I
Japão, 1995
O telefone tocou. O rapaz acordou a contragosto. Sete da manhã! Quem seria àquela hora?
Quis deixar pra lá, mas a pessoa insistiu. Devia ser algo importante... algum problema com seus pais, talvez?
Atendeu. A voz ensonada denunciava que ele havia acordado há pouco.
- Alô...?
- Oi, Gakuto! Tudo bem? Ei, cara, não era você quem estava procurando uma banda pra cantar?
- Hum...? Quem fala?
- É o Közi!
- Ah, oi... - o rapaz de Okinawa lembrou do estranho colega com apelido alemão - E aí, tem a banda?
- É que eu e um colega meu, dos tempos de pós-escola, tamos precisando de um vocalista. O que você acha?
- Ah... eu já te disse... eu acho minha voz ruim.
- Que é que custa! Tem nada demais, manda um demo pro meu conhecido e vê no que dá, sem compromisso algum!
- Esse teu conhecido... ele é quem vai escolher?
- É sim. Tu sabe né, sou meio aluado pra essas coisas... ele também é "doidão" que nem a gente, mas tem mais cabeça, é mais centrado. A música é tudo pra ele! Então, tou deixando as coisas mais na mão dele.
- Qual o nome dele...?
- Chamam ele de Mana. O nome real ninguém sabe...
Gackt suspirou profundamente, pensando por que teria atendido aquela ligação...
- Ah, cara, como você confia num sujeito que nem o nome verdadeiro dá...?
- Ele é esforçado. Na boa, é sim! Eu o conheço desde que ele veio pra Tokyo, em 1985...
- Tudo isso? E só agora vocês querem montar uma banda?
- A gente tem a banda desde 92, mas o vocalista antigo saiu fora. E aí, tenta!
- Tá OK... me dá o celular dele e eu ligo.
- Não quer que eu fale com ele primeiro...?
- Não. Nada de pontes, tá? Me dá o telefone.
Közi passou o telefone de Mana para Gackt, o qual decidiu dormir mais um pouco antes de ligar. Mal sabia ele... que aquele telefonema mudaria a sua vida para sempre.
OoOoOoOoOoOoO
Após dormir mais uma ou duas horas, Gackt acordou e resolveu ligar para o número que Közi lhe dera. No entanto, antes disso acendeu um cigarro, foi até a varanda e ficou pensando...
"Eu nunca quis ser cantor", disse de si para si. "Primeiro, meus pais vieram com aquela conversa de aulas de piano... depois, a bateria... depois... o canto, como um desafio a mim mesmo. Mas... valerá a pena? Não me sinto confiante... só que desempregado também não dá pra ficar! Contas a pagar... não tenho a mínima vontade de voltar para a casa dos meus pais... e agora?"
Após o cigarro, resolveu ligar. O telefone tocou algumas vezes. A seguir, uma voz grave, mais que a de Gackt, atendeu.
- Alô?
- Er... eu gostaria, por favor, de falar com o senhor Mana.
- É ele. Quem deseja?
- Ahn... um amigo em comum nosso, o Közi, ele... disse que o senhor estava procurando por um vocalista para a banda de vocês, e me passou seu telefone.
- Ah, sim... qual seu nome?
- Gakuto.
- Prazer em conhecê-lo, Gakuto. Como você já sabe, chamam-me Mana. Bem... tenho de analisar algumas amostras, e ver qual delas se adequa melhor ao trabalho que queremos fazer. Tudo bem se você me mandar uma fita demo?
- S-sim... mas... senhor...
- Ora, pare com isso de senhor... quantos anos você tem?
- Vinte e dois.
Uma risada foi ouvida do lado de onde Mana falava.
- Eu não sou muito mais velho que você. No máximo tenho idade pra ser um Nii-san¹ seu. Mas ao ponto de me chamar de "senhor"...
- Tudo bem... é... Mana. É que... para lhe mandar a fita, eu preciso...
- De meu endereço? Oh, sim, pode anotar...
Gackt tomou papel e caneta, e escreveu assombrado o endereço daquele homem de quem nem o verdadeiro nome conhecia. Afinal de contas... como ele não passava o nome, mas passava o endereço?
- Anotou, Gakuto?
- Sim, está tudo aqui. Eu mando logo em breve, não se preocupe!
-OK. Até mais.
- Até.
O rapaz de Okinawa desligou o telefone, pensando naquele tal de Mana... parecia realmente um sujeito singular! Será que daria certo trabalhar com ele...?
"Deve dar", pensou. "Se não der... é só organizar uma saída, talvez pra outra banda. Por que não?"
Sendo assim, Gackt foi tomar um banho e comer algo, para em seguida iniciar a confecção da fita demo.
OoOoOoOoOoOoO
Duas semanas se passaram. Gackt gravara a fita, mandara para o tal de Mana e ficara uma semana sem resposta alguma. Após algum tempo, Közi lhe ligou... e Mana ligou alguns dias a seguir. Conversaram longamente.
