se tivesse medo de falar, mas precisasse - Eu nunca havia visto você chorar. Eu... Quero ver de novo.

Freya sorriu ainda mais, comprimindo os olhos para barrar mais lágrimas. Mas foi inútil; Hugo achava que seria melhor que toda aquela enxurrada de sofrimento escorresse logo, intensamente e sem hesitação, do que ser comprimida. Isso a faria crescer tanto, até que de tão cheia, transbordasse com tamanho impacto que afetaria quem estivesse ao redor da maneira mais dolorosa. E Freya compreendia muito bem isso (apesar de estranhar que um menino de nove anos compreendesse algo assim).

As lágrimas caiam sobre o rosto dele. Eram intensas e geladas, como se estivesse banhando-se numa chuva de granizo.

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- Cuidado! - Berrou Hilda, protegendo Freya e a si, da explosão de agua que vinha do mar. Felizmente apenas alguns respingos as atingiram.

E eis que do turbilhão surgiram impactantemente. Atena, extremamente desgastada e ferida, sendo amparada por seus Cavaleiros, que apesar de lhe darem um grande auxilio, não estavam melhores do que ela.

- Pelos deuses. - Exclamou Freya, arrepiando-se por inteiro apenas por vê-los ensopados pela água gelada. Ela e irmã distribuíram os cobertores que haviam trazido, e os acompanharam até o Palácio de Valhala para aquecerem-se mais.

...

A grande mesa de jantar nem havia acabado de ser posta, e já havia alimentos para uma comunidade. As mais variadas verduras, legumes, carnes e cereais. Após uma árdua batalha contra o deus dos mares, Hilda queria uma grande hospitalidade para seus convidados, que outrora a libertaram da maleficência, apesar das tristes perdas.

Estavam quase todos a mesa, porém ainda haviam duas cadeiras vazias, e uma logo se ocupou. Shiryu andava devagar, com os olhos enfaixados, mas tinha uma incrível facilidade em encontrar as coisas, como se ainda enxergasse quase por completo.

- E Hyoga? - Indagou Saori a Hilda, olhando de canto para a ultima cadeira vazia. Hilda mirou a servente recém-chegada, indicando que respondesse.

- Está fazendo curativo no olho ferido. Tivemos um pouco de problemas pois sangrava muito, mas já está controlado.

- Certo, obrigada. - Saori sorriu com alivio.

Observando as expressões de todos, que pareciam famintos, a anfitriã pronunciou-se:

- Creio que ele não se ofenderia se já servíssemos o jantar, não? Sirvam-se.

E assim foi feito. Até que em poucos minutos o Cisne apareceu na sala. Já com o olho enfaixado, encontrou o lugar vazio, e lamentou constrangido a demora.

- Sem problemas. - Respondeu Hilda - E já se sente bem?

- Sim, na medida do possível. Ao menos ainda tenho um olho bom.

- Isso é ótimo. - Sorria a anfitriã - Vá, sirva-se.

Ao erguer-se para apanhar um alimento, Hyoga notou que Freya o mirava fixamente, sem pudor. Seu olhar era peculiar, impossível de dizer com certeza o que ela estava realmente pensando enquanto o olhava. Disfarçou seu olhar para ela, fixando os olhos no prato de porcelana, podendo apostar que suas faces estavam rubras de vergonha.

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- Mamãe! - Exclamou a menina com sua suave voz, antes de receber um abraço apertado. Já estava vestida com a roupa hospitalar, e deitada na cama, desenhava montanhas. Ao lado, no criado-mudo, havia uma revista de turismo aberta, de onde ela copiava as tais montanhas. Mas ainda que parecesse a vontade, seus gigantes olhos verdes gritavam para a mãe que queria a sua cama, em casa.

- Vou ficar aqui quanto tempo? - Questionou com a voz engasgada, e com os olhos marejados, fragmentando o coração de Freya.

- Não sei querida. Até você ficar melhor. - As pálpebras da jovem se contraiam esforçadamente.

- Eu estou melhor, mãe. É sério... - Adelle abaixou a cabeça, fitando o desenho em seu colo. O polegar de sua adorável mãe afagava suas bochechas cor-de-rosa, que estavam cada vez mais pálidas.

- Ainda não, Delle. Falta mais um pouco para você ir para casa. Tente ser paciente. - Freya afastou as mechas louras que cobriam parte do rosto da garota, e depositou um beijo ruidoso. Adelle ergueu os olhos levemente vermelhos, e enxugou as poucas lágrimas que caíram.

- Onde está Hugo? Ele vem me ver? - Tinha grande expectativa na voz, até mesmo pressa.

- Vem sim, claro. Ele está maluco para ver você.

- Que bom, bom mesmo... - A menina sorriu, confortada. Pousou o desenho sobre o criado, e fixou os olhos nas janelas, que lhe davam a visão dos solos cobertos por neve - Quero muito falar com ele...

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As luzes do grande corredor estavam mais fracas, anunciando o horário de repouso. Já era possível confundir ou esbarrar em pessoas. Mas as chances disso acontecer eram pequenas, considerando que a maioria dos convidados já havia se recolhido... a maioria.

Hyoga ainda procurava seu quarto, caminhando pelo corredor imenso já há algum tempo. Eram portas iguais em corredores diferentes, o que facilitava a desorientação. Em meio a procura, distraiu-se com a paisagens montanhosas de neve retratadas através das imensas janelas do corredor. Achava incrível como aquele lugar, ainda que tão distante, era tão parecido com a Sibéria. A saudade de sua terra veio quase instantaneamente.

Mas seu transe diante das janelas foi interrompido por um chamado firme ao longe, no fim do corredor.

- Hyoga! - Freya o mirava bem fixo, com o mesmo olhar estranho que tinha no jantar, e caminhava com certa pressa em direção a ele.

- Olá Freya... hum... - Sentia-se extremamente receoso em encará-la, e mais ainda em falar com ela, considerando os últimos acontecimentos. Mas a garota não tinha hesitava em fitá-lo, enrugando o cenho com a respiração pesada.

- Você está bem? - Indagou, afastando as mechas do rosto dele e tateando as ataduras do olho ferido - Não me diga que isso tem a ver...

- Com Hagen? Não se preocupe, foi no reino de Poseidon. - Conseguiu por fim dizer, vencendo seu embaraço.

Freya ressentiu-se, aparentando um certo alivio.

- Eu sinto muito.

- Não, sou eu quem sente. - O cavaleiro resolver ser implacável, do contrário não conseguiria mais se manifestar - Eu soube sobre Hagen e você. Eu... eu estraguei tudo. Eu sinto muitíssimo.

Hyoga não a fitava mais, mantendo os olhos fixos ao chão. Mas surpreendeu-se, a ponto de seu coração palpitar, quando ela ergueu a face dele com o indicador, levando os olhos dele ao encontro dos seus, e um leve sorriso esboçava-se.

- Fiquei imaginando... se você tivesse morrido no lugar de Hagen, e vocês não tivessem salvo Atena, como todos nós estariamos agora. Minha irmã, Asgard, tudo em ruinas... tenho calafrios apenas em imaginar. - Ela segurava uma das mãos do rapaz, que surpreso com suas palavras, a mirava profundamente, dissolvendo todo seu constrangimento - Eu de fato estou mal por Hagen, e por todos que morreram também, mas isso não tem nada a ver com você, poderiam muito bem ser outro a derrotá-lo. As coisas acontecem com um propósito. - O sorriso dela alargou-se - Eu na verdade teria que agradece-los por muito tempo pelo que fizeram por Hilda, portanto fique tranquilo.

- Obrigado por dizer isso. - Ele soltou a mão devagar, plenamente confortado - Bem, eu vou me retirar.

- Sim, vá. Tenha uma boa noite.

Ele respondeu com um sorriso ardente, caminhando pelo corredor.


Quem já vasculhou meu perfil aqui no site já notou que eu não escrevo muito (quase nada, aliás rs). Mas essa historia não saia da cabeça, se eu não escrevesse logo ficaria doida hehehe

Então aí está, em breve terá mais capítulos.

Espero que agrade. Obrigada por ler.