- Eu gostei sim da sua voz - disse Mana - É bonita, profunda... cai bem para o que desejamos fazer.
- Ora, obrigado... mas saiba que ela foi fruto de muito treinar falsete... eu tinha a voz ainda mais grossa, era difícil...
Mana riu.
- Eu sei bem como é esse negócio de voz grossa... eu mesmo tenho uma bastante grave para os padrões orientais, e jamais me veria cantando.
- Mas se eu consegui, o senhor... digo, você... também poderia.
- Sem chance. Minha voz não orna nem um pouco com o...hã... visual que ostento na banda. Mas vamos ao que interessa, Gackt: quando a gente pode se encontrar pessoalmente?
- Hum?
- É. Como o meu grupo é feito não somente de música, mas de performance teatral em palco, precisamos colocar a alma naquilo. Os seus pensamentos devem estar ligados à banda, à proposta de tudo, entendeu?
- Sim... - aquela conversa estava assustando Gackt, mas ele não deixou que o outro percebesse.
- Por isso, preciso ver você pessoalmente. E conversar algumas coisas com você. OK?
- O-ok... quando... quando podemos fazer isso?
- Amanhã. Közi vai conosco. Sabe aquele restaurante de "ramen", que fica bem na rua...?
- Ah, sim... sei sim! Você gosta de ir comer lá?
- Prefiro eu mesmo cozinhar meu "ramen" e comer em casa... sou muito caseiro. Mas já que é uma reunião comercial...
- Tudo bem, por mim!
- Às oito da noite, o que acha?
- Perfeito, senhor Mana...
- Por favor, perca esta mania de me chamar de senhor! Assim me sentirei velho antes do tempo...
- Ah, me desculpe... é que a sua voz... ela dá uma impressão de respeito.
- Ora, Gackt... respeito deve vir das atitudes, não da modulação da voz de ninguém. Mas tudo bem, você é praticamente recém-saído da adolescência... ainda tem muito pra viver. Eu posso perdoá-lo.
O rapaz não gostou de ouvir aquilo, como se o outro, apenas alguns anos mais velho do que ele, soubesse tudo da vida e ele nada. Mas deixou pra lá... afinal, era uma oferta de trabalho.
- Tudo bem, Mana. Às oito.
- Até.
Mana desligou o telefone, e Gackt ficou o resto do dia pensativo... resolveu até mesmo dar uma volta pelas ruas, pra pensar melhor sobre o que fazer. Aceitar ou não...?
Algumas horas mais tarde, Közi ligou:
- E aí, Gackt? Parece que o Mana gostou do teu trabalho, hein!
- É, parece que sim. Ele quer que nos vejamos amanhã, no restaurante de "ramen"...
- Ele me contou. Quer que eu vá junto. Olha, o Mana é gente boa. Mas é muito, MUITO exigente com o trabalho dele. Ele não brinca em serviço, entendeu? Pode fazer uma teatralidade toda, pode se vestir de maneira excêntrica... mas ele não brinca. Ele quer tudo muito correto, muito a sério. Ele quer vr comprometimento em tudo. E ele é capaz de ficar um ano sem vocalista, com a banda parada e tendo de hipotecar a casa dele, só pra não submeter a banda a um vocalista qualquer. Portanto, eu te sugiro que vá vestido de forma meio excêntrica amanhã, tá? Pra impressionar o Mana de cara, pra ele ver que você tá disposto a incorporar isso pra sua vida.
- Tá certo... eu tenho um amigo que tem um carro vermelho. E tenho um terno roxo que fica bem excêntrico, O que você acha?
- Perfeito! Ele adora essas maluquices. Ele foi punk na adolescência. Já flertou com o movimento gótico e hoje... bem, é melhor você ver pessoalmente em que "vibe" ele está hoje. Tá?
- Tá bom. Mas vem cá... você disse que ele foi punk na adolescência. Então você deve saber a idade dele, né?
- Olha, cara... aquele ali não diz nem a idade, nem o nome de verdade pra ninguém. Ele não deve ser muito mais velho que você, logo a gente imagina que tenha no máximo uns vinte e oito anos. Mais que isso com certeza não tem. Mas por que quer saber a idade do cara?
- Porque ele quis me dar uma espécie de "lição de moral" porque o chamei de senhor...
- Ah, não leve as brincadeiras do Mana-chan a sério. Ele fala demais através desses "códigos", não dê importância.
- Tudo bem. Amanhã a gente se vê.
- Falou!
Ambos desligaram quase ao mesmo tempo.
OoOoOoOoOoOoO
No dia seguinte, perto das sete da noite, Gackt se observou no espelho. Estava bem, BEM estranho com o terno roxo. Mas... era o preço, não?
- E eu até acho legais essas coisas excêntricas... heh, se eu me dedicar bastante pode ser que seja até divertido trabalhar com esse tal de Mana...
O interfone tocou. Era o amigo de Gackt, o qual o levaria para o restaurante. Ele saiu o mais rápido que pôde. O amigo o olhou de cima a baixo, assombrado.
- E aííííí, rapaz? Vai onde com essa roupa?
- Por incrível que pareça, vou a uma reunião de negócios.
- Como...?
- É, cara, desde que me enfiei nessa coisa de música, um amigo meu quer me arrumar um emprego na banda dele e de um amigo dele. E esse amigo gosta de coisas meio bizarras, logo...
- Ah, sei. Entendi. Por isso quis que eu te levasse no meu carro, eh?
- Também. Se eu for contratado, te dou um agrado...
- Que nada, deixa quieto! Amigo é pra essas coisas. Vamos lá?
- Vamos.
O carro dirigiu até o restaurante, e parou logo na porta. Em frente ao estabelecimento, se encontrava uma moça de vestido negro e branco, saia rodada, luvas rendadas, maquiagem muito bem feita em tons pastéis, lentes azuis nos olhos, os cabelos negros e longos de oriental presos num coque impecável. O sapato era branco, de salto fino e alto².
Gackt saiu do carro, e o amigo o felicitou:
- Boa sorte hein cara! Se ficar famoso, não esquece dos amigos...
- Pode deixar, não esquecerei!
Acenou ao amigo, que logo partiu. Todo mundo o olhava com estranheza pelo terno roxo e pelo carro vermelho do qual saíra, menos... a moça. E Közi, o qual logo saíra da mesa em que estava sentado dentro do estabelecimento, indo em direção a Gackt.
- E aí, cara! Nossa, tá pintoso dentro desse terno roxo, hein!
- Obrigado. Bem... vamos nos sentar?
- Vamos.
Sem que esperasse, a moça elegante os seguiu e sentou à mesa junto com eles.
- Er... a moça é sua acompanhante, Közi?
- É... mais ou menos.
- Prazer, senhora... - Gackt tomou a mão da jovem mulher e a beijou. Reparou nas luvas de veludo e num perfume peculiar, feminino, que exalava delas. Nos dedos, diversos anéis de prata.
- Ela não fala muito - disse Közi - Bem, vamos nos sentar!
Eles sentaram e conversaram de diversos assuntos. Bem, na verdade apenas Közi e Gackt, pois a moça não dizia palavra. De maneira fina e polida, ela apenas indicava com as mãos o que desejava comer, e Közi pedia para ela. Elegante como uma dama, ela comia sem fazer barulho, de boca fechada, usando os talheres com perícia.
"Que moça linda...", pensou Gackt, enquanto ora comia, ora conversava com Közi. "Pena que já está acompanhada... poxa, faz tanto tempo que não saio com uma mulher... também, essa trabalhada de me mudar, de arrumar ocupação, de dar um jeito de pagar as contas... a gente nem pensa direito em paquerar!"
O tempo foi passando, e nada do tal de Mana chegar. Gackt olhava pra um lado, pra outro... e nada. As horas passavam. Nove, dez, onze da noite... e nada. Absolutamente nada. Até a hora em que ele decidiu falar, enquanto degustavam um vinho branco recém-servido:
- Közi, desculpe falar do seu amigo assim, sem ele estar presente... mas até que pra uma pessoa super dedicada, como você mesmo disse, ele está vacilando... já são quase onze e meia e nada de ele aparecer pra gente conversar!
Közi desviou os olhos, engoliu em seco e se concentrou na sua taça de vinho. Mas a moça... a moça sorriu pela primeira vez na noite. E de seu lindo e fino rosto, de seus lábios bem pintados... saiu a voz grossa que Gackt estava habituado a ouvir do seu celular nos últimos catorze dias:
- Eu sou Mana.
To be continued OoOoOoOoOoOoO ¹Nii-san em japonês é "irmão mais velho". Com isso, Mana queria dizer que teria idade para ser apenas irmão mais velho de Gackt. ²Mana costuma usar salto plataforma bem alto, porém acho que pra se passar por mulher comum não ia pegar muito bem... então coloquei salto fino. Putz, deu a louca ni eu... e pior que quando gamo numa coisa, me fixo nela de tal forma, que nem dá pra desfazer... Acho que sou obsessiva... Agora gamei em Gackt X Mana - numa relação destrutiva pro Mana... - e o Kanon vai brigar comigo... *foge* Surtei tanto com essa fic, que fiz 5 capitulos em dois dias. Vai saber quantos mais vou fazer nos outros... e ainda tem os hiatus! Chessuis! No mais, NÃO CONHEÇO direito a história do Malice Mizer... dei um "toque meu" a alguns fatos reais, e por isso a história é ficcional, certo? Não aconteceu na vida real, etc... é loucura minha. No mais, se alguém é fã mais aguerrido da banda e eu fiz muita caquinha, me puxem a orelha... Beijos a todos e todas!
